(Fonte: A HISTÓRIA SOMBRIA DO OCULTO , Magia Loucura e Assassinato - De: Paul Roland ; EDITORA MADRAS )
HISTÓRIA DA MAGIA E FEITIÇARIA
A palavra “mago” deriva de Magi, o nome dos sacerdotes
persas do Zoroastrismo, que eram hábeis na interpretação de sonhos e
astrologia. Zoroastro (c.1700-1400 a.C) foi o primeiro profeta a proclamar que
o amor do Ser Supremo (Ahura Mazda) deveria ser buscado por sublimação, não por
sacrifícios, e que todas as criaturas vivas têm valor igual ao do homem.
Zoroastro reformulou o culto ao fogo, de forma que ele se tornou o símbolo da
Força da Vida Universal. De acordo com os Gathas, um texto sagrado atribuído ao
profeta, Ahura Mazda deu à luz espíritos gêmeos, que lutaram pelo controle do
mundo. Mas o Ser Supremo não criou o bem e o mal, pois esses conceitos são
humanos. O que chamamos de bem é simplesmente a habilidade de perceber a
realidade, ou a verdade das coisas, enquanto o mal é uma percepção distorcida
do mundo e nosso propósito nele. Esses conceitos teriam um efeito profundo –
embora raramente reconhecido – sobre os pensamentos judeus, cristãos e
muçulmanos, bem como sobre a filosofia grega.
Assumindo que a natureza humana não evoluiu de forma
significativa desde que os primeiros humanos começaram a observar seu ambiente
com algum grau de curiosidade, não é insensato imaginar que seu primeiro
pensamento não foi apreciar a majestade da criação, mas simplesmente a
autopreservação. E, quando anoitecia, podemos presumir com segurança que, em
vez de ficar admirando o pôr do sol, nossos ancestrais corriam em busca de
abrigo, parando apenas para se armar com porretes imensos, por medo do que
poderia estar espeitando nas sombras. A sobrevivência é nosso impulso mais
fundamental, e não um anseio espiritual. A reflexão, contemplação e
introspecção surgiram muito mais tarde, com o despertar gradual da
autoconsciência e uma persistente curiosidade sobre o significado da vida.
Muitos de nós não são mais sábios hoje em dia no que diz respeito a essa
questão e, ouso dizer, a vasta maioria da humanidade ainda está preocupada com
a sobrevivência básica e a autogratificação. Mesmo após a fundação das
primeiras grandes civilizações na Suméria e no Egito, por volta de 4000 a.C, o
primeiro instinto não era cultuar o Criador, mas acalmar os deuses sombrios da
morte e destruição, pois o mundo antigo era um ambiente duro e hostil. A vida cotidiana
era uma batalha incessante contra o deliberado poder destrutivo da Mãe
Natureza, sem mencionar a ameaça representada pelos predadores famintos,
doenças que se alastravam e inimigos impiedosos por todos os lados. Em um mundo
de morte e crueldade, os deuses sombrios mantinham o domínio sobre todos. Não
foi à toa que os medos dos homens encontraram expressão em lendas sobre seres
cósmicos que lutavam por supremacia nos céus e abaixo da terra, criando
tempestades, inundações, fome, terremotos e todos os tipos de desastres
naturais no processo. E em um esforço para explicar o fenômeno da morte, que em
geral era violenta e ao acaso, surgiu a crença na imortalidade da alma e na
vida após a morte, em que os bons eram recompensados e os maus, punidos. Esse mundo
inferior de almas e sombras variou de civilização para civilização e, mesmo
assim, todas as culturas, até as mais diversificadas, produziram relatos de
similaridade impressionante dele. Mas podemos presumir que ninguém retornou do
mundo dos mortos para descrever a jornada da alma. A única conclusão que
podemos obter é que os xamãs das tribos primitivas e os sumo sacerdotes das
civilizações antigas compartilhavam uma visão da vida após a morte, adquirida a
partir de estados alterados e sonhos alguns induzidos por drogas, e outros
conseguidos a partir de jejuns rigorosos e outras formas de rituais religiosos
ou de magia. É claro que tais estados alterados são subjetivos e caracterizados
pelos indivíduos, as limitações de sua linguagem e a cultura em que a experiência
aconteceu. Isso explica o simbolismo muitas vezes obscuro na descrição dos
mundos superior e inferior e de seus habitantes imaginários, encontrados nos
textos sagrados e imagens das religiões do mundo.
O registro mais antigo de um ritual de magia e xamanismo é
uma pintura pré-histórica em caverna que data do Paleolítico, encontrada na
Caverne des Trois Frères, em Ariège, na França. Ela retrata um homem vestido em
uma pele de animal, com um ornamento de cabeça com chifres, que parece ocupado
em alguma forma de dança ritualística. Alguns sugeriram que a figura representa
o Deus Cornudo de um culto da fertilidade, que sobreviveu na Europa até a Idade
Média e é a origem do deus grego Pã. Outros propuseram que foi dessa fonte que
o demônio cristão adquiriu seus cascos, chifre e rabo. Mas a pintura em Ariège
é de interesse mais que histórico, por ser um dos exemplos mais antigos de
magia ritual. A pintura não pretendia ser uma mera descrição de uma cena de
caça, pois, ao pintar sua presa, o xamã e seu povo estavam usando a técnica de
magia mais antiga conhecida pelo homem – eles estavam visualizando o que
desejavam para trazer aquele acontecimento à vida, a partir de sua vontade.
Trocando em miúdos, aquilo era a mente suplantando a matéria, uma técnica intuitiva
que foi praticada por todo o mundo e em todas as épocas, por culturas que não
tiveram ligação óbvia.
O Deus cornudo dos pagãos europeus teve sua contraparte na
divindade suprema suméria Marduk, que, de novo, não era nem bom nem mau, embora
permitisse a existência da maldade, disfarçado como o Deus Bel. Com o tempo, as
duas divindades tornaram-se uma só – Bel-Marduk -, e essa nova divindade exigia
sacrifícios humanos. Com o declínio do império sumeriano, os povos da Babilônia
e Assíria degeneraram para a idolatria e sua magia tornou-se corrupta e
destinada ao interesse pessoal. Abandonaram as realizações culturais do início
do império – astronomia, astrologia, arquitetura – em favor do sacrifício de
sangue, superstição e conquistas. O antropólogo Ivar Lissner data a aparição da
magia negra nessa época. Entre os sumérios surgiu a ideia de que, se eles
pudessem induzir animais a morrerem por meio de magia, eles poderiam vencer
seus inimigos humanos desfigurando suas imagens. Nesse mesmo estágio da
evolução humana, por todo o mundo, os homens de repente pararam de fazer
imagens com a forma humana – todos, exceto os praticantes do que hoje chamamos
de Artes Negras.
“... os deuses e a
magia nascem para iluminar sua majestade...” (Tabuleta memorial a Osíris)
Nos tempos antigos, os sacerdotes-feiticeiros do Egito
praticavam a análise dos sonhos, adivinhação, cura pela fé, profecia,
visualização remota, cirurgia psíquica (operações em pacientes hipnotizados sem
anestésicos) e uma forma de meditação conhecida como “assumindo a forma de
Deus”, que era usada quando alguém precisava de orientação. A pessoa envolvida
sentaria em uma atitude típica do deus que ela desejasse consultar – ou seja,
como retratados em estatuetas e murais. Depois, entrando em um transe leve, ela
se identificaria com as características específicas atribuídas àquela
divindade, antes de fazer seu pedido de ajuda ou orientação. Acredita-se também
que os grão-sacerdotes egípcios executavam projeção astral como rito de
iniciação para que pudessem adquirir experiência direta dos segredos da vida e
da morte. Contudo, quando os sacerdotes trocaram a busca de compreensão por
mascatear seus serviços, encontraram-se reduzidos a lançar pragas e vender a
passagem em segurança através do mundo subterrâneo. Os sacerdotes haviam
desenvolvido um método original de lançar pragas nas pessoas. Primeiro eles
criavam uma estatueta com o nome da vítima e depois atiravam sete talos de sete
tamareiras na boneca, com um arco de crina de cavalo, enquanto entoavam o nome
da pessoa amaldiçoada. Por meio de tais práticas, os grãos-sacerdotes
alcançaram uma influência e um poder sem precedentes, a ponto de até o faraó
temer ofende-los. Existiam rumores de que eles podiam animar estátuas de barro
para que, em seguida, enviavam para matar seus inimigos. Um relato desse
procedimento está preservado nos Papiros Westcar, que contam a história do
grão-sacerdote Aba-aner, que matou o amante de sua esposa depois de conferir
vida a um crocodilo de argila. Quando o faraó Neb-Ka visitou o sacerdote, ele
foi levado à margem do rio, onde Aba-aner convocou a fera encantada do Nilo, o
corpo ainda preso em suas mandíbulas. Impressionado com o poder do sacerdote e
não desejando causar desagrado, o faraó declarou “Levai o que é vosso e saí!”.
A partir daquele dia, os sacerdotes tornaram-se imunes à censura. Os tempos do antigo
Egito não eram lugares de culto silencioso. Pelo contrário, eram abarrotados de
praticantes das artes da magia, que ofereciam aos visitantes análises de sonhos,
adivinhação e orientação, tudo por um preço. Um típico pedido aos deuses
envolvia escrever a solicitação com o sangue de um pássaro ou de um animal
pequeno e, então, desenhar uma imagem do deus na mão esquerda. Depois, a mão
seria amarrada em um tecido consagrado e o suplicante se retiraria para a cama,
com a esperança de que o deus de sua escolha aparecesse em seus sonhos e lhe
desse a resposta que buscava. Para os egípcios. Tais praticas eram tão
inofensivas quanto consultar cartas de tarô ou um astrólogo hoje em dia, mas
depois que o faraó Akhenaton fracassou em introduzir o monoteísmo (crença em um
único deus), em 1362 a.C, o Egito caiu na escuridão. Todas as evidências do
reino de Akhenaton foram apagadas e os sacerdotes tornaram-se os defensores
todo-poderosos dos “deuses antigos”. A partir de então, o culto dos mortos,
presidido pelo deus com cabeça de chacal (Anúbis) dominou a sociedade egípcia,
minando-a de sua vitalidade e levando à paralisação do progresso. Seth, o irmão
maligno de Osíris, suplantou o deus solar Amon-Rá e os curadores pela fé foram
substituídos pelos magos-sacerdotes, que se tornaram cada vez mais ocupados com
a feitiçaria e menos com a ciência, consequentemente comprometendo a distinção
entre magia branca e negra. Muitos feiticeiros adquiriam corpos dos
embalsamadores, corpos em que eles praticavam a arte negra da necromancia
(conversação com os mortos). Os
embalsamadores eram uma casta de “indesejáveis”, rechaçados pela sociedade
porque traziam o fedor da morte com eles e por ter a fama de copular com os
cadáveres, como uma compensação por serem proibidos de se relacionar com outras
mulheres que não fossem as prostitutas mais reles. Quando um corpo belo e jovem
era levado a eles, mantinham-no fresco em uma cama de tijolos aquecidos por 70
dias, o tempo prescrito para o ritual de embalsamamento; mas com frequência, a
tentação de preserva-lo além daquele período resultaria na putrefação e em
risco de infecção. Dizem que tais práticas podem ter dado origem às doenças
venéreas.
“O sucesso de Satã é
maior quando ele surge com o nome de Deus em seus lábios.” (Mahatma Gandhi)
Há uma praga que funciona sob as leis da magia simpática,
que afirma que o mago pode estabelecer uma ligação psíquica com sua vítima se
possuir um objeto pessoal, ou amostra de cabelo, ou unha daquele indivíduo. Uma
boneca feita à semelhança da vítima será mais eficiente se ela puder ser vestida
com algo que pertença a tal pessoa. Essa prática procede da forma mais
primitiva de culto, o totemismo. Os nativos norte-americanos, os povos inuit da
América do Norte, do Ártico e da Sibéria e a maioria das tribos africanas,
todos se desenvolveram a partir de culturas centradas no totemismo – a crença
de que o destino das tribos estava ligado a uma espécie específica de animal.
Na Índia, essa forma de culto da natureza foi contaminada pelo culto do
sacrifício animal, introduzido pelas tribos arianas que invadiram o Vale do
Indo, por volta de 1500 a.C. O princípio central dessa prática é que todas as
doenças e infortúnios podem ser curados se forem transferidos para o corpo do
animal sagrado, que depois é morto e oferecido aos deuses. Uma ideia similar
originou a expulsão simbólica do bode expiatório. O triunvirato de deuses
hindus era Brahma, o absoluto, Vishni e Shiva. Brahma é o criador do Universo e
Vishnu, o mantenedor; porém o papel de Shiva é destruir o Universo, para que
ele possa ser recriado, dessa vez sem suas imperfeições. De vez em quando,
Shiva é representado com aspectos masculinos e femininos. Alternativamente, ele
tem uma consorte, a Deusa Mãe que pode adquirir muitas formas. Uma delas é
Kali, a Deusa da Morte, armada até os dentes. Tradicionalmente ela é retratada
pingando sague, usando um colar de crânios e armada com um par de espadas
afiadas e letais. Mas seu papel, poderes e significado variavam de acordo com a
seita a que a pessoa pertencesse. Para os shaktas, ela era cultuada com rituais
que envolviam orgias sexuais, enquanto os tugues a veneravam pelos assassinatos
rituais por estrangulamento. Mas, para os hindus, todos os deuses eram apenas
aspectos de Brahma, e eles não consideram Kali uma figura destrutiva, mas um
símbolo de mudança, pois no Hinduísmo a morte não é um fim, mas uma fase no
ciclo interminável da vida.
Em suas memórias, A Patern of Islands, o funcionário público
britânico, sir Arthur Grimble, comissário residente das Ilhas Gilbert, recordou
ter testemunhado um xamã nativo invocando do mar um imenso cardume de marsopas,
após entrar em transe. O xamã saiu de sua cabana gritando: “Elas estão vindo,
elas estão vindo”, minutos antes de a primeira marsopa ser avistada. O escritor
Colin Wilson gosta de citar as experiências do explorador britânico Ross Salmon
como um exemplo excelente da ligação psíquica entre o homem “primitivo” e a
natureza. Em suas memórias, My Quest For Eldorado, Salmon descreveu um “julgamento
pela natureza” conduzido pelo povo callawaya, nativos do norte da Bolívia. Uma
jovem fora acusada de ser infiel ao marido, então os anciãos decidiram convocar
o animal sagrado da tribo, um condor, para julgar a fidelidade da moça. O
condor é um pássaro reticente e não afeito a contato com humanos, mas depois da
cerimônia de invocação três desses pássaros surgiram aparentemente a comando
dos anciãos. Enquanto Salmon filmava a cerimônia, ele captou o momento em que
um imenso pássaro macho mergulhou e desceu na frente da mulher aterrorizada,
que tinha sido amarrada em um posto de madeira. O condor circulou por alguns
momentos e então foi em direção a ela, atacando sua garganta com o bico, antes
de um membro da equipe de filmagens espanta-lo com uma pedra. Alguns dias
depois, a mulher cometeu suicídio, jogando-se de um despenhadeiro. Ela estava
convencida de que o pássaro a havia exposto como mentirosa.
No Velho Testamento, diz-se que o rei Saul consultou a
feiticeira de Endor para perguntar ao espírito do profeta Samuel como ele
poderia vencer seus inimigos. Samuel respondeu que o destino de todo homem é
submeter seus poderes a outro. A feiticeira nessa história não é má; ela é
apenas uma sensitiva, que usa um talismã para convocar o espírito benigno às
ordens do rei, embora ele tivesse proibido expressamente seus súditos de se
envolver com o oculto. É o rei que tenta engana-la, disfarçando-se e alardeando
seus próprios decretos quando lhe era conveniente. O fim, a feiticeira senta
pena de Saul e mata um de seus animais para alimenta-lo. A história serve
apenas para revelar a falibilidade da natureza humana e os perigos da
arrogância. Os gregos também contaram histórias de videntes, feiticeiros e
magas, pois, ao mesmo tempo em que falavam de filosofia, também consultavam os
oráculos e praticavam tipos moderados de magia. Na Odisseia, o poeta do século
VIII a.C., Homero, faz seu herói protagonista convocar o espírito do vidente
Tirésias e encontrar a maga Circe, e nenhum deles era maldoso. Quinhentos anos
mais tarde, as feiticeiras ainda eram fábulas da imaginação poética, pois o
poeta Teócrito conjurou a imagem de uma garota com o coração partido, que foi
levada a rezar para Hécate, a deusa do Inferno, para ter de novo em seus braços
o amante infiel. Mas, de novo, essa feiticeira noviça não era má. Glauco, o
herói de uma passagem do Philopseudes de Luciano, que é o mais antigo texto
conhecido por fazer referência ao encanto de amor das feiticeiras chamado de “descenso
da Lua”, também não era mau. Glauco estava tão apaixonado pela bela Cila que
tema morrer de tristeza se não pudesse vê-la de novo, então ele consultou um
mago que invocou Hécate, a deusa dos mortos. Glauco foi instruído a criar uma
imagem de sua amante em argila e cravar agulhas de bronze nela, enquanto
repetia as palavras: “eu furo a ti para que te lembres de mim”. O encanto
provou-se bem-sucedido, pois Cila correu para o jovem doente de amor e o
abraçou, jurando amor eterno.
Foram os escritores romanos Horácio, Ovídio, Petrônio,
Lucano e Apuleio que criaram a imagem icônica da feiticeira como a velha
enrugada e ressequida, que vasculhava cemitérios à procura dos ingredientes de
beberagens venenosas e conversava com seus espíritos familiares. A fábula de
Lucano sugere que, embora os pensadores radicais da sociedade grega estivessem
avançando no conceito de livre-arbítrio e despachando os deuses para seu
passado poético, eles ainda estavam acorrentados à ideia de que um indivíduo
podia influenciar outro exercitando sua vontade superior. Lúcio Apuleio
tornou-se conhecido como a primeira história completa da feitiçaria, “O Asno de
Ouro”, no século II. Embora seja uma sátira, que acompanha as desventuras do
autor depois que ele se lambuzou com um unguento de feiticeira, a obra ensina
uma importante lição, ou seja, que o caminho do Lado Esquerdo era cheio de
perigos. O sábio homem ou mulher faria bem ao se manter do Lado Direito, ou
correria o risco de se tornar um asno. Não existia moral para se extrair da
descrição de um ritual necromântico na fábula de Lucano, Farsália, apenas o
terror absoluto diante do pensamento de que tais práticas poderiam ser possíveis.
Nesse relato, Sexto Pompeu, filho do general romano Pompeu, o Grande (106-48
a.C), consultou a necromante mais formidável do mundo clássico, Erista, para
saber se seu pai seria vitorioso contra César. Erista, que Lucano descreve como
“suja imunda” e horrorosa de se olhar, vivia em um cemitério na Tessália e
dormia em um túmulo, cercada por relíquias dos mortos roubadas das sepulturas à
sua volta. Quando Sexto se aproximou dela e perguntou-lhe se poderia predizer o
futuro, ela disse que apenas poderia saber o que ele precisava saber por
intermédio de um cadáver recente, porque o espírito dos mortos permanecia sobre
o corpo e podia ser persuadido a voltar pra ele. Mas deveria ser um que não
tivesse sido ferido gravemente na boca, na garganta ou nos pulmões de forma a
impedir o cadáver reanimado de falar. Então, ela o levou a um campo de batalha
onde eles encontraram um espécime adequado, um soldado que fora morto havia pouco
tempo. Enquanto Sexto lutava contra a repugnância ao pensamento do que estava
para fazer, Erista prendeu a mandíbula do cadáver com um gancho, arrastando-o
para uma caverna próxima. Lá ela preparou uma poção nojenta, que continha
sangue menstrual, a saliva de um cachorro louco e a carne de uma hiena, e
colocou em uma ferida acima do coração para reanimar o cadáver. Em meio a um
estrondo ensurdecedor de trovão e do grito de animais selvagens, ela apelou aos
deuses sombrios Hermes, Caronte, Hécate, Prosérpina e Caos para tomarem o
espírito do soldado, que era visto planando sobre o corpo sem vida. Mas o
espírito não obedeceria a suas invocações para entrar no cadáver mutilado até
ela prometer que queimaria o corpo em seguida, para que ele nunca mais fosse
convocado. Apenas após a promessa, o fantasma do soldado reentrou no corpo. À
luz espectral da lua, ele ergueu-se, trêmulo, e previu o futuro pelos lábios do
cadáver. O corpo foi queimado em seguida, o que libertou o espírito. Esse
episódio, com certeza, é pura ficção, mas tais histórias não tinham a intenção
de ser tomadas como fatos. Foram criadas para preservar a fé de pessoas que
precisavam acreditar na sobrevivência do espírito depois da morte. Uma simples
história de um fantasma benigno voltando para tranquilizar os entes queridos de
que tudo estava bem no mundo além não teria fascinado tanto a imaginação quanto
a história repulsiva de Erista.
A evidência de que o culto da feitiçaria foi uma religião
formalizada anterior ao Cristianismo só foi revelada em 1886, quando o
folclorista americano Charles Leland descobriu um documento intrigante em uma
viagem à Itália. Ele viajara até lá para pesquisar os costumes dos ciganos, mas
durante sua visita encontrou uma feiticeira autoconfessa, chamada Madalena, que
produziu uma cópia manuscrita do “Aradia – Gospel of the Witches”, que dissipou
a imagem da feitiçaria como um rito infernal. Não existia menção ao Diabo, sexo
com Satã ou sacrifício. Em vez disso, o livro delineava uma crença de que uma
força de vida universal residia em todas as coisas vivas e que essa fonte de
poder podia ser mobilizada e canalizada por aqueles que conseguissem entrar em
sintonia com ela. Leland convenceu-se de que o livro era um artefato genuíno e
tinha sido passado para Madalena como parte de sua iniciação na La Vecchia
Religione (A Religião Antiga) – um termo que é muito aplicado à feitiçaria
italiana. O documento apresenta um mito da criação alternativo em que Diana, a
deusa da Lua, dá nascimento a Arádia, a deusa da magia, depois de ter sido
fecundada por seu irmão Lúcifer, o deus do Sol. Não existe sugestão de que
Lúcifer seja nada mais que o deus da luz e do fogo, o aspecto masculino ativo
na natureza e em nós, enquanto Diana é o aspecto passivo que se manifesta nos
humanos como o instinto nutridor. Porém, o aspecto mais interessante do
Evangelho é a impressão que o texto passa, de que a feitiçaria estava em decadência
quando a Igreja instigou sua perseguição e era vista como nada mais que uma
relíquia arcaica de nosso passado pagão. Os círculos de pedra monolíticos que
haviam sido erguidos e venerados por nossos ancestrais foram abandonados,
caindo em ruínas, seu propósito místico e significado astrológico esquecidos
quase que por completo. Muitos lugares sagrados para os pagãos foram
construídos pela Igreja, e o solo, uma vez venerado como o ventre da Mãe Terra,
era cultivado e arado sem consideração pelo ser maternal que o originou. Os
festivais pagãos foram esvaziados de sua potência e importância ao serem
representados como celebrações comunitárias das estações. O ritual da
fertilidade de Beltrane. Por exemplo, foi substituído por uma dança de roda em
torno de um mastro inócuo. Por insistência da Igreja, as celebrações para
marcar o solstício de verão e o equinócio de inverno foram condenadas como
sabás de feitiçaria, para assegurar que as comunidades rurais fossem
dissuadidas de revivê-los. Mas, quando pareceu que a Igreja estava decidida a
apagar todos os rastros do Paganismo, os indivíduos, evidentemente tiveram a
iniciativa de preservar essa tradição de conhecimento natural, registrando suas
crenças e práticas em documentos como o que Leland descobriu. O Cristianismo
pode ter sido a religião oficial do Ocidente pelos últimos 2 mil anos, mas é
evidente que a crença de alguns era só da boca para fora.
À medida que o culto do Cristianismo varria a Europa no
primeiro milênio da Era Cristã, a Igreja erradicou a “velha religião” por
assimilação. Ela também adotou seus mitos, como conceitos do nascimento da
Virgem, que foi o método tradicional endossado por profetas desde o tempo de
Zoroastro, e a ressurreição física – apesar de não haver menção desses
acontecimentos nos relatos contemporâneos da vida de Jesus. A data de
nascimento do messias cristão, 25 de dezembro, vem do culto mitraico e do
festival romano da Saturnália. Até mesmo a imagem icônica da “madona e criança”
foi tomada do mito egípcio de Ísis e Hórus. Como resultado desse revisionismo
massivo, os evangelhos gnósticos, descobertos em Qumran, foram condenados como
hereges, porque não estavam em conformidade com os relatos do evangelho
canônico – isto é, os primeiros quatro livros do Novo Testamento. Porém, os
evangelhos canônicos foram escritos centenas de anos depois dos evangelhos
gnósticos, por escribas que não tinham conhecimento em primeira mão dos
ensinamentos de Jesus. Essa estratégia cínica data de tempos antigos, quando
uma nação conquistadora adotava o Deus de seu inimigo vencido como uma
divindade menor, a fim de apaziguar seus prisioneiros. Eles poderiam cultuar
seu Deus na prisão e, ao mesmo tempo, proteger-se contra a ira do Deus
derrotado. Mesmo a divindade de Jesus esteve em debate, até o Conselho de
Constantino ser convocado em Niceia, em 325 d.C., em que o controverso Arius e
o teólogo Athanasius discutiram a respeito da interpretação dos evangelhos.
Arius questionou o status de Jesus, mas foi suplantado pelos partidários dos
teólogos, que acreditavam que Jesus não era um simples mortal, mas deveria ser
venerado como o Filho de Deus. A erradicação das formas de veneração mais
antigas estendeu-se para a construção de igrejas nas fundações de templos
pagãos, embora se tenham ignorado as atividades de seus construtores que
tentavam acalmar os seus deuses da fertilidade colocando os falos de pedra
debaixo do altar. Muitas igrejas antigas também abrigavam as efigies de
Sheela-na –Gigs - ou seja, mulheres nuas expondo seus órgãos sexuais. Mas,
enquanto essas imagens do passado observassem de cima a congregação temente a
Deus, Pã, o travesso espírito da floresta e provedor de potência sexual, era
demonizado como um fornecedor do pecado e seus seguidores, condenados como
servos de um mestre profano. Se a Igreja fosse firme em suas próprias
convicções, ela poderia ter esperado com paciência para que as formas antigas
morressem, mas ela viu sua autoridade temporal ser desafiada por uma tradição
rural que não considerava o sexo um pecado. A Igreja revidou, decretando que o
sexo deveria ser sancionado pelo casamento.
Satã tornara-se um símbolo de todas as coisas e pessoas que
se opunham à autoridade da Igreja, porém, ao exercer tamanha brutalidade
enquanto ignorava os excessos de indulgência de seus próprios encarregados,
pode-se argumentar que Satã é a sombra do Cristianismo e era por isso que os
fanáticos o temiam. Como o escritor Colin Wilson ressaltou: “o Cristianismo
tornou-se uma religião mórbida e sombria, obcecada pelo pecado e pelo mal (...)
É um comentário triste sobre o que se tornou a religião de amor e perdão de
Jesus”.
É muito significativo que a Igreja não levou a sério a
prática da bruxaria até o século XIV, quando o papa João XXII sancionou uma
caça às bruxas, na crença de que seus inimigos estavam conspirando para
assassina-lo por meio de recursos de magia. Suas suspeitas eram bem fundadas.
Três bispos liderados por Hugh Geraud, o bispo de Cahors, admitiram testar a
força de seus poderes lançando uma maldição sobre a imagem de cera do sobrinho
do papa. O garoto morreu logo em seguida. Encorajados pelo feito bem-sucedido,
eles besuntaram imagens do papa e de dois líderes da corte papal de Avignon e
confiaram aos seus criados a missão de contrabandeá-las para dentro da corte,
escondendo-as em nacos de pão. Mas os criados foram revistados na entrada e a
conspiração foi descoberta. Em meio aos itens suspeitos encontrados, havia
venenos, ervas, sapos e os cabelos de um homem enforcado. O bispo Geraud
protestou inocência, mas o consideraram culpado. Ele foi esfolado vivo e seu
corpo, queimado. Embora a Igreja reconhecesse a existência das bruxas antes de
1300, elas eram vistas como velhas inofensivas, que ganhavam a vida vendendo
remédios de ervas e poções de amor para os vizinhos. O documento mais antigo da
Igreja a mencionar as bruxas, o Canon Episcopi, data do século IV. Faz desenho
à crença de que as bruxas eram “mulheres abandonadas e pervertidas por Satã” e
que tinham o poder de voar. No século XII, a autoridade do papa estava sendo
questionada por uma seita puritana chamada os cátaros (“os puros”), que acusou
a Igreja de corrupção e seus ministros de hipocrisia por enriquecerem à custa
de seus paroquianos, abandonando a doutrina de piedade e pobreza que Jesus e
seus discípulos pregaram. Os cátaros também acreditavam em um Universo onde
Deus e Satã estavam em guerra, o que deu à Igreja a oportunidade de espalhar o
rumor de que eles cultuavam Satã em pessoa e praticavam bruxaria. No entanto,
pouco se fez até 1208, quando os cátaros assassinaram o núncio apostólico.
Irado com o ato, o papa Inocêncio III declarou uma cruzada contra os cátaros ou
albigenses. A Igreja sancionou o massacre dos cátaros, homens, mulheres e
crianças, por todo o Languedoque, um principado independente no sudoeste da
França, onde se localizava o centro do grupo, e, em 1209, cerca de 10 mil
cruzados marcharam para o sul para concluir sua missão. Em Béziers, um dos
cruzados perguntou ao emissário papal como ele poderia identificar os hereges
e, em vez disso, foi instruído a matar todos os 20 mil habitantes, na crença de
que “Deus cuidará dos seus”. A cruzada Albigense, como foi chamada, durou até
1229. Muitos cátaros já tinham desaparecido, mas havia algumas fortalezas
cátaras remanescentes; então, o papa Gregório IX instituiu a Santa Inquisição.
Ele sancionou o uso da tortura para forçar confissões dos que não admitiam
livremente suas crenças blasfemas. Uma vez condenados, eles seriam queimados em
estacas para que suas almas ficassem livres para retornar a um Deus clemente.
Depois da destruição da cidadela cátara em Montsegur, em 1244, os cátaros
sobreviventes espalharam-se pela Europa, mas eram uma força exaurida. Todos os seus
vestígios desapareceram rapidamente.
Nas catacumbas do Vaticano existe um documento desbotado,
mosqueado pela idade, que data de agosto de 1308. Ele é raramente removido de
sua caixa de vidro, exceto para estudo de acadêmicos que conseguiram uma autorização
especial dos curadores. O Pergaminho de Chinon, como é conhecido, foi mantido
em segredo na Cidade do Vaticano por quase 700 anos, somente divulgado em 2004,
depois de sua existência ter se tornado de conhecimento público e pela pressão
feita sobre as autoridades papais para revelarem seu conteúdo. O pergaminho
concede absolvição aos líderes dos Cavaleiros Templários, uma ordem de monges
guerreiros formada em 1118, depois da Primeira Cruzada. Sua finalidade era
proteger os peregrinos cristãos que viajavam pela Terra Santa. Muitos desses
monges tinham sido excomungados por desafiar a autoridade do papa, portanto não
tinham nada a perder a não ser a vida. Os rigores da vida monástica os tornaram
lutadores formidáveis e, em pouco tempo, eles enriqueceram com as doações
generosas legadas por cruzados agradecidos, bem como pelos muçulmanos, que
confiavam aos Templários seus tesouros ao tomar conhecimento de que eles eram
homens honestos. Diz a lenda que os Templários também eram os guardiões do
tesouro cátaro e que o Santo Graal, o cálice que Jesus usou na Última Ceia,
faria parte desse tesouro. Foi dito também que eles compartilhavam um segredo
que poderia abalar os alicerces da Igreja; em outras palavras, Jesus teria
sobrevivido à crucificação para se casar com Maria Madalena e ser pai de uma
criança. Alguns acreditam que a linhagem sobrevive até os dias de hoje, criando
com isso um mito que formou as bases de histórias “revisionistas” recentes,
tais como “O Santo Graal e a Linhagem Sagrada” e o best seller de Dan Brown, “O
Código Da Vinci”. Acreditava-se que a prova dessa “linhagem real” estaria
codificada em pedra, em vários sítios sagrados, entre eles o Templo de Salomão,
que foi a base dos templários em Jerusalém, e a Capela de Rosslyn na Escócia,
para onde os remanescentes da ordem fugiram depois de sua perseguição pelo papa
Clemente V, em 1307. Existiram rumores ainda mais sombrios e perturbadores
acerca da ordem. Diziam que eles eram sodomitas e adoradores do Diabo, e
praticavam magia negra diante de um ídolo chamado Baphomet, que tomou a forma
de uma cabra com casco fendido, com órgãos sexuais masculinos e femininos. Baphomet
era tradicionalmente retratado sentado de pernas cruzadas sobre um globo, com
uma vela preta queimando entre seus chifres e um pentagrama gravado em sua
testa. Corriam boatos de que os Templários se prostravam diante de um falo de
madeira e um crânio decorado com joias antes de jurar sua lealdade, beijando
seus irmãos iniciados na boca, no abdome e no ânus. Essas práticas, sem dúvida,
eram inverdades, histórias fantasiadas por seus inimigos para desacredita-los e
dar motivo à Igreja para dissolver a ordem e confiscar sua vasta fortuna. A
existência do Pergaminho de Chinon indica que o próprio Vaticano reconhecera
oficialmente não haver nenhum fundamento para essas acusações. De acordo com o
Pergaminho, os Templários seriam reintegrados à Igreja Católica para poder
receber os sacramentos depois de se arrepender dos seus pecados, o que,
aparentemente, envolvia nada além de atos homossexuais. Mas essa oferta de
reconciliação foi confrontada por Filipe IV, da França, que precisava
desesperadamente de fundos e se ofendia por ter de pedir dinheiro emprestado
aos Templários. Ele exigiu que o papa acusasse os cavaleiros de heresia, para
que suas propriedades e riquezas fossem confiscadas. E assim, em 13 de outubro
de 1307, todos os Templários da França foram presos e torturados em um esforço
para arrancar-lhes confissões. Em poucos dias, 36 deles morreram em
consequência de seus ferimentos. No mês seguinte, o atormentado papa Clemente V
emitiu um decreto ordenando que todos os monarcas aprovassem a prisão de
qualquer Templário em seus reinos. Muitos morreram acreditando ter sido traídos
pela Igreja, a qual eles arriscaram suas vidas para proteger. Em 1314, a Igreja
exigiu sua última vítima entre os Templários. Jacques de Molay, Grão-Mestre dos
Cavaleiros Templários, foi queimado vivo em uma ilha no Sena, ao pôr-do-sol,
depois de desmentir sua confissão anterior, que fizera mediante tortura. Quando
o carrasco queimou os feixes de paus, De Molay afirmou que os Templários eram
vítimas do rei Filipe e seu coconspirador, o papa. Ele amaldiçoou os dois
homens que condenaram seus leais cavaleiros à morte. O rei e o papa se
juntariam a ele diante do trono de Deus dentro de um ano e responderiam ao seu
criador. Não foi uma ameaça em vão. Em um ano, Clemente V e Filipe IV da França
estavam mortos.
Os cátaros foram cruelmente exterminados, o que ainda não
satisfez o papa João XXII, cuja bula papal de 1326 declarou que a feitiçaria
era crime punível com a morte. Os inquisidores não teriam mais de provar a
heresia para justificar suas torturas de suspeitas de feitiçaria e, como
resultado, a paranoia e a perseguição espalharam-se como uma praga. Nos 400
anos seguintes, um número incontável de homens e mulheres por toda a Europa
foram “colocados” à prova” com todos os tipos de aparato desumanos, que nem
mesmo o Diabo teria conseguido imaginar. Muitos deles fizeram confissões falsas
para encerrar seu sofrimento. E tudo em nome de uma religião que fora fundada
com base no princípio do amor fraternal, do perdão e da misericórdia. Muitos
daqueles arrastados ante a Inquisição foram denunciados por vizinhos por serem
velhos, feios ou estranhos. Alguns poderiam ter sido ouvidos falando consigo
mesmos, com seu gato ou outro animal “familiar” – um sinal indubitável de
estarem em união com o Diabo, segundo seus acusadores. Outros foram “colocados
à prova” porque se sabia que eles usavam ervas e raízes em seus remédios
naturais ou porque adivinhavam a sorte. Muitos, porém, foram mortos
simplesmente por olhar para seus vizinhos de maneira errada, amaldiçoando-os
com “o Olho do Diabo”. Para justificar sua barbárie, os líderes da Inquisição
mencionaram a citação bíblica “Não tolerarás que uma feiticeira viva.”, mas
eles ignoraram o fato de que uma tradução mais precisa seria “Não permitirás
que um envenenador viva” (de acordo com o acadêmico Reginald Scot, publicado em
1584). Entretanto, nem todos os administradores do papa aprovaram seus métodos.
O arcebispo de Rheims e dois de seus colegas declararam que a feitiçaria era
uma fantasia, o que foi suficiente para persuadir o parlamento de Paris a
ordenar a liberação de todos os suspeitos. Se não fosse pelo entusiasmo do papa
Inocêncio VIII, que sucedeu no trono papal em 1484, a febre da caça as
feiticeiras teria acabado antes que se pudessem enviar mais almas inocentes
para seu criador. Mas o papa Inocência era um radical, que se engajou em punir
os pecadores da Terra e arrancar as sementes do Diabo. O primeiro ato do seu
reinado foi louvar os esforços dos “filhos queridos” do Vaticano – o inquisidor
austríaco Heinrich Kramer e Jacob Sprengler, reitor da Universidade de Colônia
– por revelarem a extensão do culto ao Demônio na Alemanha. O aval do papa foi
suficiente para encorajar Kramer e Sprengler a embarcar em um relato completo
sobre feitiçaria, publicado dois anos mais tarde. Cópias da obra Malleus
Maleficarum (O Martelo das Feiticeiras) poderiam ter acumulado poeira nas
prateleiras das bibliotecas eclesiásticas e instituições teológicas se seus
autores não tivessem feito descrições tão detalhadas das atividades sexuais dos
servos de Satã. As descrições gráficas dos hábitos noturnos de súcubos e
íncubos, que diziam visitar os cristãos tementes a Deus durante o sono, foram
aumentadas com os debates acadêmicos sobre se uma feiticeira tinha ou não o
poder de roubar o pênis de um homem. A questão libidinosa e a quase simultânea
invenção da prensa tipográfica asseguraram que o livro se tornasse leitura
obrigatória em cada mosteiro ou lar que pudesse pagar pela cópia. Para os
autores, infelizmente, os efeitos produzidos pelo livro foram mais seculares
que espirituais, levando seus leitores mais reprimidos sexualmente a
descarregarem sua raiva e frustração em incontáveis suspeitas de feitiçaria.
Por ironia, a caça as bruxas estimulou o ressurgimento do interesse pela “velha
religião”, que ganhou impulso quando um novo Ato de Bruxaria foi aprovado em
1735, revogando o ato sangrento de 1604. As pessoas não poderiam mais ser
enforcadas por bruxaria, que não existia, de acordo com os autores do ato. Mas
elas poderiam ser presas e ridicularizadas caso fingissem ser bruxas.
A corrupção e a imoralidade não foram eternizadas apenas por
hereges e pagãos. Durante a Idade das Trevas e por toda a Renascença, o poder
do papado rivalizou com o dos imperadores bizantinos e dos reis da Europa. Uma
sucessão de papas acumulou grandes fortunas e vastos exércitos para fazer
cumprir sua autoridade, mas sua arma mais formidável foi a ameaça de
excomunhão. Intimidados pela importância de uma maldição papal, soberanos do
Ocidente resistiam ao anseio de criticar os representantes de Deus na Terra.
Até mesmo os excessos do papa Bórgia, Alexandre VI (1431-1503), não geravam
censura. Alexandre era conhecido por gostar de presenciar orgias sexuais, em
que as prostitutas mais bem pagas de Roma eram remuneradas para ter relações
sexuais com a guarda papal, enquanto Lucrécia Borgia, sua filha, aplaudia e
premiava os casais mais ousados. Tais atividades macularam a santidade do
palácio papal e levaram a Igreja de Roma ao alcance da hóstia comunal de ritos
blasfemos de uma Missa Negra. De acordo com o romancista do oculto, Dennis
Wheatley, uma trindade profana de predecessores do papa de fato havia se
entregado à magia negra; em outras palavras o papa Leão I, no século V, o papa
Honório I, 200 anos mais tarde, e o papa Silvestre III, nos séculos X e XI. É
evidente que Honório não se envergonhava de suas práticas diabólicas, pois
publicou um registro delas em “O Grimório do Papa Honório”.
Em 694 d.C, o Concílio de Toledo condenou diversos padres
que teriam rezado missas para os mortos, enquanto as pessoas por eles nomeadas
ainda estavam muito vivas. Os padres tinham sido pagos para encenar as missas
como uma forma de maldição. A ameaça de excomunhão, entretanto, não erradicou a
prática por completo, já que continuou a ser usada no século XIII. Na Idade
Média, algumas ordens monásticas tinham dúvidas quanto à sua verdadeira
devoção. Por exemplo, no século XIV, o bispo de Exceter registrou o dia em que
flagrou, no bosque, os monges do convento de Frithelstock prestando homenagem a
uma estátua de Diana, a deusa da caça, e ordenou-lhes que a destruíssem. Em
1329, o frade carmelita Pierre Record recebeu uma sentença de prisão perpétua
depois de admitir ter seduzido várias mulheres fazendo suas imagens com cera,
que ele aspergiu com seu sangue e saliva, antes de enterrá-las embaixo das
soleiras de suas portas. Esses não foram casos isolados.
Antes da Reforma, frades itinerantes perambulavam pelo campo
extorquindo comida e doações dos camponeses, a quem diziam estar cometendo pecado
se negassem abrigo e sustento a “um homem de Deus”. Rígidos votos de castidade
eram reforçados com autoflagelo, cilícios e penitência, porém mesmo essas
medidas drásticas muitas vezes não eram páreo para a libido reprimida dos
jovens monges. Gerações de clérigos jovens sucumbiram à compulsão de seduzir
suas jovens paroquianas, lançando a respiração sobre elas durante a confissão –
uma técnica conhecida como insuflação. A prática era tão difundida que Santo
Agostinho, São Jerônimo e São Gregório foram compelidos a proferir uma
declaração pública que condenava a insuflação como forma de feitiçaria. O cura
de Peifane foi queimado na estaca por seduzir mulheres desse modo, bem como o
padre Louis Gaufridi e Pierre Girard, de Aix-em-Provence. O último caso é
especialmente interessante porque a vítima, uma garota simplória chamada
Charlote Cadière, ficou tão traumatizada com as investidas frequentes de
Girard, que apresentou o fenômeno dos estigmas – chagas que sangram, correspondentes
às do Cristo crucificado. A consequência de toda essa sexualidade suprimida foi
um surto de histeria religiosa, em que clérigos lascivos culpavam o Demônio por
tenta-los a cometer pecados e freiras neuróticas alegavam possessão demoníaca
para explicar suas convulsões violentas e a compulsão irracional pela
blasfêmia. Forçados a viver uma vida de autonegação e isolamento, muitos monges
e freiras apresentavam sintomas de exibicionismo inconsciente, enquanto os que
lhe ensinaram a considerar seus desejos sexuais como não naturais agarravam a
oportunidade de culpar um bode expiatório sobrenatural para seu comportamento
lascivo. Em 1633, as freiras de Loudon ficaram sob a influência insidiosa de
Urbain Grandier, um padre e confessor carismático. Durante suas visitas,
Grandier instigava as freiras em um frenesi de fervor religioso e logo as
levava a renunciar seus votos e disputar um lugar na cama dele. Mas o conflito
entre suas paixões inflamadas e seus juramentos para manter a fé em Cristo foi
demais para as irmãs psicologicamente debilitadas. Elas foram ensinadas que
Jesus morreu por seus pecados a ali estavam elas, traindo seu Senhor e obtendo
prazer com a traição. Uma após a outra, elas começaram a exibir distúrbios de comportamento
enquanto a histeria em massa rapidamente se espalhava pelo convento. Foi como
uma febre contagiosa. Freiras contorciam-se voluptuosamente no chão e gemiam
com vozes guturais e “demoníacas”, mas nenhuma exibiu de modo significativo um
sinal de poderes paranormais – apenas neuroses sexuais. Foi um exemplo perfeito de uma técnica de
magia de arrebatamento, de que deriva a palavra moderna “glamour”. Porém, não foi
a sedução de suas acusações impressionáveis e vulneráveis que assegurou a
condenação de Grandier em 1634, mas um pacto com Satã que seus acusadores alegaram
ter sido escrito com o próprio sangue dele. Esse é um dos poucos documentos
remanescentes do período, embora sua autoria seja duvidosa. Grandier era um
conquistador insaciável, não um satanista. Nenhuma de suas vítimas declarou que
ele a tivesse forçado a participar de Missa Negra e nenhuma testemunhou nada
que pudesse sugerir que os interesses dele iam além do carnal. Mesmo assim, ele
acabou queimado na estaca. Um caso menos conhecido, mas igualmente importante,
foi o das freiras de Louviers que sucumbiram a convulsões violentas e
alucinações perturbadoras depois de anos de abusos de seus padres. No centro
das alegações estava uma jovem órfã, Madeleine Bavent, que foi seduzida por um
monge franciscano e refugiou-se no convento para conter seus avanços
indesejáveis. Mas Madeleine não sabia que o convento de St. Louis e St.
Elizabeth em Louviers, perto de Rouen, estava sob a supervisão de um padre
velho e voluptuoso chamado David. Ele ordenou que as freiras participassem da
comunhão com os seios à mostra e as encorajou a andarem nuas, sob o pretexto de
que seria um pecado esconder a beleza da obra do Senhor – mas é claro que isso
só se aplicava às jovens núbeis, noivas de Cristo. O padre David interessou-se
especialmente por Madeleine, interesse que, segundo a moça mais tarde declarou,
envolvia “atos de indecência grosseira”. A provação dela não terminou com a
morte do padre David em 1628. De acordo com a confissão que ela fez em seu
julgamento em 1643, o sucessor dele, o padre Picard, era igualmente libertino.
Diferentemente de seu predecessor, ele foi além das carícias indecentes,
estuprando a moça repetidas vezes. O resultado foi um aborto, que teve de ser
induzido para se evitar um escândalo. Dizia-se que os jardins do convento de
Louviers abrigaram numerosas sepulturas de crianças estranguladas ao nascer
para evitar o constrangimento da instituição. Diz-se que esse não era o único
local do tipo dentro dos conventos. Picard faleceu em 1642, e em seguida, o seu assistente,
padre Boulle, assumiu o seu lugar. O abuso continuou. Mas agora havia rumores
de padres conduzindo Missas Negras e rituais blasfemos em solo sagrado e de freiras
“possuídas” contorcendo-se no chão e espumando pela boca. O bispo de Evreux,
François Péricard, recebeu denúncias e foi obrigado a investigar. Na companhia
de vários padres capuchinhos que tinham ampla experiência no assunto, o bispo
ouviu as confissões sombrias de Madeleine e suas colegas freiras. Eram
confissões tão fantásticas que só poderiam ter sido inventadas pela imaginação
hiperativa de indivíduos psicologicamente perturbados. Por trás das imagens
satânicas – narrativas de crianças crucificadas, hóstias de comunhão
sangrentas, rapto pelo Diabo na forma de um gato preto grande -, havia
evidências claras de abuso sexual sistemático. Os padres haviam tentado jogar a
culpa de suas ações sobre o Diabo. Ao que parece, alguns dos relatos mais sombrios
foram obras do bispo, em vez das testemunhas que prontamente confessaram, na
esperança vê de serem poupadas de tortura. O doutor Yvelin, um médico da
realeza que examinou as freiras admitiu mais tarde ter considerado seus depoimentos
como falsos. Ele disse ainda que as “atuações” delas durante os exorcismos
aparentavam ter sido bem ensaiadas. O bispo não estava disposto a permitir que
o caso fosse ouvido em uma corte pública. Se ele convencesse os capuchinhos de
que era tudo coisa do Demônio, poderia manter a audiência entre portas fechadas
e as sentenças serviriam como alerta para outros conventos. Ele conseguiu seu
objetivo. Boulle e outros padres foram considerados culpados e queimados publicamente.
Nem mesmo Picard pôde descansar em paz. Seu cadáver foi desenterrado e colocado
ao lado de Boulle na pira. Enviaram Madeleine para outro convento, onde ela foi
submetida a um tratamento severo e condenada como feiticeira. Ela tentou o
suicídio, mas sobreviveu, embora tenha morrido em 1674, com 40 anos de idade.
Se os caçadores de bruxas dos séculos XVII e XVIII fossem sinceros em seus
desejos de exorcizar o espectro do culto ao Demônio na Europa, deveriam ter
olhado para os seus, em vez de plantarem as sementes da suspeita entre os
camponeses. A maioria das cenas de devassidão e histeria religiosa foi
encontrada atrás dos muros dos conventos e não nas regiões rurais da
Inglaterra. O Diabo, ao que parece, nunca está distante dos que mais o temem.
Diz-se que Luís XIV ficou abalado com as revelações em
Louviers. Ele também se enfureceu com o rumor de que muitas damas de sua
própria corte estavam praticando o ocultismo, inclusive sua amante, Françoise
Athénaïs, marquesa de Montespan – mais conhecida como madame de Montespan. Em
1676, o rei ordenou uma investigação discreta nas atividades de uma anfitriã da
sociedade chamada Catherine Deshayes. Conhecida profissionalmente como La
Voisin, Deshayes era uma cartomante, que diziam ser feiticeira e confidente de
madame de Montespan. Os temores do rei comprovaram ter fundamento. Quando as
autoridades invadiram a casa de madame Deshayes, descobriram um templo satânico
e evidências de sacrifício humano. Havia ossos carbonizados em um forno,
inclusive os de crianças assassinadas. Assim que a descoberta foi feita, Luís
XIV ordenou que os investigadores mantivessem segredo. Eles também foram
orientados a abafar a confissão de La Voisin, por medo de que ela pudesse
incriminar aristocratas proeminentes que, dizia-se, teriam participado dos
assassinatos rituais. Uma acusação condenatória em especial sustentou que
Madame de Montespan tentou tomar o lugar da primeira amante do rei, Louise de
la Valliére, pagando La Voisin para celebrar uma missa negra. Talvez tenha sido
uma coincidência, mas a missa de la Voisin parece ter funcionado. Montespan
realmente substituiu Louise na preferência do rei, apenas alguns meses depois
da realização da missa. Mas, se o rei pensou que poderia silenciar La Voisin,
estava enganado. A feiticeira continuou a oferecer seus serviços aos enfadados
e abastados que buscavam excitação no mundo sombrio e perigoso do oculto.
Quando madame de Montespan soube que seria substituída pela última obsessão de
Luís XIV, Madame de Maintenon, governanta das crianças da realeza e futura
segunda esposa do rei, ela correu até La Voisin e encomendou outra Missa Negra –
dessa vez para amaldiçoar a governanta. La Voisin obedeceu por lealdade,
contratando o idoso abade Guibourg como mestre de cerimônias. Porém, a vítima
pretendida possuía uma determinação mais forte. Madame de Maintenon colocou sua
rival de lado, com um sussurro na orelha do rei, exigindo que a feiticeira
fosse silenciada para sempre. La Voisin foi presa, mas, na ocasião, suas
ameaças de expor os segredos sórdidos da corte não foram suficientes para
evitar sua execução. Marguerite, a única filha de La Voisin, testemunhou ter
ajudado sua mãe na Missa Negra conduzida pelo abade Guibourg. A garota
descreveu como Madame de Montespan ofereceu-se ao Demônio, enquanto o abade
realizava um ritual indecente em seu corpo nu deitado em um altar negro
drapeado. Em cada mão, ela segurava uma vela preta feita de gordura humana e
fornecida pelo carrasco público, que foi um de seus muitos amantes. La Voisin
foi considerada culpada pela prática de bruxaria e queimada viva em público, no
ano de 1680. Madame de Montespan teve mais sorte. Ela não só escapou com vida,
como também lhe foram dados meios suficientes para viver com requinte durante
seu longo retiro.
A França não foi o único país da Europa Ocidental a
testemunhar um surto de histeria de feitiçaria. Em setembro de 1589, o rei
James VI da Escócia (que depois ficaria conhecido como rei James I da
Inglaterra) esperava por sua futura noiva, a princesa Anne da Dinamarca, que
estava sendo levada à Escócia por uma grande frota dinamarquesa. Entretanto, os
navios foram abatidos por uma tempestade tão violenta que o comandante declarou
que poderia ter sido causada por bruxaria. Depois de a frota encontrar abrigo
na Noruega, o próprio James navegou até lá para trazer sua noiva. O casal feliz
finalmente alcançou a terra firme em maio de 1590, após sobreviver a outra
tempestade. James chegou à conclusão de que as tempestades se formaram porque
seus inimigos estavam aliados ao Demônio, e por isso ordenou uma grande caça às
bruxas por toda a Escócia. Esse não foi mero nervosismo pré-nupcial, porque era
de conhecimento público que o quinto conde de Bothwell, um dos principais
adversários de sua majestade, associara-se às feiticeiras. Mais tarde, soube-se
que as tempestades tinham, de fato, sido preparadas por ordem de Bothwell. Pela
liderança do bruxo John Fane, uma assembleia de feiticeiras executou a magia
necessária. No julgamento deles, Fane e sua assistente, Agnes Simpson,
confessaram ter obtido itens das roupas do rei, que enrolaram em uma efígie de
cera e depois queimaram no fogo. Não bastando, eles batizaram um gato com o
nome do rei e o afogaram no mar. Muito do que sabemos sobre a bruxaria nos
séculos XVI e XVII vem das confissões detalhadas de Fane e Simpson, com as de
inúmeras almas desafortunadas que foram capturadas e torturadas no que seria a
maior caça às bruxas da história da Inglaterra. Os relatos da inquisição real
foram registrados no próprio trabalho do rei sobre o assunto, publicado em 1580
sob o título de “Daemonologie”. O livro de James levou a sério a ameaça
representada pela feitiçaria e as assembleias de bruxas. Por essa razão,
fracassou em causar qualquer impressão em seus súditos leais, ao contrário da
publicação rival The Discovery os Witchcraft, que se provou muito popular. Essa
última fora produzida por Reginald Scot, um cavalheiro educado do campo, cético
devotado que reuniu inúmeras narrativas da província, que circulavam na época.
Ele o fez para entreter os leitores e refutar as acusações forjadas pela
inquisição de James. Uma narrativa em especial entre as selecionadas era sobre
um jovem sexualmente promíscuo que consultou uma bruxa por ter perdido seu
membro e estar desesperado para substituí-lo. Ela o guiou até uma árvore alta, onde
vários órgãos masculinos estavam estocados, mas o proibiu de escolher o maior,
porque pertencera ao padre da paróquia. Scot apresentou uma mescla de
narrativas similares de feitiços e maldições que ridicularizavam os camponeses
e a Igreja, a qual ele acusou de infamar o medo irracional e a ignorância. A
popularidade do seu livro irritou o rei, que o condenou por superar as vendas
do seu próprio livro e por tratar com superficialidade o que ela acreditava ser
uma ameaça séria ao reino. James I era um neurótico vingativo e desprezível,
atormentado com sua identidade sexual. Ele deleitou-se ao testemunhar a tortura
de seus supostos assassinos, mas no fim da vida percebeu que cometera um pecado
capital ao forçar Fane e mais de 70 indivíduos inocentes a fazer confissões
falsas. Ele teria admitido que Scot estava certo. Bruxas e demônios eram mera
ficção e não havia, afinal, nenhuma verdade nas acusações.
O Julgamento das Bruxas de Salém:
Medo e fé cega é uma combinação com um potencial devastador,
que pode causar danos mais duradouros do que qualquer demônio. Como demonstram
as inúmeras caças às bruxas e perseguições religiosas, nossa capacidade latente
para realizar diabruras maliciosas envergonharia até o próprio Diabo. Jamais
esse fato foi demonstrado de forma mais destrutiva que na pequena vila de
Salém, Massachusetts, em 1692, em que três crianças vingativas acusaram seus
vizinhos de praticarem feitiçaria. Como resultado, mais de 200 pessoas foram
presas e torturadas e 22 foram executadas ou morreram na prisão. A caça às
bruxas começou na casa do reverendo Samuel Parris, um homem mal-humorado, de
espírito mesquinho, que retornara recentemente de Barbados com Elizabeth, sua
filha de 9 anos de idade, e seus criados negros. Elizabeth e Abigail Williams,
sua prima de 11 anos, com Ann Putnam, uma amiga de 12 anos, logo caíram sob o
feitiço de uma empregada, Tituba, que as entretinha com narrativas de ritos
vodus e encantamentos para invocar os espíritos. Essas histórias lúgubres,
combinadas com às advertências severas do reverendo Parris contra o interesse
pelo Demônio, deram uma ideia às crianças entediadas para conseguirem atenção e
divertirem um pouco à custa dos seus pais austeros e puritanos. Em janeiro de 1692, elas fingiram (ou não)
convulsões, engajando-se em ataques de grito e falando em uma língua irreconhecível,
como se estivessem possuídas. Mas o jogo fugiu ao controle quando o médico
chamado diagnosticou que Elizabeth fora amaldiçoada. Tituba foi espancada
severamente pelo reverendo Parris, depois do que ela “confessou” as crianças com
a ajuda de suas cumplices, uma indigente chamada Sarah Good e Sarah Osborne,
uma senhora acamada. Quando as três garotas se apresentaram diante do
magistrado, reclamaram de estar impedidas de testemunhar pelo espírito de Sarah
Good, que deixara seu corpo para atormentá-las. Osborne e Good negaram praticar
bruxaria, mas Tituba declarou que outros aldeões estavam envolvidos no coven.
Ann Putman mencionou que Martha Cory era um deles, porque ela riu quando a
garota encenou as convulsões. Ninguém ficou a salvo das acusações das crianças.
Até mesmo um sacerdote, George Burroughs foi denunciado e executado. Quando viram
o poder e a histeria que as garotas haviam desencadeado, outras crianças logo
declararam ter sido possuídas, para poder acusar aqueles de quem elas não
gostavam. Um homem foi torturado até a morte, certamente por não confessar ser
um membro do coven, pois receava ter suas propriedades e bens confiscados caso
confessasse. Posteriormente, sua mulher foi enforcada como bruxa. Quando as
pessoas dos povoados mais distantes souberam como o Diabo fora efetivamente
erradicado em Salém, as garotas foram convidadas a identificar bruxas suspeitas
nas cidades vizinhas. Mas o magistrado de Andover recusou-se a processar seus
vizinhos com base na palavra de algumas crianças; então, ele e sua família
foram expulsos por uma multidão furiosa, que os acusou de proteger uma bruxa.
Em outubro de 1692, a razão começou a prevalecer quando Increase Mather,
presidente do Harvard College, e sir William Phips, o governador de
Massachusetts, opuseram-se à histeria em massa que os circundava. No passado, Phips
havia enfrentado alguns selvagens empunhando machados, portanto, não se
intimidaria com um grupo de crianças neuróticas e seus apoiadores fanáticos.
Ele decretou que “evidências espectrais” não seriam admissíveis em julgamentos
futuros e depois ordenou a libertação de dezenas de pessoas que esperavam
julgamento por acusações de bruxaria. Na ocasião, a lista de detidos incluía
vários membros da igreja e alguns membros respeitados da comunidade.
Infelizmente, para alguns foi tarde demais. Depois que o reverendo Parris foi
denunciado, foi forçado a empacotar seus pertences. Sua saída encerrou a caça
às bruxas tão subitamente quanto havia começado. Os acontecimentos de Salém
foram um episódio vergonhoso na história americana, mas, como o chamado pânico
satânico dos anos 1980 bem demonstrou, muitos falharam em aprender aquela lição
específica e, portanto, a história estaria destinada a se repetir.
Entre os acessórios usados pelas bruxas e magos negros,
existe a horrível “Mão da Glória” – a mão decepada de um enforcado segurando
uma vela feita com sua própria gordura. Acreditava-se petrificar qualquer um
que a visse, possibilitando à bruxa ou feiticeira roubar uma casa sem
interferência. A receita para mumificar a mão foi publicada em 1722, em um
livrinho de feitiços, conhecido como "Little Albert". Foi utilizada, ainda
recentemente, em 1939, quando uma gangue de envenenadores na Filadélfia
empregou-a para aterrorizar suas vítimas e intimidar testemunhas.
O Culto Vodu dos Mortos Vivos:
Em uma manhã em 1936, os donos de uma pequena propriedade
rural na estrada suja e sinuosa perto de Port-au-Prince, no Haiti, perceberam
uma mulher nativa cambaleando em sua direção, saída da névoa matinal. Ela
estava vestida com uma bata branca e parecia procurar por alguém. Quando ela se
aproximou, eles lhe perguntaram se poderiam ajudar, mas ela não respondeu. Seu
rosto estava sem expressão, seis olhos mortiços não viam e sua boca tinha uma
expressão dura. Então, um dos fazendeiros arfou ao reconhece-la. Mas aquilo era
impossível, porque a garota tinha morrido 29 anos antes. Foi feito um exame
superficial no hospital local. Todas as indicações eram de que ela era surda,
muda e cega, mesmo assim ela se retraiu quando os doutores tentaram tocá-la, e
sua cabeça se movimentava de um lado para o outro, como um pássaro se movimenta,
como se para pegar o que eles estavam falando. Resolveu-se, por fim, o
mistério, quando a paciente foi identificada formalmente por seu irmão e seu
marido. Ela era Felícia Felix-Mentor, que fora enterrada em 1907. Quando uma
enfermeira perguntou qual doença ele deveria registrar na ficha de admissão da
paciente, o médico só pôde estremecer e responder “zumbi”. Existem histórias
incontáveis de zumbis no folclore sombrio do Haiti – uma criatura digna de
piedade e sem vontade própria, que existe em um estado entre vida e morte -,
mas este não foi o caso. O caso de Felícia Feliz-Mentor foi investigado e
documentado pela escritora norte-americana Zora Hurston, uma cética severa que
encontrou e fotografou a garota “morta”, e saiu convencida de ela ser uma
vítima genuína dos bokors, os feiticeiros vodus que praticam magia negra. Foi um
encontro que a srta. Hurston nunca se esqueceria. “A visão foi terrível. Aquele rosto imóvel,
com os olhos mortos. As pálpebras eram brancas em torno dos olhos, como se
tivessem sido queimadas com ácido. Não existia nada que você pudesse dizer a
ela ou retirar dela exceto olhar para ela, e a visão de sua ruína era demais
para suportar por muito tempo.”
Praticamente todos os haitianos acreditam que os mortos
podem ser trazidos de volta à vida por feiticeiros, que então os usam como
escravos maquinais, e é por isso que os pobres pagam tudo o que podem para
proteger os túmulos de seus entes queridos. Eles compram um sarcófago pesado de
pedra e então injetam veneno nos cadáveres ou os mutilam. Aqueles que são pobres
demais para pagar, por proteção, montam vigília no cemitério durante dias, até
o corpo ter se decomposto a ponto de não ter utilidade para os maus. Outros
colocam uma faca no punho cerrado dos cadáveres, para que ele possa matar o
bokor como vingança por perturbar a santidade dos túmulos. A lenda dos zumbis,
ou jumbee, não está restrita à pequena ilha caribenha do Haiti. O termo é comum
a várias culturas africanas, das quais as práticas e crenças do vodu derivam. Então,
elas foram desenraizadas e transplantadas para o caribe, onde mesclaram a
invocação de espíritos com o culto aos santos do Catolicismo francês. Os
praticantes do vodu moderno distanciam-se das superstições de seus ancestrais,
que eles veem como resíduos de uma tradição cultural em que os escravos tentavam
se proteger da crueldade de seus capatazes. As bonecas ou marionetes, ainda que
são oferecidas à venda nos mercados de Port-au-Prince, não são figuras para
facilitar a magia simpática, mas objetos de poder (pwen) criados para
transportar mensagens entre vivos e os mortos. Como tal, eles são pregados às
portas dos cemitérios. A associação do vodu com a magia negra foi obra dos
missionários cristãos, que tentaram dividir seus novos convertidos nativos dos
obstinados vodouisants, que eles acusavam de praticar feitiçaria. A alegação de
feitiçaria foi uma fiação maldosa encorajada pelos proprietários brancos de
monocultura, que temiam os sacerdotes homens (houngan) e mulheres (mambo)
pudessem se tornar tão poderosos que poderiam instigar uma revolta entre os
escravos. Seus medos se concretizaram em 1791, quando um feiticeiro vodu
chamado Dutty Boukman convocou milhares de escravos para uma cerimônia à
meia-noite, nas profundezas da floresta, onde ele executou um ritual de sangue.
Em meio a uma extraordinária tempestade tropical, ele ordenou à multidão
reunida beber o sangue morno do porco que ele sacrificara, se eles quisessem se
libertar do domínio colonial dos franceses. Quando a tempestade amainou, os
escravos evaporaram de volta às fazendas e derrubaram seus opressores. Durante
os dias seguintes, dezenas de plantações foram invadidas e seus proprietários
brutalmente assassinados. Os franceses mantiveram-se firmes no poder durante
anos, mas os sobreviventes viviam com medo dos servos sem alma – os bokors -,
que, dizia-se eram imunes ás suas balas. Em 1803, o último latifundiário
francês havia sido expulso e a república independente e negra do Haiti foi
fundada. Mais tarde, os filmes hollywoodianos de terror transformaram a lenda
do zumbi em sensação, mas ela não tem base em fatos. Alguns explicam o fenômeno
afirmando que esses indivíduos apáticos são simplesmente retardados mentais,
enquanto outros dizem que eles foram enfeitiçados por feiticeiros, pelo uso de
drogas, e uma forma de hipnotismo. Mas o caso de Felícia Felix-Mentor está lá
para alertar os céticos de que horrores inexplicáveis são realmente possíveis
no Haiti.
A LENDA DO REI SALOMÃO:
Desde os tempos mais antigos, as figuras mais significativas
na moldagem da civilização foram os reis-sacerdotes, que eram versados nas leis
morais do homem e na sabedoria arcana dos mistérios. Eles eram capazes de fazer
a distinção entre o que estava sugerido nas Escrituras e o que era comumente
compreendido como sendo apenas um conjunto de leis morais que Deus concedeu ao
homem. O primeiro deles e o mais reverenciado foi o rei Salomão. Sua fama foi
universal, estendendo-se muito além das terras dos israelitas, sobre as quais
ele reinou. Ele ascendeu ao trono aos 12 anos de idade, depois que seu pai, o
rei Davi, morreu. O esplendor do palácio de Salomão sobrepujava até mesmo o dos
faraós. Dizia-se que suas casas de tesouro transbordavam ouro, metais preciosos
e gemas do tamanho de olhos de águia, enquanto ele ostentava roupas de ouro e
veludo. A seu comando havia 1.400 carros, 40 mil cavalos de carros e 20 mil
cavalos de montaria. Todas as suas taças de beber eram de ouro, pois
desprezava-se a prata como metal inferior. Seu palácio, que ele denominou de
Iahar-Halibanon, a Floresta do Líbano, tinha cem cúbitos de extensão, 50
cúbitos de largura e 30 cúbitos de altura, com aposentos de cedro. Uma floresta
de colunas se erguia de chãos pavimentados com cristal, mas o mais maravilhoso
era o trono de Salomão. Feito de mármore, era tão grande que o rei tinha se
subir seis degraus para sentar-se nele. Cada degrau era guardado por leões, um
em cada lado, que estendiam suas garras quando ele se sentava. Dois leões de
madeira foram esculpidos no trono, que tinha um par de águias trepadas nele,
cujas asas protegiam o rei do implacável sol do deserto. Ainda mais grandiosa
era a sabedoria de Salomão. Ele era mais sábio que Etã, o Ezraíta, Chalcol,
Darda ou os filhos de Mahol. Mesmo os reis das nações vizinhas enviavam seus
sábios e filósofos para serem instruídos pelo rei dos hebreus. Pois Salomão era
instruído – algo raro entre os monarcas daqueles tempos. Ele compôs 3 mil provérbios
e 5 mil cânticos, em que expôs seus conhecimentos de teologia, ciências
naturais e filosofia. Os três reinos da natureza – a terra, o céu e o mar –
obedeciam a seu comando, do mesmo modo que os espíritos: celestiais, terrenos e
infernais. De acordo com a lenda, os bons espíritos cuidavam dos jardins de
Salomão, esculpiam estátuas com as pedras retiradas das pedreiras e fiavam seus
carpetes preciosos. Mas existiam outros espíritos com que ele tinha a reputação
de se congregar. Com a ajuda do poder investido em si por um anel mágico,
Salomão também comandou a obediência de demônios, de quem, dizia-se, ele
adquirira sua sabedoria extraordinária. Esses demônios ficavam confinados
dentro dos muros do palácio pelo poder do anel e eles comiam com o restante dos
familiares em mesas de ferro. Afirmações que possivelmente foram feitas pelos
que tinham inveja da riqueza e do poder de Salomão. Com toda a sua sabedoria,
Salomão desviou-se para o lado negro, sob influência funesta de uma filha do
faraó, que o seduziu a servir a deusa dos sidonianos Astarte e Moloch, o deus
dos amonitas, com sacrifícios rituais para suas imagens. Quando se aproximou do
fim da vida, Salomão rezou para que sua morte fosse escondida dos demônios, até
que eles tivessem acabado de escrever os grimórios (livros de magia ritual) que
haviam começado sob suas ordens. Então, Salomão virou as costas para seus
servos ímpios, apoiou-se em seu bastão e se ajoelhou como se estivesse rezando.
E morreu naquela posição, enquanto os demônios continuavam a trabalhar sem
perceber que seu poder sobre eles tinha acabado. Contudo, quando eles
completaram sua tarefa, um réptil arrastou-se de uma fissura no chão e subiu
pelo bastão, e diante disso o cadáver de Salomão desmoronou, transformando-se
em poeira e vestimentas. Então, os demônios fugiram, deixando os livros para
trás, e com eles o poder de trazê-los de volta à vida. Esta é a lenda da origem
dos grimórios que trazem o nome do rei – “A Chave de Salomão”, que data do
século I, e o “Lemegeton” ou “Chave Menor de Salomão”, que pode ser datado de
1500 a.C, mas que, sem dúvida, é bem mais antigo. Os dois livros foram
traduzidos e muitas línguas e copiados à mão nos séculos anteriores à invenção
da máquina de impressão. A cópia mais antiga sobrevivente da “Chave de Salomão”
data do século XV. Ela é mantida trancada e à chave na ala “proibida” do Museu
Britânico.
O Lemegeton lista não menos que 72 demônios e suas funções.
Todos eles são descritos em detalhes, como se tivessem sido capturados e
catalogados por um caçador de insetos sobrenaturais, creditados tanto com vícios,
como com virtudes. Mais da metade dos demônios serve para ensinar ao mago
matérias como matemática, filosofia, astrologia, astronomia, lógica, línguas,
artes e ética. De acordo com o autor anônimo do livro, esses habitantes do
mundo subterrâneo também podem ser consultados sobre assuntos do passado,
presente e futuro. Porém, também existem demônios que podem ser comandados para
trabalhar como servos, localizando objetos pessoais que se consideravam
perdidos ou avisando sobre as propriedades particulares de certas ervas como o
alho, que tradicionalmente mantinha os espíritos malignos a distância. Outras ervas agiam como eméticos, para que o
mago fosse purgado das impurezas para iniciar um período de jejum, abstinência
e castidade antes de um ritual importante. Isso era crucial, porque se
acreditava que um espírito impuro existia em um nível inferior de existência
que o dos humanos, então o mago podia reduzir o risco de contaminação ou
possessão elevando sua vibração até um nível mais alto de purificação. É por
isso que se acredita ser perigoso estar sob a influência de álcool ou drogas
enquanto se envolve com o oculto. Existe um forte elemento de satisfação de
desejo, é claro, em dar a certos demônios a tarefa de garantir os desejos
secretos de seu mestre, sejam eles riqueza, posição social ou qualidades
pessoais, tais como a astúcia ou a coragem. Por mais curioso que pareça, quatro
demônios são encarregados de fornecer entretenimento para aliviar o espírito
atormentado ao fim de um dia difícil de conjurações. Ele vem na forma de
música, com sons naturais e visões. A um demônio, inclusive, cabe a tarefa de
verter água quente para o banho, enquanto outros tornam a água em vinho e de
novo em água. Mas os mesmos demônios podem causar devastações em cidades
inteiras, incinerar os inimigos do mago ou empestar qualquer um de quem eles
não gostem com pústulas e outras doenças. Também está em seu poder criar
desastres naturais e artificiais, seja na forma de guerras, terremotos,
misérias ou inundações. Os prazeres da carne não são negligenciados. Não menos
que 11 espíritos recebem a responsabilidade de enfeitiçar mulheres para que seu
mestre possa seduzi-las e um tem a função única de força-las a se despir. Com
certeza a ciência progrediu desde a era da magia, mas a natureza humana,
evidentemente evoluiu mais devagar.
MONTAGUE SUMMERS:
Em 1926, no auge da “Era do Jazz”, um obscuro clérigo católico
romano experimentou o sucesso da noite para o dia, com um dos mais inesperados
best-sellers. “The History of Witchcraft and Demonology”, do reverendo Montague
Summers (1880-1948), foi apresentado como um trabalho sério de um acadêmico,
repleto de citações em latim e francês, notas de rodapé e uma bibliografia
abrangente. Mesmo assim, imediatamente incitou a ira dos mais notáveis
pensadores da época e foi igualmente condenado pela imprensa. O escritor H.G
Wells difamou a obra como um catálogo se superstições sem sentido, enquanto
muitos jornais se perguntavam se a publicação não seria uma piada sofisticada.
Summers, no entanto, era extremamente sério. Em sua introdução, ele declarou
que a obra não era apenas uma análise de pesquisador de antigos ritos rurais
esquisitos. Ao separar o fato do folclore, ele foi capaz de cortar caminho para
“a essência e a realidade duradoura da bruxaria e do culto às bruxas ao longo
dos séculos”, para concluir que “existiram e existem organizações
deliberadamente, diria mais, entusiasticamente dedicadas ao serviço do mal”.
Para respaldar seu argumento, Summers citou caso após caso em que as bruxas
espontaneamente confessaram comungar com o Diabo. Ele observou que muitos
relatos estranhamente similares em substância, apesar das diferenças das culturas
em que eles se deram. A imagem romântica de bruxa voando montadas em cabos de
vassoura foi descartada como pura fantasia, e os que declararam ter
testemunhado tais cenas, como Claudine Bauban, foram desacreditados como
pessoas que queriam chamar atenção ou sem bom senso, como Julian Cox, que
confundiu um ritual de dança camponesa que usava cabos de vassoura com um voo
de bruxas. Mas não foi o vigor acadêmico de Summers nem a erudição de seus
argumentos que garantiram ao livro o status de cause célebre. Foi sua tendência
a se prolongar nos detalhes sexuais das cerimônias satânicas das bruxas. Seu
gosto pouco reprimido combinava-se à indignação virtuosa de alguém que não
tinha sido convidado para a orgia. Essa era uma sensação compartilhada pela
maioria dos seus leitores, que só puderam concluir que a bruxaria existia, e
bem no século XX. Summers teve a singular habilidade de tornar o assunto
deliciosamente sedutor. Montague Summers foi um personagem tão extraordinário
quanto seu contemporâneo Aleister Crowley, que ele conheceu pessoalmente. Com
um rosto de anjo excêntrico, ele aparentava ter saído de uma novela do século
XVIII de Swift ou Fielding, uma impressão que se ajustava com sua voz em
falsete cômica e penteado que se assemelhava a uma peruca da Regência. Ele
costuma vestir sotaina, chapéu de abas largas e uma capa preta. Para completar
o quadro, usava sapatos de fivela e uma bengala com castão retorcido de prata,
que representavam uma cena lasciva da Antiguidade. Seu título ecumênico era
totalmente fictício. Ele fora ordenado diácono da Igreja da Inglaterra em 1908,
mas não foi aceito oficialmente como clérigo. Talvez em função dos rumores
sobre seu interesse por satanismo ou, mais provavelmente, pelas suspeitas a
respeito de sua conduta sexual imprópria com os garotos do coro, pelo que,
posteriormente, foi julgado e absolvido. Seja qual for a verdade, ele
converteu-se ao Catolicismo e se fez passar por padre católico. Ele era um “personagem”
conhecido, representado com frequência pelos cartunistas dos jornais, como um
Frei Tuck, em caricaturas que o desenhavam surgindo da biblioteca do Museu
Britânico com um livro sobre vampirismo debaixo do braço. Mas havia os que o
consideravam um personagem um tanto sinistro. O autor de ocultismo Dennis
Wheatley recordava-se de ter sido convidado para a residência de Summers, em
Alresford, onde ele foi entretido com as histórias das lutas de seu anfitrião
com o Diabo. Um episódio especialmente memorável mostrava o suposto clérigo
realizando um exorcismo na esposa de um trabalhador na Irlanda. Ela espumava
pela boca e teve de ser subjugada enquanto executava a cerimônia. No auge do
combate, viu-se um vapor negro saindo da boca da mulher. Depois, a nuvem escura
penetrou na perna de um carneiro, que tinha sido preparado para o jantar.
Quando chegou a hora de destrinchar a carne, o anfitrião exausto e seu
convidado ficaram horrorizados ao ver a mulher cheia de vermes. É uma boa
história, mas os mesmos acontecimentos foram atribuídos a meia dúzia de
ocultistas em várias épocas. Mais significativo foi o fato de Wheatley e sua
mulher terem ficado chocados ao descobrir que dividiram sua cama com uma dezena
de aranhas gigantes. Um sinal claro, diz-se, da presença de magos negros. Na
manhã seguinte, o anfitrião levou o autor a um quarto repleto de livros. Ele
selecionou um pequeno volume de capa de couro e ofereceu-o ao seu convidado por
50 libras esterlinas. “É sua cara”, disse Summers, “vale muito mais, mas eu o
deixarei compra-lo por 50.”. Um tanto embaraçado, Wheatley declinou a oferta,
dizendo que não poderia pagar por ela naquele momento. “Nunca tinha visto a
expressão de um homem mudar com tanta rapidez”, Wheatley escreveu mais tarde. “De
uma calma benevolente, de repente se encheu de uma fúria demoníaca. Ele jogou o
livro e saiu do quarto irritado.” Para evitar mais atritos, Wheatley enviou um
telegrama fictício para si mesmo e voltou para Londres na mesma noite. O
sucesso de “The History of Witchcraft and Demonology” encorajou Summers a
escrever mais volumes sobre temas relacionados (dois exploraram a lenda do
vampirismo e o outro instigou os lobisomens), todos ostentando um grau
acadêmico similar e uma pesquisa cuidadosa. Ele apresentou cada volume como
evidência documental da existência de cada uma das criaturas parecia acreditar
em cada palavra que escrevera. Ela editou também uma tradução do Malleus
Maleficarum, tratado do século XV de Kramer e Sprenger, e pôs seu nome em uma
edição revisada de “The Discovery of Witches”, o infame guia de caçadores de
bruxas de Matthew Hopkins, além de compilar várias coleções de histórias de
horror góticas. Porém, é por reacender o interesse pela feitiçaria que ela será
mais bem lembrado, reverenciado ou insultado. “Eu me esforcei para mostrar uma
feiticeira como ela realmente era – um ser diabólico; uma peste e parasita
social; devota de uma crença repugnante e obscena; uma adepta do envenenamento,
chantagem e outros crimes horripilantes; membro de uma organização secreta
poderosa e inimiga da Igreja e do Estado; blasfema na palavra e nas ações, que
domina aldeões pelo terror e superstição; uma charlatã e curandeira, às vezes;
uma alcoviteira, uma aborteira, a conselheira sinistra das damas lascivas da
corte e dos galanteadores adúlteros; sacerdotisa do vício e de corrupção
inconcebível, à custa da vulgaridade e das paixões mais abomináveis da época.”
É necessário lembrar, porém, que o “reverendo” Montague Summers não era uma
fonte inteiramente confiável e imparcial. Apesar do seu zelo religioso
professo, ele era um membro ativo da Ordem de Chaeronea, uma ordem pederástica
cujos interesses por meninos não eram puramente filosóficos ou platônicos; ele
também foi membro da British Society for the Study of Sex Psychology, para a
qual escreveu um ensaio exaltando os defeitos e virtudes do Marquês de Sade.
GERALD GARDNER:
Com o impacto de seus cabelos brancos, barbicha de bode e
sobrancelhas espetadas, Gerald Gardner parecia um sátiro envelhecido. Ele
também desempenhou o papel, manifestando uma predileção pelo autoflagelo, que
deixava os jornais de domingo ávidos por confissões lascivas. Eles especulavam
sem distinção sobre cenas de libertinagem, que imaginavam acontecer quando os
membros de seu coven davam cambalhotas, nus sob a lua cheia. Porém, por trás do
velho travesso e de sua aparência suspeita, havia uma paixão genuína pelo
misticismo como experiência concreta e a ele pode ser creditado o renascimento
da Wicca moderna que é, atualmente, a religião que mais cresce na América. Gardner (1884-1964) viveu na Malásia durante a
juventude e lá ele se entregou à paixão pela arqueologia e antropologia,
retornando brevemente à Inglaterra, em 1920, para ver se poderia despertar o
interesse do movimento espiritualista por feitiços e “ferramentas de magia”
criadas por ele. Ele não teve sucesso, então voltou para a Malásia, onde
trabalhou para o Serviço de Alfândega Colonial até 1936. Em sua aposentadoria,
emigrou para a Inglaterra, onde se envolveu em uma sociedade secreta, a Sociedade
da Ordem Rosa-Cruz de Crotona, que praticava uma forma de magia cerimonial que
Gardner considerou fascinante, porém arcaica. Ele resolveu revigora-la com suas
próprias criações baseadas em descrições detalhadas de cerimônias pagãs de
fertilidade, que apareceram em dois trabalhos de grande influência: “The Witch
Cult In Western Europe” (1921) e “The God of the Witches” (1931), ambos da
professora Margaret Murray do University College, de Londres. Murray havia
começado com a presunção de que as bruxas antigas tinham sido mulheres velhas
desiludidas, que haviam cultuado o diabo, mas ele concluiu declarando que elas
eram remanescentes de um culto de fertilidade que foi injustamente perseguido
pela Igreja. No início, Gardner aproximou-se da bruxaria como um exercício
acadêmico, rastreando suas rotas até a Idade da Pedra. Mas ele também era um
exibicionista excêntrico, que desejava estar cercado por acólitos dispostos a
se prostrar aos pés de seu mestre e se submeter ao seu tipo peculiar de
disciplina. Gardner pode também ter tirado ideias de a “Deusa Branca” de Robert
Graves, uma história abrangente do paganismo e da magia, e de “Golden Bough”,
de James Frazer. Os dois livros teriam dado a ele material suficiente para “Book
of Shadows”, seu livro de rituais de magia e textos religiosos. Contudo, os que
estavam enamorados demais por seu mestre para observar com mais atenção
consideraram-no como totalmente original. Os textos de Dion Fortune inspiraram
Gardner a escrever “High Magic´s Aid”, seu romance sobre magia publicado em
1949, um romance medieval pomposo, no estilo de sir Walter Scott. Ele declarou
utilizar rituais de magia autênticos, parcialmente retirados de “A Chave de
Salomão”, um grimório (livro de magia) “e parcialmente de manuscritos de magia
que eu possuo”. O Ato de Feitiçaria de 1735 impedia-o de admitir abertamente
que praticava a Arte, mas quando o ato foi revogado, em 1951, Gardner viu sua
oportunidade e a explorou. Seu segundo livro, “A bruxaria Hoje” (1954),
ostentava um prefácio de Margaret Murray, que na ocasião estava perdendo
credibilidade, pois começara a promover teorias cada vez mais excêntricas, em
específico a ideia de que todos os monarcas ingleses eram bruxos. Contudo, seu
endosso não prejudicou o livro. Ele inclusive encontrou aceitação imediata pelo
público em geral, que ficou fascinado em saber que “a antiga religião” ainda
estava viva e bem na Grã-Bretanha moderna e seus adeptos não tinham vergonha de
praticar sua fé, nus, nas florestas e até nos subúrbios. Em 1946, Gardner
contratou Aleister Crowley para criar novas cerimônias de iniciação e rituais,
com o objetivo de criar sua própria versão da Arte, embora uma versão com uma
temática sadomasoquista inconfundível. Flagelos rituais e cópula eram centrais
nos ritos de iniciação gardnerianos e muito do que se passava como culto era um
teatro do absurdo. Mesmo assim, o coven de Gardner atraiu dezenas de seguidores
desencantados com as religiões ortodoxas, e eles encorajavam outros a criar
seus próprios covens na Inglaterra e na América. Esses convertidos tinham se
distanciado dos aspectos mais sensacionais da filosofia de seu fundador. Eles
haviam amadurecido em uma irmandade que outorga poderes às mulheres e celebra o
princípio feminino. Não é difícil compreender por que a Wicca é tão popular nos
dias de hoje. A religião ortodoxa oferece à mulher algo além de subserviente,
ao passo que o Cristianismo faz da mulher a responsável pelo Pecado Original. A
fonte primária dos ritos de iniciação, rituais e regras gardnerianos é o “Livro
das Sombras”. Apresentado originalmente como um documento manuscrito que
professava ser do século XVII, foi de fato escrito por Gardner no fim dos anos
1940 ou no início da década de 1950. Só Gardner poderia ter tido o atrevimento
de esboçar uma lei afirmando que as altas sacerdotisas deveriam renunciar em
favor de uma mulher mais jovem se o coven assim o desejasse. O título “Livro
das Sombras” também faz referência aos registros pessoais dos trabalhos de
magia mantidos por todas as bruxas. O livro de Gardner é singular por delinear
um plano de resistência da magia à invasão nazista da Grã-bretanha, uma ideia
que Dion Fortune compartilhou em “The Magical Battle of Britain”.
ALEX SANDERS:
Atrás das cortinas de chintz rendado de uma modesta casa com
terraço, na região de veraneio à beira-mar de Bexhill-on-Sea, o autoproclamado
“Rei das Bruxas” Alex Sanders, de 60 anos, vestia uma máscara de ouro e um
cocar pesado de penas antes de invocar um espírito do fogo asteca de uma
dimensão além do tempo e do espaço. Em seguida, seus assistentes removiam seu
robe, deixando esse xamã suburbano dançar em volta do cômodo da frente enquanto
segurava uma vela flamejante em cada mão. Aparentemente, ele estava possuído
pela entidade, que proferia palavras de sabedoria do mundo dos mortos. “Muitos
me olham com estranheza”, ele disse à equipe de TV que filmou o ritual para um
documentário. “Muitas pessoas têm medo de mim, isso é culpa delas, não minha.”
Na época, Alex era um velho frágil, com dificuldade para permanecer em pé sem
ajuda, mas, uma vez que o espírito estivesse nele, ele sentia que podia
“liderar o caminho” para seu “povo”, protegendo-os da perseguição e dos olhares
indiscretos dos tabloides. Como muitos magos e ocultistas, Alex era um egotista
impenitente e um fantasista por hábito, que cortejava a controvérsia e
atormentava a imprensa para publicar suas atividades. Não foi apenas seu
apetite por publicidade que enfureceu seus colegas wicanos, os quais temiam que
relatos sensacionalistas incitassem a perseguição e o ridículo: ele também
tinha o hábito de “enfeitar” a verdade para tornar-se mais interessante. Parece
que ele foi iniciado na Arte por um membro de um coven de Nottingham em meados
dos anos de 1960, mas Alex sempre insistiu que sua avó galesa Mary Bibby tinha
executado a cerimônia depois que ele entrou em sua casa enquanto ela realizava
um ritual. “Em uma noite de 1933, quando eu tinha 7 anos, fui enviado para a
casa de minha avó para um chá. Por alguma razão, não bati na porta ao entrar, e
me deparei com minha avó nua, seus cabelos cinzentos soltos caindo até a
cintura, em pé em um círculo desenhado no chão da cozinha.” Quando se recobrou
do choque de ter sido descoberta, ela lhe disse para retirar suas roupas e se
juntar a ela dentro do círculo. Então, ela fez um corte em seu escroto com uma
faca e declarou que ele era um deles. Depois de fazer com que jurasse segredo,
ela informou ser descendente do chefe e rei de bruxas galês Owain Glyn Dwr, e
que Alex teria o direito de assumir o título quando fosse a hora. Mas primeiro
ele tinha de se familiarizar com os ritos da “religião antiga”, copiando os
rituais de seu próprio Livro das Sombras. Qualquer que fosse a verdade, Alex
era um médium natural, assim como seus irmãos. Sua futura esposa e alta
sacerdotisa Maxine Sanders lembrou que a casa da família ficava lotada de
espíritos, atraídos pela energia psíquica gerada pelos irmãos de Alex e as sessões
mediúnicas regulares que aconteciam em volta da mesa da cozinha. “Não era
incomum entra4r na cozinha dos Sanders em plena luz do dia e encontrar uma
sessão mediúnica de materialização completa acontecendo. A sra. Sanders estaria
entretida em suas rotinas domésticas, independentemente das aparições
presentes.” A primeira praga concreta de Sanders foi dirigida à sua primeira
esposa, que o deixou quando ele tinha 26 anos, levando seus dois filhos com
ela. Alex amaldiçoou a mulher com um feitiço de fertilidade, para que, quando
ela se casasse de novo, tivesse a sobrecarga de dar à luz três pares de gêmeos.
Mas isso foi um pequeno consolo para o sentimento de ser rejeitado e
abandonado, então Alex saiu em busca de riqueza e sexo, usando feitiços para
tal fim. “Eu cometi um erro terrível ao usar magia negra em uma tentativa de
conseguir dinheiro e êxito sexual. Funcionou muito bem – eu estava andando por
Manchester e fui interpelado por um casal de meia-idade que me disse que eu era
o duplo exato de seu filho único, que morrera havia alguns anos. Eles me
levaram para sua casa, alimentaram-me e vestiram, e trataram-me como um
familiar. Eles eram riquíssimos e, em 1952, quando pedi a eles que me dessem
uma casa, com uma pensão para mantê-la, eles ficaram felizes em realizar meus
desejos. Eu fiz festas, comprei roupas caras, eu era sexualmente promiscuo; mas
depois de algum tempo, percebi que tinha uma dívida terrível a pagar.” Vários
membros da família de Sanders morreram prematuramente de câncer e a namorada de
Alex cometeu suicídio. Esses acontecimentos dissuadiram-no de continuar se
aventurando pela Linha Esquerda. Em vez disso, ele trabalhou por um tempo como
curandeiro, mas não conseguia resistir a libertar um cliente de verrugas,
transferindo-as para alguém de quem ele não gostasse. Ele também afirmou ter
curado um homem viciado em drogas e ter executado abortos psíquicos enviando a
alma de volta para o Paraíso. E, quando ele não conseguia persuadi-la a voltar,
diz-se que ele recomendava um aborteiro aqui da Terra. Ele recebeu o crédito de
ter curado p pé deformado de sua própria filha Janice, cujo tratamento fora
desacreditado pelos médicos. Seguindo instruções de seu guia espiritual, Alex
banhou o pé de Janice em azeite de oliva e o massageou até ser capaz de virá-lo
de volta à posição correta, sem nenhuma dor. Em 1963, a partir de conselhos de
seu anjo da guarda e espíritos guias, ele aceitou um trabalho subalterno na
John Rylands Library em Manchester, onde pôde estudar a fundo as cópias de dois
grimórios lendários, “A Chave de Salomão” e “O Livro da Magia Sagrada de
Abramelim, o Mago”. Mas ele não contentou só com a leitura dos livros. Ele
tinha de possuí-los. Uma noite, conseguiu retirá-los às escondidas da
biblioteca, mas foi pego em seguida. Sob a ameaça de processo, prometeu
devolvê-los, mas não antes de fazer uma cópia manuscrita dos rituais mais
potentes. É provável que lhe teriam pedido que deixasse a livraria de qualquer
modo, porque ele havia atraído atenção indesejável sobre si ao persuadir o
Manchester Evening News a publicar uma matéria de primeira página sobre
bruxaria. Esse incidente também o levou a ser banido de seu coven local, que o
considerou um peso morto. Mas a imprensa importunou-o por mais petiscos
lascivos e ele atendeu de boa vontade. Em 1965, declarou presidir sobre cem
covens a partir de sua casa em Manchester e ter criado um familiar na forma de
um bebê, feito a partir de um ato de magia sexual com outro membro masculino do
coven. Alex parece ter sido um médium de transe genuíno, mas sua afirmação de
ter canalizado um bruxo do século XVII chamado Nick Demdike não foi provada.
Acusaram-no de retirar o nome de um romance do século XIX, “The Lancashire Witches”,
de William Ainsworth, que tinha um bruxo com o mesmo nome. Em 1969, outra
reportagem no jornal dominical sensacionalista empurrou Sanders para os
holofotes e ele se viu uma celebridade menor no circuito dos programas de
entrevistas, para desgosto de outras bruxas. A reportagem era em torno da
afirmação de Alex de ser capaz de erguer os mortos, um rito que ele executou
com uma expressão séria em Alderley Edge, diante de um repórter embasbacado. O “cadáver”
era, um dos assistentes de Alex, que jazeu obediente até o momento combinado,
imóvel como uma múmia egípcia sob camadas de bandagens. O médico que atestou a
morte da vítima, para começar, era outro amigo de Alex. Quanto ao ritual, Alex
não desejava o risco de incorrer na fúria dos deuses ao dizer seus nomes em
vão, então resistiu à tentação de usar um verdadeiro encantamento e em vez
disso leu uma receita de trás para a frente! Suas farsas e a ânsia por
publicidade zangaram muitos dos que se empenhavam em praticar suas crenças a
portas fechadas e no anonimato, e Alex tinha plena consciência das críticas
levantadas contra ele. Em 1979, fez um pedido de desculpas completo e sincero e
expressou a esperança de que a totalidade dos convertidos que ele trouxera para
a Arte superasse vastamente a atenção negativa que atraíra. Sanders morreu de
câncer do pulmão no dia de Beltane, 30 de abril de 1988. Seu último desejo foi
de que seu filho Victor o sucedesse, mas Victor não queria nada com o movimento
e imigrou para a América. O ramo Alexandrino da Wicca hoje em dia está
firmemente estabelecido como uma alternativa à tradição gardneriana, mas não é
tão popular. Isso, em parte, se deve ao fato de que Sanders representou uma
imagem negativa da Wicca na imprensa, mas outro motivo pode ser a insistência
de Sanders pela admissão de homossexuais – uma regra que desorganiza a dinâmica
macho-fêmea, que é central nos trabalhos de um coven.
DION FORTUNE
A autora e ocultista Dion Fortune (1890-1946) foi a
responsável pela disseminação da teoria e prática da magia cerimonial para um
círculo tão amplo como nunca visto. A informação que ela forneceu só estivera disponível
antes para iniciados de sociedades secretas como a Golden Dawn. Codificada em
seus romances – “The Winged Bull”, “The Sea Priestess”, “The Goat Foot God” e
outros – eram ritos e rituais que os wiccanos e magos modernos foram capazes de
adaptar e incorporar a um sistema de magia neopagão baseado no culto à deusa,
ou o princípio feminino. Ele foi um afastamento da “religião antiga”, em que a
figura patriarcal de Pã mantivera-se suprema. Seus diversos estudos sobre magia
ritual e filosofia oculta, incluindo “The Cosmic Doctrine”, “The Mystical
Qabalah” e “Sane Occultism”, foram realizados na “The Occult Review”, uma
revista que teve circulação ampla nos anos de 1930. Eles devem ter sido
devorados por pessoas como Gerald Gardner e Doreen Valiente, os responsáveis
pelo ressurgimento da Wicca dos anos de 1950. Pode-se argumentar que, sem a
contribuição de Dion Fortune, o movimento wicano moderno não teria florescido
como floresceu e o movimento Nova Era não teria evoluído para uma forma de
espiritualidade centrada na natureza, que é simbolizada pela Mãe Terra e a
Rainha do Céu. Nascida Violet Mary Firth em Llandudno, Gales, ela foi criada
como cientista cristã, mas aos 20 anos foi compelida a mergulhar na filosofia e
magia oriental, depois de sofrer um colapso nervoso quando trabalhava como
professora em um colégio particular de garotas. Mais tarde, declarou que não
foi uma desordem nervosa comum, mas o resultado de um “ataque psíquico” mantido
pela diretora, que havia estudado ioga na Índia e usou sua vontade superior
para quebrar a resistência de Violet e destruir sua autoconfiança. “Eu entrei
como uma jovem forte e saudável. Saí como um destroço psíquico e mental”, ela
escreveu. Quando se recobrou, ela decidiu aprender tudo o que pudesse sobre os
poderes latentes da mente, que ela suspeitou ser a fonte de todo fenômeno
oculto. Pouco antes da Primeira Guerra Mundial, ela matriculou-se na Tavistock
Clinic para estudar psicanálise freudiana, onde conheceu seu mentor, o místico
anglo—rlandês T.W.C Moriarty, que inspirou sua coleção de contos “The Secreto f
Dr. Taverner”. Depois da morte dele em 1923, ela uniu-se à “Cristian Mystic
Lodge of the Theosophical Society”. Em 1919, ela foi iniciada em uma “loja irmã”
da Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn), onde aprendeu o
funcionamento da magia cerimonial, mas, na ocasião, a ordem estava em declínio.
“seus velhotes futriqueiros” passavam mais tempo discutindo sobre procedimentos
do que um Conselho do que um conselho de pastores de província. Durante os três
anos em que permaneceu com a ordem, ela adquiriu seu nome mágico, uma contração
de “Deo Non Fortuna” (“Por Deus, não pelo Acaso”), e chegou à conclusão de que
os ocultistas modernos não poderiam se dar ao luxo de ignorar as percepções
oferecidas pela psicologia. Ela pontuava que as ordens de magia como a Golden
Dawn estavam condenadas à extinção porque seus membros estavam determinados a
preservar um conhecimento arcano, em vez de desenvolvê-lo, do mesmo modo que as
religiões ortodoxas fizeram antes. Ela delineou sua filosofia em “Sane
Occultism”, o primeiro de vários livros sobre os aspectos práticos de magia e
do desenvolvimento psíquico. “Um conhecimento de filosófica oculta pode dar uma
pista para as pesquisas dos cientistas e equilibrar os êxtases dos místicos.”
Como psicóloga treinada e ocultista praticante, ela percebeu que a fonte
primária de nossa moléstia moderna origina-se de uma negação do nosso ser
subconsciente intuitivo, personificado pelos pagãos como Pã, ou a consorte do
Deu Cornífero, Arádia, o arquétipo feminino do si mesmo. De acordo com Dion
Fortune, a não ser que pudéssemos reconciliar os aspectos psíquicos e práticos
de nossa espiritualidade, permaneceríamos vítimas de desordens mentais, tais
como depressão, bem como doenças relacionadas ao estresse crônico. Nos romances
de Dion Fortune, mais que em seus panfletos de magia, fica claro que se
realinhar com a natureza é o caminho para a integração psicológica e a
autorrealização. A religião pede ao crente que aceite a promessa da vida após a
morte com confiança, para submeter a vida ao serviço do divino e resistir à
tentação, enquanto a filosofia oferece vida após a morte como apenas uma
possibilidade e pede ao indivíduo que assuma a responsabilidade por seu
destino. Apenas o ocultismo revela a verdadeira natureza da Realidade Maior e
nosso propósito nela, e isso capacita o indivíduo com a habilidade para criar
essa realidade. Nos anos de 1920 e 1930, não era permitido criticar a religião.
Qualquer autor que o fizesse seria ridicularizado pela imprensa e podia dizer
adeus à sua carreira literária, portanto, Fortune fez com que seus pontos de
vista sobre o Cristianismo ficassem conhecidos pela boca de seus personagens.
No “The Winged Bull”, ela deixa o personagem central, um acadêmico erudito e
ocultista, fazer o discurso. “E, então, vieram os caçadores de heresias e deram
a ele (Cristianismo) um trato final, realizando um grande esforço para se
livrar de tudo que ele havia herdado de crenças mais antigas. E eles haviam
sido como moleiros modernos, que refinam todas as vitaminas retirando-as do pão
e condenam metade da população ao raquitismo. Foi o que aconteceu com a
civilização, ela teve raquitismo espiritual porque seu alimento espiritual era
refinado demais. O homem não pode prosseguir sem um traço de paganismo e, em
geral, ele não tenta.” O ritual central na Wicca moderna, conhecido como
Descenso da Lua, sempre foi creditado ao autoproclamado “Rei das Bruxas” Gerald
Gardner e sua alta sacerdotisa Doreen Valiente, mas ele é, na verdade, uma
variação do rito descrito por Dion Fortune em seu romance “The Sea Priestess”,
publicado em 1938. Desenha-se um círculo sagrado em volta de um sacerdote e uma
alta sacerdotisa do coven, cercando-os em um espaço consagrado, marcado nos
quatro pontos cardeais do compasso e santificado com os quatro elementos: fogo,
ar (incenso), água e terra (sal). Depois, o grão-sacerdote ajoelha-se diante da
alta sacerdotisa, que está em pé de frente para o altar segurando um bastão em
uma mão e um cesto em outra, com os braços cruzados em uma imitação de Osíris.
Então, o sacerdote dá um beijo nos pés, joelhos, abdome (barriga), seios e por
fim nos lábios da sacerdotisa, antes de se dirigir a ela como a encarnação da
Deusa Mãe. Daí, ela pode ser inspirada a se dirigir ao coven, como se
canalizando a deusa, ou pode recitar uma passagem do Livro das Sombras, a “bíblia”
das bruxas, ou outro trabalho que pareça relevante na ocasião. Não existe
menção ao Demônio ou nada que possa ser interpretado como uma afronta ao
Cristianismo. Na verdade, é bem o oposto. “Eu sou a Deusa graciosa que oferece
a dádiva da alegria para o coração do homem. Sobre a terra eu concedo o
conhecimento do espírito eterno; e, após a morte, eu concedo paz, liberdade e
reunião com os que se foram no passado. Eu não exijo sacrifício; pois, perceba,
eu sou a Mãe de tudo que vive, e meu amor brota por toda a terra.” Nos romances
de Dion Fortune, o protagonista em geral é um homem que sofreu um esgotamento
nervoso ou outra crise. Em seguida, ele é resgatado por uma ocultista que o
ajuda a encontrar equilíbrio e perspectiva por meio da iniciação nos Mistérios.
Um tema secundário envolverá um hieros gamos (casamento divino) do homem com a
mulher que ele está destinado a amar. Por intermédio dela, ele encontrará
redenção e completude. “Quando o corpo de uma mulher é transformado em um altar
da Deusa que é toda beleza e vida magnética... então a deusa entra no templo.”
(The Sea Priestess) Para os ocultistas, todos os aspectos da vida, em especial
a união do homem e da mulher, têm um significado simbólico. A vida em si é um
ritual sagrado.
“Todos os deuses são um deus e todas as deusas são uma deusa
e existe um iniciador.”
ALEISTER CROWLEY:
A verdadeira face do mago notório Aleister Crowley (2 de
outubro de 1875 - 5 de dezembro de 1947) está envolta em mitos e informações
incorretas, muitas delas de sua própria autoria. Mesmo seus discípulos mais
devotados tinham uma imagem distorcida do homem que se comprazia com o título
“A Grande Besta”. Crowley foi um mestre na manipulação, um autopublicista
descarado que ansiava por atenção e tinha um prazer perverso em chocar a
sociedade polida, vangloriando-se de seus excessos com drogas e libertinagem.
Ele divertia-se em seu papel de “o homem mais perverso do mundo” e fez tudo o
que pôde para aumentar sua reputação. Uma vez, alguém o descreveu como “um
menininho sórdido que nunca cresceu”, e embora essa descrição não leve em conta
sua influência considerável na tradição esotérica ocidental, especificamente a
magia prática, ela é afinal um resumo bastante acurado de sua personalidade
excepcionalmente desagradável. Crowley nasceu em Royal Leamington Spa, perto de
Srtatforupon-Avon, em 12 de outubro de 1875, Batizado Edward Alexander Crowley,
ele mudou seu nome para Aleister quando estava na universidade. Seus pais
puritanos foram afetuosos e extremamente indulgentes ao criar seu filho único,
mas ele ressentia-se de sua criação rígida e opressiva, descrevendo sua mãe
mais tarde como uma “carola descerebrada”. Seu pai morreu de repente, quando
Aleister estava entrando na adolescência, e isso teve um efeito profundo em seu
desenvolvimento. Enquanto ele se tornava cada vez mais provocador e cheio de
vontades, sua mãe ficava cada vez mais apaixonada em sua devoção pela igreja.
Ela tentou instilar a crença de que o sexo era criação do Demônio em seu filho
e de que se submeter a tentações era o primeiro passo na estrada da maldição. “O
amor era um desafio para o Cristianismo”, escreveu Crowley mais tarde, e ele
determinou-se a superá-lo na primeira oportunidade. Com a idade de 14 anos, ele
seduziu uma empregada na cama de sua mãe, enquanto ela estava na igreja. Quando
ele confessou triunfante, ela acusou o filho de ser a Grande Besta do
Apocalipse, cuja vinda fora profetizada no Apocalipse de João, e o enviou para
um internato. A reação da mãe apenas reforçou sua crença de que a mania religiosa
era uma forma amena de insanidade. Longe dos olhos da mãe, ele explorou sua
bissexualidade de maneira irresponsável, bem como sua paixão por escrever
poesia pornográfica. Seus versos falharam em criar impressão nos círculos
literários, onde foram menosprezados como decadentes, derivativos e de um
sadismo mórbido. Sem se intimidar, Crowley pagou para tê-los publicados, porque
ele se recusava a aceitar que pudesse ser algo além de brilhante em tudo o que
fizesse. “É uma coincidência estranha”, ele vangloriou-se mais tarde, “que um
pequeno condado deu à Inglaterra dois de seus maiores poetas – porque não
podemos esquecer Shakespeare”. Sua outra paixão consumidora na época era o
montanhismo, para o que ele era bem equipado tanto mental quanto fisicamente. Seu
físico avantajado e a destemida indiferença ao perigo garantiam que se
sobressaísse, embora ele carecesse de espírito de equipe e cuidado com seus
companheiros alpinistas, tão críticos para o sucesso naquele esporte quanto a
habilidade e a força. Uma vez, em um caso famoso, ele abandonou seus parceiros
de escalada à sua sorte durante uma subida ao Kanchenjunga, quando pareceu que
eles o impediriam de alcançar o pico. Ele havia sido deposto como líder da
expedição por seu “tratamento sádico e cruel aos carregadores” e, quando os
outros membros do grupo foram enterrados em uma avalanche, ele ficou em sua
tenda, emburrado e rancoroso, ignorando seus gritos por socorro. Porém, Crowley
esqueceu o alpinismo e os versos ao descobrir o oculto no fim da adolescência.
Ele devorou os livros “The Kabbalah Unveiled”, de McGregor Mathers, e “The Book
of Black Magic and of Pacts”, de A. E. Waite, de uma só vez, mas se recusou com
teimosia a reconhecer o débito que seus livros deveram a esses autores, que ele
ridicularizou como pretensiosos. Era impossível para Crowley elogiar qualquer
pessoa que fosse, porque se considerava superior a todos; mas ele ficou
entusiasmado com as ideias de Mathers de que a magia oferecia um meio de se
elevar acima da rotina mundana da vida cotidiana e de que o talento em questões
ocultas dependia da intuição, não do intelecto. Como Crowley recordou
posteriormente, o sucesso na magia dependia da habilidade para “despertar o
gênio criativo”, não apenas acreditando que a vontade de alguém se tornaria
realidade, mas também a visualizando. Uma expectativa de sucesso quase infantil
e uma determinação obstinada em obter o que se deseja a qualquer custo são
cruciais para o resultado da magia cerimonial. Em todo ato de magia, é preciso
suspender a mente racional, por que ela limita o poder do inconsciente, do
mesmo modo que um pai desaprovador pode atrasar o progresso de uma criança,
advertindo-a sobre os problemas que ela pode encontrar. O sucesso inicial de
Crowley como mago foi resultado de sua crença que mais tarde se transformou em
autovalorização, o que ofuscou sua intuição. Ele teve uma prova de seu poder
potencial na juventude. Quando estava estudando em Cambridge, ele amaldiçoou um
mestre que havia recusado a permissão para ele encenar uma peça indecente. Sua
ação foi fincar alfinetes em uma imagem de cera feita por ele. Mas o ritual não
aconteceu como Crowley planejara. Em uma noite de lua cheia, ele convenceu
alguns de seus colegas estudantes a se juntar a ele em um campo ao lado do St.
John´s College. Eles deveriam fazer um círculo enquanto ele executava a
conjuração. Contudo, no momento crítico, um dos participantes não teve coragem
e tentou arrancar a boneca de Crowley. Uma agulha escorregou o fincou em seu
pé. No dia seguinte, o mestre caiu em uns degraus e quebrou o joelho. No início,
Crowley encantou-se com o convite para se unir ao círculo oculto da moda de
Mathers, a Hermetic Order of the Golden Dawn (Ordem Hermética da Aurora
Dourada), em 1898 – que contava com vários membros da sociedade vitoriana entre
seus adeptos, inclusive o poeta W. B. Yeats e vários autores renomados. Mas ele
se desesperou quando percebeu que eles eram tão preocupados com classificações
e regras quanto os maçons. “Eles não eram protagonistas no combate espiritual contra
restrições”, observou, “contra os opressores da alma humana, os blasfemadores
que negavam a supremacia da vontade do homem”. Com essas palavras, ele
referia-se à religião institucionalizada. Crowley estava impaciente por poder e
obcecado com a ideia de que, de alguma forma, sexo e magia estavam ligados, que
a energia vital canalizada durante o sexo poderia ser usada em magia ritual, de
modo que os desejos mais profundos pudessem ser concretizados. Com a riqueza
herdada, uma aparência de sofisticação e personalidade dominadora, Crowley
teria muitos admiradores, que se submeteriam a qualquer ato humilhante se ele
os cortejasse a acreditar que isso poderia dar nascimento a uma “criança
mágica”, uma forma-pensamento sem alma que cumpriria suas ordens. A magia
sexual, entretanto, era desaprovada pelos “velhotes” da Golden Dawn, que
consideravam a ambição imprudente de Crowley como embaraçosa e, decididamente,
de mau gosto. Crowley sentia ser merecedor de uma posição elevada dentro da
sociedade, mas Mathers pensava diferente. Seu antagonismo intensificou-se até
que, em 1904, os dois homens brigaram nos tribunais sobre os direitos dos
rituais um dia secretos, que Crowley declarou terem sido transferidos para ele
pelos “chefes secretos” incorpóreos da ordem. Mathers conseguiu obter um
mandado que impedia seu rival de publicar o material, mas Crowley era mau
perdedor. Ele invocou Belzebu e seus 49 demônios auxiliares para atormentar seu
inimigo. Mathers retaliou amaldiçoando o cachorro de Crowley e tornando seus criados
enfermos, mas o ataque psíquico deixou-o esgotado e derrotado, e ele perdeu o
apelo seguinte. A publicidade que se seguiu precipitou a dissolução da ordem e
empurrou Crowley para as páginas dos tabloides de domingo, cujos leitores
aceitaram sem reflexão suas histórias de batalhas psíquicas no plano astral.
Mas eles ficaram mais fascinados ainda por seus relacionamentos bizarros e vício
em drogas. O apetite sexual voraz e o traço sádico de Crowley foram satisfeitos
por uma série de mulheres neuróticas e impressionáveis, que se submetiam de bom
grado às suas exigências, que ele justificava afirmando ser parte de um ritual
oculto. Ele chegou a ir ao extremo de afiar seus dois dentes caninos a ponto de
poder dar a suas discípulas femininas adoradoras um “beijo de serpente”. Ele
também se tornou viciado em mescalina, que com o passar do tempo drenou
consideravelmente sua força interior e prejudicou sua saúde. Se ele não
possuísse uma vontade tão indomável, teria deteriorado a um ritmo bem mais
rápido. Doses generosas de heroína, ópio e haxixe ofuscavam seu julgamento e
percepção, ao mesmo tempo em que exacerbavam suas idiossincrasias e
relacionamentos, que eram não convencionais, para dizer o mínimo. Ele exercia
atração fatal sobre mulheres neuróticas e masoquistas, para que pudesse
dominá-las e abusar delas à vontade. Em uma ocasião, conhecidos viram-no
chutando uma de suas amantes, que ele amarrara e deixara para dormir no chão do
apartamento deles. Outra vez, ele trancou sua primeira esposa em um guarda-roupa,
enquanto divertia uma amante no mesmo quarto. Ele era igualmente abusivo com
seus amantes e companheiros homens, usando-os e descartando-os como se fossem
cães doentes. Os que cruzaram seu caminho atestaram a eficácia de suas maldições,
que deixaram um ex-acólito em estado de exaustão nervosa durante meses. Crowley
forjou uma ligação psíquica com seus discípulos mais devotados, que era tão
difícil para eles quebrarem quanto a dependência de drogas ou álcool. Nos
círculos ocultos, muitos acreditavam que a morte de Mathers em 1918 foi
resultado direto de uma maldição de Crowley. Na época do caso nos tribunais,
Crowley ainda não fizera 30 anos, mas já era uma figura conhecida nos círculos
boêmios e um mago de poder considerável. Porém, sua vida privada era uma
bagunça. Ele iniciara uma amizade com um jovem e promissor pintor, Gerald
Kelly, mais tarde presidente da Royal Academy, e, de brincadeira, ofereceu-se
para se casar com a irmã emocionalmente instável de seu novo amigo, Rose, para
salvá-la das atenções indesejáveis de seus inúmeros pretendentes. A família
ficou enraivecida ao pensar que esse fantasista poderia herdar sua fortuna, e realmente
enfurecida quando Crowley casou-se com Rose, no dia seguinte e, então,
arrastou-a para Paris, anunciando que dali por diante eles deveriam ser
tratados como Príncipe e Princesa Chioa Khan. Toda correspondência que não
fosse endereçada de modo apropriado eles retornariam sem abrir. O casamento
revelou a maldade de Crowley para que todos vissem. Ele levou Rose como uma
criança petulante de Paris para o Cairo e então para o Ceilão, explorando sua
devoção masoquista a ele, embora fossem claras suas intenções de humilhá-la.
Mas, em seguida, aconteceu algo totalmente imprevisto. Rose, agora grávida de
seu primeiro filho, revelou-se uma médium. Seja isso verdade ou não, pelo menos
garantiu que ela teria, por fim, a total atenção de seu marido. Ela disse-lhe
que ele havia ofendido o deus egípcio Hórus, mas se seguisse as instruções dela
ao pé da letra ele poderia invocar uma deidade que ditaria uma nova escritura
radical que teria seu nome. Crowley confessou ter considerado o ritual sem
sentido, mas provou ser eficiente. Não foi somente Hórus quem falou com ele,
mas também seu anjo da guarda Aiwass, provavelmente por intermédio de Rose.
Juntos, eles ditaram todo o texto que mais tarde foi publicado como “The Book
of the Law”. Ele era um pastiche pseudobíblico que anunciava a criação de uma
nova religião, cujo princípio central era de que o homem é Deus e Aleister
Crowley, seu profeta. “... pegue vossa cota e vontade de amor como quiserdes,
quando, onde e com quem quiserdes.” (Private Chaos) Se Crowley tivesse vivido
na América nos anos de 1960, ele poderia ter fundado um novo culto lucrativo;
entretanto, nos anos que precederam a Primeira Guerra Mundial, ele foi
desprezado pelo público em geral como apenas outro excêntrico nos moldes da
líder teosofista Madame Blavatsky, que também afirmava canalizar a sabedoria
esotérica do mundo espiritual. Entretanto, a filosofia autocentrada de Crowley influenciou
uma geração que surgiu nos cínicos anos de 1970 e foi adotada como credo
central da Church of Satan (Igreja de Satã). Seu édito para abandonar os fracos
e viciosos à própria sorte e rejeitar sentimentos de piedade para com aqueles
que sofrem poderia ter sido extraído da A Bíblia Satânica. Porém, em sua época,
a percepção do público sobre o ocultismo de Crowley foi distorcida por toda a
falação em torno de sua vida privada. Rose era uma musa indigna de confiança.
Depois que seu bebê morreu de febre tifoide em Rangum, ela deu à luz uma
segunda criança, mas provou ser uma mãe incapaz. Ela começou a beber e mais
tarde foi internada em um hospital psiquiátrico. Enquanto isso, Crowley
atingira um grau de poder oculto que apenas seus amigos íntimos e iniciados
tiveram o privilégio de testemunhar. Um deles descreveu como Crowley demonstrou
sua vontade superior ao deixar um homem inconsciente e fazer outro implorar
como um cão. Em outra ocasião, o escritor americano William Seabrok caminhava com
Crowley ao longo da quinta Avenida em Nova York, quando ele lhe pediu para
demonstrar suas habilidades. Crowley concordou. Ele seguiu um estranho por
alguns momentos, imitando seu modo de andar e, então, entortou os joelhos, o
que fez com que o homem caísse na rua. Mesmo enquanto vivia em um apartamento
arrendado em Londres, Crowley teve sucesso em convocar seres do mundo
subterrâneo. Em uma ocasião, ele materializou um espírito de cura com elmo e,
em outra, convocou um exército de demônios, que marcharam em torno do quarto
até serem dispersos pelos primeiros raios do sol matinal. Mas, na Mansão
Boleskin, sua propriedade recém-adquirida às margens do Lago Ness na Escócia,
os espíritos tornaram-se tão numerosos que, segundo consta, ele tinha de
trabalhar com todas as luzes acesas, mesmo em plena luz do dia, pois o quarto
estava vivo, cheio de sombras. Diz a lenda que o capataz da propriedade ficou
possuído e tentou assassinar a família, o que motivou Crowley a fazer uma
viajem não planejada para o México. Lá, ele declarou ter chegado perto de fazer
seu próprio reflexo desaparecer da superfície de um espelho, simplesmente pelo
poder da vontade. Ele percebeu que o homem é Deus, mas não teve a humildade de
se submeter ao seu ser superior como um verdadeiro adepto faria. “O homem
ignora a natureza de seu próprio ser e poder (...) O homem é capaz de ser e
usar tudo o que ele percebe, pois tudo o que ele percebe é, em certo sentido,
parte de seu ser.” Contudo, apesar de todas as suas intuições, Crowley não pôde
resistir à busca das paixões animais de sua natureza inferior. Para ele, sexo e
submissão eram inseparáveis da magia, e ele se tornou um devoto ávido de sua
própria religião. Em 1912, entrou em conflito com outro grupo oculto – o culto
Ordo Templis Orientis (OTO), sediado na Alemanha – por revelar os segredos da
ordem em sua revista de impressão própria “The Equinox”, ou seja, de que o sexo
é a chave para o poder oculto. Mas essa querela pessoal aconteceu fora dos
holofotes públicos, com Crowley conseguindo permissão para estabelecer seu
próprio ramo da OTO na Grã-Bretanha. Quando a Grande Guerra eclodiu, Crowley
fugiu para a América, onde espalhou propaganda antibritânica para ofender o
pais que falhara em reconhecer sua genialidade. Lá ele viveu à custa de amigos
e seguidores ricos, tendo dissipado a fortuna familiar em um estilo de vida
extravagante, que agora ele não estava preparado para moderar, embora não
tivesse os meios para sustenta-lo. Em 1916, tornou-se exasperado pela contínua
recusa de seus contemporâneos em lhe conceder o grau de Magus em magia, então
realizou o cerimonial sozinho. No fim da cerimônia, ele batizou um sapo e,
então, crucificou-o. No fim da guerra, seus financiadores relutantes já estavam
enfurecidos com sua arrogância e cansados de ser menosprezados. Estava na hora
de a “Besta” seguir em frente. Crowley sabia que não seria bem-vindo na
Grã-Bretanha, então comprou uma casa de campo em Cafalu, Sicília, com as rendas
de uma pequena herança, e mudou-se com sua nova “mulher escarlate”, Leah Hirsig
(a quem ele nomeou Símio de Toth), e uma amante rival, Ninette Shumway.
Ninette, sua antiga governanta, trouxe seu filhinho como companhia para os
filhos pequenos de Crowley e Leah, duas crianças pequenas, mas a “Abadia de
Thelema”, como ele rebatizou a casa, não era lugar para crianças. Crowley
decorou as paredes de seu estúdio – a câmara dos pesadelos – com suas pinturas
de demônios, e o quarto de dormir com casais copulando. As duas mulheres
estavam o tempo todo brigando e gritarias de ataques de bebedeira eram comuns.
Crowley logo se cansou delas. Ele usou sua influência e reputação para atrair
mulheres casadas e entediadas para sua casa, todas sedentas de aventuras
adúlteras longe de casa. Seus diários mágicos registraram seus sucessos com uma
alegria muito pouco reprimida. “M. M. mulher casada respeitável... a garota é
muito fraca, feminina, facilmente excitável e muito arguta, sendo esta a
primeira vez que ela comete adultério. Operação altamente orgástica e elixir
(isto é, esperma) de primeira linha.” Visitantes masculinos também eram
sujeitos aos poderes hipnóticos de seu anfitrião. Eles competiam com ciúmes por
seus favores como os membros sujeitos à lavagem cerebral dos cultos modernos e
de boa vontade compartilhavam suas esposas com o mestre. Sem dúvida, seu
julgamento fora comprometido pelas quantidades copiosas de cocaína e heroína
presentes, que o anfitrião compartilhava à larga. Como muitos homens de
personalidade e vontade forte, Crowley acreditava que podia abandonar-se à sua
ânsia por drogas sem se tornar um viciado. Para poucos de seus convidados, os
ensinamentos de Crowley foram uma revelação e libertação vitalícia da repressão
social e sexual, mas sem autodisciplina a doutrina do “Faze como quiseres” era
uma fórmula para a autodestruição. A magia é uma busca solitária que requer autodisciplina
rigorosa, o que Crowley sem dúvida não tinha. Ele precisava de uma audiência,
mesmo que fosse composta de desocupados da alta sociedade, que estivessem a
três graus abaixo de seu nível intelectual e fossem instáveis psicologicamente.
Infelizmente, alguns de seus visitantes estavam ansiosos demais, para agradar a
seu guru das trevas. Durante uma cerimônia de magia, o discípulo Raoul Loveday
bebeu o sangue de um gato que fora sacrificado. Ele morreu em seguida. Para um
homem que se declarava um adepto, Crowley estava claramente descontrolado e era
incapaz de proteger seus devotos. Talvez ele fosse apenas um ímã para
indivíduos autodestrutivos e fadados ao infortúnio. Ou o destino estava manipulando
tudo a partir das sombras? A esposa de Loveday, que o acompanhara à ilha,
recordou-se mais tarde de ter tido uma premonição da morte dele anos antes. Uma
fotografia do casal feliz tirada em Oxford, Inglaterra, tinha sido desgastada
pelo que na época eles acreditaram ser uma falha na revelação. Atrás de seu
marido, existia a leve sombra de uma figura com as mãos juntas acima da cabeça –
a mesma postura em que Raoul morreu. O episódio marcou o fim do retiro boêmio
de Crowley. Mussolini ordenou que ele fosse deportado sem cerimônia, mas o
incidente reuniu uma avalanche de manchetes chocantes. Quando tudo estava
acabado, Crowley descobriu que tinha adquirido o apelido de “o homem mais
perverso do mundo”. Ele viveu com o apelido os últimos 20 anos de sua vida. “Este
homem, Aleister Crowley, é uma das figuras mais sinistras dos tempos modernos.”,
declarou o The Sunday Times, em um artigo publicado em 1922. “Ele é um viciado
em drogas, autor de livros vis, disseminador de práticas obscenas.” Desencorajado
a voltar para a Grã-Bretanha, Crowley embarcou para Túnis com Leah e seu filho
de 5 anos, Dionysus, que havia adquirido o hábito da nicotina com seu pai e se
gabava de fumar vários maços de Woodbines por dia. Crowley não fez nada para
desencorajá-lo. Ele era tão incapaz de afeição e irresponsável como sempre.
Quando Ninette deu à luz à sua segunda filha, Anne Leah, o pai relutante fez
seu mapa astrológico e concluiu: “Parece que ela vai se tornar uma ‘putazinha’
bem comum”. Em semanas, ele abandonou tanto sua família quanto seus discípulos,
incluindo o garoto negro que ele havia iniciado em seu culto de magia sexual, e
fugiu sozinho para a França. Lá ele viveu explorando amigos, até eles terem sua
paciência exaurida e os bolsos vazios, enquanto sua família passava fome em
Túnis esperando em vão que Mussolini mostrasse piedade e permitisse que eles
permanecessem na Itália. Foi quando estava em Paris que, segundo dizem, ele
tentou o ritual que provocou sua queda – uma invocação a Pã. Um discípulo
colocara à disposição de Crowley seu pequeno hotel privado na margem sul do
Sena em Paris, junto com a permissão para ele fazer tudo o que desejasse. Nessa
época, Crowley havia atraído um pequeno círculo se seguidores, então aproveitou
a oportunidade para executar um rito que ele planejava há meses, um rito que
seria o auge de sua carreira como mago. Ele desocupou um quarto no ponto mais
alto da casa e executou um ritual de banimento, para limpar a atmosfera de toda
energia residual e qualquer impressão dos que haviam usado o quarto
anteriormente. Depois, recolheu-se a portas fechadas com seu acólito principal,
que havia tomado o nome de MacAleister (filho de Aleister). Os dois homens deram
instruções estritas para não serem perturbados em nenhuma circunstância. Era o
fim da tarde e esperava-se que a cerimônia duraria até o amanhecer. Os outros
se distraíam no restaurante e esperavam a volta de seu líder, mas no decorrer
da noite o ambiente esfriou e a conversação foi interrompida repetidas vezes
por batidas e gritos altos. Quando amanheceu, eles subiram para o último andar
e bateram na porta com cautela, mas não obtiveram resposta. Tentaram a maçaneta
da porta, mas estava trancada; então não tiveram escolha a não ser quebra-la. Dentro
eles encontraram MacAleister morto e Crowley nu em um canto. Ele estava
petrificado pelo medo e balbuciava feito um imbecil. Foram necessários quatro
meses de recuperação na tranquilidade de uma instituição mental para os
fantasmas o abandonarem. Porém, embora tenha recobrado sua força física e sua
sanidade, depois de Paris ele nunca mais foi o mesmo. Agora na meia-idade,
quase à penúria e desesperado para financiar o hábito crescente de consumo de
drogas e álcool, Crowley ficou reduzido a vender suas ideias libidinosas a quem
desse o maior lance. No fim de uma temporada em Lisboa, sua amante na época o
abandonou, o que o sacudiu de seu estupor por tempo suficiente para procurá-la
e implorar por uma reconciliação. Mas a garota alemã de 19 anos, que ele
chamava de “O Monstro”, não voltou para ele. Nunca ninguém havia dado as costas
para a Besta antes. Portanto, a rejeição
deixou-o vacilante. Em um gesto melodramático, ele encenou a própria morte,
deixando uma nota sob sua cigarreira com monograma, que ele colocou no topo de
um penhasco na praia apropriadamente denominada Hell´s Mouth (Boca do Inferno).
Mas, como uma criança petulante que tem de ser persuadida a voltar aos
holofotes, reapareceu dias depois, a tempo de abrir uma exposição de suas
pinturas. Pouco depois, ele forjou uma ação judicial contra a autora Nina Hammet,
que o havia descrito como um mago negro em seu livro “The Laughing Torso”. “Eu
fui acusado de ser um mago negro. Nunca foi feita uma declaração mais tola a
meu respeito. Eu desprezo a coisa em tal grau que mal posso acreditar na
existência de pessoas tão degradadas e idiotas a ponto de praticá-la.”
(Aleister Crowley) Todo o caso havia sido tramado por Crowley, que estava
cavando dinheiro. Nina era uma velha amiga que supostamente concordou em pagar
qualquer indenização vinda da ação por difamação, se Crowley tivesse sucesso.
Mas o caso foi rejeitado quando seus amigos se recusaram a testemunhar a favor
dele. Pior ainda, a defesa produziu resmas de sua poesia pornográfica e regalou
o júri atônito com relatos de seus rituais mágicos de masturbação. Ao rejeitar
a ação, o juiz Justice Swift declarou que ele nunca tinha visto “coisa tão
espantosa, horrível e blasfema como a produzida pelo homem que descrevia a si
mesmo como... ‘o maior poeta vivo’.” O caso levou Crowley à falência, mas isso
não teve efeito sobre ele, porque ele já dependia financeiramente de seus
amigos e seguidores há anos. Ele passou os últimos anos de sua vida em uma
pensão barata na cidade de Hastings, no litoral inglês. Uma sombra pálida da
pessoa antes formidável, ele tinha medo do escuro. Morreu em 5 de dezembro de
1947 de dependência a álcool e drogas. Suas palavras finais – “Eu estou
perplexo” – resumem uma vida esbanjada em autoindulgência e uma luta contra a
sociedade que ele considerava responsável por inibir o indivíduo. Crowley
exemplificou o destino do “mago negro” moderno, que é seduzido por sua própria
imagem e corrompido pelo poder que procura exercer tanto sobre seus admiradores
como sobre seus inimigos. Contudo, apesar de todas as suas falhas, Crowley possuía
vontade, intelecto e imaginação formidáveis, que, quando combinados com o
desejo de êxito, inspiraram-no a produzir diversos marcos da literatura oculta,
incluindo o impressionante “Magick In Theory and Practice”. Porém, mesmo essas
obras sérias foram “sabotadas” com informações incorretas e rodeios perigosos
para os incautos e inexperientes. Crowley não pôde resistir a alardear seu
conhecimento e autoridade sobre o tema, mesmo que isso significasse colocar seu
autointeresse antes do bem-estar de seus estudantes. Foi isso que o tornou uma
figura importante na história da magia. Ele apreciava sua reputação de infame,
embora protestasse vigorosamente não ser um mago negro, e de explorar os que os
seguiam como escravos, por quem não sentia nada além de repugnância. “Eu
estremeço”, ele escreveu, “quando contemplo a idiotia desses imbecis.” A fama
de Crowley era tal que diversos personagens de ficção foram baseados nele,
embora ele tivesse especialmente se enraivecido por ser imortalizado no romance
“The Magician”, de Somerset Maugham, e no suspense oculto de Dennis Wheatley, “The
Devil Rides Out”. No primeiro, ele foi o personagem central e, no segundo ele é
reconhecido instantaneamente como o satanista imprevisível Morcata. Mas, alguns
dizem que Crowley não acreditava no demônio, apesar de suas declarações de
devoção ao lado negro, feitas para o benefício dos tabloides. Ele adorava
importunar picaretas de Fleet Street e se deliciava imaginando o verdadeiro
ultraje que se seguiria quando suas histórias fossem devoradas no café da manhã
no dia seguinte. “Eu simplesmente fui para o lado de Satã; e até o momento não
posso dizer por quê. Mas me encontrei apaixonadamente ansioso para servir meu
novo mestre... Eu não estava contente em acreditar em um demônio pessoal e
servi-lo, no sentido comum da palavra. Eu queria agarrá-lo pessoalmente e
tornar-me seu chefe de Estado.” (Aleister Crowley, “The Confessions of Aleister
Crowley”)
Aleister Crowley fez pouco uso de conjurações arcaicas,
preferindo criar as suas. Diz-se que uma das mais eficientes entre elas foi o
Liber Samekh para a convocação de um demônio chamado Choronzon. Crowley usou
esse ritual em 1909, durante uma viagem a Algiers. Ele foi para o deserto
acompanhado do pupilo devotado Victor Neuburg, que o ajudou a desenhar o
círculo mágico na areia, seguido pelo triângulo de Salomão, como prescrito pelo
Lemegeton. Em seguida, eles cortaram as gargantas de três pombos e depositaram
seu sangue na extremidade de cada ponta do triangulo. Neuburg ficou no círculo
enquanto Crowley, vestido em um manto negro com capuz, ajoelhou no triangulo e
convidou o demônio a possui-lo, usando um encantamento do Grimório de Honório.
Em uma mão, ele segurava um topázio e foi dentro da pedra que o demônio
apareceu. Falando com a voz de Crowley, ele vangloriou-se das pragas que
trouxera ao mundo nos tempos antigos. Neuburg permaneceu na proteção do
círculo, mas foi quase tentado a sair, quando percebeu que Crowley tinha sido
substituído por uma mulher linda e sedutora, que agora lhe implorava que se
unisse a ela. Mas Neuburg lembrou-se de que se tratava de uma ilusão, um dos
truques típicos de Choronzon. Naquele momento, o demônio mostrou seu rosto
verdadeiro e soltou uma risada alta e zombeteira. Em seguida, ele tentou outra
artimanha. Ele ofereceu-se para ser assistente de Neuburg se ele simplesmente o
convidasse para entrar no círculo, mas o pupilo aprendera bem a lição de
Crowley e se recusou. Choronzon, em seguida, utilizou o truque mais antigo do
guia do feiticeiro. Ele assumiu a forma do mestre de Neuburg e implorou por
água para aplacar sua sede. Mas, de novo, Neuburg recusou. Ele ameaçou o
demônio com todos os tormentos do Inferno se ele não partisse. Ele não ficou
impressionado. “Tu não pensaste, ó tolo, que não existe nenhuma raiva ou dor
que eu não seja, ou qualquer inferno que não seja meu espírito?”. Choronzon
libertou uma torrente de insultos e depois jogou areia no círculo, quebrando o
contorno. Antes que Neuburg pudesse repará-lo, o demônio estava dentro do
círculo agarrado à sua garganta. Neuburg lutou furiosamente, repetindo os nomes
de poder e apunhalando a aparição com a adaga sagrada. Choronzon interrompeu o
ataque e voltou para o triangulo, onde assumiu a forma de uma mulher sedutora.
Finalmente, a energia vital do sangue dos pombos dissipou-se e ele foi
arrastado de volta para o mundo de onde viera, deixando Crowley desorientado e
exausto.
Uma vez, Crowley confessou que seus rituais de magia
continham “apenas chocolate suficiente para ter o sabor do bolo de chocolate”.
Com isso, ele queria dizer que não estava preparado para distribuir todos os
seus segredos para todo mundo que se ocupava em comprar seus livros em um
balcão. Esse também era um aviso de que ele tinha salpicado as páginas com
rodeios perigosos, para assegurar que apenas os que tivessem se dedicado ao
trabalho árduo e aos estudos necessários para se tornar um adepto teriam
sucesso no uso de seu sistema. A ocultista Dion Fortune considerava essa uma
estratégia mesquinha, desprezível e extremamente perigosa. “A fórmula (...) com
que ele trabalha deveria ser considerada adversa e maligna pelos ocultistas
acostumados com a tradição cabalística(...) não é dada nenhuma pista disso no
texto e ele é uma perigosa armadilha para o estudante incauto. Crowley(...) dá
o Norte como o ponto sagrado para onde o operador se volta para invocar, em vez
do Leste, ‘uma vez que a luz sobe’ como na prática clássica. Agora, o Norte é
chamado ‘o lugar da maior escuridão simbólica’ e é apenas o ponto sagrado de
uma seita, os Yezidees ou adoradores do Demônio(...) uma invocação ao Norte não
irá contatar o que a maioria das pessoas consideraria serem forças desejáveis.
ANTON LA VEY E A IGREJA DE SATÃ
“O Demônio é mais perigoso quando está sendo charmoso”
Professor Kumar (personagem em “Night of the Demon”)
Anton La Vey sentou-se diante do órgão, em sua câmara de
horrores no porão – denominada de forma zombeteira “Toca da Iniquidade” – como Vincent
Price, em “The Abominable Dr. Phibes”. Ele estava cercado por parafernália
satânica e marionetes em tamanho real vestidas com meias arrastão e artigos de
fetiche. Quando o castiçal de velas lançou uma sombra repentina sobre as
paredes vermelho-sangue, ele tocou canções de bandas de baile antigas para os
amigos e frequentadores habituais que haviam se reunido para homenagear o homem
que eles chamavam de “O Papa Negro”. O
ano era 1986 e o fundador da Igreja de Satã era o centro das atenções em uma
ampla casa vitoriana perto do Golden Gate Park em São Francisco, que fazia o
papel de capela para a organização satânica. Ele estava entusiasmado para
provar que o Demônio pode ser um amigo cativante e um maldito de um anfitrião
requintado. Seu porão santuário e clube noturno de prazer exibia uma coleção de
artefatos horrivelmente fascinantes, entre eles uma faca sacrificial asteca
genuína, um gancho de tortura usado pelos inquisidores espanhóis e uma cabeça
encolhida da América do Sul, de doador desconhecido. Todos eram relíquias de
religiões mortas, seu proprietário orgulhoso observou em um sussurro tão seco
quanto um pergaminho. Do lado de fora, o edifício estava pintado de preto
bíblia e a tubulação, de púrpura, de modo que se destacava como um dente
estragado no meio dos prédios em cores claras das casas urbanas que ladeavam a
rua suburbana coberta de folhas. Seu proprietário também tinha uma aparência
igualmente anticonvencional, com sua cabeça raspada, barba de bode e olhar
penetrante, sem mencionar sua habitual vestimenta funérea. Ele era a própria
imagem de um Mefistófeles moderno. Em 1968, sua aparição surpreendente e
sinistra assegurara a ele o papel que havia nascido para encenar, o do Demônio
no filme de terror de Roman Polansky “O bebê de Rosemary”. Mas a Igreja de Satã
foi apenas um show paralelo, uma fraude cínica perpetrada pelo ex-ator de
carnaval, ou seria La Vey um verdadeiro crente? Anton La Vey (1910-1997) –
nascido Howard Stanton Levey – dedicou sua vida a espalhar o evangelho negro da
Igreja de Satã, seu culto pessoal, que em seu auge tinha milhares de membros
por todo o mundo, inclusive, diz-se, celebridades convertidas como Sammy Davis
Jr., Marc Almond e Marilyn Manson. Goste-se ou não dela, agora é uma religião
oficialmente reconhecida na América, com status caritativo. Até os capelães do
exército americano são versados em seus princípios, para que possam pregar para
seus membros quando eles estiverem sob duras provas. Seu fundador admitiu ter
concebido o movimento como uma paródia da religião ortodoxa, mas quanto mais
ele refletia sobre a necessidade de uma alternativa afirmativa da vida para o
credo cristão pacifista, mais rapidamente seu cinismo natural desmoronou até
ele se tornar um convertido.
Em 30 de abril de 1966, Noite de Valburga, La Vey raspou a
cabeça para ficar parecido com os executores medievais e declarou a abertura da
Igreja de Satã, ou “o templo da indulgência gloriosa”. Ele exibia um pendor
para a autopromoção que daria orgulho a P.T Barnun. Nos anos que se seguiram, o
Demônio recompensou-o bem. Ele adquiriu várias propriedades luxuosas, uma frota
de carros clássicos e até um iate, para que pudesse fugir mais rápido que Noé,
caso um Jeová raivoso se ofendesse com sua filosofia “blasfema” e atormentasse
o mundo com outro dilúvio ou, no caso de São Francisco, com um terremoto.
Mas cortejar o Demônio também trouxe atenção indesejada, na
forma da morte trágica de Jayne Mansfield. Em 29 de julho de 1967, a estrela de
Hollywood viajava em um carro dirigido por seu amante e advogado Sam Brody,
quando um caminhão em alta velocidade os atingiu. Mansfield sofreu ferimentos
fatais na cabeça e Brody também morreu. O único sobrevivente foi a filha mais
nova de Mansfield, Mariska Hargitay (hoje a estrela da série de crimes na TV “Law
and Order”). Jayne Mansfield tornara-se um membro ativo da Igreja de Satã,
contra a vontade de Brody, o que provocou Brody a ameaçar expor La Vey como
charlatão na imprensa nacional. La Vey respondeu amaldiçoando o advogado
publicamente e declarando que ele estaria morto em um ano. Ele advertira
Mansfield a não viajar com Brody, mas ela não levou a ameaça a sério. Não é
surpresa que a publicidade subsequente tenha atraído o tipo “errado” de pessoas
para o culto. La Vey tinha plena consciência de que sua ideologia imortal
atrairia “os malucos”, como ele os chamava. Isto é, neonazistas, discípulos
rejeitados por Charles Manson e os inúmeros excêntricos que viam conspiração em
cada esquina ou ouviam vozes que os impeliam a matar em nome do Demônio. Porém,
ele afirmava que a maioria dos convertidos era atraída pelo Satanismo porque
precisavam pertencer a algo que desse sentido às suas vidas. Eles eram os
produtos psicologicamente danificados de lares desfeitos, viciados em drogas
arrastando-se dos destroços do beco sem saída de suas vidas, ou os filhos
desorientados de pais carolas, que, ao se tornar adultos, voltaram-se para La Vey,
seu guru das trevas, para exorcizar seus supostos pecados. Na Casa Negra, ele
compartilhava o desdém de seus discípulos pelas pessoas que viviam vidas
monótonas e rotineiras – o rebanho, como ele os chamava -, mas também
desprezava os indivíduos que matavam em nome de Satã para adquirir notoriedade.
“Essas pessoas não são satanistas”, ele disse a um repórter uma vez. “São
dementes. Mas, independentemente de quanto mais fizerem, elas nunca alcançarão
os cristãos. Nós temos séculos de assassinatos em nome de Deus.” Quando chegou
ao circuito de programas de entrevistas, ele aceitou as zombarias contra seu “estilo
de vida” bizarro. Satisfeito por ser comparado à Família Adams, ele decorou sua
sala de estar com teias de aranha artificiais, caveiras de lojas de truques e
um leão de estimação. Fazia meses que o leão não comia nenhum convidado, ele
garantia a seus visitantes. Mas apesar de todo o seu lado espetaculoso, La Vey
era extremamente sincero a respeito de suas crenças, mesmo elas sendo
mercadorias de segunda mão que ele adquirira de mentes mais argutas que a dele –
intelectos como o da romancista russo-americana Ayn Rand, que formulou a
filosofia do egoísmo ético e objetivismo; de H. L. Mencken, o crítico
norte-americano áspero que se punha ao Cristianismo fundamentalista; do poeta e
visionário William Blake; e, é claro, de Friedrich Nietzsche, que originou o
conceito frequentemente mal compreendido do Homem Superior. Aleister Crowley,
entretanto, não estava na lista de leituras de La Vey. Ele acusava “a Besta” de
ter “se vendido” ao negar ser um satanista e criticava-o por escrever de forma
prolixa e interminável sobre magia ritual. La Vey declarava que ele poderia ter
condensado tudo aquilo em um volume fino. A pretensão era um dos pecados
imperdoáveis da Bíblia Satânica escrita por La Vey, um sucesso de vendas perene
que foi publicado em 1969. Os outros eram a abstinência, fantasias espirituais,
autoengano, amor incondicional por aqueles que não o merecem, pacifismo, recusa
em aceitar as responsabilidades pelas próprias ações, a presunção de o homem
ser mais que um animal e superior a todas as criaturas e a observância
religiosa cega.
Ao escrever seu panfleto impresso privado “The Cloven Hoof”,
La Vey atacava as pessoas de sua categoria que depositavam a fé nos “grandes
ensinamentos” de Aleister Crowley e nos antigos grandes mestres da Golden Dawn.
O confronto entre os dois velhos demônios era claro, e La Vey fazia exceção
apenas à adoção do número da besta – 666 – que, ele lembrava a seus discípulos,
era de origem Cristã. Tanto a Igreja como Crowley haviam dado um nome ruim para
o Demônio, e ele restauraria a reputação do velho cão. Em “A Bíblia Satânica” e
seus companheiros, “The Satânic Witch” (1971) e “The Satanic Rituals” (1972),
La Vey arrolou os princípios em que sua fé materialista estava embasada.
“Parece que a teoria é esta: enquanto o homem fracassa, ele
é um dos filhos de Deus, mas, logo que obtém sucesso, ele é tomado pelo Demônio.”
(Henry Louis Mencken)
De acordo com La Vey, Satã não é uma entidade malévola, mas
uma “projeção externa do mais alto potencial de cada indivíduo”. Ele é a
personificação de nossa natureza carnal, o arquétipo de um aspecto primitivo em
nós que não deve ser suprimido ou negado. Os verdadeiros satanistas não são,
portanto, demoníacos, mas indivíduos que se dedicam à busca dos prazeres e uma
vida livre de restrições ou limitações impostas a eles pela sociedade
civilizada e sua cúmplice, a religião ortodoxa. Dessa forma, todos os
satanistas são responsáveis por suas próprias ações e não podem contar com um
salvador sobrenatural para redimi-los se forem desleais consigo mesmos e com o
código pelo qual vivem. La Vey afirmava que a religião ortodoxa fora criada
pelo homem, não por Deus; então, ninguém é obrigado a viver seguindo suas
regras, principalmente depois que as leis e os costumes de seus fundadores
perderam relevância no mundo moderno. Os profetas e sacerdotes criaram um Deus
à sua própria imagem falha, concebendo-o como um patriarca cruel e caprichoso
que nunca pode ser aplacado, porque nenhum de seus filhos pode viver de acordo
com os padrões de perfeição que a Igreja impõe a eles. Contudo, como La Vey
ressaltou, ninguém deu autoridade à Igreja para que se tornasse mediadora entre
o homem e Deus ou para impor seus dogmas à sociedade. Portanto, é direito de
todos questionar essa instituição autoeleita. A obediência sem questionamento e
a fé cega são contrárias aos princípios do Satanismo, que exige que o indivíduo
pense por si mesmo e aja de acordo com sua consciência. La Vey sustenta que a
religião ortodoxa não tem o monopólio da verdade e sugere que seus pastores são
tão capazes de agir com crueldade, em causa própria e corruptamente, quanto os
demônios com quem eles afirmam estar em guerra. Por fim, ele argumenta que é
irrealista e antinatural viver no mundo material e resistir aos prazeres que
ele tem a oferecer, recebendo em troca apenas a promessa de um paraíso.
“O Satanismo é a única religião conhecida pelo homem a
aceitar o homem como ele é.” (A Bíblia Satânica)
Em seu prefácio para a obra “A Bíblia Satânica”, La Vey
rejeita toda a literatura oculta como “bobeira esotérica” e “relíquias quebradiças
de mentes amedrontadas”. Seu credo, ele afirma, não tem por objetivo ofender,
mas é uma forma tardia de “indignação diabólica” diante da hipocrisia da
religião organizada. Em contraste, o Satanismo encoraja a gratificação dos
sentidos no lugar da culpa, pois a negação dos prazeres está na raiz de todos
os nossos sofrimentos e frustrações. La Vey não declarou ter canalizado esses
mandamentos de alguma fonte sobrenatural. Pelo contrário, ele afirmava que
formulara sua filosofia com base no individualismo assertivo, a partir de
escritos da moderna elite de intelectuais com quem ele desejava se identificar.
Embora ele não negasse que a maior parte dos textos de seu livro fosse a
síntese das ideias de outros escritores, e não menos válida por ser assim, ele
começa a parecer tão escorregadio quanto um vendedor de óleo de serpente quando
alguém olha com mais atenção para a parte que ele denomina “O Livro de Satã”. A
similaridade gritante entre a polêmica da pseudiobíblia de La Vey e o notório
tratado de darwinismo social do século XIX, “Might is Right” – publicado pelo
pseudônimo Ragnar Redbeard -, justifica claramente a acusação contra La Vey por
plágio e cinismo. Se ele foi preguiçoso até para criar paráfrases com os dogmas
principais de “Might is Right” quando os inclui em sua própria “bíblia negra”,
é de se perguntar do que mais ele se apropriou de outros trabalhos sem
reconhecimento. Para os que possam ser intimidados pelas ideias abstratas da “A
Bíblia Satânica”, La Vey acrescentou alguma sabedoria simples de seus dias de
espetáculos de carnaval, e também sua própria observação da natureza humana
extraída da experiência pessoal. Como um organista de 16 anos contratado para
tocar nos encontros evangelistas das manhãs de domingo, La Vey havia
testemunhado a hipocrisia em primeira mão. Os homens que agora se sentavam
respeitosamente com suas famílias, rezando e cantando hinos, tinham cometido a
luxúria, atrás de garotas seminuas na noite anterior. Ele sintetizou seu
cinismo quando trabalhou para o departamento de polícia de São Francisco como
fotógrafo de cenas de crime, durante os anos de 1950. Depois de testemunhar a
brutalidade de que o ser humano era capaz e ouvir as mentiras que eles contavam
para salvar suas peles, ele não pôde negar a existência do demônio interno. Se
Anton La Vey tivesse sido louco o suficiente para imaginar que tinha a proteção
do próprio Satã, com certeza teria tentado oferecer o sacrifício definitivo,
como Charles Manson e seus seguidores ofereceram. Mas ele era um egoísta
calculista e criterioso, que não infrigiria a lei, arriscando tudo o que havia
conquistado, mesmo para agradar a seu mestre infernal. Na verdade, ele explorou
a lei para garantir que sua “igreja” se qualificasse para uma classificação de
caridade. Isso fez dele um verdadeiro satanista aos olhos de seus críticos,
pela definição de satanista como um maquinador desavergonhado em causa própria.
La Vey realizava Missas Negras em seu apartamento pintado de
vermelho e preto para o entretenimento da mídia, mas nenhum sangue humano foi
espargido em nome do Demônio. Era puro teatro para os curiosos, que eram
agraciados com a visão de uma garota nua amarrada em um altar, enquanto a
congregação entoava seu mantra “In nomine dei Satanas. Lucifer excelsi...”.
Depois, um alto sacerdote encapuzado aspergia uma mistura de urina e sêmen de
um incensário com o formato de falo. Mais invocações eram acompanhadas por
pedidos individuais de qualquer coisa que os membros desejassem – um trabalho
mais bem pago, as atenções de uma garota bonita ou até a morte de um inimigo.
La Vey confessou a jornalistas que seus próprios rituais de magia negra
limitavam-se a pedir por lugares para estacionar e sucesso nos negócios, com
toda a fanfarronice de lado. Os cristãos e moralistas ficaram indignados com a
autopromoção desavergonhada de La Vey e a natureza provocante de suas crenças,
mas a verdade da questão é que eles precisavam de um demônio para condenar. Eles
precisavam acreditar que La Vey era o próprio Demo, senão sua própria
existência perderia o sentido. La Vey deve ter sido o melhor vendedor de Satã,
mas ele acertou na mosca quando escreveu: “Satã tem sido o melhor amigo que a
Igreja já teve, uma vez que a manteve no negócio por todos estes anos.”
A Golden
Dawn:
A Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn) não foi
uma sociedade secreta vitoriana sinistra dedicada à prática de ritos arcanos
proibidos, como muitas autoridades do oculto já sugeriram. Em vez disso, ela
era uma irmandade de ex-maçons e intelectuais eminentes, que procuravam contato
com entidades poderosas invisíveis, as quais eles acreditavam supervisionar a
evolução da humanidade. Entretanto, a ordem não estava totalmente livre de personagens
excêntricos e incomuns, que são atraídos naturalmente para os círculos
esotéricos. De fato, o próprio fundador era um megalomaníaco excêntrico de nome
Samurel Lidell Mathers, o filho de um clérigo de Londres, que se vestia com
kilt e insistia em ser chamado de Macgregor Mathers, conde de Glenstrae.
Mathers decorou sua casa em Paris para parecer um templo egípcio, onde ele
celebrava uma forma de missa em honra à deusa Ísis. Nessas ocasiões, vestia-se
com um manto branco esvoaçante, com uma pele de leopardo caindo de seus ombros.
Quando não estava participando de cerimônias de magia, ele gostava de relaxar
com uma variação incomum do jogo de xadrez para quatro jogadores, em que seus
oponentes eram sua esposa e seu convidado da noite. O parceiro de Matheus era
um espírito desencarnado, com quem ele entrava em comunicação telepática.
Mathers era maçom e um erudito com alguma reputação. Foi por seus conhecimentos
em línguas arcaicas e magia prática que ele foi abordado por um amigo maçom,
dr. William Wynn Westcott, em março de 1888, e convidado a formar uma ordem
moderna de magia, uma que se distanciasse bastante das que ainda se apoiavam
nos grimórios medievais. O dr. Westcott persuadiu Mathers de que sua organização
seria como nenhuma outra antes dela, porque o destino tinha colocado as bases
de um sistema de magia inteiramente novo em suas mãos. Westco6tt tinha adquirido
diversos manuscritos contendo símbolos ocultos e instruções para ritos,
escritos em uma cifra que ele nunca tinha visto. Tudo o que eles precisavam
fazer era decodifica-los. A fonte dos manuscritos é incerta. Uma versão da
história mostra o dr. Westcott encontrando-os por acaso em uma livraria de
livros usados no mercado de Farrindon Street. Outros relatos sugerem que ele os
descobriu na biblioteca da Sociedade Rosacruziana, ou que eles vieram de uma
coleção privada pertencente ao clarividente Frederick Hockley. Diz-se que a
única pista para sua verdadeira origem é uma referência a uma adepta alemã,
Anna Sprengler de Nuremberg, que rabiscou em uma margem. Diz-se que Westcott se
correspondeu com ela, com a esperança de criarem juntos o sistema e extraírem
mais segredos. Existem dúvidas, entretanto, de que Frau Spengler tenha
existido. Alguns insinuaram que toda a história foi tramada por Westcott e
Mathers, que pretendiam atrair membros de alto calibre, pessoas que garantiriam
que a organização fosse proeminente e bem fundada. Se esse foi o caso, eles
tiveram sucesso. Personalidades conhecidas como Bram Stoker, W. B. Yeats,
William Peck, o astrônomo real da Escócia, Arthur Machen, Sax Rohmer e Algernon
Blackwood arrebanharam-se para unir ao grupo.
Os exercícios práticos baseavam-se em uma mistura de yoga
oriental, misticismo cristão rosa-cruz, magia cerimonial egípcia e Cabala
Judaica – todos destinados a se obter uma expansão da consciência e aumentar a
percepção de uma realidade maior. Na prática, isso significava executar
exercícios de visualizações poderosos, tais como o Pilar do Meio, em que os
iniciados estimulavam os centros sagrados de energia do corpo etéreo (o duplo
espírito ou alma dentro de cada ser humano) para energizar, curar e equilibrar
a mente, o corpo e o espírito. Rituais rosacruzianos ofereciam os meios para
despertar o Cristo interior, o Professor Interior, ao reencenarem a
crucificação e ressurreição de Jesus, e explorações guiadas aos mundos
interiores simbólicos da psique poderiam ser feitas pela visualização de si
mesmo viajando pelos caminhos e esferas da Árvore da Vida cabalística. Outras
técnicas incluíam a projeção astral e experimentos com símbolos Tattwa – formas
coloridas simples, em cartões negros, que diziam precipitar o acesso a outras
dimensões quando segurados contra a testa. Os cinco símbolos mais importantes –
um triângulo vermelho, um quadrado amarelo, uma lua com um chifre prateado, um
círculo azul e uma elipse índigo – representavam os quatro elementos do ar,
terra, fogo e água, e o reino do espírito. O poeta W. B. Yeats, no início, tinha dúvidas
de que tais técnicas simples pudessem produzir qualquer efeito, mas ficou
convencido quando Mathers o persuadiu a segurar um dos símbolos em sua testa e
depois fechar os olhos e descrever o que tinha visto. Depois de concordar com
relutância, Yeats assustou-se com uma imagem que irrompeu de seu subconsciente,
sobre o qual ele não teve nenhum controle. Era a de um titã negro, emergindo de
uma paisagem estéril e desértica, que, de acordo com Mathers, era um espírito
elemental do fogo. Mesmo depois dessa experiência surpreendente, Yeats não se
convenceu. Ele testou as cartas de novo, em particular, apenas com seus
voluntários presentes, para que não fosse influenciado por ninguém mais, e
deliberadamente deu a eles a carta “errada” enquanto descrevia outra diferente.
Yeats queria ver se sua cobaia “veria” a imagem relacionada com a carta que ele
havia descrito ou com a carta que haviam de fato recebido. Para sua surpresa,
eles viram a imagem apropriada à carta que seguravam, o que sugere que os símbolos
tinham ligação com arquétipos universais. Yeats possuía uma imaginação muito
desenvolvida e, mesmo assim, seu intelecto não conseguia compreender como
imagens tão fortes poderiam ser desencadeadas pela meditação com formas simples
coloridas. Mas ele teve de reconhecer que essa forma de magia funcionava. As
imagens, ele concluiu: “(...) inspiravam associações que estão além do alcance
do subconsciente individual (...) que as margens de nossa memória estão
(sempre) mudando e nossas memorias são parte de uma grande memória, a memória
da própria Natureza(...) e que esta(...) grande memória pode ser evocada por
símbolos.”
Os membros da Golden Dawn consideravam-se os guardiões de
uma sabedoria eterna, que guardavam com a mesma desconfiança com que concediam
seus títulos e graus dentro da Loja. Mas foi o orgulho de seu líder que
provocaria sua queda. Depois de passar por vários ritos de iniciações com uma
rapidez incrível, Crowley exigiu o reconhecimento formal de seus avanços, com o
grau correspondente, mas seu pedido foi recusado por Yeats, que tinha grande
aversão a ele. Crowley apelou a Mathers, que consentiu, mas yeats não seria
intimidado. A disputa foi levantada em tribunal aberto, o que assinalou o início
do fim da ordem original. Em seu auge, a Golden Dawn podia afirmar possuir mais
de 300 membros, um terço dos quais eram mulheres, e a criação de Lojas em
Edimburgo, Paris e Chicago. Hoje, várias organizações afirmam descender diretamente
da Golden Dawn original, mas estão baseadas nos Estados Unidos e na Nova
Zelândia.
Nazistas e o Oculto:
Em maio de 1945, os aliados vitoriosos viram a rendição da
Alemanha nazista como o clímax de uma batalha apocalíptica entre as forças do
bem e do mal, o ato de destruição visualizado por Richard Wagner na ópera épica
Götterdämmerung. A diferença foi que a Segunda Guerra Mundial aconteceu no
palco do mundo e suas consequências foram tragicamente reais. No fim das
hostilidades, todos concordavam que a vitória dos Aliados significou mais que a
derrota militar de uma ditadura cruel que havia ameaçado arrastar o mundo para
uma nova Era das Trevas. Líderes religiosos, políticos e até alguns personagens
militares falaram da vitória sobre o Demônio e do próprio Demônio sendo
consumido pelas forças diabólicas que ele havia liberado inadvertidamente.
Porém, ninguém na época pensou que tais declarações fossem mais que retóricas.
Entretanto, muitos anos mais tarde, começaram a afirmar por meio de diversas “histórias
alternativas” sensacionalistas que deve ter havido algo de realmente diabólico
no coração sombrio do estado nazista. Em 1973, o controverso historiador Trevor
Ravenscroft causou agitação com “The Spear of Destiny”, um relato bastante
imaginativo da alegada obsessão de Hitler por um artefato oculto de grande
poder – a lança que atingiu o lado esquerdo de Jesus no local de sua
crucificação. Diz a lenda que um exército que marchasse atrás dela seria
invencível (para um relato completo leia “Nazis and the Occult, Arcturus, 2008
do mesmo autor). Por volta da mesma época, o autor Gerald Suster publicou “Hitler
– Black Magician” (mais tarde republicado como “Hitler and the Age of Horus”),
uma exposição de pseudociências nazistas excêntricas, como as teorias da Terra
oca e o mundo de gelo, que influenciaram a estratégia militar desastrosa de
Hitler na Rússia, bem como um número de experimentos bizarros com armas
secretas impraticáveis que desviaram recursos em um ponto crucial da guerra.
Outra famosa autoridade no oculto, Francis X. King, acrescentou suas revelações
em “Satan and the Swastika”, em que detalhou as atividades do “escritório
oculto” do nazismo. Entre outras coisas, seus operativos eram submetidos a
testes de eficácia dos médiuns que declaravam ser capazes de localizar os
navios inimigos, usando pêndulos suspensos sobre um mapa do Atlântico. Esse
ramo da abwehr (departamento de Defesa) também tinha a fama de ter sido usado
para localizar o ditador italiano deposto Benito Mussolini, para que ele
pudesse ser resgatado pelas forças especiais alemãs. King também revelou
detalhes dos planos do Reichsführer Heinrich Himler de gastar vários milhões de
marcos para construir uma “Camelot” nazista em Schloss Wewelsburg, na
Westphalia, para os “Cavaleiros Teutônicos” da SS. Esses três títulos
instigaram todo um subgênero de “histórias” altamente especulativas, centradas
no pressuposto de que membros da elite nazista estavam em conluio com o Demônio
ou, pelo menos, com seus acólitos. Essa ideia fascinante, embora absurda, foi
sugerida pela primeira vez nos anos de 1930 pelo romancista e ex-militar da
inteligência britânica Dennis Weathley; mas, na época, os suspenses de magia
negra eram vistos como romances sensacionalistas, tal qual os filmes universalmente
populares de Indiana Jones, que surgiram meio século depois. Enquanto os livros
de Weatley e os filmes de Spielberg são pura fantasia, é fato registrado que
certos membros da elite nazista tinham uma obsessão doentia pelos aspectos
sombrios do oculto.
Heinrich Himmler foi um homem ordinário em vários sentidos,
um burocrata insignificante com um físico mirrado, sem personalidade marcante,
e ainda sofria das vistas e de hipocondria crônica. Ele teria sido excluído da
SS se Hitler não o tivesse apontado como cabeça da organização, como uma
recompensa por sua lealdade inabalável. Um ex-chacareiro de criação de galinhas
e chofer, Himmler tornou-se o oficial mais temido no regime nazista, com poder
absoluto sobre a vida e a morte. Embora não tivesse nenhuma das qualidades que
o tornassem um grande líder, ele imaginava-se presidindo uma ordem secreta de
cavaleiros teutônicos, em um esplendor copiado de uma Camelot germânica. Quando
ele viu as ruínas de Schloss Wewelsburg em Westphalia, soube que havia
encontrado o “lar espiritual” de seus cavaleiros negros. Diz a lenda que o
local testemunharia a última batalha entre o povo ariano e seus inimigos do
leste, uma batalha que Himmler pretendia ganhar a qualquer custo. A
significância da localização foi confirmada por especialistas no Ahnenerbe, o
Escritório Oculto nazista, que informou ao Reichsfüher que o castelo fora
construído na interseção de várias linhas de poder. Isso significava que as
energias da terra convergiam para suas fundações em forma de triângulo e
poderiam ser utilizadas em rituais de magia. Com o destino da Alemanha em jogo,
o dinheiro não era impedimento. A indulgência de Hitler garantiu que nenhuma
despesa fosse poupada para o restauro do castelo à sua glória anterior. Suas
galerias amplas e aposentos abobadados foram guarnecidos com as tapeçarias e
antiguidades mais requintadas. Em um ano, gastaram-se vários milhões de marcos
na reconstrução do edifício e decoração de cada suíte em um estilo condizente
ao de um herói alemão. A peça central desse palácio extravagante era o
magnífico salão de banquetes, com sua távola redonda arturiana majestosa, em
torno da qual foram dispostas 12 cadeiras entalhadas em madeira em que sentavam
os “12 cavaleiros” de Himmler. As 12 cadeiras também representavam os signos do
zodíaco. Outra cadeira, à cabeça da mesa, seria usada pelo próprio Reischfüher.
Abaixo do Grande Salão estava a catacumba circular de pedra, que eles chamavam
de “reino dos mortos”, onde 12 pedestais negros circundavam um poço profundo.
Essa era a cripta em que os ossos dos “cavaleiros” caídos seriam venerados
pelas gerações futuras. Mas Wewelsburg era mais que um santuário. De acordo com
vários oficiais de alta patente da SS que visitaram o castelo a convite de
Himmler, ele também servia como um santuário privado para o Reichsfüher. Walter
Schellenberg testemunhou um círculo psíquico em curso, cujos membros tentavam
projetar suas mentes até um quarto adjacente onde um prisioneiro estava sendo
interrogado. O objetivo do exercício era focar suas vontades combinadas para
que o suspeito relutante fosse forçado a dizer a verdade. Não está registrado
se eles tiveram ou não sucesso.
Originalmente, os SS foram criados para servir como guarda
pessoal de Hitler, mas se tornaram a mão direita brutal do regime e uma força
que respondia apenas a si mesma. Ao criar os rituais distintivos, juramentos e
insígnia, Himmler foi capaz de instilar em cada membro a crença de que eles
eram mais que uma entidade de combate de elite. Cada homem deveria
considerar-se um iniciado em uma ordem religiosa secreta, cuja responsabilidade
sagrada era subjugar as “raças inferiores” por qualquer meio que fosse
necessário. Uma nova ordem seria estabelecida então, em que a Raça Ariana
Superior reinaria como os faraós da Antiguidade. Os membros da SS eram
doutrinados com a ideia de que eram seres superiores em um Universo amoral, e
assim operavam além dos conceitos humanos de bem e mal. É duvidoso se todos os
oficiais da SS compartilhavam a visão romântica perversa de Himmler, ou
encaravam as runas que decoravam as bandeiras e capacetes, uniformes e veículos
armados da SS como nada mais que acessórios distintivos de sua irmandade
sombria. Mas, para Himmler, as runas tinham um significado sobrenatural. Ele
emprestou a ideia dos ocultistas Völkisch, que acreditavam que as runas eram
uma verdadeira expressão da cultura ariana antiga. De acordo com a lenda
norueguesa, o “alfabeto” rúnico precedeu a palavra escrita e, portanto, cada
símbolo incorporava forças naturais de magia. Uma runa em particular tinha um
significado especial para a SS, por sua ligação com a “Volsunga Saga” do século
XIII, a mais importante das sagas islandesas, que formou a base do círculo do “anel”
de Wagner. Tanto na saga como no círculo do anel, Brynhyld (Brunilda) persuadiu
Sygur (Sigefredo) a esculpir a runa Tyr no cabo de sua espada para assegurar a
vitória na batalha. Seis séculos depois, a SS adotou tal prática. Algumas das
outras runas usadas pela SS foram:
Hakenbreuz (Cruz Curvada), que foi um símbolo pagão de Thor,
o Deus do Trovão.
Sonnenrad (Suástica da Roda do Sol). Adotada pela 5 Divisão
de Tanques da SS, era o antigo símbolo escandinavo do Sol.
“Feixe de Luz”, uma dupla SiegRune, que representava
coragem, vitória, dever e força física. Ela foi uma invenção moderna e não teve
origem no paganismo.
Wolfsangel (Garra do Lobo), que foi adotada pela 2 Divisão
de Tanques, conhecia como Das Reich, e acreditava-se afastar o perigo.
Eif Rune, que foi incorporada aos uniformes dos assistentes
pessoais de Hitler como um símbolo de devoção e lealdade.
O SS Reichfüher Heinrich Himmler contratou várias expedições
ao Tibete e outras regiões remotas do mundo em busca de artefatos ocultos, e
também acreditava muito em astrologia. De fato, ele recusava-se a tomar
qualquer decisão importante antes de consultar seu astrólogo pessoal, Wilhelm
Wulff, que tinha a reputação de fazer previsões com precisão misteriosa. Wulff
observou que Himmler tinha um conhecimento prático de astrologia, mas ele “fazia
as perguntas mais estranhas e infantis em sua busca por clareza astrológica em
questões sobre a política e militar”, o que levou Wulff a concluir que um dos
homens mais temidos do regime não era um adepto, mas “uma mediocridade(...) um
burocrata trivial com crises de consciência”. No verão de 1923, Wulff calculou
os mapas de Hitler, Göring e Ernest Röhm, o líder AS. Ele previu um destino
terrível para o futuro Füher e seus seguidores. Hitler, disse Wulff, estava
fadado a ser temido e “lançar ordens cruéis e sem sentido”, que levariam à sua
morte na primavera de 1945. Ele morreria nas mãos de um assassino e uma mulher
teria um papel importante em sua morte. As previsões de Wulff mostraram-se
corretas. Em abril de 1945, Hitler cometeu suicídio em seu bunker em Berlim,
com sua amante Eva Braun ao seu lado.
Trevor Ravenscroft afirmou que Hitler fora iniciado em uma
irmandade oculta pelo professor Karl Haushofer, que “despertou Hitler para os
reais motivos do Principado de Lúcifer que o possuíam para que ele pudesse se
tornar um veículo consciente de suas intenções malignas no século XX”. Porém, a
contribuição do professor para a ascensão de Hitler ao poder foi puramente
política. Ele introduziu as teorias geopolíticas ao ditador e em especial ao
conceito de lebensraum (espaço vital) com que Hitler justificou as invasões dos
Estados vizinhos. O professor Hausfer também persuadiu seu protegido a
abandonar o chicote de madeira como seu símbolo e moderar sua montaria como seu
símbolo e moderar sua imagem de agitador de massas em favor de uma aparência
mais de homem de Estado. Essa estratégia possibilitou a Hitler cortejar uma
parcela maior do eleitorado, que viu o apoio ao partido nazista ampliar
significativamente, até Hitler perder a paciência com o sistema eleitoral em 1933
e tomar o poder pela força.
Embora não haja nenhuma evidência de que Hitler e seu
círculo íntimo praticassem magia ritual, existe evidencia considerável de que
eles foram influenciados pelos gurus das trevas do neopaganismo, tais como
Guido von List (1848-1919), fundador do Armanismo; Lantz von Liebenfels
(1874-1954), líder da Nova Ordem dos Templários; e Houstton Stewart Chamberlain
(1855-1927), autor de tratados racistas violentos que Hitler leu com voracidade
nos anos anteriores à Grande Guerra. Esses “filósofos” protonazistas promoveram
o mito de que o povo alemão era descendente de uma raça ariana superior, que
sobrevivera à destruição da lendária ilha da Atlântida. Eles também declaravam
que era o destino da Alemanha reivindicar seu papel como a Raça Superior e
arruinar os povos “inferiores”, em especial os negros, os ciganos, os eslavos e
os judeus, que eram os “Untermenschen” ou sub-humanos nesse mito wagneriano. Os
nazistas colocaram muita fé em artefatos ocultos, tais como a Lança e o Santo
Graal e também em locais sagrados de onde as energias magnéticas da terra
poderiam ser canalizadas para objetivos de magia. Tais conceitos deviam ser
familiares a Hitler, que lera a revista Ostara de Liebenfels e outras publicações
ocultas em sua juventude, mas foi o componente de mitologia ariana que atraiu
sua visão de mundo extremamente nacionalista, não as fantasias esotéricas.
Hitler colocou sua fé na intimação e na bala do revólver, não em relíquias míticas.
Ele estava todo entusiasmado com a revolução violenta e não tinha paciência
para “místicos Völkisch”, cuja visão irremediavelmente romântica de um idílio
rural seduziu os operários a abraçarem o Nacional-socialismo como uma revolução
cultural. Ao aderirem o mito ariano, pode-se dizer que os nazistas se colocaram
no papel de emissários de Satã na Terra, pois eles perverteram a ciência, a
religião e cada faceta do esforço humano para promover sua ideologia maligna,
que impingiram pelo medo, ódio, mentiras e violência. Eles também doutrinaram
seu povo com sua propaganda venenosa, a ponto de aceitarem de bom grado o
assassinato dos incapazes e enfermos, o aprisionamento e tortura de seus
inimigos políticos, a invasão e escravidão de nações vizinhas e guerra global e
genocídio de cidadãos inocentes. Se tivessem sido bem-sucedidos em suas
ambições de estabelecer uma Nova Ordem na Europa, os nazistas teriam superado o
Cristianismo com uma forma de culto neopagão, com a suástica substituindo a
cruz cristã. Como Hitler declarou: “ou o indivíduo é alemão ou cristão. Você
não pode ser ambos (...) Nossos camponeses não se esqueceram de sua verdadeira
religião. Ela ainda está viva(...) As antigas crenças serão trazidas de volta à
boa reputação(...) Ao camponês será contado o que a Igreja destruiu: todo o
conhecimento secreto da natureza, do divino, do informe, do sobrenatural(...)
nós devemos eliminar o verniz cristão e trazer de volta uma religião apropriada
para a nossa raça(...) nosso campesinato ainda vive com crenças e valores
pagãos(...) por meio do campesinato, nós seremos realmente capazes de destruir
o Cristianismo porque neles existe uma verdadeira religião enraizada na
natureza e no sangue”.
A tentativa do regime foi de impor sua demagogia a seu
próprio povo, em vez de suas campanhas assassinas no estrangeiro, isso incensou
a Igreja alemã e levou à acusação de influências satânicas no interior do
Reich. O historiador e ocultista britânico Lewis Spence expressou o desconforto
sentido pelas autoridades religiosas alemãs nos anos anteriores à guerra ao
escrever: “... o movimento neopagão na Alemanha, a origem satânica inflexível de
seus métodos e intenções não admite discussão. A substituição da cruz pela
suástica, a abolição do Sacramento em favor de um rito parecido com o dos
mistérios de Deméter, a perseguição de igrejas cristãs e de seus sacerdotes e
pastores, e a substituição do ritual ou serviço e hinário por cerimônias
blasfemas e canções, pelo estabelecimento de uma nova divindade, pela instrução
dos jovens nos mitos do passado em vez das Escrituras – tudo isso fornece a
prova mais clara da regressão da Alemanha naquele tipo de paganismo, o qual a
política e a propaganda satanista invariavelmente consideram como o meio mais
adequado para a destruição da fé cristã”. Spence não tinha dúvidas de que
Hitler era um Fausto moderno que vendera sua alma para o Diabo e, assim,
dedicava-se a cumprir o plano de seu mestre para o domínio do mundo. “O Füher é
apenas a criatura e instrumento de forças que por séculos estiveram usando este
ou aquele ditador tirano ou outra marionete famosa, para avançar em suas
intenções arcanas que, trocando em miúdos, são a criação do caos generalizado e
a destruição final da humanidade.” Spence sustentava que o nazismo não foi
iniciado por satanistas, mas foi infiltrado pelos discípulos do Demônio, para
que a Alemanha se tornasse seu instrumento para o caos e a destruição. “Se o Príncipe
das Trevas em pessoa tivesse tomado para si o governo daquela nação, é difícil
sugerir como ele poderia ter se trazido à vida senão da forma que seu líder
infeliz o fez, ou com ruindade mais fantástica.” “Toda palavra que vem da boca
de Hitler é mentirosa. Quando ele diz paz, ele quer dizer guerra; e, quando ele
usa de forma blasfema o nome do Senhor, ele quer dizer o poder do Demônio, o
anjo caído, Satã(...) quem hoje em dia duvidar da realidade, da existência de
poderes demoníacos, falhou consideravelmente em compreender o fundamento
metafísico dessa guerra. Por trás do concreto, os acontecimentos visíveis, por
trás de qualquer objetivo, consideração lógica, nós encontramos o elemento
irracional: a luta contra o Demônio, contra os servos do Anticristo.”
O único grupo dentro da Alemanha, além da Igreja, que teve
coragem para falar contra o regime foi a organização de estudantes antinazista
conhecida como Rosa Branca, liderada por Sophie Scholl e seu irmão Hans. Eles
se sacrificaram em um esforço vão de despertar a consciência de seus
compatriotas e expor a verdadeira natureza do inimigo interno.
Toda essa falação sobre o Demônio e sobre Hitler ser um
médium para forças malevolentes é naturalmente descartada como irreal pelos
historiadores convencionais, que veem a Alemanha nazista como um fenômeno
sociopolítico e Hitler como nada mais que um agitador de massas demagogo e
oportunista militar. Eles estão certos quando sugerem não existir evidência de
que Hitler e seu círculo íntimo praticassem magia ritual ou convocassem
demônios para cumprir ordens. Contudo, Hitler despertou força das trevas
latentes na alma alemã e a nação sucumbiu a uma neurose de massas que subverteu
toda a razão. Mas ninguém que tenha marchado sob os estandartes rubro-negros,
ou encorajado as tropas de assalto com seu passo de ganso, compreendeu a
verdadeira natureza dessas forças, nem eles poderiam ter resistido à atração do
malevolente Flautista de Hamelin que os conduzia como a lemingues para a
autodestruição, a não ser que eles possuíssem uma vontade equivalente à dele.
Pois o encanto que Hitler inconscientemente lançava sobre as massas que o
idolatravam era uma forma de magia, embora ela não requeresse um círculo
desenhado no chão nem precisasse de fórmulas mágicas, mantos ou outra
parafernália oculta. O fenômeno que foi a Alemanha nazista foi, de fato, um “triunfo
da vontade”, para ecoar o título do notório filme de propaganda nazista de Leni
Reifenstahl – foi o exercício da vontade dominante de Hitler sobre todos os
outros, foi sua neurose tornada manifesta. Todos os que caíram na órbita do
Führer testemunharam seu magnetismo pessoal e seu olhar penetrante, que drenava
sua vontade de resistir. E não eram apenas as massas que ele dominava. Até seus
generais confessaram manter suas visitas ao quartel-general a um mínimo, pois
temiam que seus protestos diante da incessante intromissão de Hitler nos
assuntos militares seriam silenciados por sua personalidade autoritária. O
arquiteto de Hitler, Albert Speer, testemunhou a habilidade de seu mentor para
subjugar seus subordinados pela pura força de vontade em várias ocasiões. “Eles ficavam todos sob o seu feitiço, com
obediência cega e sem vontade própria(...) estar em sua presença por qualquer
período de tempo me deixava cansado, exausto e vazio.” Mesmo nos dias finais da
guerra, quando a degeneração do estado físico de Hitler ficou visível, o
oficial do Comando-Geral Ulrick de Maizière observou que ele “não tinha perdido
nem um pouco de seu carisma demoníaco”.
Hitler não era impressionante ou atraente como homem, mas
possuía o poder de entreter uma audiência, o que ele explorou sem piedade para
seus próprios fins. “O poder que sempre iniciou as maiores religiões e
avalanches políticas no decorrer da história foi, desde tempos imemoriais, o
poder mágico da palavra falada(...) o que eu digo é como uma ordem dada sob a
hipnose.” (Adolf Hitler, Mein Kampf) Outros, não suscetíveis a seu magnetismo
pessoal, atribuíam a atração de Hitler a forças sobrenaturais. De acordo com o líder
político nazista Hermann Rauschning: “É impossível não se pensar nele como um
médium. Pois a maior parte do tempo os médiuns são pessoas comuns e
insignificantes. De repente, eles recebem o que parece ser um poder
sobrenatural, que os coloca à parte do resto da humanidade(...) Uma vez passada
a crise, eles caem de novo na mediocridade. Era assim, sem qualquer dúvida, que
Hitler era possuído por forças demoníacas, das quais o homem individual,
Hitler, era apenas um veículo temporário.”
Quanto aos aspectos teatrais de magia cerimonial, eles
estavam presentes na Alemanha, mas na época não eram percebidos como tal. Com
seus estandartes imensos, música marcial, símbolos arcanos e consagração solene
de bandeiras, os comícios anuais de Nuremberg serviam como ritos quase
religiosos para despertar a vontade coletiva e invocar os arquétipos da psique
alemã. Ao anoitecer, 200 holofotes se acendiam em direção ao céu para criar o
que Albert Speer chamou de “catedral de luz”, embora nada de sagrado estivesse
sendo conduzido no interior desse círculo mágico. Pelotões massivos de tropas
SS com camisas pretas, as tropas de assalto com camisas marrons da AS, a
Juventude Hitlerista e outros grupos ouviam fascinados os sermões dados por seu
messias, que apelava aos seus instintos básicos e também ao orgulho. Porém, não
era o orgulho da realização, era o orgulho de Lúcifer – arrogância, desdém,
falsa sensação de superioridade e uma sede de poder insaciável.
Os nazistas não precisavam de nenhuma assistência das forças
das trevas, porque o demônio que libertaram foi totalmente criado por eles. Os
demônios que Hitler invocava eram os que afloravam de sua psique insana. Ele
não era um mago no sentido tradicional, mas instintivamente explorou seus dons
oratórios para manipular as massas para fins egoístas, apelando para seu
orgulho e seus preconceitos. O pesadelo que a Alemanha nazista representou foi
tornar a mentalidade de massa mais evidente, e isso foi mais assustador porque
uma nação que havia dado luz a alguns dos grandes intelectos e artistas da Era
Moderna havia sido corrompida. Inconsciente da natureza das forças que haviam
sido liberadas, a nação foi incapaz de conter ou controla-las e, no fim, foi
consumida por elas. Os nazistas foram a prova viva, se necessário, de que o mal
é criação do homem e que os que invocam o aspecto demoníaco ou primal de sua
natureza estão condenados à autodestruição. Infelizmente, os demônios de nossa
natureza podem causar sofrimentos incontáveis antes de ser finalmente vencidos.
Goethe apresentou uma intuição sobre a natureza do mal, que se provaria
profundamente profética: “A manifestação mais temível do demoníaco é quando ele
é predominante no caráter de um indivíduo (...) Tais pessoas nem sempre são os
homens mais eminentes, nem em intelecto ou talentos especiais (...) a parcela
mais esclarecida da humanidade tenta em vão lançar suspeitas de que eles sejam
tolos ou impostores – eles atraem as massas (...) nada pode derrota-los, apenas
o próprio Universo com que eles iniciaram a refrega.”
(continua...)
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A ARTE NEGRA POR AHNDRUS
(Fonte: Livro: Templo de AHNDRUS , DESVENDANDO AS PRÁTICAS PROIBIDAS Consagrações, Instrumentos, Feitiços e Rituais de Danilo Coppini "Dan Maxa" ; Editora: MADRAS)
Os Reis e Rainhas da Arte Negra
Abaddon:
Inteligência furiosa, causa discórdias e devastações. Não se deve invoca-lo sem uma grave e urgente necessidade. Sua comida predileta são bifes de carne crua adornados com frutas silvestres e sua bebida é o sangue de animais imolados. Ocorre o chamamento em noites de lua minguante, com o céu parcialmente nublado.
Asmodeus:
A “criatura que julga”. Espirito muito popular por praticantes das Artes Negras, quando necessitam de forças destruidoras motivadas por conceitos e injustiça. Pode ser invocado também para casos relacionados à luxuria e ao poder. Classificado como “Rei dos vingadores do mal”. Água pura (de poço) é item que jamais poderá faltar em suas invocações. Sua comida predileta é o cordeiro assado, temperado com alecrim e hortelã e sua bebida predileta é o vinho tinto. No primeiro dia de novembro, deve-se ritualizar para glorifica-lo e solicitar sua intervenção em questões pessoais.
Astaroth:
É aquele que procura, um acusador nato e inquisidor. Suas forças agem sempre que um bruxo necessitar de “fendas” para atacar oponentes. Também possui muita amplitude para elevar as pessoas cultural e financeiramente. Sua bebida preferida é o vinho branco levemente adoçado com mel. Sua comida predileta é codorna assada temerada com vinagre e raspas de limão, pequenas batatas assadas com óleo de oliva. Costuma-se glorificá-lo no mês de agosto. Estudiosos afirmam que Astaroth é a corrupção do nome grego Astarte (deusa). Porém, ela foi metamorfoseada em um demônio masculino, que criou vida após anos de energia direcionada. Portanto, tornaram-se inteligências distintas.
Azazel:
Azazel é um dos “anjos caídos” tipificados no Zohar (grupo de livros que descrevem comentários místicos sobre a religiosidade da Torá – livros de Moisés). Segundo o “Livro de Enoch”, é um dos 200 anjos que se rebelaram contra a criação. Possui grandes poderes sobrenaturais e ensina feitiçaria aos homens. Muitas lendas giram em torno desse nome, desde ser o verdadeiro pai de Caim, representar Satanás e até esposar as filhas dos homens para criar uma raça de gigantes. Em verdade, Azazel é o “deus-bode”, pois possui a capacidade de absorver a negatividade em amplo aspecto, de promover a força da virilidade, de despertar a força da sabedoria, de carregar a força da conquista material, de promover a autoestima e de ensinar os homens, que assim enxergam as maravilhas escondidas na magia. Azazel é um Deus! Ele não pode ser visto apenas como parte de um contexto expiatório (em razão de ser “deus-bode”), não se trata apenas de pecados e redenções. Para os bruxos pecar significa desconhecer. A sensualidade e virilidade de Azazel são transferidas aos que nele buscam isso. Isso também se afirma no “Livro de Enoch”. Azazel ensinou os homens a manipulação dos metais, a origem das artes, os valores das pedras. Como “deus-bode” é Senhor da Terra e possui todas as respostas. Sua comida e bebida estão descritas no feitiço destinado a ele.
Beelzebuth:
Beelzebuth é um espírito que pode intervir em todas as questões do homem (erroneamente é representado pela imagem de Bafomé "Encyclopedia of Occultism", Lewes Spence, copyright 1959, publicada originalmente em 1920). Beelzebuth é o senhor da terra, confundido por uma das traduções Vulgatas como “senhor das moscas”. Existem inúmeras lendas cercando essa deidade. Em verdade, é o antigo deus; ou seja, uma inteligência muito poderosa com força criativa e destrutiva. A forma correta de escrever seu nome é Beelzeboul (grego). É temido e amado por inúmeros seguidores, mas respeitado por todas as religiões. Sua comida predileta é um grande pedaço de carne bovina (nobre) mal assado, temperado com azeitonas, manjericão, orégano e pistache triturado. Seus pratos devem ser adornados com tâmaras secas, pêssegos, fruta-do-conde, maçãs e castanhas. Sua bebida preferida é o vinho tinto seco. Costuma-se glorifica-lo no mês de setembro e em todas as ocasiões onde ocorrer o eclipse completo da Lua.
Belial:
Inteligência rebelde, seus poderes são da guerra, violência, maldade e perversidade. Protege os bruxos de ataques e aniquila todos os inimigos. Belial possui um dom de favorecimento: pode ser invocado para provas e testes. Sua comida predileta é a carne de cupim bovina assada, levemente temperada com ervas finas, regada com óleo de oliva, adornada com muitas hortaliças, frutas secas variadas e frutas nobres. Gosta de um pote com mel ao lado e um cálice com água e lavanda. Sua bebida preferida é uma destilada (cachaça, tequila, uísque, entre outras), com cravos.
Hecate:
Hecate é a mãe da Arte Negra. Deusa poderosa, rainha dos mortos e chicote das almas. Seus poderes de magia são tão vastos como suas lendas. Seus domínios e a amplitude de suas forças são quase incompreensíveis. Essa deusa, ora Rainha, é a inteligência capaz de retirar todos os obstáculos dos caminhos de um bruxo. Mesmo sendo ela o “espinho da flor”, pode revelar onde estão os demais espinhos. Nas encruzilhadas “da vida” habita Hecate, e é essa Rainha que pode trazer as riquezas para os filhos da Arte Negra. Cães são os animais de força dela, assim como animais selvagens. Sua comida predileta é um pedaço de carne de javali. Tudo deve ser temperado com óleo de oliva, limão e louro. Muitas frutas e flores dama-da-noite, agonia, lírios ou copos-de-leite deve adornar seu prato. Um cálice de água, um de suco de maça e outro com vinho tipo rose devem ser servidos. Costuma-se ofertar esses pratos em uma encruzilhada, em lua minguante.
Leviatã:
Leviatã é o grande senhor dos mares. Representa o poder das profundezas e de todos os labirintos esquecidos. O mar é o grande senhor dos comércios, guerras e transportes. Sem esse senhor-serpente não existe comunicação mágica. Um bruxo sempre que necessitar agitar uma “situação que está parada”, dar início a algo, afundar alguma coisa, derrotar pessoas que se encontram muito distantes deve solicitar a tal inteligência. Sua comida preferida é um prato composto por peixe assado e frutos do mar cozidos em água de coco verde, temperados com cominho e pimenta-do-reino, cuidadosamente adornado com folhas de bananeira. Sua bebida é um ponche de frutas cítricas. Deve ser entregue nas pedras à beira-mar, em notes de lua cheia, quando a maré estiver cheia.
Lilith:
Deusa do livre-arbítrio, da livre expressão sexual, da liberdade das ações, da coragem, das amarrações. Lilith tem o poder de penetração nos sonhos, de manipulações mentais. Os bruxos devem apenas reverencia-la para nunca sofrer ataques e sempre estar protegidos contra influxos sexuais. Lilith habita os espelhos e toda a vaidade humana. Sua comida preferida é carne de coelho assada em fogueira, temperada com vinho de maçã e pétalas de rosas. O prato deve ser adornado com muitas flores vermelhas e ao lado deve-se colocar um espelho e um perfume feminino. Para beber, um espumante de classe. Costuma-se glorificá-la no mês de maio, sempre em lua cheia.
Lúcifer:
“Como caíste dos céus, estrela filha da manhã. Foste atirado na terra como vencedora das nações.”
As traduções para o sagrado nome de Lúcifer derivam do latim, do hebraico e do grego. Resumindo, seu nome simboliza a “estrela da manhã”, o portador de luz, o sol brilhante, enfim, todas as vertentes reconhecem-no como criatura iluminada e repleta de dons supremos. Erroneamente, muitas pessoas creem que Lúcifer seja Satã. Ambos interagem, são complementares em suas funções, mas não são a mesma energia. Satã é o fogo, o senhor absoluto das transformações, das provas, do poder de superação; enquanto Lúcifer é a fonte dos conhecimentos para se alcançar as transformações. Sem as cobranças de Satã, jamais existira a beleza de Lúcifer. Lúcifer nos ensina a cortar as amarras de um velho tempo, de velhos conceitos cansados e rejeitados. Lúcifer é a tecnologia, a evolução, a grandeza do poder e das conquistas. Lúcifer e Satã são “o caminho” para o autoconhecimento e a vida em plenitude. Sem conhecer sua origem (que está no fogo) ninguém será capaz de encontrar a luz. Lúcifer é o equilíbrio, o ponto de encontro, a magnitude, o poder de dominar os instintos e consequentemente as pessoas. Para ser bruxo é necessário comungar dessa natureza, pois, sem ela, a Arte Negra não passaria de apenas um teatro vago e sem sentido. Sua comida preferida são uvas frescas e doces. Também aprecia azeitonas fartas, queijos finos e presunto tipo “Parma”. Deve-se acondicionar em um rato de prata devidamente decorado com as folhas do parreiral. Para beber, uma bela taça de cristal com vinho tinto seco nobre. Podem ser servidas às sextas-feiras, nos horários de Vênus.
Mammon:
Esta inteligência é a verdadeira riqueza. Carrega o poder do ouro, do dinheiro e de tudo relacionado às transações bancárias. Erroneamente classificam-no como senhor da avareza, mas os bruxos que souberem adora-lo corretamente terão muita fartura e posses. Sua comida predileta é um prato composto com corações de galinha, um coração de boi e um coração de porco, temperados com alecrim e azeite de girassol. O prato deve ser forrado com folhas de mamona, ter lentilhas, grãos-de-bico, grãos de milho (tudo cozido). Como decoração, colocam-se 11 moedas e 4 notas correntes (de baixo valor). Para servir Mammon, deve-se abrir um círculo com pó de ouro, acender circularmente, de maneira alternada, 22 velas (douradas e pretas) e depositar sua oferta ao centro. Sua bebida é sempre um copo de cristal com uísques envelhecidos. Deve-se fazer ao amanhecer de um domingo, em um local com sombra e próximo a uma estrada movimentada.
Meririm:
Inteligência muito pouco conhecida, porém, tido como "um dos grandes nove senhores”. Um dos responsáveis pelos poderes do ar, principalmente dos raios e trovões. É guardião dos quatro ventos da Terra; portanto, senhor das mensagens. Tem o poder de se deslocar com velocidades incríveis a todos os lugares, através dos meridianos. Um bruxo pode invocar-lhe sempre que necessite do deslocamento mágico e da velocidade nos feitiços. Sua comida preferida são patos silvestres assados em fogueira, regados com óleo de oliva e vinho tinto e no prato deve conter uma salada de brotos de bambu. Tudo adornado com flores silvestres. Para beber, suco de uva, 21 gotas de sangue do bruxo e mel. Feito ao ar livre, após as 18h em um campo aberto ou em dias de eclipse solar.
Satã:
Em hebraico, Satã significa “o adversário”. Muitas pessoas acreditam que ele é o operador “por detrás” de todas as desgraças do mundo. Tido como força do mal, essa inteligência tem a capacidade de operar e manipular o fogo, capaz de consumir tudo que as pessoas constroem. Satã abandona todos aqueles que se prendem às correntes de dogmas ultrapassados. Satã significa vitória, novas perspectivas, derrota de inimigos que não permitem o progresso, a farpa nos olhos dos invejosos, aquele que abandonou a escravidão... Satã é a glória da manipulação dos fracos é o Heraldo da Luz. Satã é o dono das Artes Negras, das sabedorias secretas e só ele ativa as chaves para os aprendizados. Tudo o que o mundo pode nos oferecer está nas mãos dele, assim como todos os males que o mundo nos impõe são manipulados por ele. Satã é o Alpha de tudo. Essa inteligência tem como um dos pratos prediletos costelas bovinas (com muitas ripas), costelas de porco, ambas temperadas com três tipos de pimenta fresca e um fio de óleo de pimenta. Sua bebida é vinho tinto seco com 21 gotas de sangue dos bruxos em uma taça de prata, mas deverá ter um copo com alguma bebida destilada ao lado. Seu prato deverá ser decorado com folhas de louro, aveia, arroz (cozido sem tempero), ovos cozidos de galinha, codorna e pata. Costuma-se fazer esse prato sempre que o bruxo necessitar de sua intervenção, em suas disputas. Pode ser feito em qualquer local e horário após às 21h.
(continua..)
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Do Livro:
HISTÓRIA OCULTA DO SATANISMO A Verdadeira História da Magia Negra Da
Antiguidade Até Nossos Dias , De: Santiago Gamacho Hidalgo , Editora MADRAS
PACTUAR COM O DIABO:
Um dos aspectos mais interessantes da satanologia é o tema
recorrente dos seres humanos que fazem um pacto com o Diabo. A lenda de Fausto
é a mais conhecida dessas histórias. Em troca de sua alma, Satã lhe concederá
abundância ou juventude durante um período de tempo especificado. Na maioria
das versões da história, Fausto engana o Diabo e evita o pagamento. Na versão
original do mito, o Diabo mutila e mata Fausto, como liquidação do contrato. As
versões mais amplas dessa história vêem as transações com os espíritos como uma
troca da alma por algo tangível. Entretanto, na maioria das vezes, os espíritos
não estão interessados nas almas. Satanás já “tem” suas almas. Os espíritos,
como os seres humanos, estão sedentos de aplauso, louvores e atenção. Por
exemplo, o humano que faz o trato promete ao demônio de plantão a edificação de
um templo em sua honra, ou escrever um livro sobre ele ou dedicado a ele. Deixo
à imaginação do leitor supor quais favores estarão sendo pagos por meio dessas
páginas. Os espíritos querem notoriedade, ainda que os humanos queiram poder e
determinados favores especiais. Assim, o que se estabelece é uma relação
simbiótica entre os espíritos e o homem. De fato, a conclusão fundamental à
qual poderemos chegar é de que os pactos com o Diabo não são uma raridade
medieval própria dos delírios de mentes supersticiosas de outros tempos, mas,
sim, uma prática completamente vigente e muito mais ampla do que qualquer um de
nós poderia supor. A ideia do pacto ou trato é tão antiga quanto o próprio
homem. Quase todos os humanos fazem algum tipo de promessa aos seres superiores,
negociam, fazem trocas... diferentemente dos animais, os humanos e os “deuses”
fazem e rompem promessas de descanso. O pacto implica que se presuma haver
alguém com o poder de cumprir com o pactuado. Assim, cada trato é o ato de
orgulho e cada promessa, uma mentira em potencial. De fato, uma das advocações
de Satã o qualifica como o “Príncipe das Mentiras”. As promessas, os pactos, os
tratos e os acordos são, neles mesmos, um ato de fé. Na tradição
judaico-cristã, a educação das crianças inclui o aprendizado, desde a mais
tenra idade, da técnica para realizar este tipo de promessas a Deus. Inclusive
aqueles que se declaram ateus fazem tratos, de vez em quando, com as forças do
invisível. Pactos e tratos são estabelecidos em quase todas as relações imagináveis.
A fé nas promessas é um dos pilares nos quais se sustenta a civilização. O
pacto com o Diabo é um símbolo da liberdade do homem, uma situação de mercado
livre na qual o homem opera em termos de “igualdade” com seus – teoricamente –
superiores do mundo espiritual. É um comércio honrado no que se se refere ao
fato de que o homem tenta influenciar o universo para obter um benefício de
forma honesta e abertamente, algo do que o mesmo Prometeu sentiria orgulho. É
este Deus-homem do qual tantos intelectuais vêm falado durante os últimos cem
anos? Fazer um pacto com o Diabo ou com qualquer outro espírito é negociar para
obter benefícios. Não devemos nos estranhar com o fato de que o pacto tenha
tanta má fama, já que nos encontramos a um ato reprovável perante os olhos da Igreja
e da sociedade. Aquele que decide estabelecer o pacto, rechaça os meios
convencionais e ignora a suposta ajuda e autoridade dos personagens eminentes
da comunidade. Libertando-se da influência das autoridades, o homem se converte
em um ser livre e perigoso. Os pactos com os espíritos requerem esforço e não
devem ser feitos frivolamente. Com frequência, é mais fácil usar meios
convencionais para conseguir o que se deseja. Não obstante, quando esses meios
se esgotam, o pacto proporciona um sentimento de poder que mitiga a impotência,
e frequentemente é o suficiente em si mesmo para fazer com que o homem se
sobreponha aos obstáculos da vida. Em muitas liturgias, dá na mesma se não
houver crença nele, porque, o pacto não é senão um psicodrama, o qual que pode
desatar insuspeitadas capacidades ocultas. Não há que se seguir um ritual
determinado ao pé da letra. Durante toda a história da humanidade, o homem luta
contra as forças do mal para conseguir a salvação da sua alma. Tendo chegado o
século XX, os adeptos do movimento New Age descreverão esta situação como a
luta da “Luz” (a Verdade) contra as Trevas (a Ignorância). O problema com a
definição desses conceitos é que cada religião ou filosofia de vida parece ter
um significado próprio para cada um deles.
Uma alternativa ao conflito aparente dessas duas forças, é
considerar que Bem e Mal não existem, são uma ilusão, uma criação da mente do Homem,
o que C.G Jung teria chamado de arquétipo (símbolos aos quais recorrem os seres
humanos para definir nossa realidade).
O nome de Lúcifer significa “portador de luz”, algo que se
encaixa na perfeição de seu papel prometeico. A princípio, era um anjo belo e
poderoso que, mais tarde, se ergueu como líder da rebelião no céu contra a
autoridade de Deus. Por seu pecado de desobediência, Lúcifer foi exilado nos
infernos, juntos daqueles anjos que o haviam seguido durante a guerra. Em sua
nova condição, seu nome passou a ser Satã. Lúcifer pode ser visto como um herói
trágico graças ao fato de que, até mesmo em sua derrota, ele mantém seu orgulho
e seus princípios, o que é uma perspectiva muito moderna sobre o Diabo. Essa
visão tem matizes evidentes de gnósticos. A crença destes era de que o
conhecimento e a liberdade são o que realmente nos concede a condição de
humanos, e qualquer autoridade que nos impeça de conhecer nossa verdadeira
natureza ou de escolhermos nosso próprio destino é má, não importando como esta
se caracterize. Pela perspectiva gnóstica, os anjos eram escravos antes da
rebelião no céu, já que eles nunca questionavam suas ações nem mesmo as ações
do próprio Deus, tal como Adão e Eva eram escravos no Jardim do Éden e faziam o
que lhes era dito, sem se perguntarem se isso era bom ou não. Assim encontramo-nos
com duas imagens distintas de Lúcifer claramente diferenciadas: um demônio
horrendo que habita o inferno e devora as almas malditas e um rebelde destemido
que sofre o tormento eterno porque nunca se renderá à regra arbitrária imposta
pelo Todo-poderoso. A desobediência e o orgulho são os dois pecados
fundamentais de Lúcifer. De fato, de um ponto de vista religioso, não existe
pecado que não possa ser reduzido a u mato de desobediência, de negativa com relação
a acatar a lei divina.
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MAGIA NEGRA:
A prática da Magia é o coração da tradição esotérica européia.
A palavra “Magia” provém do termo Magi (Magos), sacerdotes da dinastia persa
dos Sassânidas (224-729), - ainda que sua história remonte às mesmas origens da
cultura ariana nos desertos do Irã. Os Magi eram famosos a admirados por sua
sabedoria, assim como sua capacidade para realizar milagres (“Magia”). Os
cordiais Reis Magos do mito do Natal cristão eram “Magi” (Magos), de maneira
que foi o Cristianismo quem introduziu a palavra “Magia” em nossa língua. O
Xamanismo (a religião tribal siberiana utilizada pelos antropólogos para
exemplificar como surge a religião nas culturas) unificou as funções de
sacerdote, mago, profeta, adivinho e curandeiro em um único papel, aquele do
xamã tribal. Conforme as sociedades se tornaram progressivamente maiores e mais
complexas, as funções sociais do xamã chegaram a ser mais importantes que suas
funções mágicas. Isso levou, muitas vezes, a uma ruptura entre os sacerdotes “exotéricos”,
os quais celebravam ritos como matrimônios e enterros, e os magos “esotéricos”,
que sobreviveram como curandeiros e bruxos. Depois desta ruptura, é comum achar
que o sacerdócio se converte em “ortodoxia”, com um sistema ajustado de regras
religiosas. A necessidade do contato direto com a deidade ou com as deidades
diminui até quase se extinguir, pois qualquer nova revelação divina pode
transtornar a ordem estabelecida. É por esse motivo que os sacerdotes ortodoxos
organizam muitas vezes cruzadas contra suas contrapartes “heterodoxas”, cuja
função como magos requer, em geral, o contato direto com a divindade. Na
cultura europeia, a tradição mágica dos povos celtas, dos nórdicos e dos
antigos saxões sobreviveu até épocas relativamente recentes, apesar da
repressão selvagem das autoridades eclesiásticas cristãs cuja religião já se
havia convertido em ortodoxa e exotérica na época de sua difusão por estes
lares. À parte de alguns focos de conversão obtidos por missionários
especialmente eficazes, o cristianismo foi adotado, em primeiro lugar, pelos
reis e pela nobreza, provavelmente por razões mais práticas do que espirituais.
Como resultado disso, as práticas tradicionais foram se distanciando dos
centros de poder, sendo restringida sua influência aos distritos periféricos
dos distintos reinos. É por este motivo que a sobrevivência da Magia Pré-cristã
é associada, com frequência, aos ambientes rurais mais distanciados. O termo “pagão”
se referia originalmente a qualquer aldeão, já que vem da raiz latina “paganus”,
que significa “rústico” ou “do povo”. Desde os anos 1950, ocorre certo número
de tentativas para o restabelecimento das práticas, religiões e Magia dos
tempos pagãos, sendo a mais notável a chamada Wicca, um sistema religioso que
reuniu muitas dessas tradições.
No século XVI, surgiu um renovado interesse pela exploração
das ramificações esotéricas da cristandade (a Tradição Rosa-Cruz), o judaísmo
(a Cabala) e o Islã (Sufismo). Esta inspiração foi, em grande parte, o caldo de
cultivo que propiciou a criação da Sociedade Teosófica, fundada em 1875, por
Helena P. Blavatsky, Judge e Olcott. Apesar do fato de que a sociedade estava
imbuída de um ar inequivocadamente orientalista, supunha-se também um despertar
no interesse relacionado às manifestações espirituais mais genuinamente europeias,
em particular, a tradição rosa-cruz, o esoterismo cristão e o paganismo céltico.
O aprofundamento nestes terrenos foi o que levou dois maçons britânicos, S.L
MacGregor Mathers e W. W. Westcott, a fundar a Ordem Hermética da Aurora
Dourada (Golden Dawn), em 1888. Esta se converteu indubitavelmente na
influência da Magia Ritual do século XX, sendo suas técnicas e sua filosofia a
base da qual surgiu uma variedade quase infinita de adaptações. Possivelmente,
o iniciado mais famoso da Golden Dawn foi Aleister Crowley cujos numerosos
escândalos e sua qualificação, por parte dos tabloides como “satanista” e “mago
negro” fizeram com que ele obtivesse notoriedade internacional. Nos anos de
1940, Crowley desenvolve a chamada “Magia Thelêmica”, que funde a tradição da
Golden Dawn com elementos herméticos, tântricos e egípcios, dando um passo a
mais na tendência em direção ao sincretismo esotérico iniciado pela própria
Golden Dawn e pela Sociedade Teosófica. Sua Magia em teoria e prática continua
a ser um dos textos definitivos sobre o tema. Em 1921, Margaret Murray publicou
um livro extremamente influente, “O Culto das Bruxas na Europa Ocidental”, que
foi seguido dez anos mais tarde por “O Deus das Bruxas”. Nessas obras, a autora
fazia eco da existência de uma religião pan-europeia que sobreviveu até a Idade
Média em forma de bruxaria. Em 1948, as circunstâncias para que se desse um
renascimento do paganismo europeu se viram fortalecidas pela publicação de “A
Deusa Branca”, um impecável tratado antropológico saído da pena de Robert
Graves, o qual, mais tarde, alcançaria fama mundial pela adaptação televisiva
da novela, “Eu, Cláudio”. Parece provável que essas fontes tenham formado o
alicerce para a moderna restauração da bruxaria como um culto pan-europeu, que
tem como base a adoração de um Deus solar provido de cornos (Murray) e de uma
Deusa lunar com três manifestações diferentes (Graves). A Wicca (a qual
empresta seu nome de uma palavra celta que significa “sabedoria”) aparece em 1953,
quando é mencionada pela primeira vez no livro “A Bruxaria Hoje”, de G. B.
Gardner. Apesar de muitas das teorias históricas nas quais se baseia terem
caído em descrédito na atualidade, a Wicca é, indubitavelmente, a inspiração
principal que está por trás do enorme ímpeto que vem adquirindo o movimento
neopagão, e ainda é um dos sistemas mais influentes da cultura mágica
ocidental. Nos anos de 1960, os hippies, o LSD e a ascensão da cultura
alternativa proporcionaram novos públicos para as ideias e práticas mágicas.
Aquela ´[época supunha também o ocaso quase definitivo da Magia Thelêmica e das
tradições da Golden Dawn. A explosão psicodélica, apadrinhada por Timothy
Leary, e a cultura da droga trouxeram um novo impulso experimentador, enquanto
a sofisticação da tecnologia de informação e o estudo da antropologia
ocasionaram crescentes oportunidades para a síntese de diversas tradições
religiosas. Em 1978, um guru tântrico chamado Mahendranath criou a AMOOKOS, a
Ordem Arcana e Mágica dos Cavaleiros de Shambhala. Essa organização trabalhava
com um sistema mágico desenvolvido por Michael Magee, o qual sintetizava as tradições
Tântrica e Thelêmica em uma série de práticas e rituais separados por graus. Em
1991, Mahendranath morreu e a seita desmembrou-se em diversos grupos, dos quais
o mais famoso é o Garuda Gana. Nos últimos 25 anos, os livros de Magia ou sobre
Magia concentraram-se, principalmente, na Magia Cabalística, na Psicologia
Junguiana ou no Noepaganismo, seja relacionado com a Wicca ou não. Mas quase
ninguém pretou atenção a uma série de livros, sistemas mágicos e crenças que, a
partir do Renascimento, passou a ter uma posição indiscutível na prática séria
da Arte Mágica. Esse material representa o que normalmente é considerado Magia
Negra, com a qual se pretende fazer o contato com determinados espíritos
denominados demônios. É uma forma de magia transcendental, na qual o praticante
tenta transmutar sua alma para converter-se em algo mais que um homem: obter o
poder do mago. O saber dessa Magia Negra é compilado em vários livros que, com toda
segurança, têm como base manuscritos muito mais antigos. Destacam-se: “Grimorium
Verum”, “O Grande Grimório” e “O Grimório do Papa Honório III”
---
OS GRIMÓRIOS:
O apelativo grimório é derivado da palavra gramática. Uma gramática
é a descrição de um sistema de símbolos e a combinação para criar orações com
significado. Um grimório é basicamente igual: a descrição de um sistema de
símbolos mágicos e a combinação correta. A maioria desses textos está ligada à
tradição mágica europeia, com sólidos vínculos com o judeu-cristianismo. Ainda
que esse gênero da arte mágica não deva ser confundido com o Neopaganismo,
muitas das tradições neopagãs utilizam rituais e técnicas similares, mesmo
variando substancialmente seu vocabulário (utilizam geralmente vocabulários de
origem celta).
A seguir, repassaremos brevemente alguns dos grimórios mais
utilizados:
6° e 7° Livros de Moisés: Estes dois grimórios (que, na
verdade, formam um único livro) são citados com frequência como manuais de
cabeceira de um grande número de magos. Reivindicam-se ser uma continuação do
Pentateuco – os cinco ´primeiros livros da Bíblia – e ter saído da pena de
Moisés. Ainda que afirmem possuir uma natureza cabalística, há muito pouco da
Cabala real neles. Pelo contrário, parecem resignar-se ao típico sistema de
Magia Ritual com seus correspondentes para convocar e despedir-se dos
espíritos, assim como para conseguir utilizá-los com propósitos mundanos.
Publicados em 1849, os 6° e 7° livros de Moisés afirmam incluir material de
1338m 1383 e 1501, com fragmentos traduzidos da língua samaritana, extinta
desde o século XII, e sobre a qual pouco se sabe. Os aspectos mais
interessantes desses livros são as ilustrações únicas de selos mágicos, com
caracteres hebraicos e de uma língua desconhecida, além das listas de entidades
demoníacas.
A Clávícula de Salomão: Ainda que esse grimório seja
tradicionalmente atribuído ao rei Salomão bíblico, provavelmente foi escrito no
século XIII. Sua influência na Magia atual deve-se, em grande parte, ao fato de
que foi um dos livros favoritos da Golden Dawn, com o que se converteu em uma
das fontes da Magia Ritual moderna. Esse texto tem influências genuínas e
parece muito mais bem documentado do que o grimório anterior.
“Pow-Wow” ou o Amigo Grande Tempo Perdido: É o melhor
exemplo de como a tradição mágica europeia foi transplantada para a América do
Norte. Trata-se de um grimório extensamente utilizado pela população holandesa
da Pensilvânia. Apesar de seu nome, o Pow-Wow nada tem a ver com a tradição
nativa americana, exceto pelo fato de ser um sistema de cura e de Magia Ritual
que foi importado para a América, no século XVIII, por imigrantes de origem
alemã. Depois de haver passado muito tempo no esquecimento, determinados grupos
mágicos dos Estados Unidos voltaram a usá-los em anos recentes.
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SIMON FORMAM “O DOUTOR” e DUQUE PHILLIPPE DE ORLEANS:
Apesar de a Igreja haver obtido um êxito notável na hora de reprimir os cismas que surgiram em seu seio, tradicionalmente se viu impotente para combater a prática da feitiçaria, ainda que para isso tenha precisado recorrer à clandestinidade. Aqueles magos “brancos”, como Giordano Bruno ou John Dee, que se arriscaram a defender abertamente a Magia, foram vítimas de incontáveis perseguições e intrigas por parte de pessoas e instituições que se declararam seus inimigos, jurados tão-somente pela valentia de declarar em público sua heterodoxia (algo do que, em menor proporção, também sabem muito os modernos parapsicólogos, ufólogos e todos aqueles que se dedicam ao estudo de temas “pouco convencionais”). É lógico, pois, que, perante a perspectiva da prisão ou de ser queimado em uma fogueira erigida em praça pública, os magos tenham optado pela prudente opção de ocultar sua arte aos olhos da comunidade. Bom exemplo disso é a França. Apesar de sua condição de país católico, e provavelmente devido a uma série de reis, estes que foram algo mais que bons conhecedores das artes ocultas, o país galo converteu-se na terra mais fecunda e segura para os magos profissionais. Muitos deles escaparam da fogueira por dois motivos: primeiro, as principais vítimas dos julgamentos por bruxaria eram geralmente membros do campesinato luterano e cidadãos das nações calvinistas. Contrariamente ao mito histórico, a Inquisição foi muitíssimo menos destrutiva nesse sentido do que os tribunais formados pelas novas seitas protestantes. Em segundo lugar, as pessoas que ganhavam a vida dessa curiosa forma costumavam ser indivíduos educados, que gozavam da proteção de seus clientes principais: a aristocracia. Em não poucas situações, eles mesmos eram aristocratas. Esse fato é raramente mencionado nos livros de história, mas uma importante quantidade de pessoas com grande peso na vida política da Europa foi adepta da Magia Ritual. Um exemplo famoso foi Francis Stewart Hepburn, “o Mago Marquês” de Bothwell, que de forma reiterada usou a Magia Negra para dar um empurrãozinho em sua carreira política e eliminar, ou pelo menos tentar, seus inimigos. Hepburn era primo do rei James I da Inglaterra. Foi acusado de ser o grão-mestre de um conselho ou de uma reunião noturna de bruxos e bruxas, com a suposta intervenção do demônio, ordinariamente na figura de um bode, para a prática das artes desta superstição, em Berwick. Perante a perspectiva pouco agradável de um linchamento, Hepburn viu-se forçado a abandonar o país em 1595. Muitos de seus presumidos cúmplices diabólicos foram queimados vivos, por insistência do rei.
Hepburn também era amigo e cliente do sinistro Doutor Simon
Forman, o qual, se formos levar em consideração o testemunho de seus
contemporâneos, foi um dos mais dotados e um dos maiores libertinos de sua
época. O dr. Forman foi um ocultista britânico da Época Isabelina, que exerceu
a “profissão” de médico alternativo em Londres. Seus primeiros passos como
médico e cirurgião lhe valeram uma boa temporada no cárcere. Por causa das
práticas ocultas e das perigosas poções que prescrevia, foi proibido de
praticar a medicina e, para completar o quadro novelesco que rodeia esse
personagem, depois de sua morte, foi a ele vinculado um assassinato. Apesar de
tão pouco recomendável currículo, Forman era uma espécie de herói local em
Londres, principalmente em reconhecimento a determinada ocasião na qual ele permaneceu
na cidade durante um início de peste, indo de rua em rua, aliviando os enfermos
até quase cair extenuado por causa da falta de sono e de alimento. Os registros
de sua biografia, inclusive seus muitos experimentos de caráter oculto, estão guardados
na biblioteca Bodleian, em Oxford. Simon Forman nasceu em 30 de dezembro de
1552, em Quidhampton. Com nove anos, foi matriculado em uma escola de
Salisbury, a qual teve de abandonar dois anos mais tarde, por causa da morte de
seu pai, em 31 de dezembro de 1563. Os dez anos seguintes de sua vida foram
passados como aprendiz de Mattew Commin, um comerciante local que traficava
tecidos, sal e ervas medicinais, e foi durante essa etapa como aprendiz que o
jovem Forman começou a adquirir seus primeiros conhecimentos sobre remédios
herbários. Após alguns desentendimentos com a senhora Commin, Simon deu seu
aprendizado por terminado e se transladou até Oxford para viver com seus
primos. Passou o que ele mesmo definiu como um ano infeliz matriculado no Magdalene
College, depois do qual abandonou Oxford, coincidindo com uma epidemia. Durante
os anos seguintes, Forman desempenhou diferentes ofícios, dentre eles, o de
professor de escola em Salisbury. Em 1579, chegou à conclusão de que seu futuro
passava pela aquisição de conhecimentos ocultos e aplicou-se com entusiasmo ao
estudo dessas matérias, com esperança de chegar a ser um grande mago. Quando se
mudou para Londres, em 1592, já havia passado um tempo no cárcere por causa das
suas práticas ocultas, as quais não eram precisamente muito do agrado de seus
contemporâneos (John Dee, mago e astrólogo da mesma época, também esteve
hospedado em um calabouço pelo mesmo motivo). Montou um consultório de medicina
alternativa em Billingsgate (Londres), onde desempenhou os papéis de médico e
cirurgião, duas profissões vistas como completamente separadas pelos médicos da
época. Seus tratamentos tinham como base a astrologia, que utilizava tanto para
determinar e enfermidade como o tratamento. Não foi uma época muito afortunada,
pois, sendo novo na cidade, tinha escassos pacientes, os quais apenas lhe davam
dinheiro o bastante para viver. Quando a peste se nutriu em Londres, em 1592 e
1594, o dr. Forman permaneceu na cidade, enquanto um grande número de médicos
fugia apavorado em face à possibilidade de contagiar-se. Esse ato de valor
(ainda que outras circunstâncias pudessem ter influenciado em sua permanência na
cidade) cimentou decisivamente sua reputação, já que, durante aqueles dias,
Forman salvou muitas vidas, incluindo a sua. Depois de haver contraído a
enfermidade, o dr. Forman curou-se, utilizando suas próprias águas medicinais,
uma façanha que lhe elevou à categoria de herói aos olhos da população
londrina. Sua fama e seu renome cresceram de maneira tal que o Real Colégio de
Médicos de Londres decidiu pôr fim, definitivamente, à sua carreira, em virtude
da sua condição de não-licenciado. Puseram múltiplas objeções a seus
tratamentos alternativos e submeteram a exame os conhecimentos anatômicos de
Forman. Os examinadores chegaram à conclusão de que seus conhecimentos de
medicina convencional e anatomia eram inadequados, quando não, ridículos.
Assim, pois, recusaram-se a outorgar-lhe a licença para praticar a medicina e
lhe impuseram uma assombrosa multa. Nove meses mais tarde, Forman foi acusado
de haver prescrito uma poção a um homem que, posteriormente, morreu, o que lhe
valera uma nova condenação. Depois de sete anos de conflitos com o colégio de
médicos, a universidade de Cambridge outorgou uma licença a Simon Forman em
1603, se bem que ainda não se encontram declaradas as circunstâncias em que
isso se sucedera. Para sua desgraça, as tentativas de converter-se em um grande
mago e alquimista não tiveram tanto êxito quanto sua prática médica. Ainda que
pareça ter conseguido invocar, em diversas ocasiões, o espírito de um cachorro
preto, nunca conseguiu entrar em contato com uma entidade com a qual pudesse se
comunicar. Suas tentativas de conseguir a Pedra Filosofal resultaram ser tão
custosas e estéreis quanto as de muitos de seus contemporâneos. Existem amplos
registros referentes a praticamente todos os aspectos da vida do dr. Forman.
Graças a eles, sabemos de seu amor por Shakespeare, de seus experimentos
ocultos, dos detalhes de seus conflitos com o colégio de médicos, as vidas de
seus criados, as peculiaridades de seus pacientes e, inclusive, sua própria
vida sexual. Esses diários formam um excelente retrato da vida em Londres, nos
fins do século XVI e início do século XVII. Os manuscritos originais são um dos
tesouros mais estimados da Biblioteca Bodleian de Oxford. Uma semana antes de
sua morte, Forman anunciou à sua esposa que preparasse os trajes da viúva. Uma
semana depois, em uma quinta-feira de setembro de 1611, a profecia se cumpria
enquanto ele cruzava o Tâmisa em um barco. Curiosamente, sua morte também foi
prevista por outro conhecido astrólogo da época, William Lilly. Três anos
depois de sua morte, Forman foi implicado no assassinato de sir Thomas
Overbury. Overbury era o conselheiro de Robert Carr, o favorito da corte.
Morreu em setembro de 1613, enquanto cumpria uma sentença na Torre de Londres
por recusar o cargo de embaixador da Rússia. Em 1615, o tribunal que julgava
Frances Howard (Lady Essex) e sua amiga amante, Anne Turner, chegou à conclusão
de que o dr. Forman havia corrompido, de alguma maneira, as duas mulheres
quando eram suas pacientes (parecia que ele lhes havia dado uma bebida
medicinal para tornar o marido de Lady Essex impotente). A mulher estava
atravessando o inferno de um matrimônio desventurado e estava perdidamente
apaixonada por Robert Carr, entretanto Overbury opunha-se firmemente a essa
relação, o que lhe valeu ser assassinado. A viúva de Forman foi chamada a
declarar, e seus diários foram apresentados como prova, o que serviu para que
como prova, o que serviu para que Anne Turner fosse condenada como autora essencial
do crime; Lady Essex foi expulsa da corte (ainda que mais tarde tenha sido
perdoada) e a memória de Forman recebera uma mancha que lhe faria passar à
história como um personagem sinistro. A pergunta diante de uma biografia tão
formentosa como a de Forman é se realmente as práticas ocultistas servem para
algo. A respostas habitual da maioria das pessoas costuma ser “não”, como reflexo
do que nossa cultura nos programa para crermos. Não obstante, no decorrer da
história, algumas das mentes mais refinadas e das personalidades mais poderosas
de cada época, pessoas muito pouco propensas às perdas inúteis de tempo,
tiveram em conta esse tipo de prática. Muitos desses personagens conservaram,
no decorrer de suas carreiras, seus “magos de cabeceira” e os converteram em
seus conselheiros mais assíduos. No entanto, se analisarmos os diários mágicos
de Simon Forman, veremos que seu conteúdo é completamente consoante com os
estudos modernos sobre os fenômenos psíquicos, trazendo a garantia de que procedem
de uma pessoa com conceitos e marcos de referência completamente diferentes
daqueles com os quais lidamos hoje em dia. Talvez um exemplo contribua para que
compreendamos melhor tudo isso. Um século antes da Revolução Francesa, Luís XIV
se recuperava a duras penas de uma série de desastrosas campanhas militares que
havia esgotado quase por completo os tesouros reais. A nobreza e os cortesãos
sobressaíam-se por seus respeitos, ao passo que o rei tinha assuntos mais
importantes para se preocupar. Fica difícil para uma pessoa de nosso século compreender
o grau de privilégio e de poder pessoal que tinham, naqueles dias, os nascidos
nas classes altas. Versalhes era um redemoinho impetuoso de intriga, corrupção
e sexo (tudo isso em variedades inimagináveis). Aqueles que não tinham mais
opção, exceto habitar naquela atmosfera estressante e competitiva, utilizavam
qualquer coisa que os ajudassem, não para prosperar sobre os outros, mas apenas
para sobreviver. Essas ferramentas eram a coação, a sedução, a chantagem, o suborno
e, quando os métodos mais civilizados falhavam, o veneno e a Magia Negra. Naquela
selva, destacava-se sobre todos um predador cruel e impiedoso, cujo único olhar
despertava o temor nos corações mais cínicos e habituados da corte. Era
Phillippe, duque de Orleans, o sobrinho do rei e uma das pessoas mais unidas ao
trono da França. Era inteligente, excepcionalmente culto, um completo amoral,
assassino sem escrúpulos, bissexual declarado e, desde sua juventude, um
consumado praticante das artes negras. Nas palavras de seu tio, o rei, Phillippe
era “um anuncio ambulante de todo tipo de vício e crime”. À parte disso, era
membro das principais sociedades secretas francesas. Pôde entrar sem
dificuldades nesses círculos graças ao seu pai, o irmão do rei, o qual tinha a
alcunha de “Monsieur”, que não se envergonhava de sua condição de homossexual e
se tornou famoso por ir à batalha montado a cavalo, com a espada em uma das
mãos e uma sombrinha aberta na outra. Parece que o interesse de Phillippe pela
Magia Negra começou quando era bem jovem, convertendo-se em pouco tempo em uma
das figuras principais de uma rede secreta de magos, alquimistas, envenenadores
e alcoviteiros que se estendia desde as linhas mais altas da nobreza francesa
até os mais sórdidos becos das gangues de Paris. Se alguém merecera alguma vez
o qualitativo “satânico”, este foi o duque de Orleans. Nascido para o poder,
considerava-se claramente “mais além do bem e do mal”, nas mesmas condições em
que o tornariam um moderno sociopata. Para mostrar um exemplo de seu absoluto
desprezo pelas normas morais vigentes em sua sociedade, sabe-se que ele
mantinha uma relação incestuosa com sua filha, até que esta se casou. O que
parece é que quando a lua-de-mel havia terminado, o duque de Orleans não viu
motivo algum para que o novo estado civil de sua filha lhe privasse de seu
prazer favorito, tanto que voltou a andar com ela sem que qualquer um pudesse
fazer nada para evita-lo. Como é compreensível, o marido da garota se
encontrava notavelmente perturbado perante uma situação com a qual ele
reconhecia ser incapaz de lidar. Para acalmar os ânimos de seu genro, que
estavam se tornando perigosamente inquietos e turbulentos, o duque decidiu
convidá-lo a jantar em sua casa. Em algum momento entre a sopa e a sobremesa, o
homem caiu no chão fulminado e morreu alguns dias depois em sua cama. Foi assim
que o duque começou a ser alcunhado pelo povo de “Phillippe, o Envenenador”. Há
suspeitas razoáveis por parte dos historiadores sobre sua responsabilidade na
morte do Delfin, o neto de Luís, abrindo assim o caminho para converter-se em
regente da França depois da morte do rei. O fato de que o governante de uma das
nações mais poderosas da Europa fora um assassino em série que fez uso de
muitas de suas noites no oferecimento de sangue de cabras ao diabo, parece algo
próprio de uma novela de uma novela de Stephen King, mas se trata de um fato
histórico documentado. Esse é o mundo em que nasceram os pactos com o Diabo tal
como os conhecemos hoje em dia. Um período em que as “artes negras” estavam em
seu apogeu máximo, seus praticantes eram personagens socialmente influentes e
os livros mágicos e herméticos, uma das influências nas mentes tão
esclarecidas, por exemplo, a de Isaac Newton.
---
Os Sacerdotes de Satã
O polêmico arcebispo Emmanuel Milingo proclamou, em novembro
de 1996: “Núcleos satanistas dentro do clero levam a cabo missas negras no
recinto do Vaticano (...) O Diabo está tão protegido que proíbem ao caçador, ao
exorcista, fazer seu trabalho!” O clero foi, curiosamente, um dos elementos
essenciais da história das relações do homem com o Diabo.
O sacerdócio francês da época de Luis XIV era uma classe
social imensamente empobrecida, e a grande quantidade de sacerdotes ordenados
fazia com que fosse quase impossível que todos pudessem encontrar um posto na
hierarquia funcionarial da Igreja. Muitos deles foram vítimas de uma ilusão de
prosperidade que sacudira muitas famílias humildes da época. Os filhos do
campesinato eram enviados aos seminários, às vezes em condições muito precárias
e a custo de grandes sacrifícios por parte de suas famílias, para que a igreja
lhes desse educação e um meio de vida que seus pais não lhes podiam
proporcionar. No outro extremo da escala social, os segundos filhos da
aristocracia eram consagrados à Igreja de modo a evitar problemas com os
legados e para que fossem divididos os grandes patrimônios da oligarquia
francesa. Essa situação conduziu, ao longo dos anos, a que um grande número de
pessoas especializadas nos rituais da Igreja não tivesse paróquia alguma para
ganhar a vida. A única forma que essas pessoas tinham de obter receitas parcas
era vendendo seus serviços a quem pagasse melhor. Em que consistiam esses
serviços? Basicamente na celebração de missas pagãs, com o objetivo de
proporcionar ao cliente algum tipo de benefício. Assim, chegaram a ser
celebradas missas petitórias solicitando a sedução de uma garota, o aumento da
riqueza ou, até mesmo, a morte de um inimigo. Do ponto de vista de um sacerdote
do século XVI ou XVII, não havia nada particularmente contraditório em tais
ações. Eram sacerdotes, homens de Deus consagrados. A Igreja lhes havia investido,
em nome de Deus todo-poderoso, uma série de atribuições que eles tinham a
liberdade de utilizar como melhor considerassem, especialmente lhes servia para
que não fossem para a cama com o estômago vazio. A missa era considerada um ato
mágico dotado de poder em si mesmo, sem levar em conta o propósito pelo qual a
missa era celebrada. Essa prática se converteu em algo tão comum que ocorreu o
caso de um sacerdote executado publicamente por tentativa de assassinato ao
aceitar, em troca de uma substancial quantia em dinheiro, oferecer uma missa
fúnebre em nome de alguém ainda vivo com o objetivo de conseguir sua morte. O
misticismo cristão tem raízes mágicas evidentes e, se estudássemos a história
da Igreja antiga, descobriríamos que muitos sacerdotes eram realmente
feiticeiros, indistinguíveis em sua atuação daqueles de outras tradições nas
quais a presença mágica parece muito mais evidente. Dessa forma, a missa
poderia ser considerada, sem dificuldades, um ato mágico. Cabe recordar que
existem muito mais formas de Magia que aquele estereotipado pronunciamento de
feitiços. A Teurgia – que implica oração, um ritual religioso e meditação – é uma
forma de Magia voltada ao estabelecimento de uma comunhão com os deuses.
Geralmente, emprega-se essa forma de Magia para criar um fluxo de energia entre
o praticante e sua ideia de divindade. Se meditarmos a respeito, descobriremos
que o mesmo propósito está contido na missa católica e que culmina no ato
ritual da Eucaristia. O pão e o vinho convertem-se no corpo e no sangue de
Cristo porque Jesus, que é uma manifestação de Deus, assim o disse. Visto dessa
maneira, encontramo-nos perante uma poderosa forma de Magia. Tradicionalmente,
é conhecido o costume dos feiticeiros de pronunciar a fórmula “Hocus pocus” no
momento da realização de um ato de Magia. “Hocus pocus” é um jogo de palavras
retirado do que dizia Jesus na Bíblia latina: “Hoc est corpus meum”, que
significa “Este é meu corpo” (Coríntios, 11:24). O mago pretendia apoiar-se de
alguma maneira na doutrina da presença verdadeira de Cristo na Eucaristia.
Compreendia o fato de que o sacerdote realizava um ato de Magia na missa quando
pronunciava a frase latina “hoc est corpus meum” e pretendia explorar assim o
poder inerente ao sacerdócio.
Ainda que esses sacerdotes mercenários não estivessem sempre
implicados em práticas tão elevadas e espirituais, certa senhora de Lusignan
foi surpreendida em companhia de um sacerdote, enquanto saltavam e brincavam
alegremente desnudos no bosque e praticavam “abominações” com a ajuda de um
grosso círio pascal. Embora a maioria desses personagens tenha limitado suas
atividades aos rituais ortodoxos da Igreja, houve aqueles que atravessaram a
fronteira, tornando assim o Satanismo e a Magia Negra práticas consagradas.
Conjuravam demônios, fabricavam talismãs para seus clientes e celebravam a famosa
e legendária missa negra, que tinha de ser oficiada por um sacerdote apóstata.
Isso não pressupunha qualquer dificuldade, pois, por aqueles dias, havia uma
abundância desse tipo de sacerdotes.
O papa Honório III (1216-27) é o presumido autor do grande
grimório de Honório, o Grande, que compila uma série de cerimônias projetadas
expressamente para serem realizadas por um sacerdote católico, e o conteúdo do
livro implica que fora escrito por alguém iniciado nos ritos da Igreja: “Este é
o livro de Magia Negra considerado, geralmente pelos escritores especializados
em ciências ocultas, o trabalho mais diabólico da história da magia”, disse uma
vez, para descrevê-lo, o autor Idries Shah. O livro pretende ter saído da pena
de Honório, mas muitos escritores católicos denunciam-no como uma falsificação.
Escrito originalmente em latim, o livro não obteve qualquer opinião a seu favor
entre os magos até o século XVII. Sua introdução afirma oferecer aos magos “as
chaves do reino dos céus” a capacidade “de invocar o príncipe das trevas e os
anjos que são seus criados”. A obra inclui uma curiosa bula papal que proclama:
“Nós, o Pontífice (...) temos a intenção e o desejo de comunicar este poder
sobre os espíritos que possuímos e que, até este momento, fora conhecido
somente por aqueles de nossa classe. Pela inspiração de Deus, desejamos
transmitir e compartilhar este poder com nossos irmãos respeitados e nossos
queridos filhos em Jesus Cristo”. Na preparação do ritual, o livro aconselha
que o mago “deva, em primeiro lugar, jejuar durante três dias. Depois disso,
deve confessar-se e prostrar-se perante o altar da Igreja...” Uma vez cumpridos
esses requisitos prévios, o mago “deve procurar um galo preto, ao qual matará
depois do pôr-do-sol e do qual extrairá a primeira pena da asa esquerda, a qual
será guardada cuidadosamente. Então, os olhos deste são removidos e estes,
juntamente com a língua e o coração, devem secar ao sol e serem pulverizados.”
Depois de uma série de operações que implicava consagrações, uma missa, os cânticos,
orações, a preparação de pergaminho mágico com a pele de um cordeiro macho
degolado e a preparação de um círculo mágico, poderia começar a grande
conjuração: “Conjuro-te neste círculo, ó maldito (nome do espírito)... que
atrevestes a desobedecer a Deus. Vem, agora (nome do espírito), obedeça a mim e
cumpra com meus desejos”. Depois de fazer o pedido, o mago era instruído sobre
a forma adequada de mandar o demônio embora, usando “a ordem do pentáculo” e
uma oração que era concluída da seguinte forma: “Toda honra e toda glória
àquele que está no trono, o que é eterno. Amém”.
Honorius era igualmente famoso nos círculos ocultos por
aprovar a formação da ordem dominicana em 1220. Chamados de os “monges negros”
ou os “frades de negro”, os dominicanos formaram mais tarde a maior parte do
molde da Inquisição, enviando para a tortura e para a morte incontáveis
inocentes que, no que se refere à prática da Magia Negra, encontravam-se muito
longe de muitos membros do próprio clero.
A.E. Waite, em seu “Livro de Magia Cerimonial”, considera
ridícula a ideia de que o papa estava por trás da redação deste grimório, se
bem que aceita a participação de membros do clero nesse tipo de atividades. De
fato, deixando de um lado a improvável situação de que um papa se vira
implicado em tais feitos, considera-se que o mais provável seja este livro ter
sido escrito por um sacerdote renegado. O entendimento que mostra o autor da
função e do planejamento do ritual é sofisticado e elegante. Fosse quem fosse a
pessoa que concebera o cerimonial deste grimório, possuía visão e compreensão
do poder da liturgia católica do que carece a imensa maioria dos grimórios.
As raízes literárias de outros livros de Magia conhecidos
são ainda mais insuspeitadas. No período em que foram publicados pela primeira
vez, a colônia do Haiti era uma das possessões mais ricas e apreciadas da França.
Ainda que esse não seja o lugar para ingressar em uma discussão histórica a
respeito do assunto, a maioria dos historiadores tem consciência da brutalidade
que foi mostrada em relação aos escravos negros importados (milhões deles foram
levados à ilha durante todo o período colonial) por parte de seus senhores
cristãos. A prática da religião africana foi terminantemente proibida pelos
governantes da ilha, se bem que a população de escravos era tão grande que ninguém
poderia garantir que eles não realizariam, em segredo, suas cerimônias
tradicionais. Durante o tempo em que o Haiti foi território francês, não foram
poucos os europeus que mostraram interesse por esses ritos africanos e que os
estudaram com o propósito de incorporá-los a seus próprios sistemas de
bruxaria. Ao contrário do que ocorria na América do Norte, ali os brancos
mantiveram relações pessoais muito estreitas com seus escravos, o que podemos
comprovar pela altíssima porcentagem de mulatos que, inclusive hoje em dia,
podem ser vistos na ilha. Parece provável que, graças a essa relação íntima,
alguns brancos tenham obtido o privilégio de ser iniciados na tradição ritual
africana, a qual, mais tarde, foi assimilada pela Magia europeia por intermédio
deles. Essa influência pode ser percebida em alguns famosos tratados de Magia
Negra, naqueles em que o aspecto ritual adquire uma importância desconhecida
até então. Os grimórios clássicos não contém rituais especialmente complexos.
Os livros, como o “Lemegeton” e a “Clavícula de Salomão”, falam de espíritos e
talismãs, além de incluírem conjurações e ameaças a serem repetidos pelo feiticeiro
até conseguir que as entidades a serem convocadas cumpram com sua vontade.
Não obstante, existem outros rituais nos quais é necessário,
como etapa prévia à sua execução, que haja um longo período de purificação e de
sacrifício, assim como a criação ritual das ferramentas apropriadas para
realizar a liturgia. No caso do ritual atribuído a Honório III, esse processo
estende-se durante um mês. Isso constitui um inegável paralelismo com os
rituais afro-caribenhos praticados diariamente em cada grande cidade do
Hemisfério Ocidental. Essas religiões estão a caminho de converter-se em um
pujante fenômeno espiritual que já transcendera com seu crescimento as fronteiras
geográficas e culturais que as viram nascer. Apenas nos Estados Unidos, é
estimado que existam uns cinco milhões de praticantes de Santería (conjunto de
sistemas religiosos que misturam crenças Católicas-Cristãs com as do Yorubá
tradicional). A Santería não é uma religião arcaica. É uma força vibrante com
500 anos de história ininterrupta no Hemisfério Ocidental e cujas raízes
africanas são pelo menos tão antigas e profundas como as do Cristianismo. São
milhões de praticantes nos Estados Unidos, no Caribe, na América do Sul, na
América Central e na Europa. Existe o Vodu no Haiti, a Macumba no Brasil e o Candomblé
nas costas do Norte da América do Sul. Seus adeptos procedem de todas as
classes sociais: médicos, advogados, políticos, ladrões e prostitutas. Todos
eles buscam obter o poder de controlar suas próprias vidas e conduzi-las
segundo seu critério. Os sistemas de crença tradicionais do mundo Ocidental não
têm uma participação emocional direta dos mistérios da vida, motivo pelo qual,
cada vez mais pessoas buscam respostas no vibrante ritmo dos tambores santeiros.
É uma religião de transe, de mistério, de possessão, de sangue e de sexo. Pouco
pode ser feito pelas páginas de um livro para transmitir a verdadeira essência
dessa liturgia. Se queres conhecer de verdade a Santería, é preciso frequentar
as cerimônias, fazer uma oferenda e dançar ao som dos tambores. A cor da pele
ou o lugar de nascimento não formam qualquer barreira. Os Deuses Antigos
reconhecem os seus. A Santería, ou mais corretamente, a Regla de Ocha, é uma
religião originária da África. Foi levada ao Novo Mundo pelos Yorubás da costa
ocidental da África, que hoje em dia são a Nigéria e Dahomey, uma região onde a
atividade dos traficantes de escravos foi especialmente intensa. Quando os
africanos chegaram à América, tiveram que adaptar sua religião para continuar
praticando-a, evitando o controle dos brancos. Mascararam seus orixás (as
deidades da religião Yorubá), fazendo com que eles adotassem a identidade dos
santos cristãos. Os donos das plantações assumiram a ideia de que os escravos
tinham se convertido em devotos católicos quando, na verdade, continuavam
adorando secretamente seus Orixás. O panorama político e cultural na terra dos
Yorubás era muito similar ao da Grécia Clássica; existia uma série de
cidades-estado livremente associadas. Cada cidade estava consagrada a um Orixá
e esse era seu centro de adoração. Se alguém fosse designado a ser sacerdote de
Oxum, por exemplo, essa pessoa deveria ir a Osogbo, cidade na qual havia lugar,
cidade na qual havia lugar para sua iniciação e onde tal pessoa viveria para
sempre. Essas cidades sofriam saques periódicos por parte dos traficantes de
escravos. Dessa forma, adoradores dos diferentes deuses do panteão Yorubá
viram-se obrigados a conviver no Novo Mundo. Chamavam-se entre si “Lukumí”, uma
expressão yorubá que significa “meu amigo”. Dessa maneira, eles podiam
identificar-se e diferenciar-se do restante dos escravos, procedentes de outras
regiões, como o Congo. A situação anômala de sobrevivência que presumia a
existência da escravidão fez com que os Lukumí se vissem obrigados a adaptar
sua religião às circunstâncias. Na África, cada um deles estaria sob a proteção
de um Orixá à parte de ser consagrado a Elegba. Entretanto, no Novo Mundo,
perderam-se alguns sacerdócios dos Orixás menos comuns. Os sacerdotes começaram
a temer pela adoração de seu respectivo Orixá assim que decidiram consolidar
suas práticas religiosas por meio de um sistema de iniciações que culminava com
o sacerdócio, no qual, diferentemente dos costumes africanos, o indivíduo recebia
cinco ou seis Orixás. Essa adaptação demonstrou ser extremamente eficaz para
manter o culto entre os escravos. A América foi um terreno especialmente fértil
para o enraizamento das religiões tradicionais africanas e, hoje em dia, os Estados
Unidos constituem um foco de grande expansão dessas crenças. Muitos
afro-americanos buscam suas raízes por intermédio da espiritualidade da terra
de onde foram arrancados seus antepassados e voltam-se à Santería em busca de
uma parte de sua identidade. Os Orixás não são entidades malvadas, ao
contrário, poderíamos considera-los o equivalente aos anjos cristãos. A imagem
negativa associada à Santería foi, em grande parte, inventada pelos meios de
comunicação sensacionalistas e os exageros de Hollywood. Curiosamente, a
Santería foi condenada e caluniada pela Igreja católica como uma bárbara, primitiva,
arcaica e demoníaca. Contudo, os Orixás e sua religião mantiveram-se mais vivos
do que nunca.
(continua...)
---------------------------------------------
Do Manual do Tarô Astrológico e Cabalístico, de Atílio Morris =
Atribuições Às Letras do Alfabeto Hebraico =
Aleph : O
primeiro som, a primeira letra, unidade, princípio, força, atividade, poder,
estabilidade, o homem como unidade coletiva
Beth : O interior
ativo, o poder plasmante, o germe, paternidade, o Criador, a habitação, o
objeto central
Ghimel : O sinal
do organismo, envolvimento material do corpo, seus órgãos e suas funções
Daleth : A
natureza divisível, abundância, divisão, nutrição
He : O fôlego,
princípio vivificador, vida absoluta e de toda ideia abstrata do ser, alma,
espírito
Vau : O nó que
liga ou um ponto que separa o Ser e o Não Ser, o que faz passar de uma natureza
à outra
Zain : A
tendência, o esforço dirigido a um fim, a causa final, a refração luminosa, a
indicação
Heth ou Chasid : A existência elementar,
rudimentar, equilíbrio, o calor, trabalho e ação moral e legislativa
Teth : A
resistência e proteção, teto, abrigo, refúgio, conservação, renovação, os dois
princípios: o bem e o mal
Iod : A
Divindade, manifestação potencial, duração espiritual, eternidade, como
consoante designa duração material
Caph ou Káf : Assimilação, afinidade, coesão,
vida refletida e passageira, fôrma, molde, objetos
Lamed : A idéia
de extensão, elevação, ocupação, expansão, possessão, instrução, desenvolvimento
Mem : A
maternidade, fecundidade, formação plástica, ação exterior, passividade, água,
líquido, fluidez
Nun : O Ser
produzido ou refletido, a existência individual e corporal, o filho, fruto,
geração
Samech : O
movimento circular, a circunferência, a renovação cíclica, o universo
Ayin ou Aín : A idéia de matéria, as relações
físicas, ruído, vento, vazio, o que é desarmônico, confuso, falso, perverso
Phe : A palavra,
a boca, o pensamento, o ensino, a cópula, a beleza
Tzadi ou Tsádhe : O pensamento fixo em algum
propósito, vontade, ordem, sugestão, termo, alvo, solução, cisão
Kuph ou Qof : A compreensão, arma ofensiva,
golpe, ferida, dano, designa também voz, escrita, letra, lei
Resh : A cabeça
humana, a unidade psíquica do Ser, a faculdade de sentir, querer e pensar, o
movimento, a reflexão, a origem, a repetição
Shin : A imagem
de renovação das coisas quanto a seu movimento, existência, duração relativa,
transformação, vegetação, reinos da natureza
Tav ou Tau : É o sinal dos sinais, simboliza a
reciprocidade, a abundância, a resistência, a proteção, a perfeição
---------------------------------------------
FONTE: VODU Fenômenos Psíquicos da Jamaica, De: Joseph
Williams, Editora: MADRAS
Em Notes and Queries, Londres, 25 de janeiro de 1851,
encontramos a seguinte comunicação: “Algum de seus leitores pode me dar alguma
informação sobre obeísmo. Estou curioso em saber se essa prática é uma religião
em si mesma, ou meramente um rito praticado em alguma religião africana e que
foi trazido de lá para as Índias Ocidentais(onde, segundo fui informado, está
rapidamente encontrando novos adeptos); e se o praticante obeísta adquire esse
imenso poder, que supostamente tem sobre seus irmãos negros, através de uma
arte, ou apenas atuando sobre as mentes mais supersticiosas de seus
companheiros. Qualquer informação sobre o assunto será de grande valia”.T.H.,
Mincing Lane, 10 de janeiro de 1851.
Essa pergunta recebeu muitas respostas. Na edição de 22 de
fevereiro de 1851, lemos a seguinte declaração: “Como nosso correspondente
deseja qualquer informação sobre obeísmo, na falta de algo melhor e mais
completo, ofereço minha pequena colaboração: no início deste século, os
escravos das Índias Ocidentais falavam(mais como uma superstição do que como
“religião” ou rito)da existência de um poder- alegado por seus praticantes e
confirmado pelos pacientes -, que causava bem ou mal, e que era sempre
empregado por uma “consideração” de algum tipo, por vantagem, quer honorífica,
pecuniária, ou de outra espécie daquele que a concedia. Isso ocorre pela
influência falsa de certos feitiços, cerimônias, fetiches, ou outros
encantamentos, praticados com maior ou menor diversidade de adeptos, mágicos e
conjuradores, falsos profetas de todas as épocas e países, etc. O autor
acredita que o obeísmo está em declínio e assina simplesmente M.
Na mesma edição, encontramos outra resposta: “Quanto à
pergunta de T.H. em relação ao obeísmo, embora eu não possa dar uma resposta
completa no que diz respeito à origem, etc.., acredito que o conhecimento que
tenho possa vir a acrescentar algo de valor às informações apresentadas por correspondentes mais abalisados. Visitei a
ilha da Jamaica por um breve período de tempo e pelo que pude aprender sobre o
obeísmo, o poder parece ser obtido pelo praticante pela atuação sobre os medos
de seus companheiros negros, que são conhecidamente supersticiosos. O principal
fetiche parece ser uma mistura de penas, pedaços de caixões funerários e outros
ingredientes dos quais não me lembro agora. Acredita-se que um pequeno pacote
formado com esses elementos, preso à porta de entrada da vítima, ou colocado em
seu caminho, tem o poder de trazer má sorte ao desafortunado indivíduo; e se
qualquer acidente, perda ou doença lhe sobrevier, esse fato será atribuído à
temível influência da obeah! Mas já ouvi falar de casos em que a pobre vítima
definha lentamente e morre, devido a tal poderoso encantamento que, segundo fui
informado por antigos residentes da ilha, deve ser atribuído a causas mais
naturais, especificamente, influência de veneno. O praticante obeah coloca uma
certa quantia de vidro moído na comida da pessoa que o desagradou e o resultado
é a morte lenta e com sofrimento! Talvez alguns dos leitores médicos possam
confirmar se uma infusão de vidro moído causaria esse efeito. Eu simplesmente
estou relatando a informação que recebi de outras pessoas, etc.” Essa carta foi
assinada por D.P.W.
Na edição de 19 de abril de 1851, uma carta assinada por
T.J. dá uma certa quantidade de referências para mostrar que o “obeísmo não é
apenas um rito, mas uma religião, ou melhor dizendo, uma superstição”. Mais
adiante o autor declara que “a influência obeísta não depende do exercício de
nenhuma arte ou magia natural, mas na idéia do mal infundida na mente da
vítima”.
Em Notes and Queries de 10 de março de 1851, Henry H. Breen,
escrevendo de Santa Lucia, insiste: “Obeísmo não é uma religião em si mesma,
exceto no sentido dado por Burke que afirma: ‘a superstição é a religião das
mentes fracas’. É uma crença, real ou fingida, na eficácia de certos
encantamentos e feitiços; e significa para os negros sem instrução a mesma
coisa que a magia representava para nossos ignorantes ancestrais. Em Santa
Lucia essa superstição é conhecida como kembois. Ainda é muito praticada nas
Índias Ocidentais, mas não há razão para supor que está se difundindo
rapidamente.”
Enquanto o interesse despertado pelo assunto ainda era
intenso, o Medical Times publicou um relato escrito pelo Dr. Stobo de Tortula,
nas Ilhas Virgens, sobre o peculiar caso do nascimento de uma criança que fora
seguido de sintomas impossíveis de serem diagnosticados pelo médico, embora ele
não acredite na explicação do paciente, segunda a qual ela era uma vítima de
obeah. O título do artigo é: “Spasmodic Action of the Uterus – Obeism”, e o
fato principal do caso é assim narrado: “Ann Eliza Smith, de 50 anos, Sambo,
doméstica, mãe de três filhos, sofreu um aborto entre o primeiro e o segundo
filho. Durante esse período ela esteve em más condições de saúde. A mulher
acreditava, e ainda acredita, ter sido vítima de obeah”. O editor do Medical
Times acrescenta a seguinte informação em uma nota de rodapé: “Obeísmo era uma
espécie de feitiçaria empregada como vingança, ou proteção contra roubo. O nome
deriva de Obi, a cidade, distrito, ou província da África do Sul (sic) de onde
se originou. Consiste em fazer um encantamento, ou colocar um fetiche perto da
casa do indivíduo que sofrerá sua influência, ou, quando praticada para
prevenir contra roubos, coloca-se o fetiche em alguma parte visível da casa ou
em uma árvore. O fetiche é uma cabaça, ou cabaço, contendo, entre outros
ingredientes, uma combinação de diferentes trapos coloridos, dentes de gato,
penas de papagaio, patas de rã, cascas de ovo, espinhas de peixe e caudas de
lagarto. O pânico imediatamente toma conta do indivíduo que o vê; e, seja
porque a vítima se entrega ao desespero, ou devido à secreta administração de
veneno, em muitos casos a morte é a consequência inevitável”. O editor
acrescenta logo a seguir: “Apresentaremos, agora, o relato de uma superstição
como foi descrita por uma testemunha em um julgamento que ocorreu alguns anos
atrás:
‘Você tem conhecimento de que o prisioneiro é um praticante
obeah?’
‘Sim senhor! Um verdadeiro tomador de sombra.’
‘O que você quer dizer com tomador de sombra?’
‘Ele tem um caixão.’ (aqui, um pequeno caixão foi
apresentado)
‘A que sombra você se refere?’
‘Quando ele faz obeah para alguém, pega a sombra dessa
pessoa, e a pessoa morre.’”
Esse exemplo foi tirado de A Pratical View of the Presente
State of Slavery in the West Indies, Londres, 1828, p. 185, embora nenhum crédito
seja dado ao editor que o cita no The Medical Times.
Em Notes and Queries de 15 de julho de 1899, um artigo
assinado por James Platt, Jun. Afirma: “Obi, obeah – A origem desse conhecido
termo das Índias Ocidentais não está definida com exatidão em nenhum dos nossos
dicionários. Encontramos explicações como ‘provavelmente de origem africana’
(Webster e Chambers); ‘supostamente trazida da África (Worcester). A citação a
seguir, do Dicionário Hugh Goldie da Língua Efik (do antigo Calabar), Glasglow,
1874, p. 300, parece solucionar a questão, e é de interesse tanto para os
etimologistas quanto para os estudiosos de folclore: ‘Ubio, uma coisa, ou
mistura de coisas, colocada no chão, como um fetiche para causar doença ou
morte. A obeah das Índias Ocidentais’”.
Essa curta nota produziu grandes efeitos, ou pelo menos a
influência de seu autor se fez sentir rapidamente. Pois o Dicionbário Oxford
logo em seguida aceitou a sugestão de Mr. Platt e descreveu a obeah com suas
variações obi, obia, obea, obeeah, como ‘uma palavra da África ocidental: cf.
Efik ubio – uma coisa, ou mistura de coisas, colocada ao chão, como um fetiche,
para causar doença ou morte’, e cita como fonte o Dicionário Goldie de Efik,
1874.
Em Voodos and Obeahs mostrei que o mialismo é a antítese
direta da obeah; é o remanescente da antiga dança religiosa dos ashanti.
Portanto, a obeah é secreta, maliciosa, e gradualmente assumiu uma forma de
adoração do demônio. O mialismo, pelo contrário, é praticado publicamente. É
benéfico em seus propósitos, e se transformou no moderno renascimento na Jamaica.
Na prática, porém, o mesmo indivíduo é frequentemente um praticante obeah à
noite e um praticante mialista durante o dia, quando ele “retira da terra” a
mesma obeah que plantou enquanto exercia a outra função.
Entre os ashantis da África Ocidental havia um sistema
religioso claramente definido em que o Ser Supremo, Onyame, era mais
popularmente conhecido pelo título de Nyankopon, que significa Onyame, o único,
o grande. Subordinados ao Ser Supremo estavam numerosos guardiões, entidades
menores ou espíritos, que agiam como mediadores entre Deus e os homens e que
mereciam um lugar de destaque nas observâncias religiosas, uma vez que o
próprio Deus era considerado tão distante que, de modo geral, só podia ser
alcançado por seus mediadores, exceto em caso de uma necessidade específica,
quando as pessoas se dirigiam a Ele diretamente. Consequentemente, embora o Ser
Supremo tivesse entre os ashantis um templo e um sacerdócio regular para o qual
eram necessários três anos de noviciado, nas questões diárias mais comuns a
interferência dos guardiões subordinados era solicitada, pois eles eram
considerados mais acessíveis e, como resultado, o okomfo, ou sacerdote, desses
vários espíritos exercia uma influência dominante sobre a vida geral dos
ashantis, tanto como povo quanto individualmente. Era prerrogativa do okomfo
não apenas conduzir o serviço religioso dos santuários das divindades menores,
mas também imbuir o amuleto da sorte de sua potência característica. Ele fazia
isso não somente pela invocação direta do Ser Supremo, mas especialmente pelos
espíritos intermediários, pois eles eram associados às questões humanas. Todos
esses ritos e práticas que caracterizam os principais eventos da vida, tais
como nascimento, casamento ou morte, tinham um claro caráter religioso. O mesmo
acontecia com as celebrações cívicas ou nacionais, e mesmo com a preparação
para a guerra ou a coroação de um chefe absoluto.
“O significado secundário do obonsam dá evidências de que os
ashantis acreditavam na existência de um demônio, ou espírito malévolo, pessoal
que reinava sobre os espíritos dos homens vis que morreram.” (Capitão Rattray)
Como uma derivação dessa palavra, temos sasabonsam que,
segundo Christaller “é um ser imaginário monstruoso, concebido com um grande
corpo com forma humana, mas de uma cor vermelha e com o cabelo muito comprido;
e que habita nos locais mais remotos da floresta, onde uma imensa árvore é sua
residência. Ele é inimigo dos homens, principalmente dos sacerdotes, mas é
amigo e líder dos feiticeiros e bruxos”.
O capitão Rattray declara que o poder do sasabonsam “é
puramente para maldade e feitiçaria”, e mais adiante afirma: “O sasabonsam da
Costa do Ouro e dos ashantis é um monstro que, acredita-se, habita regiões das
densas matas virgens. Ele é coberto por longos cabelos, tem grandes olhos
vermelhos, pernas compridas e pés que apontam para ambos os lados. Senta-se nos
galhos mais altos de uma árvore odum ou onyina e balança as pernas, agarrando
assim o caçador desavisado. O ser é hostil aos homens e é inimigo da classe
sacerdotal. Acredita-se que os caçadores que entram na floresta e desaparecem –
como às vezes acontece – foram pegos pelo sasabonsam”.
Temos aqui uma clara distinção teórica entre o demônio
ashanti – bonsam – e esse fabuloso monstro da floresta, o sasabonsam. Mas,
assim como em inglês, o termo demônio é usado indiscriminadamente tanto para
Satã quanto para seus asseclas; também na prática a palavra ashanti sasabonsam
é usada como um eufemismo para bonsam, já que não é bom nem ao menos mencionar
os nomes dos mortos, pois seus espíritos podem assombrá-lo.
A palavra ashanti para feiticeiro era obayifo, e o capitão
Rattray nos dá a seguinte informação sobre esse interessante assunto: “Obayifo,
derivação bayi, feitiçaria (termo sinônimo ayen), um mágico, ou de modo mais
geral é um feiticeiro. Um tipo de vampiro humano, cujo principal prazer é sugar
o sangue de crianças que, por essa razão, definham e morrem. Acredita-se que
homens e mulheres possuídos por essa magia negra têm poderes controlados pela vontade,
sendo capazes de deixar o próprio corpo e viajar grandes distâncias à noite.
Além de sugar o sangue das vítimas, eles supostamente têm a capacidade de
extrair a seiva e o sumo das plantas. (Casis de destruição de coqueiros foram
atribuídos a obayifos.) Esses feiticeiros têm aparência comum, e um homem nunca
sabe se seu amigo, ou sua mulher, é um deles. Quando estão perambulando à
noite, irradiam uma luz fosforescente das axilas e dos ânus. Um obayifo na vida
diária é conhecido por ter olhos penetrantes que estão sempre em movimento; e
por um interesse inadequado em comida, sempre falando no assunto,
principalmente sobre carne, e aproximando-se quando alguém está cozinhando.
Todos esses hábitos são propositadamente evitados. Um homem raramente negará a
outro, ainda que seja um estranho, uma porção do que estiver comendo; e um
caçador sempre dará um pedaço da carne crua se alguém pedir, esperando evitar a
insatisfação de uma pessoa que, até onde se sabe, pode ser um feiticeiro ou
mago”.
Recentemente, no Congresso Antropológico em Londres,
Modjaben Dowuona, Esq., nativo da África Ocidental e um dos vice-presidentes da
Seção Africana do Congresso, apresentou um trabalho interessante e erudito
sobre feitiçaria.
O Sr. Dowuona, desta forma, remonta a obeah da Jamaica por
meio de obayifo de ashantis, uma bruxa, para o termo bruxaria, bayi,
significando literalmente “levando as crianças embora”. Esse ponto de vista foi
sustentado por Christaller, que tirou bayi, bruxaria, de oba, criança e yi,
para extrair e transformar obayifo em bruxa ou feiticeira. Christaller também
dá como sinônimo ayen com obaayen, um composta de obaa, mulher e ayen, como a
forma feminina. E, provavelmente, foi de obayen que a palavra jamaicana obeah
derivou diretamente.
Os ashantis foram levados em grande número para a Jamaica
pelos comerciantes de escravos. Naturalmente levaram consigo todas as suas
antigas tradições e crenças que procuravam colocar em prática no novo ambiente
que os cercava. Sendo um povo fortemente religioso, ainda que escravos em uma
terra estranha, eles instintivamente voltavam-se abertamente para o okomfo em
busca de orientação e consolo, ao mesmo tempo em que, necessariamente, temiam
as maquinações secretas dos abomináveis obayifo. Esse temor rapidamente se
espalhou pela população escrava em geral, e foi e ssa influência maléfica, mais
do que qualquer outra coisa, que deu aos ashantis o controle sobre todas as
outras tribos na Jamaica.
Desde o início do estabelecimento de uma legislação na
Jamaica, reconheceu-se que as reuniões de escravos que eram marcadas por
antigas danças tribais representavam perigo para a colônia. Essas cerimônias
eram abertamente acompanhadas por uma batida de tambor que evidentemente
incitava o fanatismo dos africanos a ponto de provocar uma rebelião geral.
Em sua obra Ashanti, o capitão Rattray traz um capítulo
muito elucidativo sobre a “Linguagem dos Tambores”. Há relatos inacreditáveis
sobre a rapidez com que as notícias são transmitidas por toda a África por meio
dos assim chamados “tambores falantes”, e acredita-se que algo semelhante ao
código Morse seja utilizado com esse propósito. Agora sabemos o que realmente
acontece: dois tambores são afinados em tons diferentes – são conhecidos como
tambor macho e tambor fêmea; o primeiro com um tom baixo e o segundo com um tom
alto. Esses tambores são manipulados de modo que a entonação musical, nos casos
de línguas distintamente tonais como a ashanti, é tão precisa que se torna
inteligível, como se uma palavra tivesse sido falada.
Podemos afirmar que o processo conduzido pelos ashantis é
tão eficiente que temos gravada, por exemplo, a história dos mampons em um
recital de tambor que preservou “um registro preciso das migrações do clã desde
os tempos remotos quando os manpons estabeleceram-se em Adanse, e também os
nomes, feitos e atributos físicos de seus antigos governantes”.
De fato, a exigência de precisão é tão minuciosa que: “Um
tocador de tambor que falhe e ‘diga’ uma palavra errada pode ser punido com uma
multa de uma ovelha, e, no passado, se ele continuasse a errar poderia ter uma
orelha cortada”. O tocador deve ser muito habilidoso antes de demonstrar
publicamente sua proficiência, pois a audiência inteira estará checando todas
as palavras em cada recitação.
Na Jamaica, as reuniões religiosas dos nativos eram
proibidas por lei, o que muito prejudicava o okomfo em sua esfera de
influência; até mesmo o seu título fora mudado para “praticante mialista”,
enquanto o obayifo ou “praticante obeah”, que sempre trabalhara em segredo,
aumentava seu poder.
Como a veneração pública aos deuses não era mais possível, o
okomfo foi obrigado a agir em segredo, e não é de se surpreender que ele
combateu fogo com fogo, encantamento com encantamento. O objetivo principal de
sua religião era o bem estar da comunidade, assim como o objetivo da vida do
obayifo era prejudicar o indivíduo.
Assim, com o passar do tempo, era o okomfo, e não o obayifo,
como se acreditava, quem administrava o terrível juramento de fetiche. Era ele
quem combinava a pólvora com o rum e acrescentava pó das tumbas e sangue humano
para fazer a mistura que selava sobre os lábios dos conspiradores a horrível
natureza da trama para a liberdade, e roubava seus corações para a perigosa
empreitada. Era ele, e ninguém mais, que criava o pó místico que tornaria seus
corpos invulneráveis às balas do homem branco. Finalmenmte, era o okomfo, e não
o obayifo, que, aproveitando-se de seu conhecimento sobre ervas, induzia um
estado de torpor aos colaboradores subservientes, de modo que ele dava a
impressão de ser capaz de trazer os mortos de volta à vida.
Edward Long, o primeiro historiador a mencionar a arte
obeah, juntou-se à Assembleia da Jamaica (...) Seus registros, portanto podem
ser considerados um relato fiel do que era comumente aceito pela crença popular
da época em relação à obeah. Assim ele escreve quanto aos escravos: “eles
acreditam realmente em aparições de espectros. Os espíritos do colegas mortos
são amigáveis; outros, de aspectos mais
hostís, são chamados bugaboos. Os mais sensatos entre os escravos temem
os poderes sobrenaturais dos praticantes obeah africanos, ou supostos
conjuradores, frequentemente atribuindo os efeitos mortais à magia, quando, na
verdade, são apenas os efeitos naturais de alguma substância venenosa,
habilmente administrada por esses malfeitores. Mas os creoles imaginam que as
virtudes do batismo, ou o ato de torná-los cristãos, torna a arte obeah
totalmente ineficaz; e por essa razão muitos desejaram ser batizados, para que
possam escapar da obeah."
Praticante obeah tem um grande temor dos padres e geralmente
tanta evitar a presença deles. Existe a convicção entre seu grupo que o padre
pode exercer uma influência mais forte que a obeah.
Também é aceito como um fato pelos devotos do culto à obeah
que o padre pode demonstrar seu poder dominante “acendendo uma vela sobre eles”.
Esse processo é assim descrito: “Padre pega alfinete e pega vela, e ele espeta
a vela com alfinete; e ele acende a vela em você. Vela queima, queima, queima.
E você enfraquece, enfraquece, enfraquece. E quando a chama toca o alfinete,
você morre”.
Certa vez, um conhecido praticante obeah procurou-me
expressando seu desejo de tornar-se católico exatamente com o objetivo de
adquirir esse fantasioso poder da vela acesa.
(continua...)
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Devolvo toda a glória ao Dr. Alashira pelas coisas maravilhosas que ele fez na vida de minha família desde que o conheci. Especialmente por encerrar a estéril de 10 anos em minha família com o bebê. Minha esposa e eu nos casamos em agosto de 2008, mas tivemos desafios de fruto do útero desde então. Eu vim com vários desafios notáveis, entre os quais onde o desemprego, os problemas acadêmicos e a falta de filhos, mas o Dr. Alashira me entregou um após o outro através de um encontro em diferentes testemunhos que eu vi on-line. meus problemas, ele disse que eu não deveria entrar em pânico que tudo vai ficar bem. Após o primeiro encontro milagrosamente, consegui um emprego. e ele também conheceu outros desafios e me deu algumas tarefas a fazer ... e coisas a serem feitas. .ele me disse com precisão, inúmeras vezes que a única maneira de superar qualquer desafio da vida é acreditar em tudo o que eles pedem para você nunca duvidar e eu duvidei. Eu nunca duvidei do Dr. Alashira no ano passado, em abril, minha esposa foi aos hospitais que foi confirmar grávida..Dr ALA SHIRA se prova fiel a si próprio e ao seu mundo, encerrando a estéril de 10 anos e nos deu um menino saltitante em 9 de dezembro de 2018 / Eu lhe dei toda a glória. Te louvarei para sempre por seu trabalho maravilhoso ... por favor, em qualquer situação, ele pode ajudá-lo vá até ele_ e-mail dr.Alashirao1@gmail.com WhatsApp +2348034395438 obrigado e acredito que ele irá ajudá-lo também ..
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