segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Ocultismo e Sociedades Secretas:


(Fonte:  A HISTÓRIA SOMBRIA DO OCULTO , Magia Loucura e Assassinato - De: Paul Roland ;  EDITORA MADRAS )


HISTÓRIA DA MAGIA E FEITIÇARIA

A palavra “mago” deriva de Magi, o nome dos sacerdotes persas do Zoroastrismo, que eram hábeis na interpretação de sonhos e astrologia. Zoroastro (c.1700-1400 a.C) foi o primeiro profeta a proclamar que o amor do Ser Supremo (Ahura Mazda) deveria ser buscado por sublimação, não por sacrifícios, e que todas as criaturas vivas têm valor igual ao do homem. Zoroastro reformulou o culto ao fogo, de forma que ele se tornou o símbolo da Força da Vida Universal. De acordo com os Gathas, um texto sagrado atribuído ao profeta, Ahura Mazda deu à luz espíritos gêmeos, que lutaram pelo controle do mundo. Mas o Ser Supremo não criou o bem e o mal, pois esses conceitos são humanos. O que chamamos de bem é simplesmente a habilidade de perceber a realidade, ou a verdade das coisas, enquanto o mal é uma percepção distorcida do mundo e nosso propósito nele. Esses conceitos teriam um efeito profundo – embora raramente reconhecido – sobre os pensamentos judeus, cristãos e muçulmanos, bem como sobre a filosofia grega.

Assumindo que a natureza humana não evoluiu de forma significativa desde que os primeiros humanos começaram a observar seu ambiente com algum grau de curiosidade, não é insensato imaginar que seu primeiro pensamento não foi apreciar a majestade da criação, mas simplesmente a autopreservação. E, quando anoitecia, podemos presumir com segurança que, em vez de ficar admirando o pôr do sol, nossos ancestrais corriam em busca de abrigo, parando apenas para se armar com porretes imensos, por medo do que poderia estar espeitando nas sombras. A sobrevivência é nosso impulso mais fundamental, e não um anseio espiritual. A reflexão, contemplação e introspecção surgiram muito mais tarde, com o despertar gradual da autoconsciência e uma persistente curiosidade sobre o significado da vida. Muitos de nós não são mais sábios hoje em dia no que diz respeito a essa questão e, ouso dizer, a vasta maioria da humanidade ainda está preocupada com a sobrevivência básica e a autogratificação. Mesmo após a fundação das primeiras grandes civilizações na Suméria e no Egito, por volta de 4000 a.C, o primeiro instinto não era cultuar o Criador, mas acalmar os deuses sombrios da morte e destruição, pois o mundo antigo era um ambiente duro e hostil. A vida cotidiana era uma batalha incessante contra o deliberado poder destrutivo da Mãe Natureza, sem mencionar a ameaça representada pelos predadores famintos, doenças que se alastravam e inimigos impiedosos por todos os lados. Em um mundo de morte e crueldade, os deuses sombrios mantinham o domínio sobre todos. Não foi à toa que os medos dos homens encontraram expressão em lendas sobre seres cósmicos que lutavam por supremacia nos céus e abaixo da terra, criando tempestades, inundações, fome, terremotos e todos os tipos de desastres naturais no processo. E em um esforço para explicar o fenômeno da morte, que em geral era violenta e ao acaso, surgiu a crença na imortalidade da alma e na vida após a morte, em que os bons eram recompensados e os maus, punidos. Esse mundo inferior de almas e sombras variou de civilização para civilização e, mesmo assim, todas as culturas, até as mais diversificadas, produziram relatos de similaridade impressionante dele. Mas podemos presumir que ninguém retornou do mundo dos mortos para descrever a jornada da alma. A única conclusão que podemos obter é que os xamãs das tribos primitivas e os sumo sacerdotes das civilizações antigas compartilhavam uma visão da vida após a morte, adquirida a partir de estados alterados e sonhos alguns induzidos por drogas, e outros conseguidos a partir de jejuns rigorosos e outras formas de rituais religiosos ou de magia. É claro que tais estados alterados são subjetivos e caracterizados pelos indivíduos, as limitações de sua linguagem e a cultura em que a experiência aconteceu. Isso explica o simbolismo muitas vezes obscuro na descrição dos mundos superior e inferior e de seus habitantes imaginários, encontrados nos textos sagrados e imagens das religiões do mundo.

O registro mais antigo de um ritual de magia e xamanismo é uma pintura pré-histórica em caverna que data do Paleolítico, encontrada na Caverne des Trois Frères, em Ariège, na França. Ela retrata um homem vestido em uma pele de animal, com um ornamento de cabeça com chifres, que parece ocupado em alguma forma de dança ritualística. Alguns sugeriram que a figura representa o Deus Cornudo de um culto da fertilidade, que sobreviveu na Europa até a Idade Média e é a origem do deus grego Pã. Outros propuseram que foi dessa fonte que o demônio cristão adquiriu seus cascos, chifre e rabo. Mas a pintura em Ariège é de interesse mais que histórico, por ser um dos exemplos mais antigos de magia ritual. A pintura não pretendia ser uma mera descrição de uma cena de caça, pois, ao pintar sua presa, o xamã e seu povo estavam usando a técnica de magia mais antiga conhecida pelo homem – eles estavam visualizando o que desejavam para trazer aquele acontecimento à vida, a partir de sua vontade. Trocando em miúdos, aquilo era a mente suplantando a matéria, uma técnica intuitiva que foi praticada por todo o mundo e em todas as épocas, por culturas que não tiveram ligação óbvia.

O Deus cornudo dos pagãos europeus teve sua contraparte na divindade suprema suméria Marduk, que, de novo, não era nem bom nem mau, embora permitisse a existência da maldade, disfarçado como o Deus Bel. Com o tempo, as duas divindades tornaram-se uma só – Bel-Marduk -, e essa nova divindade exigia sacrifícios humanos. Com o declínio do império sumeriano, os povos da Babilônia e Assíria degeneraram para a idolatria e sua magia tornou-se corrupta e destinada ao interesse pessoal. Abandonaram as realizações culturais do início do império – astronomia, astrologia, arquitetura – em favor do sacrifício de sangue, superstição e conquistas. O antropólogo Ivar Lissner data a aparição da magia negra nessa época. Entre os sumérios surgiu a ideia de que, se eles pudessem induzir animais a morrerem por meio de magia, eles poderiam vencer seus inimigos humanos desfigurando suas imagens. Nesse mesmo estágio da evolução humana, por todo o mundo, os homens de repente pararam de fazer imagens com a forma humana – todos, exceto os praticantes do que hoje chamamos de Artes Negras.

 “... os deuses e a magia nascem para iluminar sua majestade...” (Tabuleta memorial a Osíris)

Nos tempos antigos, os sacerdotes-feiticeiros do Egito praticavam a análise dos sonhos, adivinhação, cura pela fé, profecia, visualização remota, cirurgia psíquica (operações em pacientes hipnotizados sem anestésicos) e uma forma de meditação conhecida como “assumindo a forma de Deus”, que era usada quando alguém precisava de orientação. A pessoa envolvida sentaria em uma atitude típica do deus que ela desejasse consultar – ou seja, como retratados em estatuetas e murais. Depois, entrando em um transe leve, ela se identificaria com as características específicas atribuídas àquela divindade, antes de fazer seu pedido de ajuda ou orientação. Acredita-se também que os grão-sacerdotes egípcios executavam projeção astral como rito de iniciação para que pudessem adquirir experiência direta dos segredos da vida e da morte. Contudo, quando os sacerdotes trocaram a busca de compreensão por mascatear seus serviços, encontraram-se reduzidos a lançar pragas e vender a passagem em segurança através do mundo subterrâneo. Os sacerdotes haviam desenvolvido um método original de lançar pragas nas pessoas. Primeiro eles criavam uma estatueta com o nome da vítima e depois atiravam sete talos de sete tamareiras na boneca, com um arco de crina de cavalo, enquanto entoavam o nome da pessoa amaldiçoada. Por meio de tais práticas, os grãos-sacerdotes alcançaram uma influência e um poder sem precedentes, a ponto de até o faraó temer ofende-los. Existiam rumores de que eles podiam animar estátuas de barro para que, em seguida, enviavam para matar seus inimigos. Um relato desse procedimento está preservado nos Papiros Westcar, que contam a história do grão-sacerdote Aba-aner, que matou o amante de sua esposa depois de conferir vida a um crocodilo de argila. Quando o faraó Neb-Ka visitou o sacerdote, ele foi levado à margem do rio, onde Aba-aner convocou a fera encantada do Nilo, o corpo ainda preso em suas mandíbulas. Impressionado com o poder do sacerdote e não desejando causar desagrado, o faraó declarou “Levai o que é vosso e saí!”. A partir daquele dia, os sacerdotes tornaram-se imunes à censura. Os tempos do antigo Egito não eram lugares de culto silencioso. Pelo contrário, eram abarrotados de praticantes das artes da magia, que ofereciam aos visitantes análises de sonhos, adivinhação e orientação, tudo por um preço. Um típico pedido aos deuses envolvia escrever a solicitação com o sangue de um pássaro ou de um animal pequeno e, então, desenhar uma imagem do deus na mão esquerda. Depois, a mão seria amarrada em um tecido consagrado e o suplicante se retiraria para a cama, com a esperança de que o deus de sua escolha aparecesse em seus sonhos e lhe desse a resposta que buscava. Para os egípcios. Tais praticas eram tão inofensivas quanto consultar cartas de tarô ou um astrólogo hoje em dia, mas depois que o faraó Akhenaton fracassou em introduzir o monoteísmo (crença em um único deus), em 1362 a.C, o Egito caiu na escuridão. Todas as evidências do reino de Akhenaton foram apagadas e os sacerdotes tornaram-se os defensores todo-poderosos dos “deuses antigos”. A partir de então, o culto dos mortos, presidido pelo deus com cabeça de chacal (Anúbis) dominou a sociedade egípcia, minando-a de sua vitalidade e levando à paralisação do progresso. Seth, o irmão maligno de Osíris, suplantou o deus solar Amon-Rá e os curadores pela fé foram substituídos pelos magos-sacerdotes, que se tornaram cada vez mais ocupados com a feitiçaria e menos com a ciência, consequentemente comprometendo a distinção entre magia branca e negra. Muitos feiticeiros adquiriam corpos dos embalsamadores, corpos em que eles praticavam a arte negra da necromancia (conversação com os mortos). Os embalsamadores eram uma casta de “indesejáveis”, rechaçados pela sociedade porque traziam o fedor da morte com eles e por ter a fama de copular com os cadáveres, como uma compensação por serem proibidos de se relacionar com outras mulheres que não fossem as prostitutas mais reles. Quando um corpo belo e jovem era levado a eles, mantinham-no fresco em uma cama de tijolos aquecidos por 70 dias, o tempo prescrito para o ritual de embalsamamento; mas com frequência, a tentação de preserva-lo além daquele período resultaria na putrefação e em risco de infecção. Dizem que tais práticas podem ter dado origem às doenças venéreas.


 “O sucesso de Satã é maior quando ele surge com o nome de Deus em seus lábios.” (Mahatma Gandhi)

Há uma praga que funciona sob as leis da magia simpática, que afirma que o mago pode estabelecer uma ligação psíquica com sua vítima se possuir um objeto pessoal, ou amostra de cabelo, ou unha daquele indivíduo. Uma boneca feita à semelhança da vítima será mais eficiente se ela puder ser vestida com algo que pertença a tal pessoa. Essa prática procede da forma mais primitiva de culto, o totemismo. Os nativos norte-americanos, os povos inuit da América do Norte, do Ártico e da Sibéria e a maioria das tribos africanas, todos se desenvolveram a partir de culturas centradas no totemismo – a crença de que o destino das tribos estava ligado a uma espécie específica de animal. Na Índia, essa forma de culto da natureza foi contaminada pelo culto do sacrifício animal, introduzido pelas tribos arianas que invadiram o Vale do Indo, por volta de 1500 a.C. O princípio central dessa prática é que todas as doenças e infortúnios podem ser curados se forem transferidos para o corpo do animal sagrado, que depois é morto e oferecido aos deuses. Uma ideia similar originou a expulsão simbólica do bode expiatório. O triunvirato de deuses hindus era Brahma, o absoluto, Vishni e Shiva. Brahma é o criador do Universo e Vishnu, o mantenedor; porém o papel de Shiva é destruir o Universo, para que ele possa ser recriado, dessa vez sem suas imperfeições. De vez em quando, Shiva é representado com aspectos masculinos e femininos. Alternativamente, ele tem uma consorte, a Deusa Mãe que pode adquirir muitas formas. Uma delas é Kali, a Deusa da Morte, armada até os dentes. Tradicionalmente ela é retratada pingando sague, usando um colar de crânios e armada com um par de espadas afiadas e letais. Mas seu papel, poderes e significado variavam de acordo com a seita a que a pessoa pertencesse. Para os shaktas, ela era cultuada com rituais que envolviam orgias sexuais, enquanto os tugues a veneravam pelos assassinatos rituais por estrangulamento. Mas, para os hindus, todos os deuses eram apenas aspectos de Brahma, e eles não consideram Kali uma figura destrutiva, mas um símbolo de mudança, pois no Hinduísmo a morte não é um fim, mas uma fase no ciclo interminável da vida.

Em suas memórias, A Patern of Islands, o funcionário público britânico, sir Arthur Grimble, comissário residente das Ilhas Gilbert, recordou ter testemunhado um xamã nativo invocando do mar um imenso cardume de marsopas, após entrar em transe. O xamã saiu de sua cabana gritando: “Elas estão vindo, elas estão vindo”, minutos antes de a primeira marsopa ser avistada. O escritor Colin Wilson gosta de citar as experiências do explorador britânico Ross Salmon como um exemplo excelente da ligação psíquica entre o homem “primitivo” e a natureza. Em suas memórias, My Quest For Eldorado, Salmon descreveu um “julgamento pela natureza” conduzido pelo povo callawaya, nativos do norte da Bolívia. Uma jovem fora acusada de ser infiel ao marido, então os anciãos decidiram convocar o animal sagrado da tribo, um condor, para julgar a fidelidade da moça. O condor é um pássaro reticente e não afeito a contato com humanos, mas depois da cerimônia de invocação três desses pássaros surgiram aparentemente a comando dos anciãos. Enquanto Salmon filmava a cerimônia, ele captou o momento em que um imenso pássaro macho mergulhou e desceu na frente da mulher aterrorizada, que tinha sido amarrada em um posto de madeira. O condor circulou por alguns momentos e então foi em direção a ela, atacando sua garganta com o bico, antes de um membro da equipe de filmagens espanta-lo com uma pedra. Alguns dias depois, a mulher cometeu suicídio, jogando-se de um despenhadeiro. Ela estava convencida de que o pássaro a havia exposto como mentirosa.


No Velho Testamento, diz-se que o rei Saul consultou a feiticeira de Endor para perguntar ao espírito do profeta Samuel como ele poderia vencer seus inimigos. Samuel respondeu que o destino de todo homem é submeter seus poderes a outro. A feiticeira nessa história não é má; ela é apenas uma sensitiva, que usa um talismã para convocar o espírito benigno às ordens do rei, embora ele tivesse proibido expressamente seus súditos de se envolver com o oculto. É o rei que tenta engana-la, disfarçando-se e alardeando seus próprios decretos quando lhe era conveniente. O fim, a feiticeira senta pena de Saul e mata um de seus animais para alimenta-lo. A história serve apenas para revelar a falibilidade da natureza humana e os perigos da arrogância. Os gregos também contaram histórias de videntes, feiticeiros e magas, pois, ao mesmo tempo em que falavam de filosofia, também consultavam os oráculos e praticavam tipos moderados de magia. Na Odisseia, o poeta do século VIII a.C., Homero, faz seu herói protagonista convocar o espírito do vidente Tirésias e encontrar a maga Circe, e nenhum deles era maldoso. Quinhentos anos mais tarde, as feiticeiras ainda eram fábulas da imaginação poética, pois o poeta Teócrito conjurou a imagem de uma garota com o coração partido, que foi levada a rezar para Hécate, a deusa do Inferno, para ter de novo em seus braços o amante infiel. Mas, de novo, essa feiticeira noviça não era má. Glauco, o herói de uma passagem do Philopseudes de Luciano, que é o mais antigo texto conhecido por fazer referência ao encanto de amor das feiticeiras chamado de “descenso da Lua”, também não era mau. Glauco estava tão apaixonado pela bela Cila que tema morrer de tristeza se não pudesse vê-la de novo, então ele consultou um mago que invocou Hécate, a deusa dos mortos. Glauco foi instruído a criar uma imagem de sua amante em argila e cravar agulhas de bronze nela, enquanto repetia as palavras: “eu furo a ti para que te lembres de mim”. O encanto provou-se bem-sucedido, pois Cila correu para o jovem doente de amor e o abraçou, jurando amor eterno.


Foram os escritores romanos Horácio, Ovídio, Petrônio, Lucano e Apuleio que criaram a imagem icônica da feiticeira como a velha enrugada e ressequida, que vasculhava cemitérios à procura dos ingredientes de beberagens venenosas e conversava com seus espíritos familiares. A fábula de Lucano sugere que, embora os pensadores radicais da sociedade grega estivessem avançando no conceito de livre-arbítrio e despachando os deuses para seu passado poético, eles ainda estavam acorrentados à ideia de que um indivíduo podia influenciar outro exercitando sua vontade superior. Lúcio Apuleio tornou-se conhecido como a primeira história completa da feitiçaria, “O Asno de Ouro”, no século II. Embora seja uma sátira, que acompanha as desventuras do autor depois que ele se lambuzou com um unguento de feiticeira, a obra ensina uma importante lição, ou seja, que o caminho do Lado Esquerdo era cheio de perigos. O sábio homem ou mulher faria bem ao se manter do Lado Direito, ou correria o risco de se tornar um asno. Não existia moral para se extrair da descrição de um ritual necromântico na fábula de Lucano, Farsália, apenas o terror absoluto diante do pensamento de que tais práticas poderiam ser possíveis. Nesse relato, Sexto Pompeu, filho do general romano Pompeu, o Grande (106-48 a.C), consultou a necromante mais formidável do mundo clássico, Erista, para saber se seu pai seria vitorioso contra César. Erista, que Lucano descreve como “suja imunda” e horrorosa de se olhar, vivia em um cemitério na Tessália e dormia em um túmulo, cercada por relíquias dos mortos roubadas das sepulturas à sua volta. Quando Sexto se aproximou dela e perguntou-lhe se poderia predizer o futuro, ela disse que apenas poderia saber o que ele precisava saber por intermédio de um cadáver recente, porque o espírito dos mortos permanecia sobre o corpo e podia ser persuadido a voltar pra ele. Mas deveria ser um que não tivesse sido ferido gravemente na boca, na garganta ou nos pulmões de forma a impedir o cadáver reanimado de falar. Então, ela o levou a um campo de batalha onde eles encontraram um espécime adequado, um soldado que fora morto havia pouco tempo. Enquanto Sexto lutava contra a repugnância ao pensamento do que estava para fazer, Erista prendeu a mandíbula do cadáver com um gancho, arrastando-o para uma caverna próxima. Lá ela preparou uma poção nojenta, que continha sangue menstrual, a saliva de um cachorro louco e a carne de uma hiena, e colocou em uma ferida acima do coração para reanimar o cadáver. Em meio a um estrondo ensurdecedor de trovão e do grito de animais selvagens, ela apelou aos deuses sombrios Hermes, Caronte, Hécate, Prosérpina e Caos para tomarem o espírito do soldado, que era visto planando sobre o corpo sem vida. Mas o espírito não obedeceria a suas invocações para entrar no cadáver mutilado até ela prometer que queimaria o corpo em seguida, para que ele nunca mais fosse convocado. Apenas após a promessa, o fantasma do soldado reentrou no corpo. À luz espectral da lua, ele ergueu-se, trêmulo, e previu o futuro pelos lábios do cadáver. O corpo foi queimado em seguida, o que libertou o espírito. Esse episódio, com certeza, é pura ficção, mas tais histórias não tinham a intenção de ser tomadas como fatos. Foram criadas para preservar a fé de pessoas que precisavam acreditar na sobrevivência do espírito depois da morte. Uma simples história de um fantasma benigno voltando para tranquilizar os entes queridos de que tudo estava bem no mundo além não teria fascinado tanto a imaginação quanto a história repulsiva de Erista.


A evidência de que o culto da feitiçaria foi uma religião formalizada anterior ao Cristianismo só foi revelada em 1886, quando o folclorista americano Charles Leland descobriu um documento intrigante em uma viagem à Itália. Ele viajara até lá para pesquisar os costumes dos ciganos, mas durante sua visita encontrou uma feiticeira autoconfessa, chamada Madalena, que produziu uma cópia manuscrita do “Aradia – Gospel of the Witches”, que dissipou a imagem da feitiçaria como um rito infernal. Não existia menção ao Diabo, sexo com Satã ou sacrifício. Em vez disso, o livro delineava uma crença de que uma força de vida universal residia em todas as coisas vivas e que essa fonte de poder podia ser mobilizada e canalizada por aqueles que conseguissem entrar em sintonia com ela. Leland convenceu-se de que o livro era um artefato genuíno e tinha sido passado para Madalena como parte de sua iniciação na La Vecchia Religione (A Religião Antiga) – um termo que é muito aplicado à feitiçaria italiana. O documento apresenta um mito da criação alternativo em que Diana, a deusa da Lua, dá nascimento a Arádia, a deusa da magia, depois de ter sido fecundada por seu irmão Lúcifer, o deus do Sol. Não existe sugestão de que Lúcifer seja nada mais que o deus da luz e do fogo, o aspecto masculino ativo na natureza e em nós, enquanto Diana é o aspecto passivo que se manifesta nos humanos como o instinto nutridor. Porém, o aspecto mais interessante do Evangelho é a impressão que o texto passa, de que a feitiçaria estava em decadência quando a Igreja instigou sua perseguição e era vista como nada mais que uma relíquia arcaica de nosso passado pagão. Os círculos de pedra monolíticos que haviam sido erguidos e venerados por nossos ancestrais foram abandonados, caindo em ruínas, seu propósito místico e significado astrológico esquecidos quase que por completo. Muitos lugares sagrados para os pagãos foram construídos pela Igreja, e o solo, uma vez venerado como o ventre da Mãe Terra, era cultivado e arado sem consideração pelo ser maternal que o originou. Os festivais pagãos foram esvaziados de sua potência e importância ao serem representados como celebrações comunitárias das estações. O ritual da fertilidade de Beltrane. Por exemplo, foi substituído por uma dança de roda em torno de um mastro inócuo. Por insistência da Igreja, as celebrações para marcar o solstício de verão e o equinócio de inverno foram condenadas como sabás de feitiçaria, para assegurar que as comunidades rurais fossem dissuadidas de revivê-los. Mas, quando pareceu que a Igreja estava decidida a apagar todos os rastros do Paganismo, os indivíduos, evidentemente tiveram a iniciativa de preservar essa tradição de conhecimento natural, registrando suas crenças e práticas em documentos como o que Leland descobriu. O Cristianismo pode ter sido a religião oficial do Ocidente pelos últimos 2 mil anos, mas é evidente que a crença de alguns era só da boca para fora.

À medida que o culto do Cristianismo varria a Europa no primeiro milênio da Era Cristã, a Igreja erradicou a “velha religião” por assimilação. Ela também adotou seus mitos, como conceitos do nascimento da Virgem, que foi o método tradicional endossado por profetas desde o tempo de Zoroastro, e a ressurreição física – apesar de não haver menção desses acontecimentos nos relatos contemporâneos da vida de Jesus. A data de nascimento do messias cristão, 25 de dezembro, vem do culto mitraico e do festival romano da Saturnália. Até mesmo a imagem icônica da “madona e criança” foi tomada do mito egípcio de Ísis e Hórus. Como resultado desse revisionismo massivo, os evangelhos gnósticos, descobertos em Qumran, foram condenados como hereges, porque não estavam em conformidade com os relatos do evangelho canônico – isto é, os primeiros quatro livros do Novo Testamento. Porém, os evangelhos canônicos foram escritos centenas de anos depois dos evangelhos gnósticos, por escribas que não tinham conhecimento em primeira mão dos ensinamentos de Jesus. Essa estratégia cínica data de tempos antigos, quando uma nação conquistadora adotava o Deus de seu inimigo vencido como uma divindade menor, a fim de apaziguar seus prisioneiros. Eles poderiam cultuar seu Deus na prisão e, ao mesmo tempo, proteger-se contra a ira do Deus derrotado. Mesmo a divindade de Jesus esteve em debate, até o Conselho de Constantino ser convocado em Niceia, em 325 d.C., em que o controverso Arius e o teólogo Athanasius discutiram a respeito da interpretação dos evangelhos. Arius questionou o status de Jesus, mas foi suplantado pelos partidários dos teólogos, que acreditavam que Jesus não era um simples mortal, mas deveria ser venerado como o Filho de Deus. A erradicação das formas de veneração mais antigas estendeu-se para a construção de igrejas nas fundações de templos pagãos, embora se tenham ignorado as atividades de seus construtores que tentavam acalmar os seus deuses da fertilidade colocando os falos de pedra debaixo do altar. Muitas igrejas antigas também abrigavam as efigies de Sheela-na –Gigs - ou seja, mulheres nuas expondo seus órgãos sexuais. Mas, enquanto essas imagens do passado observassem de cima a congregação temente a Deus, Pã, o travesso espírito da floresta e provedor de potência sexual, era demonizado como um fornecedor do pecado e seus seguidores, condenados como servos de um mestre profano. Se a Igreja fosse firme em suas próprias convicções, ela poderia ter esperado com paciência para que as formas antigas morressem, mas ela viu sua autoridade temporal ser desafiada por uma tradição rural que não considerava o sexo um pecado. A Igreja revidou, decretando que o sexo deveria ser sancionado pelo casamento.

Satã tornara-se um símbolo de todas as coisas e pessoas que se opunham à autoridade da Igreja, porém, ao exercer tamanha brutalidade enquanto ignorava os excessos de indulgência de seus próprios encarregados, pode-se argumentar que Satã é a sombra do Cristianismo e era por isso que os fanáticos o temiam. Como o escritor Colin Wilson ressaltou: “o Cristianismo tornou-se uma religião mórbida e sombria, obcecada pelo pecado e pelo mal (...) É um comentário triste sobre o que se tornou a religião de amor e perdão de Jesus”.

É muito significativo que a Igreja não levou a sério a prática da bruxaria até o século XIV, quando o papa João XXII sancionou uma caça às bruxas, na crença de que seus inimigos estavam conspirando para assassina-lo por meio de recursos de magia. Suas suspeitas eram bem fundadas. Três bispos liderados por Hugh Geraud, o bispo de Cahors, admitiram testar a força de seus poderes lançando uma maldição sobre a imagem de cera do sobrinho do papa. O garoto morreu logo em seguida. Encorajados pelo feito bem-sucedido, eles besuntaram imagens do papa e de dois líderes da corte papal de Avignon e confiaram aos seus criados a missão de contrabandeá-las para dentro da corte, escondendo-as em nacos de pão. Mas os criados foram revistados na entrada e a conspiração foi descoberta. Em meio aos itens suspeitos encontrados, havia venenos, ervas, sapos e os cabelos de um homem enforcado. O bispo Geraud protestou inocência, mas o consideraram culpado. Ele foi esfolado vivo e seu corpo, queimado. Embora a Igreja reconhecesse a existência das bruxas antes de 1300, elas eram vistas como velhas inofensivas, que ganhavam a vida vendendo remédios de ervas e poções de amor para os vizinhos. O documento mais antigo da Igreja a mencionar as bruxas, o Canon Episcopi, data do século IV. Faz desenho à crença de que as bruxas eram “mulheres abandonadas e pervertidas por Satã” e que tinham o poder de voar. No século XII, a autoridade do papa estava sendo questionada por uma seita puritana chamada os cátaros (“os puros”), que acusou a Igreja de corrupção e seus ministros de hipocrisia por enriquecerem à custa de seus paroquianos, abandonando a doutrina de piedade e pobreza que Jesus e seus discípulos pregaram. Os cátaros também acreditavam em um Universo onde Deus e Satã estavam em guerra, o que deu à Igreja a oportunidade de espalhar o rumor de que eles cultuavam Satã em pessoa e praticavam bruxaria. No entanto, pouco se fez até 1208, quando os cátaros assassinaram o núncio apostólico. Irado com o ato, o papa Inocêncio III declarou uma cruzada contra os cátaros ou albigenses. A Igreja sancionou o massacre dos cátaros, homens, mulheres e crianças, por todo o Languedoque, um principado independente no sudoeste da França, onde se localizava o centro do grupo, e, em 1209, cerca de 10 mil cruzados marcharam para o sul para concluir sua missão. Em Béziers, um dos cruzados perguntou ao emissário papal como ele poderia identificar os hereges e, em vez disso, foi instruído a matar todos os 20 mil habitantes, na crença de que “Deus cuidará dos seus”. A cruzada Albigense, como foi chamada, durou até 1229. Muitos cátaros já tinham desaparecido, mas havia algumas fortalezas cátaras remanescentes; então, o papa Gregório IX instituiu a Santa Inquisição. Ele sancionou o uso da tortura para forçar confissões dos que não admitiam livremente suas crenças blasfemas. Uma vez condenados, eles seriam queimados em estacas para que suas almas ficassem livres para retornar a um Deus clemente. Depois da destruição da cidadela cátara em Montsegur, em 1244, os cátaros sobreviventes espalharam-se pela Europa, mas eram uma força exaurida. Todos os seus vestígios desapareceram rapidamente.

Nas catacumbas do Vaticano existe um documento desbotado, mosqueado pela idade, que data de agosto de 1308. Ele é raramente removido de sua caixa de vidro, exceto para estudo de acadêmicos que conseguiram uma autorização especial dos curadores. O Pergaminho de Chinon, como é conhecido, foi mantido em segredo na Cidade do Vaticano por quase 700 anos, somente divulgado em 2004, depois de sua existência ter se tornado de conhecimento público e pela pressão feita sobre as autoridades papais para revelarem seu conteúdo. O pergaminho concede absolvição aos líderes dos Cavaleiros Templários, uma ordem de monges guerreiros formada em 1118, depois da Primeira Cruzada. Sua finalidade era proteger os peregrinos cristãos que viajavam pela Terra Santa. Muitos desses monges tinham sido excomungados por desafiar a autoridade do papa, portanto não tinham nada a perder a não ser a vida. Os rigores da vida monástica os tornaram lutadores formidáveis e, em pouco tempo, eles enriqueceram com as doações generosas legadas por cruzados agradecidos, bem como pelos muçulmanos, que confiavam aos Templários seus tesouros ao tomar conhecimento de que eles eram homens honestos. Diz a lenda que os Templários também eram os guardiões do tesouro cátaro e que o Santo Graal, o cálice que Jesus usou na Última Ceia, faria parte desse tesouro. Foi dito também que eles compartilhavam um segredo que poderia abalar os alicerces da Igreja; em outras palavras, Jesus teria sobrevivido à crucificação para se casar com Maria Madalena e ser pai de uma criança. Alguns acreditam que a linhagem sobrevive até os dias de hoje, criando com isso um mito que formou as bases de histórias “revisionistas” recentes, tais como “O Santo Graal e a Linhagem Sagrada” e o best seller de Dan Brown, “O Código Da Vinci”. Acreditava-se que a prova dessa “linhagem real” estaria codificada em pedra, em vários sítios sagrados, entre eles o Templo de Salomão, que foi a base dos templários em Jerusalém, e a Capela de Rosslyn na Escócia, para onde os remanescentes da ordem fugiram depois de sua perseguição pelo papa Clemente V, em 1307. Existiram rumores ainda mais sombrios e perturbadores acerca da ordem. Diziam que eles eram sodomitas e adoradores do Diabo, e praticavam magia negra diante de um ídolo chamado Baphomet, que tomou a forma de uma cabra com casco fendido, com órgãos sexuais masculinos e femininos. Baphomet era tradicionalmente retratado sentado de pernas cruzadas sobre um globo, com uma vela preta queimando entre seus chifres e um pentagrama gravado em sua testa. Corriam boatos de que os Templários se prostravam diante de um falo de madeira e um crânio decorado com joias antes de jurar sua lealdade, beijando seus irmãos iniciados na boca, no abdome e no ânus. Essas práticas, sem dúvida, eram inverdades, histórias fantasiadas por seus inimigos para desacredita-los e dar motivo à Igreja para dissolver a ordem e confiscar sua vasta fortuna. A existência do Pergaminho de Chinon indica que o próprio Vaticano reconhecera oficialmente não haver nenhum fundamento para essas acusações. De acordo com o Pergaminho, os Templários seriam reintegrados à Igreja Católica para poder receber os sacramentos depois de se arrepender dos seus pecados, o que, aparentemente, envolvia nada além de atos homossexuais. Mas essa oferta de reconciliação foi confrontada por Filipe IV, da França, que precisava desesperadamente de fundos e se ofendia por ter de pedir dinheiro emprestado aos Templários. Ele exigiu que o papa acusasse os cavaleiros de heresia, para que suas propriedades e riquezas fossem confiscadas. E assim, em 13 de outubro de 1307, todos os Templários da França foram presos e torturados em um esforço para arrancar-lhes confissões. Em poucos dias, 36 deles morreram em consequência de seus ferimentos. No mês seguinte, o atormentado papa Clemente V emitiu um decreto ordenando que todos os monarcas aprovassem a prisão de qualquer Templário em seus reinos. Muitos morreram acreditando ter sido traídos pela Igreja, a qual eles arriscaram suas vidas para proteger. Em 1314, a Igreja exigiu sua última vítima entre os Templários. Jacques de Molay, Grão-Mestre dos Cavaleiros Templários, foi queimado vivo em uma ilha no Sena, ao pôr-do-sol, depois de desmentir sua confissão anterior, que fizera mediante tortura. Quando o carrasco queimou os feixes de paus, De Molay afirmou que os Templários eram vítimas do rei Filipe e seu coconspirador, o papa. Ele amaldiçoou os dois homens que condenaram seus leais cavaleiros à morte. O rei e o papa se juntariam a ele diante do trono de Deus dentro de um ano e responderiam ao seu criador. Não foi uma ameaça em vão. Em um ano, Clemente V e Filipe IV da França estavam mortos.

Os cátaros foram cruelmente exterminados, o que ainda não satisfez o papa João XXII, cuja bula papal de 1326 declarou que a feitiçaria era crime punível com a morte. Os inquisidores não teriam mais de provar a heresia para justificar suas torturas de suspeitas de feitiçaria e, como resultado, a paranoia e a perseguição espalharam-se como uma praga. Nos 400 anos seguintes, um número incontável de homens e mulheres por toda a Europa foram “colocados” à prova” com todos os tipos de aparato desumanos, que nem mesmo o Diabo teria conseguido imaginar. Muitos deles fizeram confissões falsas para encerrar seu sofrimento. E tudo em nome de uma religião que fora fundada com base no princípio do amor fraternal, do perdão e da misericórdia. Muitos daqueles arrastados ante a Inquisição foram denunciados por vizinhos por serem velhos, feios ou estranhos. Alguns poderiam ter sido ouvidos falando consigo mesmos, com seu gato ou outro animal “familiar” – um sinal indubitável de estarem em união com o Diabo, segundo seus acusadores. Outros foram “colocados à prova” porque se sabia que eles usavam ervas e raízes em seus remédios naturais ou porque adivinhavam a sorte. Muitos, porém, foram mortos simplesmente por olhar para seus vizinhos de maneira errada, amaldiçoando-os com “o Olho do Diabo”. Para justificar sua barbárie, os líderes da Inquisição mencionaram a citação bíblica “Não tolerarás que uma feiticeira viva.”, mas eles ignoraram o fato de que uma tradução mais precisa seria “Não permitirás que um envenenador viva” (de acordo com o acadêmico Reginald Scot, publicado em 1584). Entretanto, nem todos os administradores do papa aprovaram seus métodos. O arcebispo de Rheims e dois de seus colegas declararam que a feitiçaria era uma fantasia, o que foi suficiente para persuadir o parlamento de Paris a ordenar a liberação de todos os suspeitos. Se não fosse pelo entusiasmo do papa Inocêncio VIII, que sucedeu no trono papal em 1484, a febre da caça as feiticeiras teria acabado antes que se pudessem enviar mais almas inocentes para seu criador. Mas o papa Inocência era um radical, que se engajou em punir os pecadores da Terra e arrancar as sementes do Diabo. O primeiro ato do seu reinado foi louvar os esforços dos “filhos queridos” do Vaticano – o inquisidor austríaco Heinrich Kramer e Jacob Sprengler, reitor da Universidade de Colônia – por revelarem a extensão do culto ao Demônio na Alemanha. O aval do papa foi suficiente para encorajar Kramer e Sprengler a embarcar em um relato completo sobre feitiçaria, publicado dois anos mais tarde. Cópias da obra Malleus Maleficarum (O Martelo das Feiticeiras) poderiam ter acumulado poeira nas prateleiras das bibliotecas eclesiásticas e instituições teológicas se seus autores não tivessem feito descrições tão detalhadas das atividades sexuais dos servos de Satã. As descrições gráficas dos hábitos noturnos de súcubos e íncubos, que diziam visitar os cristãos tementes a Deus durante o sono, foram aumentadas com os debates acadêmicos sobre se uma feiticeira tinha ou não o poder de roubar o pênis de um homem. A questão libidinosa e a quase simultânea invenção da prensa tipográfica asseguraram que o livro se tornasse leitura obrigatória em cada mosteiro ou lar que pudesse pagar pela cópia. Para os autores, infelizmente, os efeitos produzidos pelo livro foram mais seculares que espirituais, levando seus leitores mais reprimidos sexualmente a descarregarem sua raiva e frustração em incontáveis suspeitas de feitiçaria. Por ironia, a caça as bruxas estimulou o ressurgimento do interesse pela “velha religião”, que ganhou impulso quando um novo Ato de Bruxaria foi aprovado em 1735, revogando o ato sangrento de 1604. As pessoas não poderiam mais ser enforcadas por bruxaria, que não existia, de acordo com os autores do ato. Mas elas poderiam ser presas e ridicularizadas caso fingissem ser bruxas.

A corrupção e a imoralidade não foram eternizadas apenas por hereges e pagãos. Durante a Idade das Trevas e por toda a Renascença, o poder do papado rivalizou com o dos imperadores bizantinos e dos reis da Europa. Uma sucessão de papas acumulou grandes fortunas e vastos exércitos para fazer cumprir sua autoridade, mas sua arma mais formidável foi a ameaça de excomunhão. Intimidados pela importância de uma maldição papal, soberanos do Ocidente resistiam ao anseio de criticar os representantes de Deus na Terra. Até mesmo os excessos do papa Bórgia, Alexandre VI (1431-1503), não geravam censura. Alexandre era conhecido por gostar de presenciar orgias sexuais, em que as prostitutas mais bem pagas de Roma eram remuneradas para ter relações sexuais com a guarda papal, enquanto Lucrécia Borgia, sua filha, aplaudia e premiava os casais mais ousados. Tais atividades macularam a santidade do palácio papal e levaram a Igreja de Roma ao alcance da hóstia comunal de ritos blasfemos de uma Missa Negra. De acordo com o romancista do oculto, Dennis Wheatley, uma trindade profana de predecessores do papa de fato havia se entregado à magia negra; em outras palavras o papa Leão I, no século V, o papa Honório I, 200 anos mais tarde, e o papa Silvestre III, nos séculos X e XI. É evidente que Honório não se envergonhava de suas práticas diabólicas, pois publicou um registro delas em “O Grimório do Papa Honório”.

Em 694 d.C, o Concílio de Toledo condenou diversos padres que teriam rezado missas para os mortos, enquanto as pessoas por eles nomeadas ainda estavam muito vivas. Os padres tinham sido pagos para encenar as missas como uma forma de maldição. A ameaça de excomunhão, entretanto, não erradicou a prática por completo, já que continuou a ser usada no século XIII. Na Idade Média, algumas ordens monásticas tinham dúvidas quanto à sua verdadeira devoção. Por exemplo, no século XIV, o bispo de Exceter registrou o dia em que flagrou, no bosque, os monges do convento de Frithelstock prestando homenagem a uma estátua de Diana, a deusa da caça, e ordenou-lhes que a destruíssem. Em 1329, o frade carmelita Pierre Record recebeu uma sentença de prisão perpétua depois de admitir ter seduzido várias mulheres fazendo suas imagens com cera, que ele aspergiu com seu sangue e saliva, antes de enterrá-las embaixo das soleiras de suas portas. Esses não foram casos isolados.

Antes da Reforma, frades itinerantes perambulavam pelo campo extorquindo comida e doações dos camponeses, a quem diziam estar cometendo pecado se negassem abrigo e sustento a “um homem de Deus”. Rígidos votos de castidade eram reforçados com autoflagelo, cilícios e penitência, porém mesmo essas medidas drásticas muitas vezes não eram páreo para a libido reprimida dos jovens monges. Gerações de clérigos jovens sucumbiram à compulsão de seduzir suas jovens paroquianas, lançando a respiração sobre elas durante a confissão – uma técnica conhecida como insuflação. A prática era tão difundida que Santo Agostinho, São Jerônimo e São Gregório foram compelidos a proferir uma declaração pública que condenava a insuflação como forma de feitiçaria. O cura de Peifane foi queimado na estaca por seduzir mulheres desse modo, bem como o padre Louis Gaufridi e Pierre Girard, de Aix-em-Provence. O último caso é especialmente interessante porque a vítima, uma garota simplória chamada Charlote Cadière, ficou tão traumatizada com as investidas frequentes de Girard, que apresentou o fenômeno dos estigmas – chagas que sangram, correspondentes às do Cristo crucificado. A consequência de toda essa sexualidade suprimida foi um surto de histeria religiosa, em que clérigos lascivos culpavam o Demônio por tenta-los a cometer pecados e freiras neuróticas alegavam possessão demoníaca para explicar suas convulsões violentas e a compulsão irracional pela blasfêmia. Forçados a viver uma vida de autonegação e isolamento, muitos monges e freiras apresentavam sintomas de exibicionismo inconsciente, enquanto os que lhe ensinaram a considerar seus desejos sexuais como não naturais agarravam a oportunidade de culpar um bode expiatório sobrenatural para seu comportamento lascivo. Em 1633, as freiras de Loudon ficaram sob a influência insidiosa de Urbain Grandier, um padre e confessor carismático. Durante suas visitas, Grandier instigava as freiras em um frenesi de fervor religioso e logo as levava a renunciar seus votos e disputar um lugar na cama dele. Mas o conflito entre suas paixões inflamadas e seus juramentos para manter a fé em Cristo foi demais para as irmãs psicologicamente debilitadas. Elas foram ensinadas que Jesus morreu por seus pecados a ali estavam elas, traindo seu Senhor e obtendo prazer com a traição. Uma após a outra, elas começaram a exibir distúrbios de comportamento enquanto a histeria em massa rapidamente se espalhava pelo convento. Foi como uma febre contagiosa. Freiras contorciam-se voluptuosamente no chão e gemiam com vozes guturais e “demoníacas”, mas nenhuma exibiu de modo significativo um sinal de poderes paranormais – apenas neuroses sexuais.  Foi um exemplo perfeito de uma técnica de magia de arrebatamento, de que deriva a palavra moderna “glamour”. Porém, não foi a sedução de suas acusações impressionáveis e vulneráveis que assegurou a condenação de Grandier em 1634, mas um pacto com Satã que seus acusadores alegaram ter sido escrito com o próprio sangue dele. Esse é um dos poucos documentos remanescentes do período, embora sua autoria seja duvidosa. Grandier era um conquistador insaciável, não um satanista. Nenhuma de suas vítimas declarou que ele a tivesse forçado a participar de Missa Negra e nenhuma testemunhou nada que pudesse sugerir que os interesses dele iam além do carnal. Mesmo assim, ele acabou queimado na estaca. Um caso menos conhecido, mas igualmente importante, foi o das freiras de Louviers que sucumbiram a convulsões violentas e alucinações perturbadoras depois de anos de abusos de seus padres. No centro das alegações estava uma jovem órfã, Madeleine Bavent, que foi seduzida por um monge franciscano e refugiou-se no convento para conter seus avanços indesejáveis. Mas Madeleine não sabia que o convento de St. Louis e St. Elizabeth em Louviers, perto de Rouen, estava sob a supervisão de um padre velho e voluptuoso chamado David. Ele ordenou que as freiras participassem da comunhão com os seios à mostra e as encorajou a andarem nuas, sob o pretexto de que seria um pecado esconder a beleza da obra do Senhor – mas é claro que isso só se aplicava às jovens núbeis, noivas de Cristo. O padre David interessou-se especialmente por Madeleine, interesse que, segundo a moça mais tarde declarou, envolvia “atos de indecência grosseira”. A provação dela não terminou com a morte do padre David em 1628. De acordo com a confissão que ela fez em seu julgamento em 1643, o sucessor dele, o padre Picard, era igualmente libertino. Diferentemente de seu predecessor, ele foi além das carícias indecentes, estuprando a moça repetidas vezes. O resultado foi um aborto, que teve de ser induzido para se evitar um escândalo. Dizia-se que os jardins do convento de Louviers abrigaram numerosas sepulturas de crianças estranguladas ao nascer para evitar o constrangimento da instituição. Diz-se que esse não era o único local do tipo dentro dos conventos.  Picard faleceu em 1642, e em seguida, o seu assistente, padre Boulle, assumiu o seu lugar. O abuso continuou. Mas agora havia rumores de padres conduzindo Missas Negras e rituais blasfemos em solo sagrado e de freiras “possuídas” contorcendo-se no chão e espumando pela boca. O bispo de Evreux, François Péricard, recebeu denúncias e foi obrigado a investigar. Na companhia de vários padres capuchinhos que tinham ampla experiência no assunto, o bispo ouviu as confissões sombrias de Madeleine e suas colegas freiras. Eram confissões tão fantásticas que só poderiam ter sido inventadas pela imaginação hiperativa de indivíduos psicologicamente perturbados. Por trás das imagens satânicas – narrativas de crianças crucificadas, hóstias de comunhão sangrentas, rapto pelo Diabo na forma de um gato preto grande -, havia evidências claras de abuso sexual sistemático. Os padres haviam tentado jogar a culpa de suas ações sobre o Diabo. Ao que parece, alguns dos relatos mais sombrios foram obras do bispo, em vez das testemunhas que prontamente confessaram, na esperança vê de serem poupadas de tortura. O doutor Yvelin, um médico da realeza que examinou as freiras admitiu mais tarde ter considerado seus depoimentos como falsos. Ele disse ainda que as “atuações” delas durante os exorcismos aparentavam ter sido bem ensaiadas. O bispo não estava disposto a permitir que o caso fosse ouvido em uma corte pública. Se ele convencesse os capuchinhos de que era tudo coisa do Demônio, poderia manter a audiência entre portas fechadas e as sentenças serviriam como alerta para outros conventos. Ele conseguiu seu objetivo. Boulle e outros padres foram considerados culpados e queimados publicamente. Nem mesmo Picard pôde descansar em paz. Seu cadáver foi desenterrado e colocado ao lado de Boulle na pira. Enviaram Madeleine para outro convento, onde ela foi submetida a um tratamento severo e condenada como feiticeira. Ela tentou o suicídio, mas sobreviveu, embora tenha morrido em 1674, com 40 anos de idade. Se os caçadores de bruxas dos séculos XVII e XVIII fossem sinceros em seus desejos de exorcizar o espectro do culto ao Demônio na Europa, deveriam ter olhado para os seus, em vez de plantarem as sementes da suspeita entre os camponeses. A maioria das cenas de devassidão e histeria religiosa foi encontrada atrás dos muros dos conventos e não nas regiões rurais da Inglaterra. O Diabo, ao que parece, nunca está distante dos que mais o temem.

Diz-se que Luís XIV ficou abalado com as revelações em Louviers. Ele também se enfureceu com o rumor de que muitas damas de sua própria corte estavam praticando o ocultismo, inclusive sua amante, Françoise Athénaïs, marquesa de Montespan – mais conhecida como madame de Montespan. Em 1676, o rei ordenou uma investigação discreta nas atividades de uma anfitriã da sociedade chamada Catherine Deshayes. Conhecida profissionalmente como La Voisin, Deshayes era uma cartomante, que diziam ser feiticeira e confidente de madame de Montespan. Os temores do rei comprovaram ter fundamento. Quando as autoridades invadiram a casa de madame Deshayes, descobriram um templo satânico e evidências de sacrifício humano. Havia ossos carbonizados em um forno, inclusive os de crianças assassinadas. Assim que a descoberta foi feita, Luís XIV ordenou que os investigadores mantivessem segredo. Eles também foram orientados a abafar a confissão de La Voisin, por medo de que ela pudesse incriminar aristocratas proeminentes que, dizia-se, teriam participado dos assassinatos rituais. Uma acusação condenatória em especial sustentou que Madame de Montespan tentou tomar o lugar da primeira amante do rei, Louise de la Valliére, pagando La Voisin para celebrar uma missa negra. Talvez tenha sido uma coincidência, mas a missa de la Voisin parece ter funcionado. Montespan realmente substituiu Louise na preferência do rei, apenas alguns meses depois da realização da missa. Mas, se o rei pensou que poderia silenciar La Voisin, estava enganado. A feiticeira continuou a oferecer seus serviços aos enfadados e abastados que buscavam excitação no mundo sombrio e perigoso do oculto. Quando madame de Montespan soube que seria substituída pela última obsessão de Luís XIV, Madame de Maintenon, governanta das crianças da realeza e futura segunda esposa do rei, ela correu até La Voisin e encomendou outra Missa Negra – dessa vez para amaldiçoar a governanta. La Voisin obedeceu por lealdade, contratando o idoso abade Guibourg como mestre de cerimônias. Porém, a vítima pretendida possuía uma determinação mais forte. Madame de Maintenon colocou sua rival de lado, com um sussurro na orelha do rei, exigindo que a feiticeira fosse silenciada para sempre. La Voisin foi presa, mas, na ocasião, suas ameaças de expor os segredos sórdidos da corte não foram suficientes para evitar sua execução. Marguerite, a única filha de La Voisin, testemunhou ter ajudado sua mãe na Missa Negra conduzida pelo abade Guibourg. A garota descreveu como Madame de Montespan ofereceu-se ao Demônio, enquanto o abade realizava um ritual indecente em seu corpo nu deitado em um altar negro drapeado. Em cada mão, ela segurava uma vela preta feita de gordura humana e fornecida pelo carrasco público, que foi um de seus muitos amantes. La Voisin foi considerada culpada pela prática de bruxaria e queimada viva em público, no ano de 1680. Madame de Montespan teve mais sorte. Ela não só escapou com vida, como também lhe foram dados meios suficientes para viver com requinte durante seu longo retiro.


A França não foi o único país da Europa Ocidental a testemunhar um surto de histeria de feitiçaria. Em setembro de 1589, o rei James VI da Escócia (que depois ficaria conhecido como rei James I da Inglaterra) esperava por sua futura noiva, a princesa Anne da Dinamarca, que estava sendo levada à Escócia por uma grande frota dinamarquesa. Entretanto, os navios foram abatidos por uma tempestade tão violenta que o comandante declarou que poderia ter sido causada por bruxaria. Depois de a frota encontrar abrigo na Noruega, o próprio James navegou até lá para trazer sua noiva. O casal feliz finalmente alcançou a terra firme em maio de 1590, após sobreviver a outra tempestade. James chegou à conclusão de que as tempestades se formaram porque seus inimigos estavam aliados ao Demônio, e por isso ordenou uma grande caça às bruxas por toda a Escócia. Esse não foi mero nervosismo pré-nupcial, porque era de conhecimento público que o quinto conde de Bothwell, um dos principais adversários de sua majestade, associara-se às feiticeiras. Mais tarde, soube-se que as tempestades tinham, de fato, sido preparadas por ordem de Bothwell. Pela liderança do bruxo John Fane, uma assembleia de feiticeiras executou a magia necessária. No julgamento deles, Fane e sua assistente, Agnes Simpson, confessaram ter obtido itens das roupas do rei, que enrolaram em uma efígie de cera e depois queimaram no fogo. Não bastando, eles batizaram um gato com o nome do rei e o afogaram no mar. Muito do que sabemos sobre a bruxaria nos séculos XVI e XVII vem das confissões detalhadas de Fane e Simpson, com as de inúmeras almas desafortunadas que foram capturadas e torturadas no que seria a maior caça às bruxas da história da Inglaterra. Os relatos da inquisição real foram registrados no próprio trabalho do rei sobre o assunto, publicado em 1580 sob o título de “Daemonologie”. O livro de James levou a sério a ameaça representada pela feitiçaria e as assembleias de bruxas. Por essa razão, fracassou em causar qualquer impressão em seus súditos leais, ao contrário da publicação rival The Discovery os Witchcraft, que se provou muito popular. Essa última fora produzida por Reginald Scot, um cavalheiro educado do campo, cético devotado que reuniu inúmeras narrativas da província, que circulavam na época. Ele o fez para entreter os leitores e refutar as acusações forjadas pela inquisição de James. Uma narrativa em especial entre as selecionadas era sobre um jovem sexualmente promíscuo que consultou uma bruxa por ter perdido seu membro e estar desesperado para substituí-lo. Ela o guiou até uma árvore alta, onde vários órgãos masculinos estavam estocados, mas o proibiu de escolher o maior, porque pertencera ao padre da paróquia. Scot apresentou uma mescla de narrativas similares de feitiços e maldições que ridicularizavam os camponeses e a Igreja, a qual ele acusou de infamar o medo irracional e a ignorância. A popularidade do seu livro irritou o rei, que o condenou por superar as vendas do seu próprio livro e por tratar com superficialidade o que ela acreditava ser uma ameaça séria ao reino. James I era um neurótico vingativo e desprezível, atormentado com sua identidade sexual. Ele deleitou-se ao testemunhar a tortura de seus supostos assassinos, mas no fim da vida percebeu que cometera um pecado capital ao forçar Fane e mais de 70 indivíduos inocentes a fazer confissões falsas. Ele teria admitido que Scot estava certo. Bruxas e demônios eram mera ficção e não havia, afinal, nenhuma verdade nas acusações.


O Julgamento das Bruxas de Salém:

Medo e fé cega é uma combinação com um potencial devastador, que pode causar danos mais duradouros do que qualquer demônio. Como demonstram as inúmeras caças às bruxas e perseguições religiosas, nossa capacidade latente para realizar diabruras maliciosas envergonharia até o próprio Diabo. Jamais esse fato foi demonstrado de forma mais destrutiva que na pequena vila de Salém, Massachusetts, em 1692, em que três crianças vingativas acusaram seus vizinhos de praticarem feitiçaria. Como resultado, mais de 200 pessoas foram presas e torturadas e 22 foram executadas ou morreram na prisão. A caça às bruxas começou na casa do reverendo Samuel Parris, um homem mal-humorado, de espírito mesquinho, que retornara recentemente de Barbados com Elizabeth, sua filha de 9 anos de idade, e seus criados negros. Elizabeth e Abigail Williams, sua prima de 11 anos, com Ann Putnam, uma amiga de 12 anos, logo caíram sob o feitiço de uma empregada, Tituba, que as entretinha com narrativas de ritos vodus e encantamentos para invocar os espíritos. Essas histórias lúgubres, combinadas com às advertências severas do reverendo Parris contra o interesse pelo Demônio, deram uma ideia às crianças entediadas para conseguirem atenção e divertirem um pouco à custa dos seus pais austeros e puritanos.  Em janeiro de 1692, elas fingiram (ou não) convulsões, engajando-se em ataques de grito e falando em uma língua irreconhecível, como se estivessem possuídas. Mas o jogo fugiu ao controle quando o médico chamado diagnosticou que Elizabeth fora amaldiçoada. Tituba foi espancada severamente pelo reverendo Parris, depois do que ela “confessou” as crianças com a ajuda de suas cumplices, uma indigente chamada Sarah Good e Sarah Osborne, uma senhora acamada. Quando as três garotas se apresentaram diante do magistrado, reclamaram de estar impedidas de testemunhar pelo espírito de Sarah Good, que deixara seu corpo para atormentá-las. Osborne e Good negaram praticar bruxaria, mas Tituba declarou que outros aldeões estavam envolvidos no coven. Ann Putman mencionou que Martha Cory era um deles, porque ela riu quando a garota encenou as convulsões. Ninguém ficou a salvo das acusações das crianças. Até mesmo um sacerdote, George Burroughs foi denunciado e executado. Quando viram o poder e a histeria que as garotas haviam desencadeado, outras crianças logo declararam ter sido possuídas, para poder acusar aqueles de quem elas não gostavam. Um homem foi torturado até a morte, certamente por não confessar ser um membro do coven, pois receava ter suas propriedades e bens confiscados caso confessasse. Posteriormente, sua mulher foi enforcada como bruxa. Quando as pessoas dos povoados mais distantes souberam como o Diabo fora efetivamente erradicado em Salém, as garotas foram convidadas a identificar bruxas suspeitas nas cidades vizinhas. Mas o magistrado de Andover recusou-se a processar seus vizinhos com base na palavra de algumas crianças; então, ele e sua família foram expulsos por uma multidão furiosa, que os acusou de proteger uma bruxa. Em outubro de 1692, a razão começou a prevalecer quando Increase Mather, presidente do Harvard College, e sir William Phips, o governador de Massachusetts, opuseram-se à histeria em massa que os circundava. No passado, Phips havia enfrentado alguns selvagens empunhando machados, portanto, não se intimidaria com um grupo de crianças neuróticas e seus apoiadores fanáticos. Ele decretou que “evidências espectrais” não seriam admissíveis em julgamentos futuros e depois ordenou a libertação de dezenas de pessoas que esperavam julgamento por acusações de bruxaria. Na ocasião, a lista de detidos incluía vários membros da igreja e alguns membros respeitados da comunidade. Infelizmente, para alguns foi tarde demais. Depois que o reverendo Parris foi denunciado, foi forçado a empacotar seus pertences. Sua saída encerrou a caça às bruxas tão subitamente quanto havia começado. Os acontecimentos de Salém foram um episódio vergonhoso na história americana, mas, como o chamado pânico satânico dos anos 1980 bem demonstrou, muitos falharam em aprender aquela lição específica e, portanto, a história estaria destinada a se repetir.


Entre os acessórios usados pelas bruxas e magos negros, existe a horrível “Mão da Glória” – a mão decepada de um enforcado segurando uma vela feita com sua própria gordura. Acreditava-se petrificar qualquer um que a visse, possibilitando à bruxa ou feiticeira roubar uma casa sem interferência. A receita para mumificar a mão foi publicada em 1722, em um livrinho de feitiços, conhecido como "Little Albert". Foi utilizada, ainda recentemente, em 1939, quando uma gangue de envenenadores na Filadélfia empregou-a para aterrorizar suas vítimas e intimidar testemunhas.

O Culto Vodu dos Mortos Vivos:

Em uma manhã em 1936, os donos de uma pequena propriedade rural na estrada suja e sinuosa perto de Port-au-Prince, no Haiti, perceberam uma mulher nativa cambaleando em sua direção, saída da névoa matinal. Ela estava vestida com uma bata branca e parecia procurar por alguém. Quando ela se aproximou, eles lhe perguntaram se poderiam ajudar, mas ela não respondeu. Seu rosto estava sem expressão, seis olhos mortiços não viam e sua boca tinha uma expressão dura. Então, um dos fazendeiros arfou ao reconhece-la. Mas aquilo era impossível, porque a garota tinha morrido 29 anos antes. Foi feito um exame superficial no hospital local. Todas as indicações eram de que ela era surda, muda e cega, mesmo assim ela se retraiu quando os doutores tentaram tocá-la, e sua cabeça se movimentava de um lado para o outro, como um pássaro se movimenta, como se para pegar o que eles estavam falando. Resolveu-se, por fim, o mistério, quando a paciente foi identificada formalmente por seu irmão e seu marido. Ela era Felícia Felix-Mentor, que fora enterrada em 1907. Quando uma enfermeira perguntou qual doença ele deveria registrar na ficha de admissão da paciente, o médico só pôde estremecer e responder “zumbi”. Existem histórias incontáveis de zumbis no folclore sombrio do Haiti – uma criatura digna de piedade e sem vontade própria, que existe em um estado entre vida e morte -, mas este não foi o caso. O caso de Felícia Feliz-Mentor foi investigado e documentado pela escritora norte-americana Zora Hurston, uma cética severa que encontrou e fotografou a garota “morta”, e saiu convencida de ela ser uma vítima genuína dos bokors, os feiticeiros vodus que praticam magia negra. Foi um encontro que a srta. Hurston nunca se esqueceria.  “A visão foi terrível. Aquele rosto imóvel, com os olhos mortos. As pálpebras eram brancas em torno dos olhos, como se tivessem sido queimadas com ácido. Não existia nada que você pudesse dizer a ela ou retirar dela exceto olhar para ela, e a visão de sua ruína era demais para suportar por muito tempo.”

Praticamente todos os haitianos acreditam que os mortos podem ser trazidos de volta à vida por feiticeiros, que então os usam como escravos maquinais, e é por isso que os pobres pagam tudo o que podem para proteger os túmulos de seus entes queridos. Eles compram um sarcófago pesado de pedra e então injetam veneno nos cadáveres ou os mutilam. Aqueles que são pobres demais para pagar, por proteção, montam vigília no cemitério durante dias, até o corpo ter se decomposto a ponto de não ter utilidade para os maus. Outros colocam uma faca no punho cerrado dos cadáveres, para que ele possa matar o bokor como vingança por perturbar a santidade dos túmulos. A lenda dos zumbis, ou jumbee, não está restrita à pequena ilha caribenha do Haiti. O termo é comum a várias culturas africanas, das quais as práticas e crenças do vodu derivam. Então, elas foram desenraizadas e transplantadas para o caribe, onde mesclaram a invocação de espíritos com o culto aos santos do Catolicismo francês. Os praticantes do vodu moderno distanciam-se das superstições de seus ancestrais, que eles veem como resíduos de uma tradição cultural em que os escravos tentavam se proteger da crueldade de seus capatazes. As bonecas ou marionetes, ainda que são oferecidas à venda nos mercados de Port-au-Prince, não são figuras para facilitar a magia simpática, mas objetos de poder (pwen) criados para transportar mensagens entre vivos e os mortos. Como tal, eles são pregados às portas dos cemitérios. A associação do vodu com a magia negra foi obra dos missionários cristãos, que tentaram dividir seus novos convertidos nativos dos obstinados vodouisants, que eles acusavam de praticar feitiçaria. A alegação de feitiçaria foi uma fiação maldosa encorajada pelos proprietários brancos de monocultura, que temiam os sacerdotes homens (houngan) e mulheres (mambo) pudessem se tornar tão poderosos que poderiam instigar uma revolta entre os escravos. Seus medos se concretizaram em 1791, quando um feiticeiro vodu chamado Dutty Boukman convocou milhares de escravos para uma cerimônia à meia-noite, nas profundezas da floresta, onde ele executou um ritual de sangue. Em meio a uma extraordinária tempestade tropical, ele ordenou à multidão reunida beber o sangue morno do porco que ele sacrificara, se eles quisessem se libertar do domínio colonial dos franceses. Quando a tempestade amainou, os escravos evaporaram de volta às fazendas e derrubaram seus opressores. Durante os dias seguintes, dezenas de plantações foram invadidas e seus proprietários brutalmente assassinados. Os franceses mantiveram-se firmes no poder durante anos, mas os sobreviventes viviam com medo dos servos sem alma – os bokors -, que, dizia-se eram imunes ás suas balas. Em 1803, o último latifundiário francês havia sido expulso e a república independente e negra do Haiti foi fundada. Mais tarde, os filmes hollywoodianos de terror transformaram a lenda do zumbi em sensação, mas ela não tem base em fatos. Alguns explicam o fenômeno afirmando que esses indivíduos apáticos são simplesmente retardados mentais, enquanto outros dizem que eles foram enfeitiçados por feiticeiros, pelo uso de drogas, e uma forma de hipnotismo. Mas o caso de Felícia Felix-Mentor está lá para alertar os céticos de que horrores inexplicáveis são realmente possíveis no Haiti.

A LENDA DO REI SALOMÃO:


Desde os tempos mais antigos, as figuras mais significativas na moldagem da civilização foram os reis-sacerdotes, que eram versados nas leis morais do homem e na sabedoria arcana dos mistérios. Eles eram capazes de fazer a distinção entre o que estava sugerido nas Escrituras e o que era comumente compreendido como sendo apenas um conjunto de leis morais que Deus concedeu ao homem. O primeiro deles e o mais reverenciado foi o rei Salomão. Sua fama foi universal, estendendo-se muito além das terras dos israelitas, sobre as quais ele reinou. Ele ascendeu ao trono aos 12 anos de idade, depois que seu pai, o rei Davi, morreu. O esplendor do palácio de Salomão sobrepujava até mesmo o dos faraós. Dizia-se que suas casas de tesouro transbordavam ouro, metais preciosos e gemas do tamanho de olhos de águia, enquanto ele ostentava roupas de ouro e veludo. A seu comando havia 1.400 carros, 40 mil cavalos de carros e 20 mil cavalos de montaria. Todas as suas taças de beber eram de ouro, pois desprezava-se a prata como metal inferior. Seu palácio, que ele denominou de Iahar-Halibanon, a Floresta do Líbano, tinha cem cúbitos de extensão, 50 cúbitos de largura e 30 cúbitos de altura, com aposentos de cedro. Uma floresta de colunas se erguia de chãos pavimentados com cristal, mas o mais maravilhoso era o trono de Salomão. Feito de mármore, era tão grande que o rei tinha se subir seis degraus para sentar-se nele. Cada degrau era guardado por leões, um em cada lado, que estendiam suas garras quando ele se sentava. Dois leões de madeira foram esculpidos no trono, que tinha um par de águias trepadas nele, cujas asas protegiam o rei do implacável sol do deserto. Ainda mais grandiosa era a sabedoria de Salomão. Ele era mais sábio que Etã, o Ezraíta, Chalcol, Darda ou os filhos de Mahol. Mesmo os reis das nações vizinhas enviavam seus sábios e filósofos para serem instruídos pelo rei dos hebreus. Pois Salomão era instruído – algo raro entre os monarcas daqueles tempos. Ele compôs 3 mil provérbios e 5 mil cânticos, em que expôs seus conhecimentos de teologia, ciências naturais e filosofia. Os três reinos da natureza – a terra, o céu e o mar – obedeciam a seu comando, do mesmo modo que os espíritos: celestiais, terrenos e infernais. De acordo com a lenda, os bons espíritos cuidavam dos jardins de Salomão, esculpiam estátuas com as pedras retiradas das pedreiras e fiavam seus carpetes preciosos. Mas existiam outros espíritos com que ele tinha a reputação de se congregar. Com a ajuda do poder investido em si por um anel mágico, Salomão também comandou a obediência de demônios, de quem, dizia-se, ele adquirira sua sabedoria extraordinária. Esses demônios ficavam confinados dentro dos muros do palácio pelo poder do anel e eles comiam com o restante dos familiares em mesas de ferro. Afirmações que possivelmente foram feitas pelos que tinham inveja da riqueza e do poder de Salomão. Com toda a sua sabedoria, Salomão desviou-se para o lado negro, sob influência funesta de uma filha do faraó, que o seduziu a servir a deusa dos sidonianos Astarte e Moloch, o deus dos amonitas, com sacrifícios rituais para suas imagens. Quando se aproximou do fim da vida, Salomão rezou para que sua morte fosse escondida dos demônios, até que eles tivessem acabado de escrever os grimórios (livros de magia ritual) que haviam começado sob suas ordens. Então, Salomão virou as costas para seus servos ímpios, apoiou-se em seu bastão e se ajoelhou como se estivesse rezando. E morreu naquela posição, enquanto os demônios continuavam a trabalhar sem perceber que seu poder sobre eles tinha acabado. Contudo, quando eles completaram sua tarefa, um réptil arrastou-se de uma fissura no chão e subiu pelo bastão, e diante disso o cadáver de Salomão desmoronou, transformando-se em poeira e vestimentas. Então, os demônios fugiram, deixando os livros para trás, e com eles o poder de trazê-los de volta à vida. Esta é a lenda da origem dos grimórios que trazem o nome do rei – “A Chave de Salomão”, que data do século I, e o “Lemegeton” ou “Chave Menor de Salomão”, que pode ser datado de 1500 a.C, mas que, sem dúvida, é bem mais antigo. Os dois livros foram traduzidos e muitas línguas e copiados à mão nos séculos anteriores à invenção da máquina de impressão. A cópia mais antiga sobrevivente da “Chave de Salomão” data do século XV. Ela é mantida trancada e à chave na ala “proibida” do Museu Britânico. O Lemegeton lista não menos que 72 demônios e suas funções. Todos eles são descritos em detalhes, como se tivessem sido capturados e catalogados por um caçador de insetos sobrenaturais, creditados tanto com vícios, como com virtudes. Mais da metade dos demônios serve para ensinar ao mago matérias como matemática, filosofia, astrologia, astronomia, lógica, línguas, artes e ética. De acordo com o autor anônimo do livro, esses habitantes do mundo subterrâneo também podem ser consultados sobre assuntos do passado, presente e futuro. Porém, também existem demônios que podem ser comandados para trabalhar como servos, localizando objetos pessoais que se consideravam perdidos ou avisando sobre as propriedades particulares de certas ervas como o alho, que tradicionalmente mantinha os espíritos malignos a distância.  Outras ervas agiam como eméticos, para que o mago fosse purgado das impurezas para iniciar um período de jejum, abstinência e castidade antes de um ritual importante. Isso era crucial, porque se acreditava que um espírito impuro existia em um nível inferior de existência que o dos humanos, então o mago podia reduzir o risco de contaminação ou possessão elevando sua vibração até um nível mais alto de purificação. É por isso que se acredita ser perigoso estar sob a influência de álcool ou drogas enquanto se envolve com o oculto. Existe um forte elemento de satisfação de desejo, é claro, em dar a certos demônios a tarefa de garantir os desejos secretos de seu mestre, sejam eles riqueza, posição social ou qualidades pessoais, tais como a astúcia ou a coragem. Por mais curioso que pareça, quatro demônios são encarregados de fornecer entretenimento para aliviar o espírito atormentado ao fim de um dia difícil de conjurações. Ele vem na forma de música, com sons naturais e visões. A um demônio, inclusive, cabe a tarefa de verter água quente para o banho, enquanto outros tornam a água em vinho e de novo em água. Mas os mesmos demônios podem causar devastações em cidades inteiras, incinerar os inimigos do mago ou empestar qualquer um de quem eles não gostem com pústulas e outras doenças. Também está em seu poder criar desastres naturais e artificiais, seja na forma de guerras, terremotos, misérias ou inundações. Os prazeres da carne não são negligenciados. Não menos que 11 espíritos recebem a responsabilidade de enfeitiçar mulheres para que seu mestre possa seduzi-las e um tem a função única de força-las a se despir. Com certeza a ciência progrediu desde a era da magia, mas a natureza humana, evidentemente evoluiu mais devagar.


MONTAGUE SUMMERS:


Em 1926, no auge da “Era do Jazz”, um obscuro clérigo católico romano experimentou o sucesso da noite para o dia, com um dos mais inesperados best-sellers. “The History of Witchcraft and Demonology”, do reverendo Montague Summers (1880-1948), foi apresentado como um trabalho sério de um acadêmico, repleto de citações em latim e francês, notas de rodapé e uma bibliografia abrangente. Mesmo assim, imediatamente incitou a ira dos mais notáveis pensadores da época e foi igualmente condenado pela imprensa. O escritor H.G Wells difamou a obra como um catálogo se superstições sem sentido, enquanto muitos jornais se perguntavam se a publicação não seria uma piada sofisticada. Summers, no entanto, era extremamente sério. Em sua introdução, ele declarou que a obra não era apenas uma análise de pesquisador de antigos ritos rurais esquisitos. Ao separar o fato do folclore, ele foi capaz de cortar caminho para “a essência e a realidade duradoura da bruxaria e do culto às bruxas ao longo dos séculos”, para concluir que “existiram e existem organizações deliberadamente, diria mais, entusiasticamente dedicadas ao serviço do mal”. Para respaldar seu argumento, Summers citou caso após caso em que as bruxas espontaneamente confessaram comungar com o Diabo. Ele observou que muitos relatos estranhamente similares em substância, apesar das diferenças das culturas em que eles se deram. A imagem romântica de bruxa voando montadas em cabos de vassoura foi descartada como pura fantasia, e os que declararam ter testemunhado tais cenas, como Claudine Bauban, foram desacreditados como pessoas que queriam chamar atenção ou sem bom senso, como Julian Cox, que confundiu um ritual de dança camponesa que usava cabos de vassoura com um voo de bruxas. Mas não foi o vigor acadêmico de Summers nem a erudição de seus argumentos que garantiram ao livro o status de cause célebre. Foi sua tendência a se prolongar nos detalhes sexuais das cerimônias satânicas das bruxas. Seu gosto pouco reprimido combinava-se à indignação virtuosa de alguém que não tinha sido convidado para a orgia. Essa era uma sensação compartilhada pela maioria dos seus leitores, que só puderam concluir que a bruxaria existia, e bem no século XX. Summers teve a singular habilidade de tornar o assunto deliciosamente sedutor. Montague Summers foi um personagem tão extraordinário quanto seu contemporâneo Aleister Crowley, que ele conheceu pessoalmente. Com um rosto de anjo excêntrico, ele aparentava ter saído de uma novela do século XVIII de Swift ou Fielding, uma impressão que se ajustava com sua voz em falsete cômica e penteado que se assemelhava a uma peruca da Regência. Ele costuma vestir sotaina, chapéu de abas largas e uma capa preta. Para completar o quadro, usava sapatos de fivela e uma bengala com castão retorcido de prata, que representavam uma cena lasciva da Antiguidade. Seu título ecumênico era totalmente fictício. Ele fora ordenado diácono da Igreja da Inglaterra em 1908, mas não foi aceito oficialmente como clérigo. Talvez em função dos rumores sobre seu interesse por satanismo ou, mais provavelmente, pelas suspeitas a respeito de sua conduta sexual imprópria com os garotos do coro, pelo que, posteriormente, foi julgado e absolvido. Seja qual for a verdade, ele converteu-se ao Catolicismo e se fez passar por padre católico. Ele era um “personagem” conhecido, representado com frequência pelos cartunistas dos jornais, como um Frei Tuck, em caricaturas que o desenhavam surgindo da biblioteca do Museu Britânico com um livro sobre vampirismo debaixo do braço. Mas havia os que o consideravam um personagem um tanto sinistro. O autor de ocultismo Dennis Wheatley recordava-se de ter sido convidado para a residência de Summers, em Alresford, onde ele foi entretido com as histórias das lutas de seu anfitrião com o Diabo. Um episódio especialmente memorável mostrava o suposto clérigo realizando um exorcismo na esposa de um trabalhador na Irlanda. Ela espumava pela boca e teve de ser subjugada enquanto executava a cerimônia. No auge do combate, viu-se um vapor negro saindo da boca da mulher. Depois, a nuvem escura penetrou na perna de um carneiro, que tinha sido preparado para o jantar. Quando chegou a hora de destrinchar a carne, o anfitrião exausto e seu convidado ficaram horrorizados ao ver a mulher cheia de vermes. É uma boa história, mas os mesmos acontecimentos foram atribuídos a meia dúzia de ocultistas em várias épocas. Mais significativo foi o fato de Wheatley e sua mulher terem ficado chocados ao descobrir que dividiram sua cama com uma dezena de aranhas gigantes. Um sinal claro, diz-se, da presença de magos negros. Na manhã seguinte, o anfitrião levou o autor a um quarto repleto de livros. Ele selecionou um pequeno volume de capa de couro e ofereceu-o ao seu convidado por 50 libras esterlinas. “É sua cara”, disse Summers, “vale muito mais, mas eu o deixarei compra-lo por 50.”. Um tanto embaraçado, Wheatley declinou a oferta, dizendo que não poderia pagar por ela naquele momento. “Nunca tinha visto a expressão de um homem mudar com tanta rapidez”, Wheatley escreveu mais tarde. “De uma calma benevolente, de repente se encheu de uma fúria demoníaca. Ele jogou o livro e saiu do quarto irritado.” Para evitar mais atritos, Wheatley enviou um telegrama fictício para si mesmo e voltou para Londres na mesma noite. O sucesso de “The History of Witchcraft and Demonology” encorajou Summers a escrever mais volumes sobre temas relacionados (dois exploraram a lenda do vampirismo e o outro instigou os lobisomens), todos ostentando um grau acadêmico similar e uma pesquisa cuidadosa. Ele apresentou cada volume como evidência documental da existência de cada uma das criaturas parecia acreditar em cada palavra que escrevera. Ela editou também uma tradução do Malleus Maleficarum, tratado do século XV de Kramer e Sprenger, e pôs seu nome em uma edição revisada de “The Discovery of Witches”, o infame guia de caçadores de bruxas de Matthew Hopkins, além de compilar várias coleções de histórias de horror góticas. Porém, é por reacender o interesse pela feitiçaria que ela será mais bem lembrado, reverenciado ou insultado. “Eu me esforcei para mostrar uma feiticeira como ela realmente era – um ser diabólico; uma peste e parasita social; devota de uma crença repugnante e obscena; uma adepta do envenenamento, chantagem e outros crimes horripilantes; membro de uma organização secreta poderosa e inimiga da Igreja e do Estado; blasfema na palavra e nas ações, que domina aldeões pelo terror e superstição; uma charlatã e curandeira, às vezes; uma alcoviteira, uma aborteira, a conselheira sinistra das damas lascivas da corte e dos galanteadores adúlteros; sacerdotisa do vício e de corrupção inconcebível, à custa da vulgaridade e das paixões mais abomináveis da época.” É necessário lembrar, porém, que o “reverendo” Montague Summers não era uma fonte inteiramente confiável e imparcial. Apesar do seu zelo religioso professo, ele era um membro ativo da Ordem de Chaeronea, uma ordem pederástica cujos interesses por meninos não eram puramente filosóficos ou platônicos; ele também foi membro da British Society for the Study of Sex Psychology, para a qual escreveu um ensaio exaltando os defeitos e virtudes do Marquês de Sade.

GERALD GARDNER:
Com o impacto de seus cabelos brancos, barbicha de bode e sobrancelhas espetadas, Gerald Gardner parecia um sátiro envelhecido. Ele também desempenhou o papel, manifestando uma predileção pelo autoflagelo, que deixava os jornais de domingo ávidos por confissões lascivas. Eles especulavam sem distinção sobre cenas de libertinagem, que imaginavam acontecer quando os membros de seu coven davam cambalhotas, nus sob a lua cheia. Porém, por trás do velho travesso e de sua aparência suspeita, havia uma paixão genuína pelo misticismo como experiência concreta e a ele pode ser creditado o renascimento da Wicca moderna que é, atualmente, a religião que mais cresce na América.  Gardner (1884-1964) viveu na Malásia durante a juventude e lá ele se entregou à paixão pela arqueologia e antropologia, retornando brevemente à Inglaterra, em 1920, para ver se poderia despertar o interesse do movimento espiritualista por feitiços e “ferramentas de magia” criadas por ele. Ele não teve sucesso, então voltou para a Malásia, onde trabalhou para o Serviço de Alfândega Colonial até 1936. Em sua aposentadoria, emigrou para a Inglaterra, onde se envolveu em uma sociedade secreta, a Sociedade da Ordem Rosa-Cruz de Crotona, que praticava uma forma de magia cerimonial que Gardner considerou fascinante, porém arcaica. Ele resolveu revigora-la com suas próprias criações baseadas em descrições detalhadas de cerimônias pagãs de fertilidade, que apareceram em dois trabalhos de grande influência: “The Witch Cult In Western Europe” (1921) e “The God of the Witches” (1931), ambos da professora Margaret Murray do University College, de Londres. Murray havia começado com a presunção de que as bruxas antigas tinham sido mulheres velhas desiludidas, que haviam cultuado o diabo, mas ele concluiu declarando que elas eram remanescentes de um culto de fertilidade que foi injustamente perseguido pela Igreja. No início, Gardner aproximou-se da bruxaria como um exercício acadêmico, rastreando suas rotas até a Idade da Pedra. Mas ele também era um exibicionista excêntrico, que desejava estar cercado por acólitos dispostos a se prostrar aos pés de seu mestre e se submeter ao seu tipo peculiar de disciplina. Gardner pode também ter tirado ideias de a “Deusa Branca” de Robert Graves, uma história abrangente do paganismo e da magia, e de “Golden Bough”, de James Frazer. Os dois livros teriam dado a ele material suficiente para “Book of Shadows”, seu livro de rituais de magia e textos religiosos. Contudo, os que estavam enamorados demais por seu mestre para observar com mais atenção consideraram-no como totalmente original. Os textos de Dion Fortune inspiraram Gardner a escrever “High Magic´s Aid”, seu romance sobre magia publicado em 1949, um romance medieval pomposo, no estilo de sir Walter Scott. Ele declarou utilizar rituais de magia autênticos, parcialmente retirados de “A Chave de Salomão”, um grimório (livro de magia) “e parcialmente de manuscritos de magia que eu possuo”. O Ato de Feitiçaria de 1735 impedia-o de admitir abertamente que praticava a Arte, mas quando o ato foi revogado, em 1951, Gardner viu sua oportunidade e a explorou. Seu segundo livro, “A bruxaria Hoje” (1954), ostentava um prefácio de Margaret Murray, que na ocasião estava perdendo credibilidade, pois começara a promover teorias cada vez mais excêntricas, em específico a ideia de que todos os monarcas ingleses eram bruxos. Contudo, seu endosso não prejudicou o livro. Ele inclusive encontrou aceitação imediata pelo público em geral, que ficou fascinado em saber que “a antiga religião” ainda estava viva e bem na Grã-Bretanha moderna e seus adeptos não tinham vergonha de praticar sua fé, nus, nas florestas e até nos subúrbios. Em 1946, Gardner contratou Aleister Crowley para criar novas cerimônias de iniciação e rituais, com o objetivo de criar sua própria versão da Arte, embora uma versão com uma temática sadomasoquista inconfundível. Flagelos rituais e cópula eram centrais nos ritos de iniciação gardnerianos e muito do que se passava como culto era um teatro do absurdo. Mesmo assim, o coven de Gardner atraiu dezenas de seguidores desencantados com as religiões ortodoxas, e eles encorajavam outros a criar seus próprios covens na Inglaterra e na América. Esses convertidos tinham se distanciado dos aspectos mais sensacionais da filosofia de seu fundador. Eles haviam amadurecido em uma irmandade que outorga poderes às mulheres e celebra o princípio feminino. Não é difícil compreender por que a Wicca é tão popular nos dias de hoje. A religião ortodoxa oferece à mulher algo além de subserviente, ao passo que o Cristianismo faz da mulher a responsável pelo Pecado Original. A fonte primária dos ritos de iniciação, rituais e regras gardnerianos é o “Livro das Sombras”. Apresentado originalmente como um documento manuscrito que professava ser do século XVII, foi de fato escrito por Gardner no fim dos anos 1940 ou no início da década de 1950. Só Gardner poderia ter tido o atrevimento de esboçar uma lei afirmando que as altas sacerdotisas deveriam renunciar em favor de uma mulher mais jovem se o coven assim o desejasse. O título “Livro das Sombras” também faz referência aos registros pessoais dos trabalhos de magia mantidos por todas as bruxas. O livro de Gardner é singular por delinear um plano de resistência da magia à invasão nazista da Grã-bretanha, uma ideia que Dion Fortune compartilhou em “The Magical Battle of Britain”.



ALEX SANDERS:

Atrás das cortinas de chintz rendado de uma modesta casa com terraço, na região de veraneio à beira-mar de Bexhill-on-Sea, o autoproclamado “Rei das Bruxas” Alex Sanders, de 60 anos, vestia uma máscara de ouro e um cocar pesado de penas antes de invocar um espírito do fogo asteca de uma dimensão além do tempo e do espaço. Em seguida, seus assistentes removiam seu robe, deixando esse xamã suburbano dançar em volta do cômodo da frente enquanto segurava uma vela flamejante em cada mão. Aparentemente, ele estava possuído pela entidade, que proferia palavras de sabedoria do mundo dos mortos. “Muitos me olham com estranheza”, ele disse à equipe de TV que filmou o ritual para um documentário. “Muitas pessoas têm medo de mim, isso é culpa delas, não minha.” Na época, Alex era um velho frágil, com dificuldade para permanecer em pé sem ajuda, mas, uma vez que o espírito estivesse nele, ele sentia que podia “liderar o caminho” para seu “povo”, protegendo-os da perseguição e dos olhares indiscretos dos tabloides. Como muitos magos e ocultistas, Alex era um egotista impenitente e um fantasista por hábito, que cortejava a controvérsia e atormentava a imprensa para publicar suas atividades. Não foi apenas seu apetite por publicidade que enfureceu seus colegas wicanos, os quais temiam que relatos sensacionalistas incitassem a perseguição e o ridículo: ele também tinha o hábito de “enfeitar” a verdade para tornar-se mais interessante. Parece que ele foi iniciado na Arte por um membro de um coven de Nottingham em meados dos anos de 1960, mas Alex sempre insistiu que sua avó galesa Mary Bibby tinha executado a cerimônia depois que ele entrou em sua casa enquanto ela realizava um ritual. “Em uma noite de 1933, quando eu tinha 7 anos, fui enviado para a casa de minha avó para um chá. Por alguma razão, não bati na porta ao entrar, e me deparei com minha avó nua, seus cabelos cinzentos soltos caindo até a cintura, em pé em um círculo desenhado no chão da cozinha.” Quando se recobrou do choque de ter sido descoberta, ela lhe disse para retirar suas roupas e se juntar a ela dentro do círculo. Então, ela fez um corte em seu escroto com uma faca e declarou que ele era um deles. Depois de fazer com que jurasse segredo, ela informou ser descendente do chefe e rei de bruxas galês Owain Glyn Dwr, e que Alex teria o direito de assumir o título quando fosse a hora. Mas primeiro ele tinha de se familiarizar com os ritos da “religião antiga”, copiando os rituais de seu próprio Livro das Sombras. Qualquer que fosse a verdade, Alex era um médium natural, assim como seus irmãos. Sua futura esposa e alta sacerdotisa Maxine Sanders lembrou que a casa da família ficava lotada de espíritos, atraídos pela energia psíquica gerada pelos irmãos de Alex e as sessões mediúnicas regulares que aconteciam em volta da mesa da cozinha. “Não era incomum entra4r na cozinha dos Sanders em plena luz do dia e encontrar uma sessão mediúnica de materialização completa acontecendo. A sra. Sanders estaria entretida em suas rotinas domésticas, independentemente das aparições presentes.” A primeira praga concreta de Sanders foi dirigida à sua primeira esposa, que o deixou quando ele tinha 26 anos, levando seus dois filhos com ela. Alex amaldiçoou a mulher com um feitiço de fertilidade, para que, quando ela se casasse de novo, tivesse a sobrecarga de dar à luz três pares de gêmeos. Mas isso foi um pequeno consolo para o sentimento de ser rejeitado e abandonado, então Alex saiu em busca de riqueza e sexo, usando feitiços para tal fim. “Eu cometi um erro terrível ao usar magia negra em uma tentativa de conseguir dinheiro e êxito sexual. Funcionou muito bem – eu estava andando por Manchester e fui interpelado por um casal de meia-idade que me disse que eu era o duplo exato de seu filho único, que morrera havia alguns anos. Eles me levaram para sua casa, alimentaram-me e vestiram, e trataram-me como um familiar. Eles eram riquíssimos e, em 1952, quando pedi a eles que me dessem uma casa, com uma pensão para mantê-la, eles ficaram felizes em realizar meus desejos. Eu fiz festas, comprei roupas caras, eu era sexualmente promiscuo; mas depois de algum tempo, percebi que tinha uma dívida terrível a pagar.” Vários membros da família de Sanders morreram prematuramente de câncer e a namorada de Alex cometeu suicídio. Esses acontecimentos dissuadiram-no de continuar se aventurando pela Linha Esquerda. Em vez disso, ele trabalhou por um tempo como curandeiro, mas não conseguia resistir a libertar um cliente de verrugas, transferindo-as para alguém de quem ele não gostasse. Ele também afirmou ter curado um homem viciado em drogas e ter executado abortos psíquicos enviando a alma de volta para o Paraíso. E, quando ele não conseguia persuadi-la a voltar, diz-se que ele recomendava um aborteiro aqui da Terra. Ele recebeu o crédito de ter curado p pé deformado de sua própria filha Janice, cujo tratamento fora desacreditado pelos médicos. Seguindo instruções de seu guia espiritual, Alex banhou o pé de Janice em azeite de oliva e o massageou até ser capaz de virá-lo de volta à posição correta, sem nenhuma dor. Em 1963, a partir de conselhos de seu anjo da guarda e espíritos guias, ele aceitou um trabalho subalterno na John Rylands Library em Manchester, onde pôde estudar a fundo as cópias de dois grimórios lendários, “A Chave de Salomão” e “O Livro da Magia Sagrada de Abramelim, o Mago”. Mas ele não contentou só com a leitura dos livros. Ele tinha de possuí-los. Uma noite, conseguiu retirá-los às escondidas da biblioteca, mas foi pego em seguida. Sob a ameaça de processo, prometeu devolvê-los, mas não antes de fazer uma cópia manuscrita dos rituais mais potentes. É provável que lhe teriam pedido que deixasse a livraria de qualquer modo, porque ele havia atraído atenção indesejável sobre si ao persuadir o Manchester Evening News a publicar uma matéria de primeira página sobre bruxaria. Esse incidente também o levou a ser banido de seu coven local, que o considerou um peso morto. Mas a imprensa importunou-o por mais petiscos lascivos e ele atendeu de boa vontade. Em 1965, declarou presidir sobre cem covens a partir de sua casa em Manchester e ter criado um familiar na forma de um bebê, feito a partir de um ato de magia sexual com outro membro masculino do coven. Alex parece ter sido um médium de transe genuíno, mas sua afirmação de ter canalizado um bruxo do século XVII chamado Nick Demdike não foi provada. Acusaram-no de retirar o nome de um romance do século XIX, “The Lancashire Witches”, de William Ainsworth, que tinha um bruxo com o mesmo nome. Em 1969, outra reportagem no jornal dominical sensacionalista empurrou Sanders para os holofotes e ele se viu uma celebridade menor no circuito dos programas de entrevistas, para desgosto de outras bruxas. A reportagem era em torno da afirmação de Alex de ser capaz de erguer os mortos, um rito que ele executou com uma expressão séria em Alderley Edge, diante de um repórter embasbacado. O “cadáver” era, um dos assistentes de Alex, que jazeu obediente até o momento combinado, imóvel como uma múmia egípcia sob camadas de bandagens. O médico que atestou a morte da vítima, para começar, era outro amigo de Alex. Quanto ao ritual, Alex não desejava o risco de incorrer na fúria dos deuses ao dizer seus nomes em vão, então resistiu à tentação de usar um verdadeiro encantamento e em vez disso leu uma receita de trás para a frente! Suas farsas e a ânsia por publicidade zangaram muitos dos que se empenhavam em praticar suas crenças a portas fechadas e no anonimato, e Alex tinha plena consciência das críticas levantadas contra ele. Em 1979, fez um pedido de desculpas completo e sincero e expressou a esperança de que a totalidade dos convertidos que ele trouxera para a Arte superasse vastamente a atenção negativa que atraíra. Sanders morreu de câncer do pulmão no dia de Beltane, 30 de abril de 1988. Seu último desejo foi de que seu filho Victor o sucedesse, mas Victor não queria nada com o movimento e imigrou para a América. O ramo Alexandrino da Wicca hoje em dia está firmemente estabelecido como uma alternativa à tradição gardneriana, mas não é tão popular. Isso, em parte, se deve ao fato de que Sanders representou uma imagem negativa da Wicca na imprensa, mas outro motivo pode ser a insistência de Sanders pela admissão de homossexuais – uma regra que desorganiza a dinâmica macho-fêmea, que é central nos trabalhos de um coven.



DION FORTUNE

A autora e ocultista Dion Fortune (1890-1946) foi a responsável pela disseminação da teoria e prática da magia cerimonial para um círculo tão amplo como nunca visto. A informação que ela forneceu só estivera disponível antes para iniciados de sociedades secretas como a Golden Dawn. Codificada em seus romances – “The Winged Bull”, “The Sea Priestess”, “The Goat Foot God” e outros – eram ritos e rituais que os wiccanos e magos modernos foram capazes de adaptar e incorporar a um sistema de magia neopagão baseado no culto à deusa, ou o princípio feminino. Ele foi um afastamento da “religião antiga”, em que a figura patriarcal de Pã mantivera-se suprema. Seus diversos estudos sobre magia ritual e filosofia oculta, incluindo “The Cosmic Doctrine”, “The Mystical Qabalah” e “Sane Occultism”, foram realizados na “The Occult Review”, uma revista que teve circulação ampla nos anos de 1930. Eles devem ter sido devorados por pessoas como Gerald Gardner e Doreen Valiente, os responsáveis pelo ressurgimento da Wicca dos anos de 1950. Pode-se argumentar que, sem a contribuição de Dion Fortune, o movimento wicano moderno não teria florescido como floresceu e o movimento Nova Era não teria evoluído para uma forma de espiritualidade centrada na natureza, que é simbolizada pela Mãe Terra e a Rainha do Céu. Nascida Violet Mary Firth em Llandudno, Gales, ela foi criada como cientista cristã, mas aos 20 anos foi compelida a mergulhar na filosofia e magia oriental, depois de sofrer um colapso nervoso quando trabalhava como professora em um colégio particular de garotas. Mais tarde, declarou que não foi uma desordem nervosa comum, mas o resultado de um “ataque psíquico” mantido pela diretora, que havia estudado ioga na Índia e usou sua vontade superior para quebrar a resistência de Violet e destruir sua autoconfiança. “Eu entrei como uma jovem forte e saudável. Saí como um destroço psíquico e mental”, ela escreveu. Quando se recobrou, ela decidiu aprender tudo o que pudesse sobre os poderes latentes da mente, que ela suspeitou ser a fonte de todo fenômeno oculto. Pouco antes da Primeira Guerra Mundial, ela matriculou-se na Tavistock Clinic para estudar psicanálise freudiana, onde conheceu seu mentor, o místico anglo—rlandês T.W.C Moriarty, que inspirou sua coleção de contos “The Secreto f Dr. Taverner”. Depois da morte dele em 1923, ela uniu-se à “Cristian Mystic Lodge of the Theosophical Society”. Em 1919, ela foi iniciada em uma “loja irmã” da Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn), onde aprendeu o funcionamento da magia cerimonial, mas, na ocasião, a ordem estava em declínio. “seus velhotes futriqueiros” passavam mais tempo discutindo sobre procedimentos do que um Conselho do que um conselho de pastores de província. Durante os três anos em que permaneceu com a ordem, ela adquiriu seu nome mágico, uma contração de “Deo Non Fortuna” (“Por Deus, não pelo Acaso”), e chegou à conclusão de que os ocultistas modernos não poderiam se dar ao luxo de ignorar as percepções oferecidas pela psicologia. Ela pontuava que as ordens de magia como a Golden Dawn estavam condenadas à extinção porque seus membros estavam determinados a preservar um conhecimento arcano, em vez de desenvolvê-lo, do mesmo modo que as religiões ortodoxas fizeram antes. Ela delineou sua filosofia em “Sane Occultism”, o primeiro de vários livros sobre os aspectos práticos de magia e do desenvolvimento psíquico. “Um conhecimento de filosófica oculta pode dar uma pista para as pesquisas dos cientistas e equilibrar os êxtases dos místicos.” Como psicóloga treinada e ocultista praticante, ela percebeu que a fonte primária de nossa moléstia moderna origina-se de uma negação do nosso ser subconsciente intuitivo, personificado pelos pagãos como Pã, ou a consorte do Deu Cornífero, Arádia, o arquétipo feminino do si mesmo. De acordo com Dion Fortune, a não ser que pudéssemos reconciliar os aspectos psíquicos e práticos de nossa espiritualidade, permaneceríamos vítimas de desordens mentais, tais como depressão, bem como doenças relacionadas ao estresse crônico. Nos romances de Dion Fortune, mais que em seus panfletos de magia, fica claro que se realinhar com a natureza é o caminho para a integração psicológica e a autorrealização. A religião pede ao crente que aceite a promessa da vida após a morte com confiança, para submeter a vida ao serviço do divino e resistir à tentação, enquanto a filosofia oferece vida após a morte como apenas uma possibilidade e pede ao indivíduo que assuma a responsabilidade por seu destino. Apenas o ocultismo revela a verdadeira natureza da Realidade Maior e nosso propósito nela, e isso capacita o indivíduo com a habilidade para criar essa realidade. Nos anos de 1920 e 1930, não era permitido criticar a religião. Qualquer autor que o fizesse seria ridicularizado pela imprensa e podia dizer adeus à sua carreira literária, portanto, Fortune fez com que seus pontos de vista sobre o Cristianismo ficassem conhecidos pela boca de seus personagens. No “The Winged Bull”, ela deixa o personagem central, um acadêmico erudito e ocultista, fazer o discurso. “E, então, vieram os caçadores de heresias e deram a ele (Cristianismo) um trato final, realizando um grande esforço para se livrar de tudo que ele havia herdado de crenças mais antigas. E eles haviam sido como moleiros modernos, que refinam todas as vitaminas retirando-as do pão e condenam metade da população ao raquitismo. Foi o que aconteceu com a civilização, ela teve raquitismo espiritual porque seu alimento espiritual era refinado demais. O homem não pode prosseguir sem um traço de paganismo e, em geral, ele não tenta.” O ritual central na Wicca moderna, conhecido como Descenso da Lua, sempre foi creditado ao autoproclamado “Rei das Bruxas” Gerald Gardner e sua alta sacerdotisa Doreen Valiente, mas ele é, na verdade, uma variação do rito descrito por Dion Fortune em seu romance “The Sea Priestess”, publicado em 1938. Desenha-se um círculo sagrado em volta de um sacerdote e uma alta sacerdotisa do coven, cercando-os em um espaço consagrado, marcado nos quatro pontos cardeais do compasso e santificado com os quatro elementos: fogo, ar (incenso), água e terra (sal). Depois, o grão-sacerdote ajoelha-se diante da alta sacerdotisa, que está em pé de frente para o altar segurando um bastão em uma mão e um cesto em outra, com os braços cruzados em uma imitação de Osíris. Então, o sacerdote dá um beijo nos pés, joelhos, abdome (barriga), seios e por fim nos lábios da sacerdotisa, antes de se dirigir a ela como a encarnação da Deusa Mãe. Daí, ela pode ser inspirada a se dirigir ao coven, como se canalizando a deusa, ou pode recitar uma passagem do Livro das Sombras, a “bíblia” das bruxas, ou outro trabalho que pareça relevante na ocasião. Não existe menção ao Demônio ou nada que possa ser interpretado como uma afronta ao Cristianismo. Na verdade, é bem o oposto. “Eu sou a Deusa graciosa que oferece a dádiva da alegria para o coração do homem. Sobre a terra eu concedo o conhecimento do espírito eterno; e, após a morte, eu concedo paz, liberdade e reunião com os que se foram no passado. Eu não exijo sacrifício; pois, perceba, eu sou a Mãe de tudo que vive, e meu amor brota por toda a terra.” Nos romances de Dion Fortune, o protagonista em geral é um homem que sofreu um esgotamento nervoso ou outra crise. Em seguida, ele é resgatado por uma ocultista que o ajuda a encontrar equilíbrio e perspectiva por meio da iniciação nos Mistérios. Um tema secundário envolverá um hieros gamos (casamento divino) do homem com a mulher que ele está destinado a amar. Por intermédio dela, ele encontrará redenção e completude. “Quando o corpo de uma mulher é transformado em um altar da Deusa que é toda beleza e vida magnética... então a deusa entra no templo.” (The Sea Priestess) Para os ocultistas, todos os aspectos da vida, em especial a união do homem e da mulher, têm um significado simbólico. A vida em si é um ritual sagrado. “Todos os deuses são um deus e todas as deusas são uma deusa e existe um iniciador.”


ALEISTER CROWLEY:

A verdadeira face do mago notório Aleister Crowley (2 de outubro de 1875 - 5 de dezembro de 1947) está envolta em mitos e informações incorretas, muitas delas de sua própria autoria. Mesmo seus discípulos mais devotados tinham uma imagem distorcida do homem que se comprazia com o título “A Grande Besta”. Crowley foi um mestre na manipulação, um autopublicista descarado que ansiava por atenção e tinha um prazer perverso em chocar a sociedade polida, vangloriando-se de seus excessos com drogas e libertinagem. Ele divertia-se em seu papel de “o homem mais perverso do mundo” e fez tudo o que pôde para aumentar sua reputação. Uma vez, alguém o descreveu como “um menininho sórdido que nunca cresceu”, e embora essa descrição não leve em conta sua influência considerável na tradição esotérica ocidental, especificamente a magia prática, ela é afinal um resumo bastante acurado de sua personalidade excepcionalmente desagradável. Crowley nasceu em Royal Leamington Spa, perto de Srtatforupon-Avon, em 12 de outubro de 1875, Batizado Edward Alexander Crowley, ele mudou seu nome para Aleister quando estava na universidade. Seus pais puritanos foram afetuosos e extremamente indulgentes ao criar seu filho único, mas ele ressentia-se de sua criação rígida e opressiva, descrevendo sua mãe mais tarde como uma “carola descerebrada”. Seu pai morreu de repente, quando Aleister estava entrando na adolescência, e isso teve um efeito profundo em seu desenvolvimento. Enquanto ele se tornava cada vez mais provocador e cheio de vontades, sua mãe ficava cada vez mais apaixonada em sua devoção pela igreja. Ela tentou instilar a crença de que o sexo era criação do Demônio em seu filho e de que se submeter a tentações era o primeiro passo na estrada da maldição. “O amor era um desafio para o Cristianismo”, escreveu Crowley mais tarde, e ele determinou-se a superá-lo na primeira oportunidade. Com a idade de 14 anos, ele seduziu uma empregada na cama de sua mãe, enquanto ela estava na igreja. Quando ele confessou triunfante, ela acusou o filho de ser a Grande Besta do Apocalipse, cuja vinda fora profetizada no Apocalipse de João, e o enviou para um internato. A reação da mãe apenas reforçou sua crença de que a mania religiosa era uma forma amena de insanidade. Longe dos olhos da mãe, ele explorou sua bissexualidade de maneira irresponsável, bem como sua paixão por escrever poesia pornográfica. Seus versos falharam em criar impressão nos círculos literários, onde foram menosprezados como decadentes, derivativos e de um sadismo mórbido. Sem se intimidar, Crowley pagou para tê-los publicados, porque ele se recusava a aceitar que pudesse ser algo além de brilhante em tudo o que fizesse. “É uma coincidência estranha”, ele vangloriou-se mais tarde, “que um pequeno condado deu à Inglaterra dois de seus maiores poetas – porque não podemos esquecer Shakespeare”. Sua outra paixão consumidora na época era o montanhismo, para o que ele era bem equipado tanto mental quanto fisicamente. Seu físico avantajado e a destemida indiferença ao perigo garantiam que se sobressaísse, embora ele carecesse de espírito de equipe e cuidado com seus companheiros alpinistas, tão críticos para o sucesso naquele esporte quanto a habilidade e a força. Uma vez, em um caso famoso, ele abandonou seus parceiros de escalada à sua sorte durante uma subida ao Kanchenjunga, quando pareceu que eles o impediriam de alcançar o pico. Ele havia sido deposto como líder da expedição por seu “tratamento sádico e cruel aos carregadores” e, quando os outros membros do grupo foram enterrados em uma avalanche, ele ficou em sua tenda, emburrado e rancoroso, ignorando seus gritos por socorro. Porém, Crowley esqueceu o alpinismo e os versos ao descobrir o oculto no fim da adolescência. Ele devorou os livros “The Kabbalah Unveiled”, de McGregor Mathers, e “The Book of Black Magic and of Pacts”, de A. E. Waite, de uma só vez, mas se recusou com teimosia a reconhecer o débito que seus livros deveram a esses autores, que ele ridicularizou como pretensiosos. Era impossível para Crowley elogiar qualquer pessoa que fosse, porque se considerava superior a todos; mas ele ficou entusiasmado com as ideias de Mathers de que a magia oferecia um meio de se elevar acima da rotina mundana da vida cotidiana e de que o talento em questões ocultas dependia da intuição, não do intelecto. Como Crowley recordou posteriormente, o sucesso na magia dependia da habilidade para “despertar o gênio criativo”, não apenas acreditando que a vontade de alguém se tornaria realidade, mas também a visualizando. Uma expectativa de sucesso quase infantil e uma determinação obstinada em obter o que se deseja a qualquer custo são cruciais para o resultado da magia cerimonial. Em todo ato de magia, é preciso suspender a mente racional, por que ela limita o poder do inconsciente, do mesmo modo que um pai desaprovador pode atrasar o progresso de uma criança, advertindo-a sobre os problemas que ela pode encontrar. O sucesso inicial de Crowley como mago foi resultado de sua crença que mais tarde se transformou em autovalorização, o que ofuscou sua intuição. Ele teve uma prova de seu poder potencial na juventude. Quando estava estudando em Cambridge, ele amaldiçoou um mestre que havia recusado a permissão para ele encenar uma peça indecente. Sua ação foi fincar alfinetes em uma imagem de cera feita por ele. Mas o ritual não aconteceu como Crowley planejara. Em uma noite de lua cheia, ele convenceu alguns de seus colegas estudantes a se juntar a ele em um campo ao lado do St. John´s College. Eles deveriam fazer um círculo enquanto ele executava a conjuração. Contudo, no momento crítico, um dos participantes não teve coragem e tentou arrancar a boneca de Crowley. Uma agulha escorregou o fincou em seu pé. No dia seguinte, o mestre caiu em uns degraus e quebrou o joelho. No início, Crowley encantou-se com o convite para se unir ao círculo oculto da moda de Mathers, a Hermetic Order of the Golden Dawn (Ordem Hermética da Aurora Dourada), em 1898 – que contava com vários membros da sociedade vitoriana entre seus adeptos, inclusive o poeta W. B. Yeats e vários autores renomados. Mas ele se desesperou quando percebeu que eles eram tão preocupados com classificações e regras quanto os maçons. “Eles não eram protagonistas no combate espiritual contra restrições”, observou, “contra os opressores da alma humana, os blasfemadores que negavam a supremacia da vontade do homem”. Com essas palavras, ele referia-se à religião institucionalizada. Crowley estava impaciente por poder e obcecado com a ideia de que, de alguma forma, sexo e magia estavam ligados, que a energia vital canalizada durante o sexo poderia ser usada em magia ritual, de modo que os desejos mais profundos pudessem ser concretizados. Com a riqueza herdada, uma aparência de sofisticação e personalidade dominadora, Crowley teria muitos admiradores, que se submeteriam a qualquer ato humilhante se ele os cortejasse a acreditar que isso poderia dar nascimento a uma “criança mágica”, uma forma-pensamento sem alma que cumpriria suas ordens. A magia sexual, entretanto, era desaprovada pelos “velhotes” da Golden Dawn, que consideravam a ambição imprudente de Crowley como embaraçosa e, decididamente, de mau gosto. Crowley sentia ser merecedor de uma posição elevada dentro da sociedade, mas Mathers pensava diferente. Seu antagonismo intensificou-se até que, em 1904, os dois homens brigaram nos tribunais sobre os direitos dos rituais um dia secretos, que Crowley declarou terem sido transferidos para ele pelos “chefes secretos” incorpóreos da ordem. Mathers conseguiu obter um mandado que impedia seu rival de publicar o material, mas Crowley era mau perdedor. Ele invocou Belzebu e seus 49 demônios auxiliares para atormentar seu inimigo. Mathers retaliou amaldiçoando o cachorro de Crowley e tornando seus criados enfermos, mas o ataque psíquico deixou-o esgotado e derrotado, e ele perdeu o apelo seguinte. A publicidade que se seguiu precipitou a dissolução da ordem e empurrou Crowley para as páginas dos tabloides de domingo, cujos leitores aceitaram sem reflexão suas histórias de batalhas psíquicas no plano astral. Mas eles ficaram mais fascinados ainda por seus relacionamentos bizarros e vício em drogas. O apetite sexual voraz e o traço sádico de Crowley foram satisfeitos por uma série de mulheres neuróticas e impressionáveis, que se submetiam de bom grado às suas exigências, que ele justificava afirmando ser parte de um ritual oculto. Ele chegou a ir ao extremo de afiar seus dois dentes caninos a ponto de poder dar a suas discípulas femininas adoradoras um “beijo de serpente”. Ele também se tornou viciado em mescalina, que com o passar do tempo drenou consideravelmente sua força interior e prejudicou sua saúde. Se ele não possuísse uma vontade tão indomável, teria deteriorado a um ritmo bem mais rápido. Doses generosas de heroína, ópio e haxixe ofuscavam seu julgamento e percepção, ao mesmo tempo em que   exacerbavam suas idiossincrasias e relacionamentos, que eram não convencionais, para dizer o mínimo. Ele exercia atração fatal sobre mulheres neuróticas e masoquistas, para que pudesse dominá-las e abusar delas à vontade. Em uma ocasião, conhecidos viram-no chutando uma de suas amantes, que ele amarrara e deixara para dormir no chão do apartamento deles. Outra vez, ele trancou sua primeira esposa em um guarda-roupa, enquanto divertia uma amante no mesmo quarto. Ele era igualmente abusivo com seus amantes e companheiros homens, usando-os e descartando-os como se fossem cães doentes. Os que cruzaram seu caminho atestaram a eficácia de suas maldições, que deixaram um ex-acólito em estado de exaustão nervosa durante meses. Crowley forjou uma ligação psíquica com seus discípulos mais devotados, que era tão difícil para eles quebrarem quanto a dependência de drogas ou álcool. Nos círculos ocultos, muitos acreditavam que a morte de Mathers em 1918 foi resultado direto de uma maldição de Crowley. Na época do caso nos tribunais, Crowley ainda não fizera 30 anos, mas já era uma figura conhecida nos círculos boêmios e um mago de poder considerável. Porém, sua vida privada era uma bagunça. Ele iniciara uma amizade com um jovem e promissor pintor, Gerald Kelly, mais tarde presidente da Royal Academy, e, de brincadeira, ofereceu-se para se casar com a irmã emocionalmente instável de seu novo amigo, Rose, para salvá-la das atenções indesejáveis de seus inúmeros pretendentes. A família ficou enraivecida ao pensar que esse fantasista poderia herdar sua fortuna, e realmente enfurecida quando Crowley casou-se com Rose, no dia seguinte e, então, arrastou-a para Paris, anunciando que dali por diante eles deveriam ser tratados como Príncipe e Princesa Chioa Khan. Toda correspondência que não fosse endereçada de modo apropriado eles retornariam sem abrir. O casamento revelou a maldade de Crowley para que todos vissem. Ele levou Rose como uma criança petulante de Paris para o Cairo e então para o Ceilão, explorando sua devoção masoquista a ele, embora fossem claras suas intenções de humilhá-la. Mas, em seguida, aconteceu algo totalmente imprevisto. Rose, agora grávida de seu primeiro filho, revelou-se uma médium. Seja isso verdade ou não, pelo menos garantiu que ela teria, por fim, a total atenção de seu marido. Ela disse-lhe que ele havia ofendido o deus egípcio Hórus, mas se seguisse as instruções dela ao pé da letra ele poderia invocar uma deidade que ditaria uma nova escritura radical que teria seu nome. Crowley confessou ter considerado o ritual sem sentido, mas provou ser eficiente. Não foi somente Hórus quem falou com ele, mas também seu anjo da guarda Aiwass, provavelmente por intermédio de Rose. Juntos, eles ditaram todo o texto que mais tarde foi publicado como “The Book of the Law”. Ele era um pastiche pseudobíblico que anunciava a criação de uma nova religião, cujo princípio central era de que o homem é Deus e Aleister Crowley, seu profeta. “... pegue vossa cota e vontade de amor como quiserdes, quando, onde e com quem quiserdes.” (Private Chaos) Se Crowley tivesse vivido na América nos anos de 1960, ele poderia ter fundado um novo culto lucrativo; entretanto, nos anos que precederam a Primeira Guerra Mundial, ele foi desprezado pelo público em geral como apenas outro excêntrico nos moldes da líder teosofista Madame Blavatsky, que também afirmava canalizar a sabedoria esotérica do mundo espiritual. Entretanto, a filosofia autocentrada de Crowley influenciou uma geração que surgiu nos cínicos anos de 1970 e foi adotada como credo central da Church of Satan (Igreja de Satã). Seu édito para abandonar os fracos e viciosos à própria sorte e rejeitar sentimentos de piedade para com aqueles que sofrem poderia ter sido extraído da A Bíblia Satânica. Porém, em sua época, a percepção do público sobre o ocultismo de Crowley foi distorcida por toda a falação em torno de sua vida privada. Rose era uma musa indigna de confiança. Depois que seu bebê morreu de febre tifoide em Rangum, ela deu à luz uma segunda criança, mas provou ser uma mãe incapaz. Ela começou a beber e mais tarde foi internada em um hospital psiquiátrico. Enquanto isso, Crowley atingira um grau de poder oculto que apenas seus amigos íntimos e iniciados tiveram o privilégio de testemunhar. Um deles descreveu como Crowley demonstrou sua vontade superior ao deixar um homem inconsciente e fazer outro implorar como um cão. Em outra ocasião, o escritor americano William Seabrok caminhava com Crowley ao longo da quinta Avenida em Nova York, quando ele lhe pediu para demonstrar suas habilidades. Crowley concordou. Ele seguiu um estranho por alguns momentos, imitando seu modo de andar e, então, entortou os joelhos, o que fez com que o homem caísse na rua. Mesmo enquanto vivia em um apartamento arrendado em Londres, Crowley teve sucesso em convocar seres do mundo subterrâneo. Em uma ocasião, ele materializou um espírito de cura com elmo e, em outra, convocou um exército de demônios, que marcharam em torno do quarto até serem dispersos pelos primeiros raios do sol matinal. Mas, na Mansão Boleskin, sua propriedade recém-adquirida às margens do Lago Ness na Escócia, os espíritos tornaram-se tão numerosos que, segundo consta, ele tinha de trabalhar com todas as luzes acesas, mesmo em plena luz do dia, pois o quarto estava vivo, cheio de sombras. Diz a lenda que o capataz da propriedade ficou possuído e tentou assassinar a família, o que motivou Crowley a fazer uma viajem não planejada para o México. Lá, ele declarou ter chegado perto de fazer seu próprio reflexo desaparecer da superfície de um espelho, simplesmente pelo poder da vontade. Ele percebeu que o homem é Deus, mas não teve a humildade de se submeter ao seu ser superior como um verdadeiro adepto faria. “O homem ignora a natureza de seu próprio ser e poder (...) O homem é capaz de ser e usar tudo o que ele percebe, pois tudo o que ele percebe é, em certo sentido, parte de seu ser.” Contudo, apesar de todas as suas intuições, Crowley não pôde resistir à busca das paixões animais de sua natureza inferior. Para ele, sexo e submissão eram inseparáveis da magia, e ele se tornou um devoto ávido de sua própria religião. Em 1912, entrou em conflito com outro grupo oculto – o culto Ordo Templis Orientis (OTO), sediado na Alemanha – por revelar os segredos da ordem em sua revista de impressão própria “The Equinox”, ou seja, de que o sexo é a chave para o poder oculto. Mas essa querela pessoal aconteceu fora dos holofotes públicos, com Crowley conseguindo permissão para estabelecer seu próprio ramo da OTO na Grã-Bretanha. Quando a Grande Guerra eclodiu, Crowley fugiu para a América, onde espalhou propaganda antibritânica para ofender o pais que falhara em reconhecer sua genialidade. Lá ele viveu à custa de amigos e seguidores ricos, tendo dissipado a fortuna familiar em um estilo de vida extravagante, que agora ele não estava preparado para moderar, embora não tivesse os meios para sustenta-lo. Em 1916, tornou-se exasperado pela contínua recusa de seus contemporâneos em lhe conceder o grau de Magus em magia, então realizou o cerimonial sozinho. No fim da cerimônia, ele batizou um sapo e, então, crucificou-o. No fim da guerra, seus financiadores relutantes já estavam enfurecidos com sua arrogância e cansados de ser menosprezados. Estava na hora de a “Besta” seguir em frente. Crowley sabia que não seria bem-vindo na Grã-Bretanha, então comprou uma casa de campo em Cafalu, Sicília, com as rendas de uma pequena herança, e mudou-se com sua nova “mulher escarlate”, Leah Hirsig (a quem ele nomeou Símio de Toth), e uma amante rival, Ninette Shumway. Ninette, sua antiga governanta, trouxe seu filhinho como companhia para os filhos pequenos de Crowley e Leah, duas crianças pequenas, mas a “Abadia de Thelema”, como ele rebatizou a casa, não era lugar para crianças. Crowley decorou as paredes de seu estúdio – a câmara dos pesadelos – com suas pinturas de demônios, e o quarto de dormir com casais copulando. As duas mulheres estavam o tempo todo brigando e gritarias de ataques de bebedeira eram comuns. Crowley logo se cansou delas. Ele usou sua influência e reputação para atrair mulheres casadas e entediadas para sua casa, todas sedentas de aventuras adúlteras longe de casa. Seus diários mágicos registraram seus sucessos com uma alegria muito pouco reprimida. “M. M. mulher casada respeitável... a garota é muito fraca, feminina, facilmente excitável e muito arguta, sendo esta a primeira vez que ela comete adultério. Operação altamente orgástica e elixir (isto é, esperma) de primeira linha.” Visitantes masculinos também eram sujeitos aos poderes hipnóticos de seu anfitrião. Eles competiam com ciúmes por seus favores como os membros sujeitos à lavagem cerebral dos cultos modernos e de boa vontade compartilhavam suas esposas com o mestre. Sem dúvida, seu julgamento fora comprometido pelas quantidades copiosas de cocaína e heroína presentes, que o anfitrião compartilhava à larga. Como muitos homens de personalidade e vontade forte, Crowley acreditava que podia abandonar-se à sua ânsia por drogas sem se tornar um viciado. Para poucos de seus convidados, os ensinamentos de Crowley foram uma revelação e libertação vitalícia da repressão social e sexual, mas sem autodisciplina a doutrina do “Faze como quiseres” era uma fórmula para a autodestruição. A magia é uma busca solitária que requer autodisciplina rigorosa, o que Crowley sem dúvida não tinha. Ele precisava de uma audiência, mesmo que fosse composta de desocupados da alta sociedade, que estivessem a três graus abaixo de seu nível intelectual e fossem instáveis psicologicamente. Infelizmente, alguns de seus visitantes estavam ansiosos demais, para agradar a seu guru das trevas. Durante uma cerimônia de magia, o discípulo Raoul Loveday bebeu o sangue de um gato que fora sacrificado. Ele morreu em seguida. Para um homem que se declarava um adepto, Crowley estava claramente descontrolado e era incapaz de proteger seus devotos. Talvez ele fosse apenas um ímã para indivíduos autodestrutivos e fadados ao infortúnio. Ou o destino estava manipulando tudo a partir das sombras? A esposa de Loveday, que o acompanhara à ilha, recordou-se mais tarde de ter tido uma premonição da morte dele anos antes. Uma fotografia do casal feliz tirada em Oxford, Inglaterra, tinha sido desgastada pelo que na época eles acreditaram ser uma falha na revelação. Atrás de seu marido, existia a leve sombra de uma figura com as mãos juntas acima da cabeça – a mesma postura em que Raoul morreu. O episódio marcou o fim do retiro boêmio de Crowley. Mussolini ordenou que ele fosse deportado sem cerimônia, mas o incidente reuniu uma avalanche de manchetes chocantes. Quando tudo estava acabado, Crowley descobriu que tinha adquirido o apelido de “o homem mais perverso do mundo”. Ele viveu com o apelido os últimos 20 anos de sua vida. “Este homem, Aleister Crowley, é uma das figuras mais sinistras dos tempos modernos.”, declarou o The Sunday Times, em um artigo publicado em 1922. “Ele é um viciado em drogas, autor de livros vis, disseminador de práticas obscenas.” Desencorajado a voltar para a Grã-Bretanha, Crowley embarcou para Túnis com Leah e seu filho de 5 anos, Dionysus, que havia adquirido o hábito da nicotina com seu pai e se gabava de fumar vários maços de Woodbines por dia. Crowley não fez nada para desencorajá-lo. Ele era tão incapaz de afeição e irresponsável como sempre. Quando Ninette deu à luz à sua segunda filha, Anne Leah, o pai relutante fez seu mapa astrológico e concluiu: “Parece que ela vai se tornar uma ‘putazinha’ bem comum”. Em semanas, ele abandonou tanto sua família quanto seus discípulos, incluindo o garoto negro que ele havia iniciado em seu culto de magia sexual, e fugiu sozinho para a França. Lá ele viveu explorando amigos, até eles terem sua paciência exaurida e os bolsos vazios, enquanto sua família passava fome em Túnis esperando em vão que Mussolini mostrasse piedade e permitisse que eles permanecessem na Itália. Foi quando estava em Paris que, segundo dizem, ele tentou o ritual que provocou sua queda – uma invocação a Pã. Um discípulo colocara à disposição de Crowley seu pequeno hotel privado na margem sul do Sena em Paris, junto com a permissão para ele fazer tudo o que desejasse. Nessa época, Crowley havia atraído um pequeno círculo se seguidores, então aproveitou a oportunidade para executar um rito que ele planejava há meses, um rito que seria o auge de sua carreira como mago. Ele desocupou um quarto no ponto mais alto da casa e executou um ritual de banimento, para limpar a atmosfera de toda energia residual e qualquer impressão dos que haviam usado o quarto anteriormente. Depois, recolheu-se a portas fechadas com seu acólito principal, que havia tomado o nome de MacAleister (filho de Aleister). Os dois homens deram instruções estritas para não serem perturbados em nenhuma circunstância. Era o fim da tarde e esperava-se que a cerimônia duraria até o amanhecer. Os outros se distraíam no restaurante e esperavam a volta de seu líder, mas no decorrer da noite o ambiente esfriou e a conversação foi interrompida repetidas vezes por batidas e gritos altos. Quando amanheceu, eles subiram para o último andar e bateram na porta com cautela, mas não obtiveram resposta. Tentaram a maçaneta da porta, mas estava trancada; então não tiveram escolha a não ser quebra-la. Dentro eles encontraram MacAleister morto e Crowley nu em um canto. Ele estava petrificado pelo medo e balbuciava feito um imbecil. Foram necessários quatro meses de recuperação na tranquilidade de uma instituição mental para os fantasmas o abandonarem. Porém, embora tenha recobrado sua força física e sua sanidade, depois de Paris ele nunca mais foi o mesmo. Agora na meia-idade, quase à penúria e desesperado para financiar o hábito crescente de consumo de drogas e álcool, Crowley ficou reduzido a vender suas ideias libidinosas a quem desse o maior lance. No fim de uma temporada em Lisboa, sua amante na época o abandonou, o que o sacudiu de seu estupor por tempo suficiente para procurá-la e implorar por uma reconciliação. Mas a garota alemã de 19 anos, que ele chamava de “O Monstro”, não voltou para ele. Nunca ninguém havia dado as costas para a Besta antes.  Portanto, a rejeição deixou-o vacilante. Em um gesto melodramático, ele encenou a própria morte, deixando uma nota sob sua cigarreira com monograma, que ele colocou no topo de um penhasco na praia apropriadamente denominada Hell´s Mouth (Boca do Inferno). Mas, como uma criança petulante que tem de ser persuadida a voltar aos holofotes, reapareceu dias depois, a tempo de abrir uma exposição de suas pinturas. Pouco depois, ele forjou uma ação judicial contra a autora Nina Hammet, que o havia descrito como um mago negro em seu livro “The Laughing Torso”. “Eu fui acusado de ser um mago negro. Nunca foi feita uma declaração mais tola a meu respeito. Eu desprezo a coisa em tal grau que mal posso acreditar na existência de pessoas tão degradadas e idiotas a ponto de praticá-la.” (Aleister Crowley) Todo o caso havia sido tramado por Crowley, que estava cavando dinheiro. Nina era uma velha amiga que supostamente concordou em pagar qualquer indenização vinda da ação por difamação, se Crowley tivesse sucesso. Mas o caso foi rejeitado quando seus amigos se recusaram a testemunhar a favor dele. Pior ainda, a defesa produziu resmas de sua poesia pornográfica e regalou o júri atônito com relatos de seus rituais mágicos de masturbação. Ao rejeitar a ação, o juiz Justice Swift declarou que ele nunca tinha visto “coisa tão espantosa, horrível e blasfema como a produzida pelo homem que descrevia a si mesmo como... ‘o maior poeta vivo’.” O caso levou Crowley à falência, mas isso não teve efeito sobre ele, porque ele já dependia financeiramente de seus amigos e seguidores há anos. Ele passou os últimos anos de sua vida em uma pensão barata na cidade de Hastings, no litoral inglês. Uma sombra pálida da pessoa antes formidável, ele tinha medo do escuro. Morreu em 5 de dezembro de 1947 de dependência a álcool e drogas. Suas palavras finais – “Eu estou perplexo” – resumem uma vida esbanjada em autoindulgência e uma luta contra a sociedade que ele considerava responsável por inibir o indivíduo. Crowley exemplificou o destino do “mago negro” moderno, que é seduzido por sua própria imagem e corrompido pelo poder que procura exercer tanto sobre seus admiradores como sobre seus inimigos. Contudo, apesar de todas as suas falhas, Crowley possuía vontade, intelecto e imaginação formidáveis, que, quando combinados com o desejo de êxito, inspiraram-no a produzir diversos marcos da literatura oculta, incluindo o impressionante “Magick In Theory and Practice”. Porém, mesmo essas obras sérias foram “sabotadas” com informações incorretas e rodeios perigosos para os incautos e inexperientes. Crowley não pôde resistir a alardear seu conhecimento e autoridade sobre o tema, mesmo que isso significasse colocar seu autointeresse antes do bem-estar de seus estudantes. Foi isso que o tornou uma figura importante na história da magia. Ele apreciava sua reputação de infame, embora protestasse vigorosamente não ser um mago negro, e de explorar os que os seguiam como escravos, por quem não sentia nada além de repugnância. “Eu estremeço”, ele escreveu, “quando contemplo a idiotia desses imbecis.” A fama de Crowley era tal que diversos personagens de ficção foram baseados nele, embora ele tivesse especialmente se enraivecido por ser imortalizado no romance “The Magician”, de Somerset Maugham, e no suspense oculto de Dennis Wheatley, “The Devil Rides Out”. No primeiro, ele foi o personagem central e, no segundo ele é reconhecido instantaneamente como o satanista imprevisível Morcata. Mas, alguns dizem que Crowley não acreditava no demônio, apesar de suas declarações de devoção ao lado negro, feitas para o benefício dos tabloides. Ele adorava importunar picaretas de Fleet Street e se deliciava imaginando o verdadeiro ultraje que se seguiria quando suas histórias fossem devoradas no café da manhã no dia seguinte. “Eu simplesmente fui para o lado de Satã; e até o momento não posso dizer por quê. Mas me encontrei apaixonadamente ansioso para servir meu novo mestre... Eu não estava contente em acreditar em um demônio pessoal e servi-lo, no sentido comum da palavra. Eu queria agarrá-lo pessoalmente e tornar-me seu chefe de Estado.” (Aleister Crowley, “The Confessions of Aleister Crowley”)

Aleister Crowley fez pouco uso de conjurações arcaicas, preferindo criar as suas. Diz-se que uma das mais eficientes entre elas foi o Liber Samekh para a convocação de um demônio chamado Choronzon. Crowley usou esse ritual em 1909, durante uma viagem a Algiers. Ele foi para o deserto acompanhado do pupilo devotado Victor Neuburg, que o ajudou a desenhar o círculo mágico na areia, seguido pelo triângulo de Salomão, como prescrito pelo Lemegeton. Em seguida, eles cortaram as gargantas de três pombos e depositaram seu sangue na extremidade de cada ponta do triangulo. Neuburg ficou no círculo enquanto Crowley, vestido em um manto negro com capuz, ajoelhou no triangulo e convidou o demônio a possui-lo, usando um encantamento do Grimório de Honório. Em uma mão, ele segurava um topázio e foi dentro da pedra que o demônio apareceu. Falando com a voz de Crowley, ele vangloriou-se das pragas que trouxera ao mundo nos tempos antigos. Neuburg permaneceu na proteção do círculo, mas foi quase tentado a sair, quando percebeu que Crowley tinha sido substituído por uma mulher linda e sedutora, que agora lhe implorava que se unisse a ela. Mas Neuburg lembrou-se de que se tratava de uma ilusão, um dos truques típicos de Choronzon. Naquele momento, o demônio mostrou seu rosto verdadeiro e soltou uma risada alta e zombeteira. Em seguida, ele tentou outra artimanha. Ele ofereceu-se para ser assistente de Neuburg se ele simplesmente o convidasse para entrar no círculo, mas o pupilo aprendera bem a lição de Crowley e se recusou. Choronzon, em seguida, utilizou o truque mais antigo do guia do feiticeiro. Ele assumiu a forma do mestre de Neuburg e implorou por água para aplacar sua sede. Mas, de novo, Neuburg recusou. Ele ameaçou o demônio com todos os tormentos do Inferno se ele não partisse. Ele não ficou impressionado. “Tu não pensaste, ó tolo, que não existe nenhuma raiva ou dor que eu não seja, ou qualquer inferno que não seja meu espírito?”. Choronzon libertou uma torrente de insultos e depois jogou areia no círculo, quebrando o contorno. Antes que Neuburg pudesse repará-lo, o demônio estava dentro do círculo agarrado à sua garganta. Neuburg lutou furiosamente, repetindo os nomes de poder e apunhalando a aparição com a adaga sagrada. Choronzon interrompeu o ataque e voltou para o triangulo, onde assumiu a forma de uma mulher sedutora. Finalmente, a energia vital do sangue dos pombos dissipou-se e ele foi arrastado de volta para o mundo de onde viera, deixando Crowley desorientado e exausto.


Uma vez, Crowley confessou que seus rituais de magia continham “apenas chocolate suficiente para ter o sabor do bolo de chocolate”. Com isso, ele queria dizer que não estava preparado para distribuir todos os seus segredos para todo mundo que se ocupava em comprar seus livros em um balcão. Esse também era um aviso de que ele tinha salpicado as páginas com rodeios perigosos, para assegurar que apenas os que tivessem se dedicado ao trabalho árduo e aos estudos necessários para se tornar um adepto teriam sucesso no uso de seu sistema. A ocultista Dion Fortune considerava essa uma estratégia mesquinha, desprezível e extremamente perigosa. “A fórmula (...) com que ele trabalha deveria ser considerada adversa e maligna pelos ocultistas acostumados com a tradição cabalística(...) não é dada nenhuma pista disso no texto e ele é uma perigosa armadilha para o estudante incauto. Crowley(...) dá o Norte como o ponto sagrado para onde o operador se volta para invocar, em vez do Leste, ‘uma vez que a luz sobe’ como na prática clássica. Agora, o Norte é chamado ‘o lugar da maior escuridão simbólica’ e é apenas o ponto sagrado de uma seita, os Yezidees ou adoradores do Demônio(...) uma invocação ao Norte não irá contatar o que a maioria das pessoas consideraria serem forças desejáveis.


ANTON LA VEY E A IGREJA DE SATÃ

“O Demônio é mais perigoso quando está sendo charmoso” Professor Kumar (personagem em “Night of the Demon”)

Anton La Vey sentou-se diante do órgão, em sua câmara de horrores no porão – denominada de forma zombeteira “Toca da Iniquidade” – como Vincent Price, em “The Abominable Dr. Phibes”. Ele estava cercado por parafernália satânica e marionetes em tamanho real vestidas com meias arrastão e artigos de fetiche. Quando o castiçal de velas lançou uma sombra repentina sobre as paredes vermelho-sangue, ele tocou canções de bandas de baile antigas para os amigos e frequentadores habituais que haviam se reunido para homenagear o homem que eles chamavam de “O Papa Negro”.  O ano era 1986 e o fundador da Igreja de Satã era o centro das atenções em uma ampla casa vitoriana perto do Golden Gate Park em São Francisco, que fazia o papel de capela para a organização satânica. Ele estava entusiasmado para provar que o Demônio pode ser um amigo cativante e um maldito de um anfitrião requintado. Seu porão santuário e clube noturno de prazer exibia uma coleção de artefatos horrivelmente fascinantes, entre eles uma faca sacrificial asteca genuína, um gancho de tortura usado pelos inquisidores espanhóis e uma cabeça encolhida da América do Sul, de doador desconhecido. Todos eram relíquias de religiões mortas, seu proprietário orgulhoso observou em um sussurro tão seco quanto um pergaminho. Do lado de fora, o edifício estava pintado de preto bíblia e a tubulação, de púrpura, de modo que se destacava como um dente estragado no meio dos prédios em cores claras das casas urbanas que ladeavam a rua suburbana coberta de folhas. Seu proprietário também tinha uma aparência igualmente anticonvencional, com sua cabeça raspada, barba de bode e olhar penetrante, sem mencionar sua habitual vestimenta funérea. Ele era a própria imagem de um Mefistófeles moderno. Em 1968, sua aparição surpreendente e sinistra assegurara a ele o papel que havia nascido para encenar, o do Demônio no filme de terror de Roman Polansky “O bebê de Rosemary”. Mas a Igreja de Satã foi apenas um show paralelo, uma fraude cínica perpetrada pelo ex-ator de carnaval, ou seria La Vey um verdadeiro crente? Anton La Vey (1910-1997) – nascido Howard Stanton Levey – dedicou sua vida a espalhar o evangelho negro da Igreja de Satã, seu culto pessoal, que em seu auge tinha milhares de membros por todo o mundo, inclusive, diz-se, celebridades convertidas como Sammy Davis Jr., Marc Almond e Marilyn Manson. Goste-se ou não dela, agora é uma religião oficialmente reconhecida na América, com status caritativo. Até os capelães do exército americano são versados em seus princípios, para que possam pregar para seus membros quando eles estiverem sob duras provas. Seu fundador admitiu ter concebido o movimento como uma paródia da religião ortodoxa, mas quanto mais ele refletia sobre a necessidade de uma alternativa afirmativa da vida para o credo cristão pacifista, mais rapidamente seu cinismo natural desmoronou até ele se tornar um convertido.
Em 30 de abril de 1966, Noite de Valburga, La Vey raspou a cabeça para ficar parecido com os executores medievais e declarou a abertura da Igreja de Satã, ou “o templo da indulgência gloriosa”. Ele exibia um pendor para a autopromoção que daria orgulho a P.T Barnun. Nos anos que se seguiram, o Demônio recompensou-o bem. Ele adquiriu várias propriedades luxuosas, uma frota de carros clássicos e até um iate, para que pudesse fugir mais rápido que Noé, caso um Jeová raivoso se ofendesse com sua filosofia “blasfema” e atormentasse o mundo com outro dilúvio ou, no caso de São Francisco, com um terremoto.
Mas cortejar o Demônio também trouxe atenção indesejada, na forma da morte trágica de Jayne Mansfield. Em 29 de julho de 1967, a estrela de Hollywood viajava em um carro dirigido por seu amante e advogado Sam Brody, quando um caminhão em alta velocidade os atingiu. Mansfield sofreu ferimentos fatais na cabeça e Brody também morreu. O único sobrevivente foi a filha mais nova de Mansfield, Mariska Hargitay (hoje a estrela da série de crimes na TV “Law and Order”). Jayne Mansfield tornara-se um membro ativo da Igreja de Satã, contra a vontade de Brody, o que provocou Brody a ameaçar expor La Vey como charlatão na imprensa nacional. La Vey respondeu amaldiçoando o advogado publicamente e declarando que ele estaria morto em um ano. Ele advertira Mansfield a não viajar com Brody, mas ela não levou a ameaça a sério. Não é surpresa que a publicidade subsequente tenha atraído o tipo “errado” de pessoas para o culto. La Vey tinha plena consciência de que sua ideologia imortal atrairia “os malucos”, como ele os chamava. Isto é, neonazistas, discípulos rejeitados por Charles Manson e os inúmeros excêntricos que viam conspiração em cada esquina ou ouviam vozes que os impeliam a matar em nome do Demônio. Porém, ele afirmava que a maioria dos convertidos era atraída pelo Satanismo porque precisavam pertencer a algo que desse sentido às suas vidas. Eles eram os produtos psicologicamente danificados de lares desfeitos, viciados em drogas arrastando-se dos destroços do beco sem saída de suas vidas, ou os filhos desorientados de pais carolas, que, ao se tornar adultos, voltaram-se para La Vey, seu guru das trevas, para exorcizar seus supostos pecados. Na Casa Negra, ele compartilhava o desdém de seus discípulos pelas pessoas que viviam vidas monótonas e rotineiras – o rebanho, como ele os chamava -, mas também desprezava os indivíduos que matavam em nome de Satã para adquirir notoriedade. “Essas pessoas não são satanistas”, ele disse a um repórter uma vez. “São dementes. Mas, independentemente de quanto mais fizerem, elas nunca alcançarão os cristãos. Nós temos séculos de assassinatos em nome de Deus.” Quando chegou ao circuito de programas de entrevistas, ele aceitou as zombarias contra seu “estilo de vida” bizarro. Satisfeito por ser comparado à Família Adams, ele decorou sua sala de estar com teias de aranha artificiais, caveiras de lojas de truques e um leão de estimação. Fazia meses que o leão não comia nenhum convidado, ele garantia a seus visitantes. Mas apesar de todo o seu lado espetaculoso, La Vey era extremamente sincero a respeito de suas crenças, mesmo elas sendo mercadorias de segunda mão que ele adquirira de mentes mais argutas que a dele – intelectos como o da romancista russo-americana Ayn Rand, que formulou a filosofia do egoísmo ético e objetivismo; de H. L. Mencken, o crítico norte-americano áspero que se punha ao Cristianismo fundamentalista; do poeta e visionário William Blake; e, é claro, de Friedrich Nietzsche, que originou o conceito frequentemente mal compreendido do Homem Superior. Aleister Crowley, entretanto, não estava na lista de leituras de La Vey. Ele acusava “a Besta” de ter “se vendido” ao negar ser um satanista e criticava-o por escrever de forma prolixa e interminável sobre magia ritual. La Vey declarava que ele poderia ter condensado tudo aquilo em um volume fino. A pretensão era um dos pecados imperdoáveis da Bíblia Satânica escrita por La Vey, um sucesso de vendas perene que foi publicado em 1969. Os outros eram a abstinência, fantasias espirituais, autoengano, amor incondicional por aqueles que não o merecem, pacifismo, recusa em aceitar as responsabilidades pelas próprias ações, a presunção de o homem ser mais que um animal e superior a todas as criaturas e a observância religiosa cega.

Ao escrever seu panfleto impresso privado “The Cloven Hoof”, La Vey atacava as pessoas de sua categoria que depositavam a fé nos “grandes ensinamentos” de Aleister Crowley e nos antigos grandes mestres da Golden Dawn. O confronto entre os dois velhos demônios era claro, e La Vey fazia exceção apenas à adoção do número da besta – 666 – que, ele lembrava a seus discípulos, era de origem Cristã. Tanto a Igreja como Crowley haviam dado um nome ruim para o Demônio, e ele restauraria a reputação do velho cão. Em “A Bíblia Satânica” e seus companheiros, “The Satânic Witch” (1971) e “The Satanic Rituals” (1972), La Vey arrolou os princípios em que sua fé materialista estava embasada.
“Parece que a teoria é esta: enquanto o homem fracassa, ele é um dos filhos de Deus, mas, logo que obtém sucesso, ele é tomado pelo Demônio.” (Henry Louis Mencken)
De acordo com La Vey, Satã não é uma entidade malévola, mas uma “projeção externa do mais alto potencial de cada indivíduo”. Ele é a personificação de nossa natureza carnal, o arquétipo de um aspecto primitivo em nós que não deve ser suprimido ou negado. Os verdadeiros satanistas não são, portanto, demoníacos, mas indivíduos que se dedicam à busca dos prazeres e uma vida livre de restrições ou limitações impostas a eles pela sociedade civilizada e sua cúmplice, a religião ortodoxa. Dessa forma, todos os satanistas são responsáveis por suas próprias ações e não podem contar com um salvador sobrenatural para redimi-los se forem desleais consigo mesmos e com o código pelo qual vivem. La Vey afirmava que a religião ortodoxa fora criada pelo homem, não por Deus; então, ninguém é obrigado a viver seguindo suas regras, principalmente depois que as leis e os costumes de seus fundadores perderam relevância no mundo moderno. Os profetas e sacerdotes criaram um Deus à sua própria imagem falha, concebendo-o como um patriarca cruel e caprichoso que nunca pode ser aplacado, porque nenhum de seus filhos pode viver de acordo com os padrões de perfeição que a Igreja impõe a eles. Contudo, como La Vey ressaltou, ninguém deu autoridade à Igreja para que se tornasse mediadora entre o homem e Deus ou para impor seus dogmas à sociedade. Portanto, é direito de todos questionar essa instituição autoeleita. A obediência sem questionamento e a fé cega são contrárias aos princípios do Satanismo, que exige que o indivíduo pense por si mesmo e aja de acordo com sua consciência. La Vey sustenta que a religião ortodoxa não tem o monopólio da verdade e sugere que seus pastores são tão capazes de agir com crueldade, em causa própria e corruptamente, quanto os demônios com quem eles afirmam estar em guerra. Por fim, ele argumenta que é irrealista e antinatural viver no mundo material e resistir aos prazeres que ele tem a oferecer, recebendo em troca apenas a promessa de um paraíso.
“O Satanismo é a única religião conhecida pelo homem a aceitar o homem como ele é.” (A Bíblia Satânica)
Em seu prefácio para a obra “A Bíblia Satânica”, La Vey rejeita toda a literatura oculta como “bobeira esotérica” e “relíquias quebradiças de mentes amedrontadas”. Seu credo, ele afirma, não tem por objetivo ofender, mas é uma forma tardia de “indignação diabólica” diante da hipocrisia da religião organizada. Em contraste, o Satanismo encoraja a gratificação dos sentidos no lugar da culpa, pois a negação dos prazeres está na raiz de todos os nossos sofrimentos e frustrações. La Vey não declarou ter canalizado esses mandamentos de alguma fonte sobrenatural. Pelo contrário, ele afirmava que formulara sua filosofia com base no individualismo assertivo, a partir de escritos da moderna elite de intelectuais com quem ele desejava se identificar. Embora ele não negasse que a maior parte dos textos de seu livro fosse a síntese das ideias de outros escritores, e não menos válida por ser assim, ele começa a parecer tão escorregadio quanto um vendedor de óleo de serpente quando alguém olha com mais atenção para a parte que ele denomina “O Livro de Satã”. A similaridade gritante entre a polêmica da pseudiobíblia de La Vey e o notório tratado de darwinismo social do século XIX, “Might is Right” – publicado pelo pseudônimo Ragnar Redbeard -, justifica claramente a acusação contra La Vey por plágio e cinismo. Se ele foi preguiçoso até para criar paráfrases com os dogmas principais de “Might is Right” quando os inclui em sua própria “bíblia negra”, é de se perguntar do que mais ele se apropriou de outros trabalhos sem reconhecimento. Para os que possam ser intimidados pelas ideias abstratas da “A Bíblia Satânica”, La Vey acrescentou alguma sabedoria simples de seus dias de espetáculos de carnaval, e também sua própria observação da natureza humana extraída da experiência pessoal. Como um organista de 16 anos contratado para tocar nos encontros evangelistas das manhãs de domingo, La Vey havia testemunhado a hipocrisia em primeira mão. Os homens que agora se sentavam respeitosamente com suas famílias, rezando e cantando hinos, tinham cometido a luxúria, atrás de garotas seminuas na noite anterior. Ele sintetizou seu cinismo quando trabalhou para o departamento de polícia de São Francisco como fotógrafo de cenas de crime, durante os anos de 1950. Depois de testemunhar a brutalidade de que o ser humano era capaz e ouvir as mentiras que eles contavam para salvar suas peles, ele não pôde negar a existência do demônio interno. Se Anton La Vey tivesse sido louco o suficiente para imaginar que tinha a proteção do próprio Satã, com certeza teria tentado oferecer o sacrifício definitivo, como Charles Manson e seus seguidores ofereceram. Mas ele era um egoísta calculista e criterioso, que não infrigiria a lei, arriscando tudo o que havia conquistado, mesmo para agradar a seu mestre infernal. Na verdade, ele explorou a lei para garantir que sua “igreja” se qualificasse para uma classificação de caridade. Isso fez dele um verdadeiro satanista aos olhos de seus críticos, pela definição de satanista como um maquinador desavergonhado em causa própria.

La Vey realizava Missas Negras em seu apartamento pintado de vermelho e preto para o entretenimento da mídia, mas nenhum sangue humano foi espargido em nome do Demônio. Era puro teatro para os curiosos, que eram agraciados com a visão de uma garota nua amarrada em um altar, enquanto a congregação entoava seu mantra “In nomine dei Satanas. Lucifer excelsi...”. Depois, um alto sacerdote encapuzado aspergia uma mistura de urina e sêmen de um incensário com o formato de falo. Mais invocações eram acompanhadas por pedidos individuais de qualquer coisa que os membros desejassem – um trabalho mais bem pago, as atenções de uma garota bonita ou até a morte de um inimigo. La Vey confessou a jornalistas que seus próprios rituais de magia negra limitavam-se a pedir por lugares para estacionar e sucesso nos negócios, com toda a fanfarronice de lado. Os cristãos e moralistas ficaram indignados com a autopromoção desavergonhada de La Vey e a natureza provocante de suas crenças, mas a verdade da questão é que eles precisavam de um demônio para condenar. Eles precisavam acreditar que La Vey era o próprio Demo, senão sua própria existência perderia o sentido. La Vey deve ter sido o melhor vendedor de Satã, mas ele acertou na mosca quando escreveu: “Satã tem sido o melhor amigo que a Igreja já teve, uma vez que a manteve no negócio por todos estes anos.”


A Golden Dawn:

A Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn) não foi uma sociedade secreta vitoriana sinistra dedicada à prática de ritos arcanos proibidos, como muitas autoridades do oculto já sugeriram. Em vez disso, ela era uma irmandade de ex-maçons e intelectuais eminentes, que procuravam contato com entidades poderosas invisíveis, as quais eles acreditavam supervisionar a evolução da humanidade. Entretanto, a ordem não estava totalmente livre de personagens excêntricos e incomuns, que são atraídos naturalmente para os círculos esotéricos. De fato, o próprio fundador era um megalomaníaco excêntrico de nome Samurel Lidell Mathers, o filho de um clérigo de Londres, que se vestia com kilt e insistia em ser chamado de Macgregor Mathers, conde de Glenstrae. Mathers decorou sua casa em Paris para parecer um templo egípcio, onde ele celebrava uma forma de missa em honra à deusa Ísis. Nessas ocasiões, vestia-se com um manto branco esvoaçante, com uma pele de leopardo caindo de seus ombros. Quando não estava participando de cerimônias de magia, ele gostava de relaxar com uma variação incomum do jogo de xadrez para quatro jogadores, em que seus oponentes eram sua esposa e seu convidado da noite. O parceiro de Matheus era um espírito desencarnado, com quem ele entrava em comunicação telepática. Mathers era maçom e um erudito com alguma reputação. Foi por seus conhecimentos em línguas arcaicas e magia prática que ele foi abordado por um amigo maçom, dr. William Wynn Westcott, em março de 1888, e convidado a formar uma ordem moderna de magia, uma que se distanciasse bastante das que ainda se apoiavam nos grimórios medievais. O dr. Westcott persuadiu Mathers de que sua organização seria como nenhuma outra antes dela, porque o destino tinha colocado as bases de um sistema de magia inteiramente novo em suas mãos. Westco6tt tinha adquirido diversos manuscritos contendo símbolos ocultos e instruções para ritos, escritos em uma cifra que ele nunca tinha visto. Tudo o que eles precisavam fazer era decodifica-los. A fonte dos manuscritos é incerta. Uma versão da história mostra o dr. Westcott encontrando-os por acaso em uma livraria de livros usados no mercado de Farrindon Street. Outros relatos sugerem que ele os descobriu na biblioteca da Sociedade Rosacruziana, ou que eles vieram de uma coleção privada pertencente ao clarividente Frederick Hockley. Diz-se que a única pista para sua verdadeira origem é uma referência a uma adepta alemã, Anna Sprengler de Nuremberg, que rabiscou em uma margem. Diz-se que Westcott se correspondeu com ela, com a esperança de criarem juntos o sistema e extraírem mais segredos. Existem dúvidas, entretanto, de que Frau Spengler tenha existido. Alguns insinuaram que toda a história foi tramada por Westcott e Mathers, que pretendiam atrair membros de alto calibre, pessoas que garantiriam que a organização fosse proeminente e bem fundada. Se esse foi o caso, eles tiveram sucesso. Personalidades conhecidas como Bram Stoker, W. B. Yeats, William Peck, o astrônomo real da Escócia, Arthur Machen, Sax Rohmer e Algernon Blackwood arrebanharam-se para unir ao grupo.
Os exercícios práticos baseavam-se em uma mistura de yoga oriental, misticismo cristão rosa-cruz, magia cerimonial egípcia e Cabala Judaica – todos destinados a se obter uma expansão da consciência e aumentar a percepção de uma realidade maior. Na prática, isso significava executar exercícios de visualizações poderosos, tais como o Pilar do Meio, em que os iniciados estimulavam os centros sagrados de energia do corpo etéreo (o duplo espírito ou alma dentro de cada ser humano) para energizar, curar e equilibrar a mente, o corpo e o espírito. Rituais rosacruzianos ofereciam os meios para despertar o Cristo interior, o Professor Interior, ao reencenarem a crucificação e ressurreição de Jesus, e explorações guiadas aos mundos interiores simbólicos da psique poderiam ser feitas pela visualização de si mesmo viajando pelos caminhos e esferas da Árvore da Vida cabalística. Outras técnicas incluíam a projeção astral e experimentos com símbolos Tattwa – formas coloridas simples, em cartões negros, que diziam precipitar o acesso a outras dimensões quando segurados contra a testa. Os cinco símbolos mais importantes – um triângulo vermelho, um quadrado amarelo, uma lua com um chifre prateado, um círculo azul e uma elipse índigo – representavam os quatro elementos do ar, terra, fogo e água, e o reino do espírito.  O poeta W. B. Yeats, no início, tinha dúvidas de que tais técnicas simples pudessem produzir qualquer efeito, mas ficou convencido quando Mathers o persuadiu a segurar um dos símbolos em sua testa e depois fechar os olhos e descrever o que tinha visto. Depois de concordar com relutância, Yeats assustou-se com uma imagem que irrompeu de seu subconsciente, sobre o qual ele não teve nenhum controle. Era a de um titã negro, emergindo de uma paisagem estéril e desértica, que, de acordo com Mathers, era um espírito elemental do fogo. Mesmo depois dessa experiência surpreendente, Yeats não se convenceu. Ele testou as cartas de novo, em particular, apenas com seus voluntários presentes, para que não fosse influenciado por ninguém mais, e deliberadamente deu a eles a carta “errada” enquanto descrevia outra diferente. Yeats queria ver se sua cobaia “veria” a imagem relacionada com a carta que ele havia descrito ou com a carta que haviam de fato recebido. Para sua surpresa, eles viram a imagem apropriada à carta que seguravam, o que sugere que os símbolos tinham ligação com arquétipos universais. Yeats possuía uma imaginação muito desenvolvida e, mesmo assim, seu intelecto não conseguia compreender como imagens tão fortes poderiam ser desencadeadas pela meditação com formas simples coloridas. Mas ele teve de reconhecer que essa forma de magia funcionava. As imagens, ele concluiu: “(...) inspiravam associações que estão além do alcance do subconsciente individual (...) que as margens de nossa memória estão (sempre) mudando e nossas memorias são parte de uma grande memória, a memória da própria Natureza(...) e que esta(...) grande memória pode ser evocada por símbolos.”

Os membros da Golden Dawn consideravam-se os guardiões de uma sabedoria eterna, que guardavam com a mesma desconfiança com que concediam seus títulos e graus dentro da Loja. Mas foi o orgulho de seu líder que provocaria sua queda. Depois de passar por vários ritos de iniciações com uma rapidez incrível, Crowley exigiu o reconhecimento formal de seus avanços, com o grau correspondente, mas seu pedido foi recusado por Yeats, que tinha grande aversão a ele. Crowley apelou a Mathers, que consentiu, mas yeats não seria intimidado. A disputa foi levantada em tribunal aberto, o que assinalou o início do fim da ordem original. Em seu auge, a Golden Dawn podia afirmar possuir mais de 300 membros, um terço dos quais eram mulheres, e a criação de Lojas em Edimburgo, Paris e Chicago. Hoje, várias organizações afirmam descender diretamente da Golden Dawn original, mas estão baseadas nos Estados Unidos e na Nova Zelândia.


Nazistas e o Oculto:

Em maio de 1945, os aliados vitoriosos viram a rendição da Alemanha nazista como o clímax de uma batalha apocalíptica entre as forças do bem e do mal, o ato de destruição visualizado por Richard Wagner na ópera épica Götterdämmerung. A diferença foi que a Segunda Guerra Mundial aconteceu no palco do mundo e suas consequências foram tragicamente reais. No fim das hostilidades, todos concordavam que a vitória dos Aliados significou mais que a derrota militar de uma ditadura cruel que havia ameaçado arrastar o mundo para uma nova Era das Trevas. Líderes religiosos, políticos e até alguns personagens militares falaram da vitória sobre o Demônio e do próprio Demônio sendo consumido pelas forças diabólicas que ele havia liberado inadvertidamente. Porém, ninguém na época pensou que tais declarações fossem mais que retóricas. Entretanto, muitos anos mais tarde, começaram a afirmar por meio de diversas “histórias alternativas” sensacionalistas que deve ter havido algo de realmente diabólico no coração sombrio do estado nazista. Em 1973, o controverso historiador Trevor Ravenscroft causou agitação com “The Spear of Destiny”, um relato bastante imaginativo da alegada obsessão de Hitler por um artefato oculto de grande poder – a lança que atingiu o lado esquerdo de Jesus no local de sua crucificação. Diz a lenda que um exército que marchasse atrás dela seria invencível (para um relato completo leia “Nazis and the Occult, Arcturus, 2008 do mesmo autor). Por volta da mesma época, o autor Gerald Suster publicou “Hitler – Black Magician” (mais tarde republicado como “Hitler and the Age of Horus”), uma exposição de pseudociências nazistas excêntricas, como as teorias da Terra oca e o mundo de gelo, que influenciaram a estratégia militar desastrosa de Hitler na Rússia, bem como um número de experimentos bizarros com armas secretas impraticáveis que desviaram recursos em um ponto crucial da guerra. Outra famosa autoridade no oculto, Francis X. King, acrescentou suas revelações em “Satan and the Swastika”, em que detalhou as atividades do “escritório oculto” do nazismo. Entre outras coisas, seus operativos eram submetidos a testes de eficácia dos médiuns que declaravam ser capazes de localizar os navios inimigos, usando pêndulos suspensos sobre um mapa do Atlântico. Esse ramo da abwehr (departamento de Defesa) também tinha a fama de ter sido usado para localizar o ditador italiano deposto Benito Mussolini, para que ele pudesse ser resgatado pelas forças especiais alemãs. King também revelou detalhes dos planos do Reichsführer Heinrich Himler de gastar vários milhões de marcos para construir uma “Camelot” nazista em Schloss Wewelsburg, na Westphalia, para os “Cavaleiros Teutônicos” da SS. Esses três títulos instigaram todo um subgênero de “histórias” altamente especulativas, centradas no pressuposto de que membros da elite nazista estavam em conluio com o Demônio ou, pelo menos, com seus acólitos. Essa ideia fascinante, embora absurda, foi sugerida pela primeira vez nos anos de 1930 pelo romancista e ex-militar da inteligência britânica Dennis Weathley; mas, na época, os suspenses de magia negra eram vistos como romances sensacionalistas, tal qual os filmes universalmente populares de Indiana Jones, que surgiram meio século depois. Enquanto os livros de Weatley e os filmes de Spielberg são pura fantasia, é fato registrado que certos membros da elite nazista tinham uma obsessão doentia pelos aspectos sombrios do oculto.
Heinrich Himmler foi um homem ordinário em vários sentidos, um burocrata insignificante com um físico mirrado, sem personalidade marcante, e ainda sofria das vistas e de hipocondria crônica. Ele teria sido excluído da SS se Hitler não o tivesse apontado como cabeça da organização, como uma recompensa por sua lealdade inabalável. Um ex-chacareiro de criação de galinhas e chofer, Himmler tornou-se o oficial mais temido no regime nazista, com poder absoluto sobre a vida e a morte. Embora não tivesse nenhuma das qualidades que o tornassem um grande líder, ele imaginava-se presidindo uma ordem secreta de cavaleiros teutônicos, em um esplendor copiado de uma Camelot germânica. Quando ele viu as ruínas de Schloss Wewelsburg em Westphalia, soube que havia encontrado o “lar espiritual” de seus cavaleiros negros. Diz a lenda que o local testemunharia a última batalha entre o povo ariano e seus inimigos do leste, uma batalha que Himmler pretendia ganhar a qualquer custo. A significância da localização foi confirmada por especialistas no Ahnenerbe, o Escritório Oculto nazista, que informou ao Reichsfüher que o castelo fora construído na interseção de várias linhas de poder. Isso significava que as energias da terra convergiam para suas fundações em forma de triângulo e poderiam ser utilizadas em rituais de magia. Com o destino da Alemanha em jogo, o dinheiro não era impedimento. A indulgência de Hitler garantiu que nenhuma despesa fosse poupada para o restauro do castelo à sua glória anterior. Suas galerias amplas e aposentos abobadados foram guarnecidos com as tapeçarias e antiguidades mais requintadas. Em um ano, gastaram-se vários milhões de marcos na reconstrução do edifício e decoração de cada suíte em um estilo condizente ao de um herói alemão. A peça central desse palácio extravagante era o magnífico salão de banquetes, com sua távola redonda arturiana majestosa, em torno da qual foram dispostas 12 cadeiras entalhadas em madeira em que sentavam os “12 cavaleiros” de Himmler. As 12 cadeiras também representavam os signos do zodíaco. Outra cadeira, à cabeça da mesa, seria usada pelo próprio Reischfüher. Abaixo do Grande Salão estava a catacumba circular de pedra, que eles chamavam de “reino dos mortos”, onde 12 pedestais negros circundavam um poço profundo. Essa era a cripta em que os ossos dos “cavaleiros” caídos seriam venerados pelas gerações futuras. Mas Wewelsburg era mais que um santuário. De acordo com vários oficiais de alta patente da SS que visitaram o castelo a convite de Himmler, ele também servia como um santuário privado para o Reichsfüher. Walter Schellenberg testemunhou um círculo psíquico em curso, cujos membros tentavam projetar suas mentes até um quarto adjacente onde um prisioneiro estava sendo interrogado. O objetivo do exercício era focar suas vontades combinadas para que o suspeito relutante fosse forçado a dizer a verdade. Não está registrado se eles tiveram ou não sucesso.
Originalmente, os SS foram criados para servir como guarda pessoal de Hitler, mas se tornaram a mão direita brutal do regime e uma força que respondia apenas a si mesma. Ao criar os rituais distintivos, juramentos e insígnia, Himmler foi capaz de instilar em cada membro a crença de que eles eram mais que uma entidade de combate de elite. Cada homem deveria considerar-se um iniciado em uma ordem religiosa secreta, cuja responsabilidade sagrada era subjugar as “raças inferiores” por qualquer meio que fosse necessário. Uma nova ordem seria estabelecida então, em que a Raça Ariana Superior reinaria como os faraós da Antiguidade. Os membros da SS eram doutrinados com a ideia de que eram seres superiores em um Universo amoral, e assim operavam além dos conceitos humanos de bem e mal. É duvidoso se todos os oficiais da SS compartilhavam a visão romântica perversa de Himmler, ou encaravam as runas que decoravam as bandeiras e capacetes, uniformes e veículos armados da SS como nada mais que acessórios distintivos de sua irmandade sombria. Mas, para Himmler, as runas tinham um significado sobrenatural. Ele emprestou a ideia dos ocultistas Völkisch, que acreditavam que as runas eram uma verdadeira expressão da cultura ariana antiga. De acordo com a lenda norueguesa, o “alfabeto” rúnico precedeu a palavra escrita e, portanto, cada símbolo incorporava forças naturais de magia. Uma runa em particular tinha um significado especial para a SS, por sua ligação com a “Volsunga Saga” do século XIII, a mais importante das sagas islandesas, que formou a base do círculo do “anel” de Wagner. Tanto na saga como no círculo do anel, Brynhyld (Brunilda) persuadiu Sygur (Sigefredo) a esculpir a runa Tyr no cabo de sua espada para assegurar a vitória na batalha. Seis séculos depois, a SS adotou tal prática. Algumas das outras runas usadas pela SS foram:
Hakenbreuz (Cruz Curvada), que foi um símbolo pagão de Thor, o Deus do Trovão.
Sonnenrad (Suástica da Roda do Sol). Adotada pela 5 Divisão de Tanques da SS, era o antigo símbolo escandinavo do Sol.
“Feixe de Luz”, uma dupla SiegRune, que representava coragem, vitória, dever e força física. Ela foi uma invenção moderna e não teve origem no paganismo.
Wolfsangel (Garra do Lobo), que foi adotada pela 2 Divisão de Tanques, conhecia como Das Reich, e acreditava-se afastar o perigo.
Eif Rune, que foi incorporada aos uniformes dos assistentes pessoais de Hitler como um símbolo de devoção e lealdade.
O SS Reichfüher Heinrich Himmler contratou várias expedições ao Tibete e outras regiões remotas do mundo em busca de artefatos ocultos, e também acreditava muito em astrologia. De fato, ele recusava-se a tomar qualquer decisão importante antes de consultar seu astrólogo pessoal, Wilhelm Wulff, que tinha a reputação de fazer previsões com precisão misteriosa. Wulff observou que Himmler tinha um conhecimento prático de astrologia, mas ele “fazia as perguntas mais estranhas e infantis em sua busca por clareza astrológica em questões sobre a política e militar”, o que levou Wulff a concluir que um dos homens mais temidos do regime não era um adepto, mas “uma mediocridade(...) um burocrata trivial com crises de consciência”. No verão de 1923, Wulff calculou os mapas de Hitler, Göring e Ernest Röhm, o líder AS. Ele previu um destino terrível para o futuro Füher e seus seguidores. Hitler, disse Wulff, estava fadado a ser temido e “lançar ordens cruéis e sem sentido”, que levariam à sua morte na primavera de 1945. Ele morreria nas mãos de um assassino e uma mulher teria um papel importante em sua morte. As previsões de Wulff mostraram-se corretas. Em abril de 1945, Hitler cometeu suicídio em seu bunker em Berlim, com sua amante Eva Braun ao seu lado.
Trevor Ravenscroft afirmou que Hitler fora iniciado em uma irmandade oculta pelo professor Karl Haushofer, que “despertou Hitler para os reais motivos do Principado de Lúcifer que o possuíam para que ele pudesse se tornar um veículo consciente de suas intenções malignas no século XX”. Porém, a contribuição do professor para a ascensão de Hitler ao poder foi puramente política. Ele introduziu as teorias geopolíticas ao ditador e em especial ao conceito de lebensraum (espaço vital) com que Hitler justificou as invasões dos Estados vizinhos. O professor Hausfer também persuadiu seu protegido a abandonar o chicote de madeira como seu símbolo e moderar sua montaria como seu símbolo e moderar sua imagem de agitador de massas em favor de uma aparência mais de homem de Estado. Essa estratégia possibilitou a Hitler cortejar uma parcela maior do eleitorado, que viu o apoio ao partido nazista ampliar significativamente, até Hitler perder a paciência com o sistema eleitoral em 1933 e tomar o poder pela força.
Embora não haja nenhuma evidência de que Hitler e seu círculo íntimo praticassem magia ritual, existe evidencia considerável de que eles foram influenciados pelos gurus das trevas do neopaganismo, tais como Guido von List (1848-1919), fundador do Armanismo; Lantz von Liebenfels (1874-1954), líder da Nova Ordem dos Templários; e Houstton Stewart Chamberlain (1855-1927), autor de tratados racistas violentos que Hitler leu com voracidade nos anos anteriores à Grande Guerra. Esses “filósofos” protonazistas promoveram o mito de que o povo alemão era descendente de uma raça ariana superior, que sobrevivera à destruição da lendária ilha da Atlântida. Eles também declaravam que era o destino da Alemanha reivindicar seu papel como a Raça Superior e arruinar os povos “inferiores”, em especial os negros, os ciganos, os eslavos e os judeus, que eram os “Untermenschen” ou sub-humanos nesse mito wagneriano. Os nazistas colocaram muita fé em artefatos ocultos, tais como a Lança e o Santo Graal e também em locais sagrados de onde as energias magnéticas da terra poderiam ser canalizadas para objetivos de magia. Tais conceitos deviam ser familiares a Hitler, que lera a revista Ostara de Liebenfels e outras publicações ocultas em sua juventude, mas foi o componente de mitologia ariana que atraiu sua visão de mundo extremamente nacionalista, não as fantasias esotéricas. Hitler colocou sua fé na intimação e na bala do revólver, não em relíquias míticas. Ele estava todo entusiasmado com a revolução violenta e não tinha paciência para “místicos Völkisch”, cuja visão irremediavelmente romântica de um idílio rural seduziu os operários a abraçarem o Nacional-socialismo como uma revolução cultural. Ao aderirem o mito ariano, pode-se dizer que os nazistas se colocaram no papel de emissários de Satã na Terra, pois eles perverteram a ciência, a religião e cada faceta do esforço humano para promover sua ideologia maligna, que impingiram pelo medo, ódio, mentiras e violência. Eles também doutrinaram seu povo com sua propaganda venenosa, a ponto de aceitarem de bom grado o assassinato dos incapazes e enfermos, o aprisionamento e tortura de seus inimigos políticos, a invasão e escravidão de nações vizinhas e guerra global e genocídio de cidadãos inocentes. Se tivessem sido bem-sucedidos em suas ambições de estabelecer uma Nova Ordem na Europa, os nazistas teriam superado o Cristianismo com uma forma de culto neopagão, com a suástica substituindo a cruz cristã. Como Hitler declarou: “ou o indivíduo é alemão ou cristão. Você não pode ser ambos (...) Nossos camponeses não se esqueceram de sua verdadeira religião. Ela ainda está viva(...) As antigas crenças serão trazidas de volta à boa reputação(...) Ao camponês será contado o que a Igreja destruiu: todo o conhecimento secreto da natureza, do divino, do informe, do sobrenatural(...) nós devemos eliminar o verniz cristão e trazer de volta uma religião apropriada para a nossa raça(...) nosso campesinato ainda vive com crenças e valores pagãos(...) por meio do campesinato, nós seremos realmente capazes de destruir o Cristianismo porque neles existe uma verdadeira religião enraizada na natureza e no sangue”.
A tentativa do regime foi de impor sua demagogia a seu próprio povo, em vez de suas campanhas assassinas no estrangeiro, isso incensou a Igreja alemã e levou à acusação de influências satânicas no interior do Reich. O historiador e ocultista britânico Lewis Spence expressou o desconforto sentido pelas autoridades religiosas alemãs nos anos anteriores à guerra ao escrever: “... o movimento neopagão na Alemanha, a origem satânica inflexível de seus métodos e intenções não admite discussão. A substituição da cruz pela suástica, a abolição do Sacramento em favor de um rito parecido com o dos mistérios de Deméter, a perseguição de igrejas cristãs e de seus sacerdotes e pastores, e a substituição do ritual ou serviço e hinário por cerimônias blasfemas e canções, pelo estabelecimento de uma nova divindade, pela instrução dos jovens nos mitos do passado em vez das Escrituras – tudo isso fornece a prova mais clara da regressão da Alemanha naquele tipo de paganismo, o qual a política e a propaganda satanista invariavelmente consideram como o meio mais adequado para a destruição da fé cristã”. Spence não tinha dúvidas de que Hitler era um Fausto moderno que vendera sua alma para o Diabo e, assim, dedicava-se a cumprir o plano de seu mestre para o domínio do mundo. “O Füher é apenas a criatura e instrumento de forças que por séculos estiveram usando este ou aquele ditador tirano ou outra marionete famosa, para avançar em suas intenções arcanas que, trocando em miúdos, são a criação do caos generalizado e a destruição final da humanidade.” Spence sustentava que o nazismo não foi iniciado por satanistas, mas foi infiltrado pelos discípulos do Demônio, para que a Alemanha se tornasse seu instrumento para o caos e a destruição. “Se o Príncipe das Trevas em pessoa tivesse tomado para si o governo daquela nação, é difícil sugerir como ele poderia ter se trazido à vida senão da forma que seu líder infeliz o fez, ou com ruindade mais fantástica.” “Toda palavra que vem da boca de Hitler é mentirosa. Quando ele diz paz, ele quer dizer guerra; e, quando ele usa de forma blasfema o nome do Senhor, ele quer dizer o poder do Demônio, o anjo caído, Satã(...) quem hoje em dia duvidar da realidade, da existência de poderes demoníacos, falhou consideravelmente em compreender o fundamento metafísico dessa guerra. Por trás do concreto, os acontecimentos visíveis, por trás de qualquer objetivo, consideração lógica, nós encontramos o elemento irracional: a luta contra o Demônio, contra os servos do Anticristo.”
O único grupo dentro da Alemanha, além da Igreja, que teve coragem para falar contra o regime foi a organização de estudantes antinazista conhecida como Rosa Branca, liderada por Sophie Scholl e seu irmão Hans. Eles se sacrificaram em um esforço vão de despertar a consciência de seus compatriotas e expor a verdadeira natureza do inimigo interno.
Toda essa falação sobre o Demônio e sobre Hitler ser um médium para forças malevolentes é naturalmente descartada como irreal pelos historiadores convencionais, que veem a Alemanha nazista como um fenômeno sociopolítico e Hitler como nada mais que um agitador de massas demagogo e oportunista militar. Eles estão certos quando sugerem não existir evidência de que Hitler e seu círculo íntimo praticassem magia ritual ou convocassem demônios para cumprir ordens. Contudo, Hitler despertou força das trevas latentes na alma alemã e a nação sucumbiu a uma neurose de massas que subverteu toda a razão. Mas ninguém que tenha marchado sob os estandartes rubro-negros, ou encorajado as tropas de assalto com seu passo de ganso, compreendeu a verdadeira natureza dessas forças, nem eles poderiam ter resistido à atração do malevolente Flautista de Hamelin que os conduzia como a lemingues para a autodestruição, a não ser que eles possuíssem uma vontade equivalente à dele. Pois o encanto que Hitler inconscientemente lançava sobre as massas que o idolatravam era uma forma de magia, embora ela não requeresse um círculo desenhado no chão nem precisasse de fórmulas mágicas, mantos ou outra parafernália oculta. O fenômeno que foi a Alemanha nazista foi, de fato, um “triunfo da vontade”, para ecoar o título do notório filme de propaganda nazista de Leni Reifenstahl – foi o exercício da vontade dominante de Hitler sobre todos os outros, foi sua neurose tornada manifesta. Todos os que caíram na órbita do Führer testemunharam seu magnetismo pessoal e seu olhar penetrante, que drenava sua vontade de resistir. E não eram apenas as massas que ele dominava. Até seus generais confessaram manter suas visitas ao quartel-general a um mínimo, pois temiam que seus protestos diante da incessante intromissão de Hitler nos assuntos militares seriam silenciados por sua personalidade autoritária. O arquiteto de Hitler, Albert Speer, testemunhou a habilidade de seu mentor para subjugar seus subordinados pela pura força de vontade em várias ocasiões.  “Eles ficavam todos sob o seu feitiço, com obediência cega e sem vontade própria(...) estar em sua presença por qualquer período de tempo me deixava cansado, exausto e vazio.” Mesmo nos dias finais da guerra, quando a degeneração do estado físico de Hitler ficou visível, o oficial do Comando-Geral Ulrick de Maizière observou que ele “não tinha perdido nem um pouco de seu carisma demoníaco”.
Hitler não era impressionante ou atraente como homem, mas possuía o poder de entreter uma audiência, o que ele explorou sem piedade para seus próprios fins. “O poder que sempre iniciou as maiores religiões e avalanches políticas no decorrer da história foi, desde tempos imemoriais, o poder mágico da palavra falada(...) o que eu digo é como uma ordem dada sob a hipnose.” (Adolf Hitler, Mein Kampf) Outros, não suscetíveis a seu magnetismo pessoal, atribuíam a atração de Hitler a forças sobrenaturais. De acordo com o líder político nazista Hermann Rauschning: “É impossível não se pensar nele como um médium. Pois a maior parte do tempo os médiuns são pessoas comuns e insignificantes. De repente, eles recebem o que parece ser um poder sobrenatural, que os coloca à parte do resto da humanidade(...) Uma vez passada a crise, eles caem de novo na mediocridade. Era assim, sem qualquer dúvida, que Hitler era possuído por forças demoníacas, das quais o homem individual, Hitler, era apenas um veículo temporário.”

Quanto aos aspectos teatrais de magia cerimonial, eles estavam presentes na Alemanha, mas na época não eram percebidos como tal. Com seus estandartes imensos, música marcial, símbolos arcanos e consagração solene de bandeiras, os comícios anuais de Nuremberg serviam como ritos quase religiosos para despertar a vontade coletiva e invocar os arquétipos da psique alemã. Ao anoitecer, 200 holofotes se acendiam em direção ao céu para criar o que Albert Speer chamou de “catedral de luz”, embora nada de sagrado estivesse sendo conduzido no interior desse círculo mágico. Pelotões massivos de tropas SS com camisas pretas, as tropas de assalto com camisas marrons da AS, a Juventude Hitlerista e outros grupos ouviam fascinados os sermões dados por seu messias, que apelava aos seus instintos básicos e também ao orgulho. Porém, não era o orgulho da realização, era o orgulho de Lúcifer – arrogância, desdém, falsa sensação de superioridade e uma sede de poder insaciável.

Os nazistas não precisavam de nenhuma assistência das forças das trevas, porque o demônio que libertaram foi totalmente criado por eles. Os demônios que Hitler invocava eram os que afloravam de sua psique insana. Ele não era um mago no sentido tradicional, mas instintivamente explorou seus dons oratórios para manipular as massas para fins egoístas, apelando para seu orgulho e seus preconceitos. O pesadelo que a Alemanha nazista representou foi tornar a mentalidade de massa mais evidente, e isso foi mais assustador porque uma nação que havia dado luz a alguns dos grandes intelectos e artistas da Era Moderna havia sido corrompida. Inconsciente da natureza das forças que haviam sido liberadas, a nação foi incapaz de conter ou controla-las e, no fim, foi consumida por elas. Os nazistas foram a prova viva, se necessário, de que o mal é criação do homem e que os que invocam o aspecto demoníaco ou primal de sua natureza estão condenados à autodestruição. Infelizmente, os demônios de nossa natureza podem causar sofrimentos incontáveis antes de ser finalmente vencidos. Goethe apresentou uma intuição sobre a natureza do mal, que se provaria profundamente profética: “A manifestação mais temível do demoníaco é quando ele é predominante no caráter de um indivíduo (...) Tais pessoas nem sempre são os homens mais eminentes, nem em intelecto ou talentos especiais (...) a parcela mais esclarecida da humanidade tenta em vão lançar suspeitas de que eles sejam tolos ou impostores – eles atraem as massas (...) nada pode derrota-los, apenas o próprio Universo com que eles iniciaram a refrega.”




(continua...)




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A ARTE NEGRA POR AHNDRUS

(Fonte: Livro: Templo de AHNDRUS , DESVENDANDO AS PRÁTICAS PROIBIDAS Consagrações, Instrumentos, Feitiços e Rituais de Danilo Coppini "Dan Maxa" ; Editora: MADRAS)

Os Reis e Rainhas da Arte Negra



Abaddon:


Inteligência furiosa, causa discórdias e devastações. Não se deve invoca-lo sem uma grave e urgente necessidade. Sua comida predileta são bifes de carne crua adornados com frutas silvestres e sua bebida é o sangue de animais imolados. Ocorre o chamamento em noites de lua minguante, com o céu parcialmente nublado.



Asmodeus:


A “criatura que julga”. Espirito muito popular por praticantes das Artes Negras, quando necessitam de forças destruidoras motivadas por conceitos e injustiça. Pode ser invocado também para casos relacionados à luxuria e ao poder. Classificado como “Rei dos vingadores do mal”. Água pura (de poço) é item que jamais poderá faltar em suas invocações. Sua comida predileta é o cordeiro assado, temperado com alecrim e hortelã e sua bebida predileta é o vinho tinto. No primeiro dia de novembro, deve-se ritualizar para glorifica-lo e solicitar sua intervenção em questões pessoais.



Astaroth:



É aquele que procura, um acusador nato e inquisidor. Suas forças agem sempre que um bruxo necessitar de “fendas” para atacar oponentes. Também possui muita amplitude para elevar as pessoas cultural e financeiramente. Sua bebida preferida é o vinho branco levemente adoçado com mel. Sua comida predileta é codorna assada temerada com vinagre e raspas de limão, pequenas batatas assadas com óleo de oliva. Costuma-se glorificá-lo no mês de agosto. Estudiosos afirmam que Astaroth é a corrupção do nome grego Astarte (deusa). Porém, ela foi metamorfoseada em um demônio masculino, que criou vida após anos de energia direcionada. Portanto, tornaram-se inteligências distintas.





Azazel:

Azazel é um dos “anjos caídos” tipificados no Zohar (grupo de livros que descrevem comentários místicos sobre a religiosidade da Torá – livros de Moisés). Segundo o “Livro de Enoch”, é um dos 200 anjos que se rebelaram contra a criação. Possui grandes poderes sobrenaturais e ensina feitiçaria aos homens. Muitas lendas giram em torno desse nome, desde ser o verdadeiro pai de Caim, representar Satanás e até esposar as filhas dos homens para criar uma raça de gigantes. Em verdade, Azazel é o “deus-bode”, pois possui a capacidade de absorver a negatividade em amplo aspecto, de promover a força da virilidade, de despertar a força da sabedoria, de carregar a força da conquista material, de promover a autoestima e de ensinar os homens, que assim enxergam as maravilhas escondidas na magia. Azazel é um Deus! Ele não pode ser visto apenas como parte de um contexto expiatório (em razão de ser “deus-bode”), não se trata apenas de pecados e redenções. Para os bruxos pecar significa desconhecer. A sensualidade e virilidade de Azazel são transferidas aos que nele buscam isso. Isso também se afirma no “Livro de Enoch”. Azazel ensinou os homens a manipulação dos metais, a origem das artes, os valores das pedras. Como “deus-bode” é Senhor da Terra e possui todas as respostas. Sua comida e bebida estão descritas no feitiço destinado a ele.




Beelzebuth:

Beelzebuth é um espírito que pode intervir em todas as questões do homem (erroneamente é representado pela imagem de Bafomé  "Encyclopedia of Occultism", Lewes Spence, copyright 1959, publicada originalmente em 1920). Beelzebuth é o senhor da terra, confundido por uma das traduções Vulgatas como “senhor das moscas”. Existem inúmeras lendas cercando essa deidade. Em verdade, é o antigo deus; ou seja, uma inteligência muito poderosa com força criativa e destrutiva. A forma correta de escrever seu nome é Beelzeboul (grego). É temido e amado por inúmeros seguidores, mas respeitado por todas as religiões. Sua comida predileta é um grande pedaço de carne bovina (nobre) mal assado, temperado com azeitonas, manjericão, orégano e pistache triturado. Seus pratos devem ser adornados com tâmaras secas, pêssegos, fruta-do-conde, maçãs e castanhas. Sua bebida preferida é o vinho tinto seco. Costuma-se glorifica-lo no mês de setembro e em todas as ocasiões onde ocorrer o eclipse completo da Lua.



Belial:

Inteligência rebelde, seus poderes são da guerra, violência, maldade e perversidade. Protege os bruxos de ataques e aniquila todos os inimigos. Belial possui um dom de favorecimento: pode ser invocado para provas e testes. Sua comida predileta é a carne de cupim bovina assada, levemente temperada com ervas finas, regada com óleo de oliva, adornada com muitas hortaliças, frutas secas variadas e frutas nobres. Gosta de um pote com mel ao lado e um cálice com água e lavanda. Sua bebida preferida é uma destilada (cachaça, tequila, uísque, entre outras), com cravos.




Hecate:

Hecate é a mãe da Arte Negra. Deusa poderosa, rainha dos mortos e chicote das almas. Seus poderes de magia são tão vastos como suas lendas. Seus domínios e a amplitude de suas forças são quase incompreensíveis. Essa deusa, ora Rainha, é a inteligência capaz de retirar todos os obstáculos dos caminhos de um bruxo. Mesmo sendo ela o “espinho da flor”, pode revelar onde estão os demais espinhos. Nas encruzilhadas “da vida” habita Hecate, e é essa Rainha que pode trazer as riquezas para os filhos da Arte Negra. Cães são os animais de força dela, assim como animais selvagens. Sua comida predileta é um pedaço de carne de javali. Tudo deve ser temperado com óleo de oliva, limão e louro. Muitas frutas e flores dama-da-noite, agonia, lírios ou copos-de-leite deve adornar seu prato. Um cálice de água, um de suco de maça e outro com vinho tipo rose devem ser servidos. Costuma-se ofertar esses pratos em uma encruzilhada, em lua minguante.  









Leviatã:


Leviatã é o grande senhor dos mares. Representa o poder das profundezas e de todos os labirintos esquecidos. O mar é o grande senhor dos comércios, guerras e transportes. Sem esse senhor-serpente não existe comunicação mágica. Um bruxo sempre que necessitar agitar uma “situação que está parada”, dar início a algo, afundar alguma coisa, derrotar pessoas que se encontram muito distantes deve solicitar a tal inteligência. Sua comida preferida é um prato composto por peixe assado e frutos do mar cozidos em água de coco verde, temperados com cominho e pimenta-do-reino, cuidadosamente adornado com folhas de bananeira. Sua bebida é um ponche de frutas cítricas. Deve ser entregue nas pedras à beira-mar, em notes de lua cheia, quando a maré estiver cheia.









Lilith:

Deusa do livre-arbítrio, da livre expressão sexual, da liberdade das ações, da coragem, das amarrações. Lilith tem o poder de penetração nos sonhos, de manipulações mentais. Os bruxos devem apenas reverencia-la para nunca sofrer ataques e sempre  estar protegidos contra influxos sexuais. Lilith habita os espelhos e toda a vaidade humana. Sua comida preferida é carne de coelho assada em fogueira, temperada com vinho de maçã e pétalas de rosas. O prato deve ser adornado com muitas flores vermelhas e ao lado deve-se colocar um espelho e um perfume feminino. Para beber, um espumante de classe. Costuma-se glorificá-la no mês de maio, sempre em lua cheia.









Lúcifer:

“Como caíste dos céus, estrela filha da manhã. Foste atirado na terra como vencedora das nações.”








As traduções para o sagrado nome de Lúcifer derivam do latim, do hebraico e do grego. Resumindo, seu nome simboliza a “estrela da manhã”, o portador de luz, o sol brilhante, enfim, todas as vertentes reconhecem-no como criatura iluminada e repleta de dons supremos. Erroneamente, muitas pessoas creem que Lúcifer seja Satã. Ambos interagem, são complementares em suas funções, mas não são a mesma energia. Satã é o fogo, o senhor absoluto das transformações, das provas, do poder de superação; enquanto Lúcifer é a fonte dos conhecimentos para se alcançar as transformações. Sem as cobranças de Satã, jamais existira a beleza de Lúcifer. Lúcifer nos ensina a cortar as amarras de um velho tempo, de velhos conceitos cansados e rejeitados. Lúcifer é a tecnologia, a evolução, a grandeza do poder e das conquistas. Lúcifer e Satã são “o caminho” para o autoconhecimento e a vida em plenitude. Sem conhecer sua origem (que está no fogo) ninguém será capaz de encontrar a luz. Lúcifer é o equilíbrio, o ponto de encontro, a magnitude, o poder de dominar os instintos e consequentemente as pessoas. Para ser bruxo é necessário comungar dessa natureza, pois, sem ela, a Arte Negra não passaria de apenas um teatro vago e sem sentido. Sua comida preferida são uvas frescas e doces. Também aprecia azeitonas fartas, queijos finos e presunto tipo “Parma”. Deve-se acondicionar em um rato de prata devidamente decorado com as folhas do parreiral. Para beber, uma bela taça de cristal com vinho tinto seco nobre. Podem ser servidas às sextas-feiras, nos horários de Vênus.









Mammon:

Esta inteligência é a verdadeira riqueza. Carrega o poder do ouro, do dinheiro e de tudo relacionado às transações bancárias. Erroneamente classificam-no como senhor da avareza, mas os bruxos que souberem adora-lo corretamente terão muita fartura e posses. Sua comida predileta é um prato composto com corações de galinha, um coração de boi e um coração de porco, temperados com alecrim e azeite de girassol. O prato deve ser forrado com folhas de mamona, ter lentilhas, grãos-de-bico, grãos de milho (tudo cozido). Como decoração, colocam-se 11 moedas e 4 notas correntes (de baixo valor). Para servir Mammon, deve-se abrir um círculo com pó de ouro, acender circularmente, de maneira alternada, 22 velas (douradas e pretas) e depositar sua oferta ao centro. Sua bebida é sempre um copo de cristal com uísques envelhecidos. Deve-se fazer ao  amanhecer de um domingo, em um local com sombra e próximo a uma estrada movimentada.









Meririm:

Inteligência muito pouco conhecida, porém, tido como "um dos grandes nove senhores”. Um dos responsáveis pelos poderes do ar, principalmente dos raios e trovões. É guardião dos quatro ventos da Terra; portanto, senhor das mensagens. Tem o poder de se deslocar com velocidades incríveis a todos os lugares, através dos meridianos. Um bruxo pode invocar-lhe sempre que necessite do deslocamento mágico e da velocidade nos feitiços. Sua comida preferida são patos silvestres assados em fogueira, regados com óleo de oliva e vinho tinto e no prato deve conter uma salada de brotos de bambu. Tudo adornado com flores silvestres. Para beber, suco de uva, 21 gotas de sangue do bruxo e mel. Feito ao ar livre, após as 18h em um campo aberto ou em dias de eclipse solar.









Satã:

Em hebraico, Satã significa “o adversário”. Muitas pessoas acreditam que ele é o operador “por detrás” de todas as desgraças do mundo. Tido como força do mal, essa inteligência tem a capacidade de operar e manipular o fogo, capaz de consumir tudo que as pessoas constroem. Satã abandona todos aqueles que se prendem às correntes de dogmas ultrapassados. Satã significa vitória, novas perspectivas, derrota de inimigos que não permitem o progresso, a farpa nos olhos dos invejosos, aquele que abandonou a escravidão... Satã é a glória da manipulação dos fracos é o Heraldo da Luz. Satã é o dono das Artes Negras, das sabedorias secretas e só ele ativa as chaves para os aprendizados. Tudo o que o mundo pode nos oferecer está nas mãos dele, assim como todos os males que o mundo nos impõe são manipulados por ele. Satã é o Alpha de tudo. Essa inteligência tem como um dos pratos prediletos costelas bovinas (com muitas ripas), costelas de porco, ambas temperadas com três tipos de pimenta fresca e um fio de óleo de pimenta. Sua bebida é vinho tinto seco com 21 gotas de sangue dos bruxos em uma taça de prata, mas deverá ter um copo com alguma bebida destilada ao lado. Seu prato deverá ser decorado com folhas de louro, aveia, arroz (cozido sem tempero), ovos cozidos de galinha, codorna e pata. Costuma-se fazer esse prato sempre que o bruxo necessitar de sua intervenção, em suas disputas. Pode ser feito em qualquer local e horário após às 21h.

(continua..)







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Do Livro: HISTÓRIA OCULTA DO SATANISMO A Verdadeira História da Magia Negra Da Antiguidade Até Nossos Dias , De: Santiago Gamacho Hidalgo , Editora MADRAS



PACTUAR COM O DIABO:

Um dos aspectos mais interessantes da satanologia é o tema recorrente dos seres humanos que fazem um pacto com o Diabo. A lenda de Fausto é a mais conhecida dessas histórias. Em troca de sua alma, Satã lhe concederá abundância ou juventude durante um período de tempo especificado. Na maioria das versões da história, Fausto engana o Diabo e evita o pagamento. Na versão original do mito, o Diabo mutila e mata Fausto, como liquidação do contrato. As versões mais amplas dessa história vêem as transações com os espíritos como uma troca da alma por algo tangível. Entretanto, na maioria das vezes, os espíritos não estão interessados nas almas. Satanás já “tem” suas almas. Os espíritos, como os seres humanos, estão sedentos de aplauso, louvores e atenção. Por exemplo, o humano que faz o trato promete ao demônio de plantão a edificação de um templo em sua honra, ou escrever um livro sobre ele ou dedicado a ele. Deixo à imaginação do leitor supor quais favores estarão sendo pagos por meio dessas páginas. Os espíritos querem notoriedade, ainda que os humanos queiram poder e determinados favores especiais. Assim, o que se estabelece é uma relação simbiótica entre os espíritos e o homem. De fato, a conclusão fundamental à qual poderemos chegar é de que os pactos com o Diabo não são uma raridade medieval própria dos delírios de mentes supersticiosas de outros tempos, mas, sim, uma prática completamente vigente e muito mais ampla do que qualquer um de nós poderia supor. A ideia do pacto ou trato é tão antiga quanto o próprio homem. Quase todos os humanos fazem algum tipo de promessa aos seres superiores, negociam, fazem trocas... diferentemente dos animais, os humanos e os “deuses” fazem e rompem promessas de descanso. O pacto implica que se presuma haver alguém com o poder de cumprir com o pactuado. Assim, cada trato é o ato de orgulho e cada promessa, uma mentira em potencial. De fato, uma das advocações de Satã o qualifica como o “Príncipe das Mentiras”. As promessas, os pactos, os tratos e os acordos são, neles mesmos, um ato de fé. Na tradição judaico-cristã, a educação das crianças inclui o aprendizado, desde a mais tenra idade, da técnica para realizar este tipo de promessas a Deus. Inclusive aqueles que se declaram ateus fazem tratos, de vez em quando, com as forças do invisível. Pactos e tratos são estabelecidos em quase todas as relações imagináveis. A fé nas promessas é um dos pilares nos quais se sustenta a civilização. O pacto com o Diabo é um símbolo da liberdade do homem, uma situação de mercado livre na qual o homem opera em termos de “igualdade” com seus – teoricamente – superiores do mundo espiritual. É um comércio honrado no que se se refere ao fato de que o homem tenta influenciar o universo para obter um benefício de forma honesta e abertamente, algo do que o mesmo Prometeu sentiria orgulho. É este Deus-homem do qual tantos intelectuais vêm falado durante os últimos cem anos? Fazer um pacto com o Diabo ou com qualquer outro espírito é negociar para obter benefícios. Não devemos nos estranhar com o fato de que o pacto tenha tanta má fama, já que nos encontramos a um ato reprovável perante os olhos da Igreja e da sociedade. Aquele que decide estabelecer o pacto, rechaça os meios convencionais e ignora a suposta ajuda e autoridade dos personagens eminentes da comunidade. Libertando-se da influência das autoridades, o homem se converte em um ser livre e perigoso. Os pactos com os espíritos requerem esforço e não devem ser feitos frivolamente. Com frequência, é mais fácil usar meios convencionais para conseguir o que se deseja. Não obstante, quando esses meios se esgotam, o pacto proporciona um sentimento de poder que mitiga a impotência, e frequentemente é o suficiente em si mesmo para fazer com que o homem se sobreponha aos obstáculos da vida. Em muitas liturgias, dá na mesma se não houver crença nele, porque, o pacto não é senão um psicodrama, o qual que pode desatar insuspeitadas capacidades ocultas. Não há que se seguir um ritual determinado ao pé da letra. Durante toda a história da humanidade, o homem luta contra as forças do mal para conseguir a salvação da sua alma. Tendo chegado o século XX, os adeptos do movimento New Age descreverão esta situação como a luta da “Luz” (a Verdade) contra as Trevas (a Ignorância). O problema com a definição desses conceitos é que cada religião ou filosofia de vida parece ter um significado próprio para cada um deles.Uma alternativa ao conflito aparente dessas duas forças, é considerar que Bem e Mal não existem, são uma ilusão, uma criação da mente do Homem, o que C.G Jung teria chamado de arquétipo (símbolos aos quais recorrem os seres humanos para definir nossa realidade).
O nome de Lúcifer significa “portador de luz”, algo que se encaixa na perfeição de seu papel prometeico. A princípio, era um anjo belo e poderoso que, mais tarde, se ergueu como líder da rebelião no céu contra a autoridade de Deus. Por seu pecado de desobediência, Lúcifer foi exilado nos infernos, juntos daqueles anjos que o haviam seguido durante a guerra. Em sua nova condição, seu nome passou a ser Satã. Lúcifer pode ser visto como um herói trágico graças ao fato de que, até mesmo em sua derrota, ele mantém seu orgulho e seus princípios, o que é uma perspectiva muito moderna sobre o Diabo. Essa visão tem matizes evidentes de gnósticos. A crença destes era de que o conhecimento e a liberdade são o que realmente nos concede a condição de humanos, e qualquer autoridade que nos impeça de conhecer nossa verdadeira natureza ou de escolhermos nosso próprio destino é má, não importando como esta se caracterize. Pela perspectiva gnóstica, os anjos eram escravos antes da rebelião no céu, já que eles nunca questionavam suas ações nem mesmo as ações do próprio Deus, tal como Adão e Eva eram escravos no Jardim do Éden e faziam o que lhes era dito, sem se perguntarem se isso era bom ou não. Assim encontramo-nos com duas imagens distintas de Lúcifer claramente diferenciadas: um demônio horrendo que habita o inferno e devora as almas malditas e um rebelde destemido que sofre o tormento eterno porque nunca se renderá à regra arbitrária imposta pelo Todo-poderoso. A desobediência e o orgulho são os dois pecados fundamentais de Lúcifer. De fato, de um ponto de vista religioso, não existe pecado que não possa ser reduzido a u mato de desobediência, de negativa com relação a acatar a lei divina.

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MAGIA NEGRA:

A prática da Magia é o coração da tradição esotérica européia. A palavra “Magia” provém do termo Magi (Magos), sacerdotes da dinastia persa dos Sassânidas (224-729), - ainda que sua história remonte às mesmas origens da cultura ariana nos desertos do Irã. Os Magi eram famosos a admirados por sua sabedoria, assim como sua capacidade para realizar milagres (“Magia”). Os cordiais Reis Magos do mito do Natal cristão eram “Magi” (Magos), de maneira que foi o Cristianismo quem introduziu a palavra “Magia” em nossa língua. O Xamanismo (a religião tribal siberiana utilizada pelos antropólogos para exemplificar como surge a religião nas culturas) unificou as funções de sacerdote, mago, profeta, adivinho e curandeiro em um único papel, aquele do xamã tribal. Conforme as sociedades se tornaram progressivamente maiores e mais complexas, as funções sociais do xamã chegaram a ser mais importantes que suas funções mágicas. Isso levou, muitas vezes, a uma ruptura entre os sacerdotes “exotéricos”, os quais celebravam ritos como matrimônios e enterros, e os magos “esotéricos”, que sobreviveram como curandeiros e bruxos. Depois desta ruptura, é comum achar que o sacerdócio se converte em “ortodoxia”, com um sistema ajustado de regras religiosas. A necessidade do contato direto com a deidade ou com as deidades diminui até quase se extinguir, pois qualquer nova revelação divina pode transtornar a ordem estabelecida. É por esse motivo que os sacerdotes ortodoxos organizam muitas vezes cruzadas contra suas contrapartes “heterodoxas”, cuja função como magos requer, em geral, o contato direto com a divindade. Na cultura europeia, a tradição mágica dos povos celtas, dos nórdicos e dos antigos saxões sobreviveu até épocas relativamente recentes, apesar da repressão selvagem das autoridades eclesiásticas cristãs cuja religião já se havia convertido em ortodoxa e exotérica na época de sua difusão por estes lares. À parte de alguns focos de conversão obtidos por missionários especialmente eficazes, o cristianismo foi adotado, em primeiro lugar, pelos reis e pela nobreza, provavelmente por razões mais práticas do que espirituais. Como resultado disso, as práticas tradicionais foram se distanciando dos centros de poder, sendo restringida sua influência aos distritos periféricos dos distintos reinos. É por este motivo que a sobrevivência da Magia Pré-cristã é associada, com frequência, aos ambientes rurais mais distanciados. O termo “pagão” se referia originalmente a qualquer aldeão, já que vem da raiz latina “paganus”, que significa “rústico” ou “do povo”. Desde os anos 1950, ocorre certo número de tentativas para o restabelecimento das práticas, religiões e Magia dos tempos pagãos, sendo a mais notável a chamada Wicca, um sistema religioso que reuniu muitas dessas tradições.

No século XVI, surgiu um renovado interesse pela exploração das ramificações esotéricas da cristandade (a Tradição Rosa-Cruz), o judaísmo (a Cabala) e o Islã (Sufismo). Esta inspiração foi, em grande parte, o caldo de cultivo que propiciou a criação da Sociedade Teosófica, fundada em 1875, por Helena P. Blavatsky, Judge  e Olcott.  Apesar do fato de que a sociedade estava imbuída de um ar inequivocadamente orientalista, supunha-se também um despertar no interesse relacionado às manifestações espirituais mais genuinamente europeias, em particular, a tradição rosa-cruz, o esoterismo cristão e o paganismo céltico. O aprofundamento nestes terrenos foi o que levou dois maçons britânicos, S.L MacGregor Mathers e W. W. Westcott, a fundar a Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn), em 1888. Esta se converteu indubitavelmente na influência da Magia Ritual do século XX, sendo suas técnicas e sua filosofia a base da qual surgiu uma variedade quase infinita de adaptações. Possivelmente, o iniciado mais famoso da Golden Dawn foi Aleister Crowley cujos numerosos escândalos e sua qualificação, por parte dos tabloides como “satanista” e “mago negro” fizeram com que ele obtivesse notoriedade internacional. Nos anos de 1940, Crowley desenvolve a chamada “Magia Thelêmica”, que funde a tradição da Golden Dawn com elementos herméticos, tântricos e egípcios, dando um passo a mais na tendência em direção ao sincretismo esotérico iniciado pela própria Golden Dawn e pela Sociedade Teosófica. Sua Magia em teoria e prática continua a ser um dos textos definitivos sobre o tema. Em 1921, Margaret Murray publicou um livro extremamente influente, “O Culto das Bruxas na Europa Ocidental”, que foi seguido dez anos mais tarde por “O Deus das Bruxas”. Nessas obras, a autora fazia eco da existência de uma religião pan-europeia que sobreviveu até a Idade Média em forma de bruxaria. Em 1948, as circunstâncias para que se desse um renascimento do paganismo europeu se viram fortalecidas pela publicação de “A Deusa Branca”, um impecável tratado antropológico saído da pena de Robert Graves, o qual, mais tarde, alcançaria fama mundial pela adaptação televisiva da novela, “Eu, Cláudio”. Parece provável que essas fontes tenham formado o alicerce para a moderna restauração da bruxaria como um culto pan-europeu, que tem como base a adoração de um Deus solar provido de cornos (Murray) e de uma Deusa lunar com três manifestações diferentes (Graves). A Wicca (a qual empresta seu nome de uma palavra celta que significa “sabedoria”) aparece em 1953, quando é mencionada pela primeira vez no livro “A Bruxaria Hoje”, de G. B. Gardner. Apesar de muitas das teorias históricas nas quais se baseia terem caído em descrédito na atualidade, a Wicca é, indubitavelmente, a inspiração principal que está por trás do enorme ímpeto que vem adquirindo o movimento neopagão, e ainda é um dos sistemas mais influentes da cultura mágica ocidental. Nos anos de 1960, os hippies, o LSD e a ascensão da cultura alternativa proporcionaram novos públicos para as ideias e práticas mágicas. Aquela ´[época supunha também o ocaso quase definitivo da Magia Thelêmica e das tradições da Golden Dawn. A explosão psicodélica, apadrinhada por Timothy Leary, e a cultura da droga trouxeram um novo impulso experimentador, enquanto a sofisticação da tecnologia de informação e o estudo da antropologia ocasionaram crescentes oportunidades para a síntese de diversas tradições religiosas. Em 1978, um guru tântrico chamado Mahendranath criou a AMOOKOS, a Ordem Arcana e Mágica dos Cavaleiros de Shambhala. Essa organização trabalhava com um sistema mágico desenvolvido por Michael Magee, o qual sintetizava as tradições Tântrica e Thelêmica em uma série de práticas e rituais separados por graus. Em 1991, Mahendranath morreu e a seita desmembrou-se em diversos grupos, dos quais o mais famoso é o Garuda Gana. Nos últimos 25 anos, os livros de Magia ou sobre Magia concentraram-se, principalmente, na Magia Cabalística, na Psicologia Junguiana ou no Noepaganismo, seja relacionado com a Wicca ou não. Mas quase ninguém pretou atenção a uma série de livros, sistemas mágicos e crenças que, a partir do Renascimento, passou a ter uma posição indiscutível na prática séria da Arte Mágica. Esse material representa o que normalmente é considerado Magia Negra, com a qual se pretende fazer o contato com determinados espíritos denominados demônios. É uma forma de magia transcendental, na qual o praticante tenta transmutar sua alma para converter-se em algo mais que um homem: obter o poder do mago. O saber dessa Magia Negra é compilado em vários livros que, com toda segurança, têm como base manuscritos muito mais antigos. Destacam-se: “Grimorium Verum”, “O Grande Grimório” e “O Grimório do Papa Honório III”

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OS GRIMÓRIOS:

O apelativo grimório é derivado da palavra gramática. Uma gramática é a descrição de um sistema de símbolos e a combinação para criar orações com significado. Um grimório é basicamente igual: a descrição de um sistema de símbolos mágicos e a combinação correta. A maioria desses textos está ligada à tradição mágica europeia, com sólidos vínculos com o judeu-cristianismo. Ainda que esse gênero da arte mágica não deva ser confundido com o Neopaganismo, muitas das tradições neopagãs utilizam rituais e técnicas similares, mesmo variando substancialmente seu vocabulário (utilizam geralmente vocabulários de origem celta).

A seguir, repassaremos brevemente alguns dos grimórios mais utilizados:
6° e 7° Livros de Moisés: Estes dois grimórios (que, na verdade, formam um único livro) são citados com frequência como manuais de cabeceira de um grande número de magos. Reivindicam-se ser uma continuação do Pentateuco – os cinco ´primeiros livros da Bíblia – e ter saído da pena de Moisés. Ainda que afirmem possuir uma natureza cabalística, há muito pouco da Cabala real neles. Pelo contrário, parecem resignar-se ao típico sistema de Magia Ritual com seus correspondentes para convocar e despedir-se dos espíritos, assim como para conseguir utilizá-los com propósitos mundanos. Publicados em 1849, os 6° e 7° livros de Moisés afirmam incluir material de 1338m 1383 e 1501, com fragmentos traduzidos da língua samaritana, extinta desde o século XII, e sobre a qual pouco se sabe. Os aspectos mais interessantes desses livros são as ilustrações únicas de selos mágicos, com caracteres hebraicos e de uma língua desconhecida, além das listas de entidades demoníacas.

A Clávícula de Salomão: Ainda que esse grimório seja tradicionalmente atribuído ao rei Salomão bíblico, provavelmente foi escrito no século XIII. Sua influência na Magia atual deve-se, em grande parte, ao fato de que foi um dos livros favoritos da Golden Dawn, com o que se converteu em uma das fontes da Magia Ritual moderna. Esse texto tem influências genuínas e parece muito mais bem documentado do que o grimório anterior.


“Pow-Wow” ou o Amigo Grande Tempo Perdido: É o melhor exemplo de como a tradição mágica europeia foi transplantada para a América do Norte. Trata-se de um grimório extensamente utilizado pela população holandesa da Pensilvânia. Apesar de seu nome, o Pow-Wow nada tem a ver com a tradição nativa americana, exceto pelo fato de ser um sistema de cura e de Magia Ritual que foi importado para a América, no século XVIII, por imigrantes de origem alemã. Depois de haver passado muito tempo no esquecimento, determinados grupos mágicos dos Estados Unidos voltaram a usá-los em anos recentes.

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SIMON FORMAM “O DOUTOR” e DUQUE PHILLIPPE DE ORLEANS:

Apesar de a Igreja haver obtido um êxito notável na hora de reprimir os cismas que surgiram em seu seio, tradicionalmente se viu impotente para combater a prática da feitiçaria, ainda que para isso tenha precisado recorrer à clandestinidade. Aqueles magos “brancos”, como Giordano Bruno ou John Dee, que se arriscaram a defender abertamente a Magia, foram vítimas de incontáveis perseguições e intrigas por parte de pessoas e instituições que se declararam seus inimigos, jurados tão-somente pela valentia de declarar em público sua heterodoxia (algo do que, em menor proporção, também sabem muito os modernos parapsicólogos, ufólogos e todos aqueles que se dedicam ao estudo de temas “pouco convencionais”). É lógico, pois, que, perante a perspectiva da prisão ou de ser queimado em uma fogueira erigida em praça pública, os magos tenham optado pela prudente opção de ocultar sua arte aos olhos da comunidade. Bom exemplo disso é a França. Apesar de sua condição de país católico, e provavelmente devido a uma série de reis, estes que foram algo mais que bons conhecedores das artes ocultas, o país galo converteu-se na terra mais fecunda e segura para os magos profissionais. Muitos deles escaparam da fogueira por dois motivos: primeiro, as principais vítimas dos julgamentos por bruxaria eram geralmente membros do campesinato luterano e cidadãos das nações calvinistas. Contrariamente ao mito histórico, a Inquisição foi muitíssimo menos destrutiva nesse sentido do que os tribunais formados pelas novas seitas protestantes. Em segundo lugar, as pessoas que ganhavam a vida dessa curiosa forma costumavam ser indivíduos educados, que gozavam da proteção de seus clientes principais: a aristocracia. Em não poucas situações, eles mesmos eram aristocratas. Esse fato é raramente mencionado nos livros de história, mas uma importante quantidade de pessoas com grande peso na vida política da Europa foi adepta da Magia Ritual. Um exemplo famoso foi Francis Stewart Hepburn, “o Mago Marquês” de Bothwell, que de forma reiterada usou a Magia Negra para dar um empurrãozinho em sua carreira política e eliminar, ou pelo menos tentar, seus inimigos. Hepburn era primo do rei James I da Inglaterra. Foi acusado de ser o grão-mestre de um conselho ou de uma reunião noturna de bruxos e bruxas, com a suposta intervenção do demônio, ordinariamente na figura de um bode, para a prática das artes desta superstição, em Berwick. Perante a perspectiva pouco agradável de um linchamento, Hepburn viu-se forçado a abandonar o país em 1595. Muitos de seus presumidos cúmplices diabólicos foram queimados vivos, por insistência do rei.
Hepburn também era amigo e cliente do sinistro Doutor Simon Forman, o qual, se formos levar em consideração o testemunho de seus contemporâneos, foi um dos mais dotados e um dos maiores libertinos de sua época. O dr. Forman foi um ocultista britânico da Época Isabelina, que exerceu a “profissão” de médico alternativo em Londres. Seus primeiros passos como médico e cirurgião lhe valeram uma boa temporada no cárcere. Por causa das práticas ocultas e das perigosas poções que prescrevia, foi proibido de praticar a medicina e, para completar o quadro novelesco que rodeia esse personagem, depois de sua morte, foi a ele vinculado um assassinato. Apesar de tão pouco recomendável currículo, Forman era uma espécie de herói local em Londres, principalmente em reconhecimento a determinada ocasião na qual ele permaneceu na cidade durante um início de peste, indo de rua em rua, aliviando os enfermos até quase cair extenuado por causa da falta de sono e de alimento. Os registros de sua biografia, inclusive seus muitos experimentos de caráter oculto, estão guardados na biblioteca Bodleian, em Oxford. Simon Forman nasceu em 30 de dezembro de 1552, em Quidhampton. Com nove anos, foi matriculado em uma escola de Salisbury, a qual teve de abandonar dois anos mais tarde, por causa da morte de seu pai, em 31 de dezembro de 1563. Os dez anos seguintes de sua vida foram passados como aprendiz de Mattew Commin, um comerciante local que traficava tecidos, sal e ervas medicinais, e foi durante essa etapa como aprendiz que o jovem Forman começou a adquirir seus primeiros conhecimentos sobre remédios herbários. Após alguns desentendimentos com a senhora Commin, Simon deu seu aprendizado por terminado e se transladou até Oxford para viver com seus primos. Passou o que ele mesmo definiu como um ano infeliz matriculado no Magdalene College, depois do qual abandonou Oxford, coincidindo com uma epidemia. Durante os anos seguintes, Forman desempenhou diferentes ofícios, dentre eles, o de professor de escola em Salisbury. Em 1579, chegou à conclusão de que seu futuro passava pela aquisição de conhecimentos ocultos e aplicou-se com entusiasmo ao estudo dessas matérias, com esperança de chegar a ser um grande mago. Quando se mudou para Londres, em 1592, já havia passado um tempo no cárcere por causa das suas práticas ocultas, as quais não eram precisamente muito do agrado de seus contemporâneos (John Dee, mago e astrólogo da mesma época, também esteve hospedado em um calabouço pelo mesmo motivo). Montou um consultório de medicina alternativa em Billingsgate (Londres), onde desempenhou os papéis de médico e cirurgião, duas profissões vistas como completamente separadas pelos médicos da época. Seus tratamentos tinham como base a astrologia, que utilizava tanto para determinar e enfermidade como o tratamento. Não foi uma época muito afortunada, pois, sendo novo na cidade, tinha escassos pacientes, os quais apenas lhe davam dinheiro o bastante para viver. Quando a peste se nutriu em Londres, em 1592 e 1594, o dr. Forman permaneceu na cidade, enquanto um grande número de médicos fugia apavorado em face à possibilidade de contagiar-se. Esse ato de valor (ainda que outras circunstâncias pudessem ter influenciado em sua permanência na cidade) cimentou decisivamente sua reputação, já que, durante aqueles dias, Forman salvou muitas vidas, incluindo a sua. Depois de haver contraído a enfermidade, o dr. Forman curou-se, utilizando suas próprias águas medicinais, uma façanha que lhe elevou à categoria de herói aos olhos da população londrina. Sua fama e seu renome cresceram de maneira tal que o Real Colégio de Médicos de Londres decidiu pôr fim, definitivamente, à sua carreira, em virtude da sua condição de não-licenciado. Puseram múltiplas objeções a seus tratamentos alternativos e submeteram a exame os conhecimentos anatômicos de Forman. Os examinadores chegaram à conclusão de que seus conhecimentos de medicina convencional e anatomia eram inadequados, quando não, ridículos. Assim, pois, recusaram-se a outorgar-lhe a licença para praticar a medicina e lhe impuseram uma assombrosa multa. Nove meses mais tarde, Forman foi acusado de haver prescrito uma poção a um homem que, posteriormente, morreu, o que lhe valera uma nova condenação. Depois de sete anos de conflitos com o colégio de médicos, a universidade de Cambridge outorgou uma licença a Simon Forman em 1603, se bem que ainda não se encontram declaradas as circunstâncias em que isso se sucedera. Para sua desgraça, as tentativas de converter-se em um grande mago e alquimista não tiveram tanto êxito quanto sua prática médica. Ainda que pareça ter conseguido invocar, em diversas ocasiões, o espírito de um cachorro preto, nunca conseguiu entrar em contato com uma entidade com a qual pudesse se comunicar. Suas tentativas de conseguir a Pedra Filosofal resultaram ser tão custosas e estéreis quanto as de muitos de seus contemporâneos. Existem amplos registros referentes a praticamente todos os aspectos da vida do dr. Forman. Graças a eles, sabemos de seu amor por Shakespeare, de seus experimentos ocultos, dos detalhes de seus conflitos com o colégio de médicos, as vidas de seus criados, as peculiaridades de seus pacientes e, inclusive, sua própria vida sexual. Esses diários formam um excelente retrato da vida em Londres, nos fins do século XVI e início do século XVII. Os manuscritos originais são um dos tesouros mais estimados da Biblioteca Bodleian de Oxford. Uma semana antes de sua morte, Forman anunciou à sua esposa que preparasse os trajes da viúva. Uma semana depois, em uma quinta-feira de setembro de 1611, a profecia se cumpria enquanto ele cruzava o Tâmisa em um barco. Curiosamente, sua morte também foi prevista por outro conhecido astrólogo da época, William Lilly. Três anos depois de sua morte, Forman foi implicado no assassinato de sir Thomas Overbury. Overbury era o conselheiro de Robert Carr, o favorito da corte. Morreu em setembro de 1613, enquanto cumpria uma sentença na Torre de Londres por recusar o cargo de embaixador da Rússia. Em 1615, o tribunal que julgava Frances Howard (Lady Essex) e sua amiga amante, Anne Turner, chegou à conclusão de que o dr. Forman havia corrompido, de alguma maneira, as duas mulheres quando eram suas pacientes (parecia que ele lhes havia dado uma bebida medicinal para tornar o marido de Lady Essex impotente). A mulher estava atravessando o inferno de um matrimônio desventurado e estava perdidamente apaixonada por Robert Carr, entretanto Overbury opunha-se firmemente a essa relação, o que lhe valeu ser assassinado. A viúva de Forman foi chamada a declarar, e seus diários foram apresentados como prova, o que serviu para que como prova, o que serviu para que Anne Turner fosse condenada como autora essencial do crime; Lady Essex foi expulsa da corte (ainda que mais tarde tenha sido perdoada) e a memória de Forman recebera uma mancha que lhe faria passar à história como um personagem sinistro. A pergunta diante de uma biografia tão formentosa como a de Forman é se realmente as práticas ocultistas servem para algo. A respostas habitual da maioria das pessoas costuma ser “não”, como reflexo do que nossa cultura nos programa para crermos. Não obstante, no decorrer da história, algumas das mentes mais refinadas e das personalidades mais poderosas de cada época, pessoas muito pouco propensas às perdas inúteis de tempo, tiveram em conta esse tipo de prática. Muitos desses personagens conservaram, no decorrer de suas carreiras, seus “magos de cabeceira” e os converteram em seus conselheiros mais assíduos. No entanto, se analisarmos os diários mágicos de Simon Forman, veremos que seu conteúdo é completamente consoante com os estudos modernos sobre os fenômenos psíquicos, trazendo a garantia de que procedem de uma pessoa com conceitos e marcos de referência completamente diferentes daqueles com os quais lidamos hoje em dia. Talvez um exemplo contribua para que compreendamos melhor tudo isso. Um século antes da Revolução Francesa, Luís XIV se recuperava a duras penas de uma série de desastrosas campanhas militares que havia esgotado quase por completo os tesouros reais. A nobreza e os cortesãos sobressaíam-se por seus respeitos, ao passo que o rei tinha assuntos mais importantes para se preocupar. Fica difícil para uma pessoa de nosso século compreender o grau de privilégio e de poder pessoal que tinham, naqueles dias, os nascidos nas classes altas. Versalhes era um redemoinho impetuoso de intriga, corrupção e sexo (tudo isso em variedades inimagináveis). Aqueles que não tinham mais opção, exceto habitar naquela atmosfera estressante e competitiva, utilizavam qualquer coisa que os ajudassem, não para prosperar sobre os outros, mas apenas para sobreviver. Essas ferramentas eram a coação, a sedução, a chantagem, o suborno e, quando os métodos mais civilizados falhavam, o veneno e a Magia Negra. Naquela selva, destacava-se sobre todos um predador cruel e impiedoso, cujo único olhar despertava o temor nos corações mais cínicos e habituados da corte. Era Phillippe, duque de Orleans, o sobrinho do rei e uma das pessoas mais unidas ao trono da França. Era inteligente, excepcionalmente culto, um completo amoral, assassino sem escrúpulos, bissexual declarado e, desde sua juventude, um consumado praticante das artes negras. Nas palavras de seu tio, o rei, Phillippe era “um anuncio ambulante de todo tipo de vício e crime”. À parte disso, era membro das principais sociedades secretas francesas. Pôde entrar sem dificuldades nesses círculos graças ao seu pai, o irmão do rei, o qual tinha a alcunha de “Monsieur”, que não se envergonhava de sua condição de homossexual e se tornou famoso por ir à batalha montado a cavalo, com a espada em uma das mãos e uma sombrinha aberta na outra. Parece que o interesse de Phillippe pela Magia Negra começou quando era bem jovem, convertendo-se em pouco tempo em uma das figuras principais de uma rede secreta de magos, alquimistas, envenenadores e alcoviteiros que se estendia desde as linhas mais altas da nobreza francesa até os mais sórdidos becos das gangues de Paris. Se alguém merecera alguma vez o qualitativo “satânico”, este foi o duque de Orleans. Nascido para o poder, considerava-se claramente “mais além do bem e do mal”, nas mesmas condições em que o tornariam um moderno sociopata. Para mostrar um exemplo de seu absoluto desprezo pelas normas morais vigentes em sua sociedade, sabe-se que ele mantinha uma relação incestuosa com sua filha, até que esta se casou. O que parece é que quando a lua-de-mel havia terminado, o duque de Orleans não viu motivo algum para que o novo estado civil de sua filha lhe privasse de seu prazer favorito, tanto que voltou a andar com ela sem que qualquer um pudesse fazer nada para evita-lo. Como é compreensível, o marido da garota se encontrava notavelmente perturbado perante uma situação com a qual ele reconhecia ser incapaz de lidar. Para acalmar os ânimos de seu genro, que estavam se tornando perigosamente inquietos e turbulentos, o duque decidiu convidá-lo a jantar em sua casa. Em algum momento entre a sopa e a sobremesa, o homem caiu no chão fulminado e morreu alguns dias depois em sua cama. Foi assim que o duque começou a ser alcunhado pelo povo de “Phillippe, o Envenenador”. Há suspeitas razoáveis por parte dos historiadores sobre sua responsabilidade na morte do Delfin, o neto de Luís, abrindo assim o caminho para converter-se em regente da França depois da morte do rei. O fato de que o governante de uma das nações mais poderosas da Europa fora um assassino em série que fez uso de muitas de suas noites no oferecimento de sangue de cabras ao diabo, parece algo próprio de uma novela de uma novela de Stephen King, mas se trata de um fato histórico documentado. Esse é o mundo em que nasceram os pactos com o Diabo tal como os conhecemos hoje em dia. Um período em que as “artes negras” estavam em seu apogeu máximo, seus praticantes eram personagens socialmente influentes e os livros mágicos e herméticos, uma das influências nas mentes tão esclarecidas, por exemplo, a de Isaac Newton.

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Os Sacerdotes de Satã

O polêmico arcebispo Emmanuel Milingo proclamou, em novembro de 1996: “Núcleos satanistas dentro do clero levam a cabo missas negras no recinto do Vaticano (...) O Diabo está tão protegido que proíbem ao caçador, ao exorcista, fazer seu trabalho!” O clero foi, curiosamente, um dos elementos essenciais da história das relações do homem com o Diabo.
O sacerdócio francês da época de Luis XIV era uma classe social imensamente empobrecida, e a grande quantidade de sacerdotes ordenados fazia com que fosse quase impossível que todos pudessem encontrar um posto na hierarquia funcionarial da Igreja. Muitos deles foram vítimas de uma ilusão de prosperidade que sacudira muitas famílias humildes da época. Os filhos do campesinato eram enviados aos seminários, às vezes em condições muito precárias e a custo de grandes sacrifícios por parte de suas famílias, para que a igreja lhes desse educação e um meio de vida que seus pais não lhes podiam proporcionar. No outro extremo da escala social, os segundos filhos da aristocracia eram consagrados à Igreja de modo a evitar problemas com os legados e para que fossem divididos os grandes patrimônios da oligarquia francesa. Essa situação conduziu, ao longo dos anos, a que um grande número de pessoas especializadas nos rituais da Igreja não tivesse paróquia alguma para ganhar a vida. A única forma que essas pessoas tinham de obter receitas parcas era vendendo seus serviços a quem pagasse melhor. Em que consistiam esses serviços? Basicamente na celebração de missas pagãs, com o objetivo de proporcionar ao cliente algum tipo de benefício. Assim, chegaram a ser celebradas missas petitórias solicitando a sedução de uma garota, o aumento da riqueza ou, até mesmo, a morte de um inimigo. Do ponto de vista de um sacerdote do século XVI ou XVII, não havia nada particularmente contraditório em tais ações. Eram sacerdotes, homens de Deus consagrados. A Igreja lhes havia investido, em nome de Deus todo-poderoso, uma série de atribuições que eles tinham a liberdade de utilizar como melhor considerassem, especialmente lhes servia para que não fossem para a cama com o estômago vazio. A missa era considerada um ato mágico dotado de poder em si mesmo, sem levar em conta o propósito pelo qual a missa era celebrada. Essa prática se converteu em algo tão comum que ocorreu o caso de um sacerdote executado publicamente por tentativa de assassinato ao aceitar, em troca de uma substancial quantia em dinheiro, oferecer uma missa fúnebre em nome de alguém ainda vivo com o objetivo de conseguir sua morte. O misticismo cristão tem raízes mágicas evidentes e, se estudássemos a história da Igreja antiga, descobriríamos que muitos sacerdotes eram realmente feiticeiros, indistinguíveis em sua atuação daqueles de outras tradições nas quais a presença mágica parece muito mais evidente. Dessa forma, a missa poderia ser considerada, sem dificuldades, um ato mágico. Cabe recordar que existem muito mais formas de Magia que aquele estereotipado pronunciamento de feitiços. A Teurgia – que implica oração, um ritual religioso e meditação – é uma forma de Magia voltada ao estabelecimento de uma comunhão com os deuses. Geralmente, emprega-se essa forma de Magia para criar um fluxo de energia entre o praticante e sua ideia de divindade. Se meditarmos a respeito, descobriremos que o mesmo propósito está contido na missa católica e que culmina no ato ritual da Eucaristia. O pão e o vinho convertem-se no corpo e no sangue de Cristo porque Jesus, que é uma manifestação de Deus, assim o disse. Visto dessa maneira, encontramo-nos perante uma poderosa forma de Magia. Tradicionalmente, é conhecido o costume dos feiticeiros de pronunciar a fórmula “Hocus pocus” no momento da realização de um ato de Magia. “Hocus pocus” é um jogo de palavras retirado do que dizia Jesus na Bíblia latina: “Hoc est corpus meum”, que significa “Este é meu corpo” (Coríntios, 11:24). O mago pretendia apoiar-se de alguma maneira na doutrina da presença verdadeira de Cristo na Eucaristia. Compreendia o fato de que o sacerdote realizava um ato de Magia na missa quando pronunciava a frase latina “hoc est corpus meum” e pretendia explorar assim o poder inerente ao sacerdócio.

Ainda que esses sacerdotes mercenários não estivessem sempre implicados em práticas tão elevadas e espirituais, certa senhora de Lusignan foi surpreendida em companhia de um sacerdote, enquanto saltavam e brincavam alegremente desnudos no bosque e praticavam “abominações” com a ajuda de um grosso círio pascal. Embora a maioria desses personagens tenha limitado suas atividades aos rituais ortodoxos da Igreja, houve aqueles que atravessaram a fronteira, tornando assim o Satanismo e a Magia Negra práticas consagradas. Conjuravam demônios, fabricavam talismãs para seus clientes e celebravam a famosa e legendária missa negra, que tinha de ser oficiada por um sacerdote apóstata. Isso não pressupunha qualquer dificuldade, pois, por aqueles dias, havia uma abundância desse tipo de sacerdotes.

O papa Honório III (1216-27) é o presumido autor do grande grimório de Honório, o Grande, que compila uma série de cerimônias projetadas expressamente para serem realizadas por um sacerdote católico, e o conteúdo do livro implica que fora escrito por alguém iniciado nos ritos da Igreja: “Este é o livro de Magia Negra considerado, geralmente pelos escritores especializados em ciências ocultas, o trabalho mais diabólico da história da magia”, disse uma vez, para descrevê-lo, o autor Idries Shah. O livro pretende ter saído da pena de Honório, mas muitos escritores católicos denunciam-no como uma falsificação. Escrito originalmente em latim, o livro não obteve qualquer opinião a seu favor entre os magos até o século XVII. Sua introdução afirma oferecer aos magos “as chaves do reino dos céus” a capacidade “de invocar o príncipe das trevas e os anjos que são seus criados”. A obra inclui uma curiosa bula papal que proclama: “Nós, o Pontífice (...) temos a intenção e o desejo de comunicar este poder sobre os espíritos que possuímos e que, até este momento, fora conhecido somente por aqueles de nossa classe. Pela inspiração de Deus, desejamos transmitir e compartilhar este poder com nossos irmãos respeitados e nossos queridos filhos em Jesus Cristo”. Na preparação do ritual, o livro aconselha que o mago “deva, em primeiro lugar, jejuar durante três dias. Depois disso, deve confessar-se e prostrar-se perante o altar da Igreja...” Uma vez cumpridos esses requisitos prévios, o mago “deve procurar um galo preto, ao qual matará depois do pôr-do-sol e do qual extrairá a primeira pena da asa esquerda, a qual será guardada cuidadosamente. Então, os olhos deste são removidos e estes, juntamente com a língua e o coração, devem secar ao sol e serem pulverizados.” Depois de uma série de operações que implicava consagrações, uma missa, os cânticos, orações, a preparação de pergaminho mágico com a pele de um cordeiro macho degolado e a preparação de um círculo mágico, poderia começar a grande conjuração: “Conjuro-te neste círculo, ó maldito (nome do espírito)... que atrevestes a desobedecer a Deus. Vem, agora (nome do espírito), obedeça a mim e cumpra com meus desejos”. Depois de fazer o pedido, o mago era instruído sobre a forma adequada de mandar o demônio embora, usando “a ordem do pentáculo” e uma oração que era concluída da seguinte forma: “Toda honra e toda glória àquele que está no trono, o que é eterno. Amém”.
Honorius era igualmente famoso nos círculos ocultos por aprovar a formação da ordem dominicana em 1220. Chamados de os “monges negros” ou os “frades de negro”, os dominicanos formaram mais tarde a maior parte do molde da Inquisição, enviando para a tortura e para a morte incontáveis inocentes que, no que se refere à prática da Magia Negra, encontravam-se muito longe de muitos membros do próprio clero.
A.E. Waite, em seu “Livro de Magia Cerimonial”, considera ridícula a ideia de que o papa estava por trás da redação deste grimório, se bem que aceita a participação de membros do clero nesse tipo de atividades. De fato, deixando de um lado a improvável situação de que um papa se vira implicado em tais feitos, considera-se que o mais provável seja este livro ter sido escrito por um sacerdote renegado. O entendimento que mostra o autor da função e do planejamento do ritual é sofisticado e elegante. Fosse quem fosse a pessoa que concebera o cerimonial deste grimório, possuía visão e compreensão do poder da liturgia católica do que carece a imensa maioria dos grimórios.

As raízes literárias de outros livros de Magia conhecidos são ainda mais insuspeitadas. No período em que foram publicados pela primeira vez, a colônia do Haiti era uma das possessões mais ricas e apreciadas da França. Ainda que esse não seja o lugar para ingressar em uma discussão histórica a respeito do assunto, a maioria dos historiadores tem consciência da brutalidade que foi mostrada em relação aos escravos negros importados (milhões deles foram levados à ilha durante todo o período colonial) por parte de seus senhores cristãos. A prática da religião africana foi terminantemente proibida pelos governantes da ilha, se bem que a população de escravos era tão grande que ninguém poderia garantir que eles não realizariam, em segredo, suas cerimônias tradicionais. Durante o tempo em que o Haiti foi território francês, não foram poucos os europeus que mostraram interesse por esses ritos africanos e que os estudaram com o propósito de incorporá-los a seus próprios sistemas de bruxaria. Ao contrário do que ocorria na América do Norte, ali os brancos mantiveram relações pessoais muito estreitas com seus escravos, o que podemos comprovar pela altíssima porcentagem de mulatos que, inclusive hoje em dia, podem ser vistos na ilha. Parece provável que, graças a essa relação íntima, alguns brancos tenham obtido o privilégio de ser iniciados na tradição ritual africana, a qual, mais tarde, foi assimilada pela Magia europeia por intermédio deles. Essa influência pode ser percebida em alguns famosos tratados de Magia Negra, naqueles em que o aspecto ritual adquire uma importância desconhecida até então. Os grimórios clássicos não contém rituais especialmente complexos. Os livros, como o “Lemegeton” e a “Clavícula de Salomão”, falam de espíritos e talismãs, além de incluírem conjurações e ameaças a serem repetidos pelo feiticeiro até conseguir que as entidades a serem convocadas cumpram com sua vontade.

Não obstante, existem outros rituais nos quais é necessário, como etapa prévia à sua execução, que haja um longo período de purificação e de sacrifício, assim como a criação ritual das ferramentas apropriadas para realizar a liturgia. No caso do ritual atribuído a Honório III, esse processo estende-se durante um mês. Isso constitui um inegável paralelismo com os rituais afro-caribenhos praticados diariamente em cada grande cidade do Hemisfério Ocidental. Essas religiões estão a caminho de converter-se em um pujante fenômeno espiritual que já transcendera com seu crescimento as fronteiras geográficas e culturais que as viram nascer. Apenas nos Estados Unidos, é estimado que existam uns cinco milhões de praticantes de Santería (conjunto de sistemas religiosos que misturam crenças Católicas-Cristãs com as do Yorubá tradicional). A Santería não é uma religião arcaica. É uma força vibrante com 500 anos de história ininterrupta no Hemisfério Ocidental e cujas raízes africanas são pelo menos tão antigas e profundas como as do Cristianismo. São milhões de praticantes nos Estados Unidos, no Caribe, na América do Sul, na América Central e na Europa. Existe o Vodu no Haiti, a Macumba no Brasil e o Candomblé nas costas do Norte da América do Sul. Seus adeptos procedem de todas as classes sociais: médicos, advogados, políticos, ladrões e prostitutas. Todos eles buscam obter o poder de controlar suas próprias vidas e conduzi-las segundo seu critério. Os sistemas de crença tradicionais do mundo Ocidental não têm uma participação emocional direta dos mistérios da vida, motivo pelo qual, cada vez mais pessoas buscam respostas no vibrante ritmo dos tambores santeiros. É uma religião de transe, de mistério, de possessão, de sangue e de sexo. Pouco pode ser feito pelas páginas de um livro para transmitir a verdadeira essência dessa liturgia. Se queres conhecer de verdade a Santería, é preciso frequentar as cerimônias, fazer uma oferenda e dançar ao som dos tambores. A cor da pele ou o lugar de nascimento não formam qualquer barreira. Os Deuses Antigos reconhecem os seus. A Santería, ou mais corretamente, a Regla de Ocha, é uma religião originária da África. Foi levada ao Novo Mundo pelos Yorubás da costa ocidental da África, que hoje em dia são a Nigéria e Dahomey, uma região onde a atividade dos traficantes de escravos foi especialmente intensa. Quando os africanos chegaram à América, tiveram que adaptar sua religião para continuar praticando-a, evitando o controle dos brancos. Mascararam seus orixás (as deidades da religião Yorubá), fazendo com que eles adotassem a identidade dos santos cristãos. Os donos das plantações assumiram a ideia de que os escravos tinham se convertido em devotos católicos quando, na verdade, continuavam adorando secretamente seus Orixás. O panorama político e cultural na terra dos Yorubás era muito similar ao da Grécia Clássica; existia uma série de cidades-estado livremente associadas. Cada cidade estava consagrada a um Orixá e esse era seu centro de adoração. Se alguém fosse designado a ser sacerdote de Oxum, por exemplo, essa pessoa deveria ir a Osogbo, cidade na qual havia lugar, cidade na qual havia lugar para sua iniciação e onde tal pessoa viveria para sempre. Essas cidades sofriam saques periódicos por parte dos traficantes de escravos. Dessa forma, adoradores dos diferentes deuses do panteão Yorubá viram-se obrigados a conviver no Novo Mundo. Chamavam-se entre si “Lukumí”, uma expressão yorubá que significa “meu amigo”. Dessa maneira, eles podiam identificar-se e diferenciar-se do restante dos escravos, procedentes de outras regiões, como o Congo. A situação anômala de sobrevivência que presumia a existência da escravidão fez com que os Lukumí se vissem obrigados a adaptar sua religião às circunstâncias. Na África, cada um deles estaria sob a proteção de um Orixá à parte de ser consagrado a Elegba. Entretanto, no Novo Mundo, perderam-se alguns sacerdócios dos Orixás menos comuns. Os sacerdotes começaram a temer pela adoração de seu respectivo Orixá assim que decidiram consolidar suas práticas religiosas por meio de um sistema de iniciações que culminava com o sacerdócio, no qual, diferentemente dos costumes africanos, o indivíduo recebia cinco ou seis Orixás. Essa adaptação demonstrou ser extremamente eficaz para manter o culto entre os escravos. A América foi um terreno especialmente fértil para o enraizamento das religiões tradicionais africanas e, hoje em dia, os Estados Unidos constituem um foco de grande expansão dessas crenças. Muitos afro-americanos buscam suas raízes por intermédio da espiritualidade da terra de onde foram arrancados seus antepassados e voltam-se à Santería em busca de uma parte de sua identidade. Os Orixás não são entidades malvadas, ao contrário, poderíamos considera-los o equivalente aos anjos cristãos. A imagem negativa associada à Santería foi, em grande parte, inventada pelos meios de comunicação sensacionalistas e os exageros de Hollywood. Curiosamente, a Santería foi condenada e caluniada pela Igreja católica como uma bárbara, primitiva, arcaica e demoníaca. Contudo, os Orixás e sua religião mantiveram-se mais vivos do que nunca.

(continua...)


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Do Manual do Tarô Astrológico e Cabalístico, de Atílio Morris =


Atribuições Às Letras do Alfabeto Hebraico =
Aleph : O primeiro som, a primeira letra, unidade, princípio, força, atividade, poder, estabilidade, o homem como unidade coletiva
Beth : O interior ativo, o poder plasmante, o germe, paternidade, o Criador, a habitação, o objeto central
Ghimel : O sinal do organismo, envolvimento material do corpo, seus órgãos e suas funções
Daleth : A natureza divisível, abundância, divisão, nutrição
He : O fôlego, princípio vivificador, vida absoluta e de toda ideia abstrata do ser, alma, espírito
Vau : O nó que liga ou um ponto que separa o Ser e o Não Ser, o que faz passar de uma natureza à outra
Zain : A tendência, o esforço dirigido a um fim, a causa final, a refração luminosa, a indicação
Heth ou Chasid : A existência elementar, rudimentar, equilíbrio, o calor, trabalho e ação moral e legislativa
Teth : A resistência e proteção, teto, abrigo, refúgio, conservação, renovação, os dois princípios: o bem e o mal
Iod : A Divindade, manifestação potencial, duração espiritual, eternidade, como consoante designa duração material
Caph ou Káf : Assimilação, afinidade, coesão, vida refletida e passageira, fôrma, molde, objetos
Lamed : A idéia de extensão, elevação, ocupação, expansão, possessão, instrução, desenvolvimento
Mem : A maternidade, fecundidade, formação plástica, ação exterior, passividade, água, líquido, fluidez
Nun : O Ser produzido ou refletido, a existência individual e corporal, o filho, fruto, geração
Samech : O movimento circular, a circunferência, a renovação cíclica, o universo
Ayin ou Aín : A idéia de matéria, as relações físicas, ruído, vento, vazio, o que é desarmônico, confuso, falso, perverso
Phe : A palavra, a boca, o pensamento, o ensino, a cópula, a beleza
Tzadi ou Tsádhe : O pensamento fixo em algum propósito, vontade, ordem, sugestão, termo, alvo, solução, cisão
Kuph ou Qof : A compreensão, arma ofensiva, golpe, ferida, dano, designa também voz, escrita, letra, lei
Resh : A cabeça humana, a unidade psíquica do Ser, a faculdade de sentir, querer e pensar, o movimento, a reflexão, a origem, a repetição
Shin : A imagem de renovação das coisas quanto a seu movimento, existência, duração relativa, transformação, vegetação, reinos da natureza
Tav ou Tau : É o sinal dos sinais, simboliza a reciprocidade, a abundância, a resistência, a proteção, a perfeição



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FONTE: VODU Fenômenos Psíquicos da Jamaica, De: Joseph Williams, Editora: MADRAS

 

Em Notes and Queries, Londres, 25 de janeiro de 1851, encontramos a seguinte comunicação: “Algum de seus leitores pode me dar alguma informação sobre obeísmo. Estou curioso em saber se essa prática é uma religião em si mesma, ou meramente um rito praticado em alguma religião africana e que foi trazido de lá para as Índias Ocidentais(onde, segundo fui informado, está rapidamente encontrando novos adeptos); e se o praticante obeísta adquire esse imenso poder, que supostamente tem sobre seus irmãos negros, através de uma arte, ou apenas atuando sobre as mentes mais supersticiosas de seus companheiros. Qualquer informação sobre o assunto será de grande valia”.T.H., Mincing Lane, 10 de janeiro de 1851.

Essa pergunta recebeu muitas respostas. Na edição de 22 de fevereiro de 1851, lemos a seguinte declaração: “Como nosso correspondente deseja qualquer informação sobre obeísmo, na falta de algo melhor e mais completo, ofereço minha pequena colaboração: no início deste século, os escravos das Índias Ocidentais falavam(mais como uma superstição do que como “religião” ou rito)da existência de um poder- alegado por seus praticantes e confirmado pelos pacientes -, que causava bem ou mal, e que era sempre empregado por uma “consideração” de algum tipo, por vantagem, quer honorífica, pecuniária, ou de outra espécie daquele que a concedia. Isso ocorre pela influência falsa de certos feitiços, cerimônias, fetiches, ou outros encantamentos, praticados com maior ou menor diversidade de adeptos, mágicos e conjuradores, falsos profetas de todas as épocas e países, etc. O autor acredita que o obeísmo está em declínio e assina simplesmente M.

Na mesma edição, encontramos outra resposta: “Quanto à pergunta de T.H. em relação ao obeísmo, embora eu não possa dar uma resposta completa no que diz respeito à origem, etc.., acredito que o conhecimento que tenho possa vir a acrescentar algo de valor às informações apresentadas por  correspondentes mais abalisados. Visitei a ilha da Jamaica por um breve período de tempo e pelo que pude aprender sobre o obeísmo, o poder parece ser obtido pelo praticante pela atuação sobre os medos de seus companheiros negros, que são conhecidamente supersticiosos. O principal fetiche parece ser uma mistura de penas, pedaços de caixões funerários e outros ingredientes dos quais não me lembro agora. Acredita-se que um pequeno pacote formado com esses elementos, preso à porta de entrada da vítima, ou colocado em seu caminho, tem o poder de trazer má sorte ao desafortunado indivíduo; e se qualquer acidente, perda ou doença lhe sobrevier, esse fato será atribuído à temível influência da obeah! Mas já ouvi falar de casos em que a pobre vítima definha lentamente e morre, devido a tal poderoso encantamento que, segundo fui informado por antigos residentes da ilha, deve ser atribuído a causas mais naturais, especificamente, influência de veneno. O praticante obeah coloca uma certa quantia de vidro moído na comida da pessoa que o desagradou e o resultado é a morte lenta e com sofrimento! Talvez alguns dos leitores médicos possam confirmar se uma infusão de vidro moído causaria esse efeito. Eu simplesmente estou relatando a informação que recebi de outras pessoas, etc.” Essa carta foi assinada por D.P.W. 

Na edição de 19 de abril de 1851, uma carta assinada por T.J. dá uma certa quantidade de referências para mostrar que o “obeísmo não é apenas um rito, mas uma religião, ou melhor dizendo, uma superstição”. Mais adiante o autor declara que “a influência obeísta não depende do exercício de nenhuma arte ou magia natural, mas na idéia do mal infundida na mente da vítima”.

Em Notes and Queries de 10 de março de 1851, Henry H. Breen, escrevendo de Santa Lucia, insiste: “Obeísmo não é uma religião em si mesma, exceto no sentido dado por Burke que afirma: ‘a superstição é a religião das mentes fracas’. É uma crença, real ou fingida, na eficácia de certos encantamentos e feitiços; e significa para os negros sem instrução a mesma coisa que a magia representava para nossos ignorantes ancestrais. Em Santa Lucia essa superstição é conhecida como kembois. Ainda é muito praticada nas Índias Ocidentais, mas não há razão para supor que está se difundindo rapidamente.”

Enquanto o interesse despertado pelo assunto ainda era intenso, o Medical Times publicou um relato escrito pelo Dr. Stobo de Tortula, nas Ilhas Virgens, sobre o peculiar caso do nascimento de uma criança que fora seguido de sintomas impossíveis de serem diagnosticados pelo médico, embora ele não acredite na explicação do paciente, segunda a qual ela era uma vítima de obeah. O título do artigo é: “Spasmodic Action of the Uterus – Obeism”, e o fato principal do caso é assim narrado: “Ann Eliza Smith, de 50 anos, Sambo, doméstica, mãe de três filhos, sofreu um aborto entre o primeiro e o segundo filho. Durante esse período ela esteve em más condições de saúde. A mulher acreditava, e ainda acredita, ter sido vítima de obeah”. O editor do Medical Times acrescenta a seguinte informação em uma nota de rodapé: “Obeísmo era uma espécie de feitiçaria empregada como vingança, ou proteção contra roubo. O nome deriva de Obi, a cidade, distrito, ou província da África do Sul (sic) de onde se originou. Consiste em fazer um encantamento, ou colocar um fetiche perto da casa do indivíduo que sofrerá sua influência, ou, quando praticada para prevenir contra roubos, coloca-se o fetiche em alguma parte visível da casa ou em uma árvore. O fetiche é uma cabaça, ou cabaço, contendo, entre outros ingredientes, uma combinação de diferentes trapos coloridos, dentes de gato, penas de papagaio, patas de rã, cascas de ovo, espinhas de peixe e caudas de lagarto. O pânico imediatamente toma conta do indivíduo que o vê; e, seja porque a vítima se entrega ao desespero, ou devido à secreta administração de veneno, em muitos casos a morte é a consequência inevitável”. O editor acrescenta logo a seguir: “Apresentaremos, agora, o relato de uma superstição como foi descrita por uma testemunha em um julgamento que ocorreu alguns anos atrás:

‘Você tem conhecimento de que o prisioneiro é um praticante obeah?’

‘Sim senhor! Um verdadeiro tomador de sombra.’

‘O que você quer dizer com tomador de sombra?’

‘Ele tem um caixão.’ (aqui, um pequeno caixão foi apresentado)

‘A que sombra você se refere?’

‘Quando ele faz obeah para alguém, pega a sombra dessa pessoa, e a pessoa morre.’”

Esse exemplo foi tirado de A Pratical View of the Presente State of Slavery in the West Indies, Londres, 1828, p. 185, embora nenhum crédito seja dado ao editor que o cita no The Medical Times.

Em Notes and Queries de 15 de julho de 1899, um artigo assinado por James Platt, Jun. Afirma: “Obi, obeah – A origem desse conhecido termo das Índias Ocidentais não está definida com exatidão em nenhum dos nossos dicionários. Encontramos explicações como ‘provavelmente de origem africana’ (Webster e Chambers); ‘supostamente trazida da África (Worcester). A citação a seguir, do Dicionário Hugh Goldie da Língua Efik (do antigo Calabar), Glasglow, 1874, p. 300, parece solucionar a questão, e é de interesse tanto para os etimologistas quanto para os estudiosos de folclore: ‘Ubio, uma coisa, ou mistura de coisas, colocada no chão, como um fetiche para causar doença ou morte. A obeah das Índias Ocidentais’”.

Essa curta nota produziu grandes efeitos, ou pelo menos a influência de seu autor se fez sentir rapidamente. Pois o Dicionbário Oxford logo em seguida aceitou a sugestão de Mr. Platt e descreveu a obeah com suas variações obi, obia, obea, obeeah, como ‘uma palavra da África ocidental: cf. Efik ubio – uma coisa, ou mistura de coisas, colocada ao chão, como um fetiche, para causar doença ou morte’, e cita como fonte o Dicionário Goldie de Efik, 1874.

Em Voodos and Obeahs mostrei que o mialismo é a antítese direta da obeah; é o remanescente da antiga dança religiosa dos ashanti. Portanto, a obeah é secreta, maliciosa, e gradualmente assumiu uma forma de adoração do demônio. O mialismo, pelo contrário, é praticado publicamente. É benéfico em seus propósitos, e se transformou no moderno renascimento na Jamaica. Na prática, porém, o mesmo indivíduo é frequentemente um praticante obeah à noite e um praticante mialista durante o dia, quando ele “retira da terra” a mesma obeah que plantou enquanto exercia a outra função.

Entre os ashantis da África Ocidental havia um sistema religioso claramente definido em que o Ser Supremo, Onyame, era mais popularmente conhecido pelo título de Nyankopon, que significa Onyame, o único, o grande. Subordinados ao Ser Supremo estavam numerosos guardiões, entidades menores ou espíritos, que agiam como mediadores entre Deus e os homens e que mereciam um lugar de destaque nas observâncias religiosas, uma vez que o próprio Deus era considerado tão distante que, de modo geral, só podia ser alcançado por seus mediadores, exceto em caso de uma necessidade específica, quando as pessoas se dirigiam a Ele diretamente. Consequentemente, embora o Ser Supremo tivesse entre os ashantis um templo e um sacerdócio regular para o qual eram necessários três anos de noviciado, nas questões diárias mais comuns a interferência dos guardiões subordinados era solicitada, pois eles eram considerados mais acessíveis e, como resultado, o okomfo, ou sacerdote, desses vários espíritos exercia uma influência dominante sobre a vida geral dos ashantis, tanto como povo quanto individualmente. Era prerrogativa do okomfo não apenas conduzir o serviço religioso dos santuários das divindades menores, mas também imbuir o amuleto da sorte de sua potência característica. Ele fazia isso não somente pela invocação direta do Ser Supremo, mas especialmente pelos espíritos intermediários, pois eles eram associados às questões humanas. Todos esses ritos e práticas que caracterizam os principais eventos da vida, tais como nascimento, casamento ou morte, tinham um claro caráter religioso. O mesmo acontecia com as celebrações cívicas ou nacionais, e mesmo com a preparação para a guerra ou a coroação de um chefe absoluto.

“O significado secundário do obonsam dá evidências de que os ashantis acreditavam na existência de um demônio, ou espírito malévolo, pessoal que reinava sobre os espíritos dos homens vis que morreram.” (Capitão Rattray)

Como uma derivação dessa palavra, temos sasabonsam que, segundo Christaller “é um ser imaginário monstruoso, concebido com um grande corpo com forma humana, mas de uma cor vermelha e com o cabelo muito comprido; e que habita nos locais mais remotos da floresta, onde uma imensa árvore é sua residência. Ele é inimigo dos homens, principalmente dos sacerdotes, mas é amigo e líder dos feiticeiros e bruxos”.

O capitão Rattray declara que o poder do sasabonsam “é puramente para maldade e feitiçaria”, e mais adiante afirma: “O sasabonsam da Costa do Ouro e dos ashantis é um monstro que, acredita-se, habita regiões das densas matas virgens. Ele é coberto por longos cabelos, tem grandes olhos vermelhos, pernas compridas e pés que apontam para ambos os lados. Senta-se nos galhos mais altos de uma árvore odum ou onyina e balança as pernas, agarrando assim o caçador desavisado. O ser é hostil aos homens e é inimigo da classe sacerdotal. Acredita-se que os caçadores que entram na floresta e desaparecem – como às vezes acontece – foram pegos pelo sasabonsam”.

Temos aqui uma clara distinção teórica entre o demônio ashanti – bonsam – e esse fabuloso monstro da floresta, o sasabonsam. Mas, assim como em inglês, o termo demônio é usado indiscriminadamente tanto para Satã quanto para seus asseclas; também na prática a palavra ashanti sasabonsam é usada como um eufemismo para bonsam, já que não é bom nem ao menos mencionar os nomes dos mortos, pois seus espíritos podem assombrá-lo.

A palavra ashanti para feiticeiro era obayifo, e o capitão Rattray nos dá a seguinte informação sobre esse interessante assunto: “Obayifo, derivação bayi, feitiçaria (termo sinônimo ayen), um mágico, ou de modo mais geral é um feiticeiro. Um tipo de vampiro humano, cujo principal prazer é sugar o sangue de crianças que, por essa razão, definham e morrem. Acredita-se que homens e mulheres possuídos por essa magia negra têm poderes controlados pela vontade, sendo capazes de deixar o próprio corpo e viajar grandes distâncias à noite. Além de sugar o sangue das vítimas, eles supostamente têm a capacidade de extrair a seiva e o sumo das plantas. (Casis de destruição de coqueiros foram atribuídos a obayifos.) Esses feiticeiros têm aparência comum, e um homem nunca sabe se seu amigo, ou sua mulher, é um deles. Quando estão perambulando à noite, irradiam uma luz fosforescente das axilas e dos ânus. Um obayifo na vida diária é conhecido por ter olhos penetrantes que estão sempre em movimento; e por um interesse inadequado em comida, sempre falando no assunto, principalmente sobre carne, e aproximando-se quando alguém está cozinhando. Todos esses hábitos são propositadamente evitados. Um homem raramente negará a outro, ainda que seja um estranho, uma porção do que estiver comendo; e um caçador sempre dará um pedaço da carne crua se alguém pedir, esperando evitar a insatisfação de uma pessoa que, até onde se sabe, pode ser um feiticeiro ou mago”.

Recentemente, no Congresso Antropológico em Londres, Modjaben Dowuona, Esq., nativo da África Ocidental e um dos vice-presidentes da Seção Africana do Congresso, apresentou um trabalho interessante e erudito sobre feitiçaria.

O Sr. Dowuona, desta forma, remonta a obeah da Jamaica por meio de obayifo de ashantis, uma bruxa, para o termo bruxaria, bayi, significando literalmente “levando as crianças embora”. Esse ponto de vista foi sustentado por Christaller, que tirou bayi, bruxaria, de oba, criança e yi, para extrair e transformar obayifo em bruxa ou feiticeira. Christaller também dá como sinônimo ayen com obaayen, um composta de obaa, mulher e ayen, como a forma feminina. E, provavelmente, foi de obayen que a palavra jamaicana obeah derivou diretamente.

Os ashantis foram levados em grande número para a Jamaica pelos comerciantes de escravos. Naturalmente levaram consigo todas as suas antigas tradições e crenças que procuravam colocar em prática no novo ambiente que os cercava. Sendo um povo fortemente religioso, ainda que escravos em uma terra estranha, eles instintivamente voltavam-se abertamente para o okomfo em busca de orientação e consolo, ao mesmo tempo em que, necessariamente, temiam as maquinações secretas dos abomináveis obayifo. Esse temor rapidamente se espalhou pela população escrava em geral, e foi e ssa influência maléfica, mais do que qualquer outra coisa, que deu aos ashantis o controle sobre todas as outras tribos na Jamaica.

Desde o início do estabelecimento de uma legislação na Jamaica, reconheceu-se que as reuniões de escravos que eram marcadas por antigas danças tribais representavam perigo para a colônia. Essas cerimônias eram abertamente acompanhadas por uma batida de tambor que evidentemente incitava o fanatismo dos africanos a ponto de provocar uma rebelião geral.

Em sua obra Ashanti, o capitão Rattray traz um capítulo muito elucidativo sobre a “Linguagem dos Tambores”. Há relatos inacreditáveis sobre a rapidez com que as notícias são transmitidas por toda a África por meio dos assim chamados “tambores falantes”, e acredita-se que algo semelhante ao código Morse seja utilizado com esse propósito. Agora sabemos o que realmente acontece: dois tambores são afinados em tons diferentes – são conhecidos como tambor macho e tambor fêmea; o primeiro com um tom baixo e o segundo com um tom alto. Esses tambores são manipulados de modo que a entonação musical, nos casos de línguas distintamente tonais como a ashanti, é tão precisa que se torna inteligível, como se uma palavra tivesse sido falada.

Podemos afirmar que o processo conduzido pelos ashantis é tão eficiente que temos gravada, por exemplo, a história dos mampons em um recital de tambor que preservou “um registro preciso das migrações do clã desde os tempos remotos quando os manpons estabeleceram-se em Adanse, e também os nomes, feitos e atributos físicos de seus antigos governantes”.

De fato, a exigência de precisão é tão minuciosa que: “Um tocador de tambor que falhe e ‘diga’ uma palavra errada pode ser punido com uma multa de uma ovelha, e, no passado, se ele continuasse a errar poderia ter uma orelha cortada”. O tocador deve ser muito habilidoso antes de demonstrar publicamente sua proficiência, pois a audiência inteira estará checando todas as palavras em cada recitação.

Na Jamaica, as reuniões religiosas dos nativos eram proibidas por lei, o que muito prejudicava o okomfo em sua esfera de influência; até mesmo o seu título fora mudado para “praticante mialista”, enquanto o obayifo ou “praticante obeah”, que sempre trabalhara em segredo, aumentava seu poder.

Como a veneração pública aos deuses não era mais possível, o okomfo foi obrigado a agir em segredo, e não é de se surpreender que ele combateu fogo com fogo, encantamento com encantamento. O objetivo principal de sua religião era o bem estar da comunidade, assim como o objetivo da vida do obayifo era prejudicar o indivíduo.

Assim, com o passar do tempo, era o okomfo, e não o obayifo, como se acreditava, quem administrava o terrível juramento de fetiche. Era ele quem combinava a pólvora com o rum e acrescentava pó das tumbas e sangue humano para fazer a mistura que selava sobre os lábios dos conspiradores a horrível natureza da trama para a liberdade, e roubava seus corações para a perigosa empreitada. Era ele, e ninguém mais, que criava o pó místico que tornaria seus corpos invulneráveis às balas do homem branco. Finalmenmte, era o okomfo, e não o obayifo, que, aproveitando-se de seu conhecimento sobre ervas, induzia um estado de torpor aos colaboradores subservientes, de modo que ele dava a impressão de ser capaz de trazer os mortos de volta à vida.

Edward Long, o primeiro historiador a mencionar a arte obeah, juntou-se à Assembleia da Jamaica (...) Seus registros, portanto podem ser considerados um relato fiel do que era comumente aceito pela crença popular da época em relação à obeah. Assim ele escreve quanto aos escravos: “eles acreditam realmente em aparições de espectros. Os espíritos do colegas mortos são amigáveis; outros, de aspectos mais  hostís, são chamados bugaboos. Os mais sensatos entre os escravos temem os poderes sobrenaturais dos praticantes obeah africanos, ou supostos conjuradores, frequentemente atribuindo os efeitos mortais à magia, quando, na verdade, são apenas os efeitos naturais de alguma substância venenosa, habilmente administrada por esses malfeitores. Mas os creoles imaginam que as virtudes do batismo, ou o ato de torná-los cristãos, torna a arte obeah totalmente ineficaz; e por essa razão muitos desejaram ser batizados, para que possam escapar da obeah."

Praticante obeah tem um grande temor dos padres e geralmente tanta evitar a presença deles. Existe a convicção entre seu grupo que o padre pode exercer uma influência mais forte que a obeah.

Também é aceito como um fato pelos devotos do culto à obeah que o padre pode demonstrar seu poder dominante “acendendo uma vela sobre eles”. Esse processo é assim descrito: “Padre pega alfinete e pega vela, e ele espeta a vela com alfinete; e ele acende a vela em você. Vela queima, queima, queima. E você enfraquece, enfraquece, enfraquece. E quando a chama toca o alfinete, você morre”.

Certa vez, um conhecido praticante obeah procurou-me expressando seu desejo de tornar-se católico exatamente com o objetivo de adquirir esse fantasioso poder da vela acesa.

(continua...)


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Um comentário:

  1. Devolvo toda a glória ao Dr. Alashira pelas coisas maravilhosas que ele fez na vida de minha família desde que o conheci. Especialmente por encerrar a estéril de 10 anos em minha família com o bebê. Minha esposa e eu nos casamos em agosto de 2008, mas tivemos desafios de fruto do útero desde então. Eu vim com vários desafios notáveis, entre os quais onde o desemprego, os problemas acadêmicos e a falta de filhos, mas o Dr. Alashira me entregou um após o outro através de um encontro em diferentes testemunhos que eu vi on-line. meus problemas, ele disse que eu não deveria entrar em pânico que tudo vai ficar bem. Após o primeiro encontro milagrosamente, consegui um emprego. e ele também conheceu outros desafios e me deu algumas tarefas a fazer ... e coisas a serem feitas. .ele me disse com precisão, inúmeras vezes que a única maneira de superar qualquer desafio da vida é acreditar em tudo o que eles pedem para você nunca duvidar e eu duvidei. Eu nunca duvidei do Dr. Alashira no ano passado, em abril, minha esposa foi aos hospitais que foi confirmar grávida..Dr ALA SHIRA se prova fiel a si próprio e ao seu mundo, encerrando a estéril de 10 anos e nos deu um menino saltitante em 9 de dezembro de 2018 / Eu lhe dei toda a glória. Te louvarei para sempre por seu trabalho maravilhoso ... por favor, em qualquer situação, ele pode ajudá-lo vá até ele_ e-mail dr.Alashirao1@gmail.com WhatsApp +2348034395438 obrigado e acredito que ele irá ajudá-lo também ..

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